Acórdão nº 26747/22.2T8LSB-A.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 07-11-2023

Data de Julgamento07 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão26747/22.2T8LSB-A.L1-7
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
1 A apelada deduziu oposição à execução que o apelante moveu contra si invocando a nulidade da sua citação ocorrida no processo de onde resultou o título que serve de base à execução a que esta oposição se encontra apensa, processo que correu termos no Julgados de Paz de Lisboa. suscitou ainda a incompetência dos julgados de paz e impugnou os factos que foram alegados no processo que correu termos no julgado de paz, questões cujo conhecimento ficou prejudicado pela decisão que o tribunal de primeira instância veio a proferir, objeto deste recurso.
2 Alegou a ali embargante/ora apelada que nunca foi citada para o processo junto dos julgados de paz. Disse, concretamente, que nunca recebeu citação do Julgado de Paz de Lisboa e que nunca foi chamada ao processo para estar presente, exercer o contraditório e/ou apresentar provas, nem alguma vez sequer percebeu que tal seria necessário, ficando, por conseguinte, cerceada no seu direito de defesa.
3 Juntou certidão do processo dos julgados de paz.
4 A ali embargada/ora apelante contestou a suscitada nulidade de citação, invocando que a citação foi realizada nos termos legais, pelo que é válida.
5 Findos os articulados, o tribunal de primeira instância proferiu a decisão objeto de recurso.
6 A apelante, inconformada com a decisão do tribunal de primeira instância, apresentou recurso com alegações que concluiu, em suma, da seguinte forma
CONCLUSÕES DO APELANTE
A – A sentença recorrida apresenta contradições entre o despacho a que alude o artigo 595.º do C.P.C e a elaboração do relatório e respetiva decisão quando, por um lado, refere “inexistem quaisquer nulidades secundárias arguidas, exceções ou questões prévias que obstem à apreciação do mérito da causa e de que cumpra conhecer, à exceção da prescrição, única questão em apreciação nestes autos ”, e, por outro, além de não estar em causa uma qualquer exceção de prescrição, o tribunal formulou decisão sobre a nulidade da citação efetuada na ação que precede os autos executivos, o que não se compreende,
B - O tribunal a quo errou ao defender que não lhe cabia verificar, em sede de Embargos de Execução, se em algum momento, se deve considerar a ré regularmente citada, por ter sido recusada a carta de citação, quer pela empresa Executada, quer pelo seu legal representante.
C - Para o que aqui releva, ao contrário do que entendeu o tribunal a quo, a questão sub judice não se coloca em saber como efetivar nesses processos - que correm termos nos Julgados de Paz - a representação dos ausentes, mas sim apurar se, face às diligências tomadas pelo Julgado de Paz, tendentes à citação da ali Requerida, a sociedade Recorrida se considerou, ou não, citada, para aqueles autos.
D – Designadamente, deveria o tribunal a quo, ter considerado verificada a citação da ali requerida, ainda que as cartas registadas com aviso de receção que foram remetidas à ré tendo em vista a sua citação tenham sido por esta recusadas
E – Isto porque, as cartas de citação foram remetidas para a morada da apelada que constava nas bases públicas.
F – A frustração da citação por recusa em receber a carta de citação por parte da apelada, à do disposto no artigo 246.º, n.ºs 3 e 4 do C.P.C., deve valer como ato de citação, por ser norma aplicável subsidiariamente aos Julgados de Paz, no que concerne à citação das pessoas coletivas, por força do artigo 63.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho.
G – A circunstância de o tribunal de primeira instância não ter apreciado as consequências da recusa em receber a carta e os seus efeitos na citação constitui uma verdadeira omissão de pronúncia, além de constituir erro de julgamento.
H - É evidente, face a todas as diligências efetuadas pelo Julgado de Paz de Lisboa, que o mesmo obedeceu aos trâmites legais previstos no artigo 46.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, bem como ao disposto no artigo 246.º, n.º 4 do C.P.C.
I - Quer a Recorrida, quer o seu legal representante, não tomaram conhecimento da citação por causa que lhes foi inteiramente imputável, e, como tal, não podiam vir agora, em sede de Embargos de Executado, invocar possíveis desconformidades em seu proveito,
J - Mais: como se sabe, tanto a Executada/Recorrida, como o seu legal representante, foram citados na morada da sede da ré e domicílio do seu legal representante, para os termos do processo de execução.
K – A decisão do tribunal de primeira instância constitui uma violação das normas que o próprio Mm.º Juiz a quo invocou – artigo 10.º, n.º e 729.º, al. a) do C.P.C. - bem como a violação dos artigo 188.º, n.º 1, al. e) e 246.º, n.º 3 do C.P.C., e artigo 63.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de Julho, aplicável aos Julgados de Paz.
7 A apelada não respondeu ao recurso.
OBJETO DO RECURSO
8 O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso e daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras (artigos 635.º, n.ºs 3 e 4, 639.º, n.º 1 e 608.º, n.º 2, do CPC). O tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista e é livre na interpretação e aplicação do direito (artigo 5.º, n.º 3, do CPC).
9 À luz do exposto, o objeto deste recurso consubstancia-se em analisar e decidir o seguinte:
. Contradição entre o despacho a que alude o artigo 595.º do C.P.C e a elaboração do relatório e respetiva decisão.
. Omissão de pronuncia do tribunal de primeira instância sobre a regularidade da citação da ora apelada.
. Erro de direito sobre a regularidade da citação da ora apelada.
10 Para decidir, o tribunal considera os fundamentos constantes do relatório, a que acrescem os seguintes
FUNDAMENTOS FÁCTICO-PROCESSUAIS
FACTOS JULGADOS PROVADOS PELO TRIBUNAL A QUO
1. A execução tem como título executivo uma sentença proferida pelos julgados de paz.
2. Nesse processo, as cartas registadas com aviso de receção que foram remetidas à ré, aqui executada, tendo em vista a sua citação, pelas razões que constam na certidão enviada pelos julgados de paz, cujo teor aqui se dá por integralmente reproduzido para os devidos efeitos legais, nunca foram por aquela pessoalmente recebidas.
3. No âmbito desses autos, e por se entender não se poder considerar a ré citada, decidiu-se, para esse efeito, remeter a citação por carta registada com aviso de receção, dirigida ao seu legal representante.
4. A qual, pelas razões que constam na referida certidão, também não foi por aquele recebida.
5. Não admitindo a lei dos julgados de paz citação edital, e por não existir Magistrado do Ministério Público junto dos julgados de paz, decidiu-se solicitar à Ordem dos Advogados a nomeação de patrono oficioso para defender os interesses da ré, aqui embargante.
6. Nomeado patrono oficioso, foi o mesmo citado em representação da aqui embargante.
OUTROS FACTOS
11 É relevante considerar ainda, ao abrigo do disposto no artigo 607.º, n.º 4, do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 663.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, que resulta dos autos, designadamente do teor da certidão do processo dos julgados de paz junta pela apelada nos autos, o seguinte:
7. Por carta registada datada de 21/9/2020 foi remetida, dirigida à apelada, para a Av.ª S…, carta de citação, registada, no âmbito do processo pendente no Julgado de Paz de Lisboa aludido no ponto 1 dos factos provados. A carta registada foi devolvida com a menção “não reclamada”.
8. Por carta registada datada de 25/9/2020 foi remetida, dirigida à apelada, para a Av.ª S…, nova carta de citação, registada. Esta segunda carta foi devolvida com a menção “recusada”.
9. Por carta registada datada de 11/1/2022 foi remetida, dirigida a E…, para a Av.ª S…, carta de citação, na qualidade de representante legal da apelada. Esta carta foi devolvida com a menção “recusada”.
9. Na data de envio das mencionadas cartas, a sede da apelada inscrita no Ficheiro Central de pessoas coletivas do RNPC era na Av.ª S... e era gerente único da apelada, E...
10. Em 21/2/2022, foi proferido o seguinte despacho pelo Julgado de Paz de Lisboa:
“uma vez frustradas as diligências de citação postal da demandada EFG…, inclusive na pessoa do seu representante legal e desconhecendo-se o seu atual paradeiro (…). (Deve) ser designado defensor oficioso à referida demandada. (…) Determino se oficie à Delegação da ordem dos Advogados para com urgência proceder à respetiva nomeação”.
11. Em 2/3/2022, na sequência de resposta do CDOA, a juiz de paz proferiu o despacho: “cite-se o defensor oficioso”.

CONHECIMENTO DO OBJETO DO RECURSO
Enquadramento legal
Artigo 46.º da Lei n.º 78/2001, de 13 de julho (Lei de Organização, Competência e Funcionamento dos Julgados de Paz)
1 - As citações e notificações podem ser efetuadas por via postal, podendo, em alternativa, ser feitas pessoalmente, pelo funcionário.
2 - Não se admite a citação edital.
3 - As notificações podem ser efetuadas pessoalmente, por telefone, telecópia ou via postal e podem ser dirigidas para o domicílio ou, se for do conhecimento da secretaria, para o local de trabalho do demandado.
4 - Não há lugar à expedição de cartas rogatórias e precatórias.
Artigo 63.º, da Lei 78/2001, de 13 de julho
É subsidiariamente aplicável, no que não seja incompatível com a presente lei e no respeito pelos princípios gerais do processo nos julgados de paz, o disposto no Código de Processo Civil, com exceção das normas respeitantes ao compromisso arbitral, bem como à reconvenção, à réplica e aos articulados supervenientes.
Artigo 188.º, n.º 1, do Código de Processo Civil
1 - Há falta de citação:
a) Quando o ato tenha sido completamente omitido;
b) Quando tenha havido erro de identidade do citado;
c) Quando se tenha empregado indevidamente a citação edital;
d) Quando se mostre que foi efetuada depois
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