Acórdão nº 2504/21.2T8SLX.L1-6 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-06-23

Data de Julgamento23 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão2504/21.2T8SLX.L1-6
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na 6ª Secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa

1. - Relatório.
A [ ADMINISTRAÇÃO CONJUNTA DO PRÉDIO RÚSTICO DENOMINADO PINHEIRO ….], instituída em 01/12/1996, intentou AÇÃO DECLARATIVA DE IMPUGNAÇÃO DE DELIBERAÇÃO, nos termos do disposto nos artigos 177º e 178º do Código Civil e do n.º 8 do artigo 12º da Lei n.º 91/95 de 2 de setembro,
Contra,
B [ ADMINISTRAÇÃO CONJUNTA DA AUGI DO PINHEIRO ….], instituída na assembleia constitutiva da AUGI do Pinheiro … realizada em 18/09/2021, e Representada por,
1 - NELSON ………., residente no Seixal;
2 - ARMANDO …..., residente em Alhos Vedros; e
3- MANUEL ….….., residente em Corroios.
1.1.- Na acção referida, PETICIONA a autora, que ,Uma vez julgada a presente ação como procedente, por provada, seja, em consequência :
i) declarada ilícita a realização da “Assembleia Constitutiva” da Ré/AUGI do Pinheiro ……, realizada no dia 18 de Setembro de 2021;
ii)anuladas todas as deliberações tomadas na referida Assembleia Constitutiva” e realizada no dia 18 de Setembro de 2021, bem como todos os seus efeitos e actos praticados em resultado dessas mesmas deliberações.
1.2. - Para tanto, alegou a autora, em síntese que :
- Na sequência da entrada em vigor da Lei nº 91/95, de 2 de setembro e que veio estabelecer o regime excecional para a reconversão urbanística das áreas urbanas de génese ilegal (AUGI), realizou-se em 01 de Dezembro de 1996, a Assembleia Geral constitutiva da “Administração Conjunta do Prédio Rústico denominado Pinheiro …..”, a aqui Autora/Requerente, tendo a partir de então ficado instituída a Administração Conjunta dos 10 prédios que constituem a AUGI do Pinheiro …….;
- Não obstante o referido, certo é que em 18/9/2021 veio a ter lugar uma “nova” Assembleia constitutiva da AUGI do Pinheiro ….., que teve lugar no Pavilhão Desportivo Municipal do Clube de Pessoal da Siderurgia Nacional e que foi convocada pelo comproprietário Nelson ……., constando da respectiva ordem de trabalhos, designadamente, “Deliberar instituir a Administração conjunta dos prédios e promover a reconversão urbanística da AUGI, nos termos da Lei n.º 91/95 de 2 de Setembro, alterado pelas Lei 165/99 de 14 de Setembro, Lei 64/2003 de 23 de Agosto, Lei 10/2008 de 20 de Fevereiro, Lei 79/2013 de 26 de Novembro, Lei 70/2015 de 15 de Julho”;
- Acontece que a convocação e realização em 18/9/2021 de uma Assembleia constitutiva da AUGI do Pinheiro ….. mostram-se desprovidas de base legal [ porque a LAUGI, a coberto da qual foi convocada a dita Assembleia Geral, não ser aplicável para efeitos de instituição de uma Administração Conjunta ], razão porque inevitável é a inexistência e/ou nulidade das deliberações que nela possam ter sido tomadas;
- Acresce que os prédios que porventura a nova administração conjunta eleita pretende representar já se encontraram integrados numa administração conjunta, a aqui Requerente e, ainda que a LAUGI, dentro da sua excecionalidade, preveja alguns regimes especiais tendentes à reconversão urbanística dos prédios integrados em AUGI, esta não previa, nem prevê, a possibilidade de um mesmo prédio poder integrar mais que uma administração conjunta;
- Por último, e sem prejuízo da ilegalidade da convocatória e suas deliberações, de que não se abdica, tem a Requerente fundadas dúvidas quanto ao quórum indicado como presente ou representado na Assembleia Geral, a referida ata indica como estando presente 160 comproprietários, aos quais corresponderiam 315.552,00 avos indivisos e 38% de quórum.
1.2. – Citada a Ré, veio a mesma deduzir oposição, contestando a acção por excepção [ invocando a Excepção Dilatória de Ilegitimidade Activa ] e por impugnação motivada [ aduzindo que a convocação e realização da assembleia que instituiu a Ré dispõe de pertinente fundamento legal ] , e impetrando que os representantes da autora ( Fernando ….., António ….. e Helena ….. ) sejam condenados por litigância de má-fé, em multa e indemnização a atribuir à R. no valor de € 50.000,00 (cinquenta mil euros), enquanto elementos da comissão de administração que representou a A.
1.3. – Após Resposta da autora à matéria da excepção [ impetrando a sua improcedência, pois que, diz a autora que a LAUGI prevê que a impugnação de uma deliberação pode ser deduzida por “qualquer interessado que as não tenha aprovado”, logo, de forma expressa, a LAUGI não se limitou a dar essa possibilidade apenas aos comproprietários, sendo que no conceito de “interessado” caberá, necessariamente, a aqui Requerente, pois esta efetua a administração conjunta de um “grupo” de prédios que, aparentemente, a Requerida pretende vir a administrar ], foi dispensada a realização da audiência prévia ( ao abrigo do disposto nos artigos 593.º, n.º1 e artigo 6.º, n.º1, ambos do Código de Processo Civil) e, conhecendo-se da excepção dilatória pela Ré invocada, proferiu-se DESPACHO SANEADOR, nele se decidindo :
“(…)
Em face do exposto, julga-se procedente a excepção dilatória de ilegitimidade ativa e, em consequência, absolve-se a ré da instância, nos termos do disposto nos artigos 278.º, n.º 1, alínea e), 576.º, n.º 2 e 577.º, alínea e), todos do Código de Processo Civil.
Custas pela autora, conforme artigo 527.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Fixa-se o valor da causa em € 30.000,01 (trinta mil euros e um cêntimo), artigos 296.º, n.º 1, 303.º, n.º 1 e 306.º, n.ºs 1 e 2, do Código de Processo Civil.
Registe e notifique.
Sxl, 25.03.2022
A Juiz de Direito”.
1.4. – Notificada da DECISÃO identificada em 1.3., e da mesma discordando, veio então a autora ADMINISTRAÇÃO CONJUNTA DO PRÉDIO RÚSTICO DENOMINADO PINHEIRO ……. interpor recurso de apelação, que admitido foi, formulando na respectiva peça recursória as seguintes conclusões :
1 - A Meritíssima Juiz “a quo” proferiu a sua decisão final, quanto à exceção de ilegitimidade ativa da Autora, tendo declarado esta como “parte ilegítima”, e, consequentemente, absolvendo a Ré da instância.
2 - Fundamentando, em síntese, a sua Douta Decisão no facto de ter verificado a “questão da legitimidade processual activa, no âmbito específico da Lei n.º 91/95, de 02 de setembro (reconversão das áreas urbanas de génese ilegal)”.
3 - Mais referindo que “O artigo 12.º da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, sob a epígrafe «funcionamento da assembleia», estabelece no n.º 8 que «as deliberações da assembleia podem ser judicialmente impugnadas por qualquer interessado que as não tenha aprovado, no prazo de 60 dias a contar da data da assembleia ou da publicação referida no n.º 6 do presente artigo, consoante aquele haja ou não estado presente na reunião.»”.
4 - Concluindo que “a administração conjunta não tem direito de voto na assembleia. Assim, não tendo direito de voto, não podia aprovar ou não aprovar a deliberação em causa nos presentes autos, não se encontrando, por isso, abrangida pelo círculo de interessados a que alude o artigo 12.º, n.º 8, da citada Lei.”.
5 - A Autora/Apelante, não se conformando com a Douta Sentença, vem interpor o presente Recurso, tendo o mesmo como objeto a matéria de direito, vertida na citada decisão.
6 - A referida sentença merece censura, quanto às decisões de Direito proferidas na Douta Sentença ora em crise, referente ao não reconhecimento do direito da Apelante em impugnar a deliberação da Apelada.
7 - O Tribunal “a quo” refere, na sua Douta Sentença, e bem, que “no caso em apreço, importa atentar na questão da legitimidade processual activa, no âmbito específico da Lei n.º 91/95, de 02 de setembro(reconversão das áreas urbanas de génese ilegal).”
8 - Mais especificando que, “O artigo 12.º da Lei n.º 91/95, de 2 de setembro, sob a epígrafe « funcionamento da assembleia», estabelece no n.º 8 que «as deliberações da assembleia podem ser judicialmente impugnadas por qualquer interessado que as não tenha aprovado, no prazo de 60 dias a contar da data da assembleia ou da publicação referida no n.º 6 do presente artigo, consoante aquele haja ou não estado presente na reunião.»”.
9 - Todavia, o Tribunal “a quo” veio a concluir que “a administração conjunta não tem direito de voto na assembleia. Assim, não tendo direito de voto, não podia aprovar ou não aprovar a deliberação em causa nos presentes autos, não se encontrando, por isso, abrangida pelo círculo de interessados a que alude o artigo 12.º, n.º 8, da citada Lei.”.
10 - Pois, nos termos do n.º 1 do artigo 8º da Lei n.º 91/95 de 2 de Setembro (LAUGI), “ O prédio ou prédios integrados na mesma AUGI ficam sujeitos a administração conjunta, assegurada pelos respetivos proprietários ou comproprietários.”
11 - E, de acordo com o disposto na alínea g) do n.º 1 do artigo 15º da LAUGI, compete à Comissão de Administração da Administração Conjunta, “Representar a administração conjunta em juízo”, ou seja, representar em juízo a totalidade dos comproprietários que compõem a Administração Conjunta.
12 - Assim, perante uma deliberação que afeta a totalidade dos comproprietários da AUGI (Área Urbana de Génese Ilegal), a Comissão de Administração procedeu ao pedido de impugnação da mesma, em representação dos comproprietários que compõem a Administração Conjunta, nos termos dos artigos da LAUGI atrás identificados.
13 - O legislador, ao aprovar a citada LAUGI, quis especificamente identificar quais os interessados que poderiam requerer a declaração da AUGI, circunscrevendo-os (apenas) aos comproprietários da Administração Conjunta (vide n.º 1 do artigo 35º conjugado com o artigo 9º da LAUGI.
14 - No entanto, já quanto à possibilidade de impugnação das deliberações da Assembleia Geral, a LAUGI veio a conceder esse poder a qualquer interessados que as não tenha aprovado (n.º 8 do artigo 12º), sem qualquer tipo de delimitação ou restrição. Esta disposição legal é bastante clara ao possibilitar a referida impugnação a “qualquer interessado” e não a “qualquer comproprietário”.
15 - Deste modo, qualquer
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