Acórdão nº 2495/20.7T8ACB.C1 de Tribunal da Relação de Coimbra, 2022-09-28

Ano2022
Número Acordão2495/20.7T8ACB.C1
ÓrgãoTribunal da Relação de Coimbra - (JUÍZO DE COMÉRCIO DE ALCOBAÇA DO TRIBUNAL JUDICIAL DA COMARCA DE LEIRIA)

Apelação nº 2495/20.7T8ACB.C1

Tribunal recorrido: Comarca de Leiria - Alcobaça - Juízo Comércio - Juiz 2

Des. Relatora: Maria Catarina Gonçalves

Des. Adjuntos: Maria João Areias

Paulo Correia

Acordam no Tribunal da Relação de Coimbra:

I.

Nos autos de insolvência referentes a AA, o Sr. Administrador Judicial – BB – veio juntar aos autos o cálculo da remuneração variável que entendia ser-lhe devida nos termos do art.º 23.º, n.º 4, alínea a), e n.º 7, do Estatuto do Administrador Judicial, concluindo pela remuneração de 20.965,61€, nos termos do seguinte quadro:

Observado o contraditório – com a notificação dos demais intervenientes que nada disseram – foi proferida decisão que fixou aquela remuneração no valor de 13.745,19€, acrescida de IVA à taxa legal.

Inconformado com essa decisão, o Sr. Administrador da Insolvência veio interpor recurso, formulando as seguintes conclusões:

Primeiro. Procede o presente recurso da decisão datada de 22.06.2022, em que determinou o M.mo Juiz a quo, no que ao âmago do presente recurso interessa, o seguinte: “Pelo exposto e de acordo com as normas legais citadas, decido fixar a remuneração variável do Srº. Administrador da Insolvência em €13.745,19, acrescida de IVA à taxa legal.”

Segundo. No que tange à remuneração variável em função da liquidação da massa insolvente (artigo 23.º, n.º 4, al. b) da Lei n.º 22/2013, de 26 de Fevereiro – Estatuto do Administrador Judicial), o tribunal a quo decidiu – acertadamente, crê-se - em conformidade com o cálculo apresentado pelo aqui apelante, fixando tal valor em €8.856,44 (sem IVA), correspondente a 5% do resultado da liquidação.

Terceiro. Já quanto à remuneração variável decorrente da satisfação dos créditos (artigo 23.º, n.º 7 do EAJ), enquanto o apelante calculou uma majoração de €8.188,77, o tribunal a quo entendeu ser-lhe devido a esse título apenas €4.888,75.

Quarto. Com o devido respeito, que é muito, o Tribunal a quo desconsiderou os pressupostos factuais e a redacção legal que subjaz ao confronto de interesses emergentes no presente recurso, designadamente arredando a aplicação da majoração que o legislador EXPRESSA e DECLARADAMENTE consignou no artigo 23.º, n.º 7 do EAJ.

Quinto. Nos termos do disposto no artigo 23.º, n.º 7 do EAJ “O valor alcançado por aplicação das regras referidas nos n.os 5 e 6 é majorado, em função do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos, em 5 /prct. do montante dos créditos satisfeitos, sendo o respetivo valor pago previamente à satisfação daqueles.”

Sexto. Partindo do citado preceito, o tribunal a quo discorreu e concluiu nos seguintes termos:

“Assim temos um total de créditos reclamados e admitidos de €3.20617,75. O grau de satisfação de tais créditos é de 55,24% (0,5524) ((€177.128,86 /€320.617,75). A taxa de majoração é assim de 2,76% (5%*55,24% (0,5524)) e não 5% como parece indicar o Sr.º AI, uma vez que importa ter em conta o grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos como supra referimos. Aplicando o critério de majoração em função da satisfação dos credores, obtemos o valor de 4.888,75€ (€177.128,86 *2,76%).”

Sétimo. No entanto, com todo o respeito que é devido, andou mal o tribunal a quo ao calcular a majoração remuneratória nos termos vindos de citar.

Oitavo. A redacção do artigo 23.º, n.º 7 do EAJ é sobejamente clara, determinando expressamente que a majoração da remuneração do administrador da insolvência corresponde a 5% do montante dos créditos satisfeitos.

Nono. Decorre directa e inequivocamente da citada norma que a taxa de 5% deve ser aplicada sobre um montante - “importância, soma, verba” -, isto é, sobre um valor nominal.

Décimo. Em sentido oposto e conflituante com o da norma, o tribunal a quo decidiu, discricionariamente, aplicar a taxa de 5%, não a um montante, mas a uma percentagem, neste caso de 55,24%, que, segundo argumenta, corresponderia ao grau de satisfação dos créditos.

Décimo primeiro. Ao fundamentar a sua decisão, o tribunal a quo afirma o seguinte:

“Está igualmente prevista uma majoração da remuneração variável em função do grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos, correspondente a 5% do grau de satisfação dos créditos (n.º 7).”

Décimo segundo. Ora, conforme já se registou, o artigo 23.º, n.º 7 EAJ prevê que a remuneração do administrador da insolvência seja majorada em “5% do montante dos créditos satisfeitos” e não em “5% do grau de satisfação dos créditos”.

Décimo terceiro. Como bem se percebe, o tribunal a quo subverte a redacção da norma em crise, preterindo, assim, o regime expressamente consagrado pelo legislador.

Décimo quarto. De facto, perante a formulação “5% do grau de satisfação dos créditos”, caberia admitir a realização do cálculo da majoração nos termos propugnados pelo tribunal a quo.

Décimo quinto. No entanto, a redacção que o legislador conferiu à norma é substancialmente diversa, e reflecte uma inequívoca opção por um regime distinto daquele que o tribunal a quo aplicou.

Décimo sexto. Tanto mais que deve presumir-se que o legislador se soube expressar correctamente – cfr. art.º 9.º n.º 3 do CCivil -, e que não estamos perante qualquer lacuna ou erro na expressão do legislador.

Décimo sétimo. Assim, se o legislador pretendesse que a taxa de 5% prevista no artigo 23.º, n.º 7 EAJ se aplicasse sobre uma percentagem não teria determinado expressamente que ela incidisse sobre um montante.

Décimo oitavo. O tribunal a quo entendeu que “o cálculo apresentado pelo Sr.º AI não considerou o grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos”, argumentando que a aplicação da taxa de 5% directamente ao montante dos créditos satisfeitos implica a desconsideração daquela variável.

Décimo nono. De facto, não oferece a menor dúvida que o legislador elegeu como critério da majoração da remuneração do administrador da insolvência o grau de satisfação dos créditos reclamados e admitidos.

Vigésimo. Porém, não deixou margem ao julgador para densificar esse critério, isto é, para determinar quais os parâmetros para aquilatar do grau de satisfação dos créditos.

Vigésimo primeiro. Em verdade, detendo-nos na redacção da norma, resulta evidente que, depois de indicar o princípio...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT