Acórdão nº 247/20.3YHLSB.L1-PICRS de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-03-10

Ano2022
Número Acordão247/20.3YHLSB.L1-PICRS
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção de Propriedade Intelectual, Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa:

*


I.–RELATÓRIO


MISERICÓRDIA – OBRA DA FIGUEIRA, IPSS, com os sinais identificativos constantes dos autos, interpôs recurso judicial do despacho de recusa do registo da marca nacional n.º 628179 “POUSADA NOSSA SENHORA DOS NAVEGANTES”, contra o INSTITUTO NACIONAL DA PROPRIEDADE INDUSTRIAL (INPI) e ENATUR – EMPRESA NACIONAL DE TURISMO, S.A., neles também melhor identificada.

O Tribunal «a quo» descreveu os contornos da acção e as suas principais ocorrências processuais até à sentença nos seguintes termos:
Misericórdia – Obra da Figueira, IPSS, pessoa colectiva nº 5.......6 com sede no Largo ..... ....., 3...-... - F____ F____ (adiante também designada ‘recorrente’), veio nos termos dos artigos 3.º e seguintes do Código da Propriedade Industrial (CPI) interpor recurso da decisão do Instituto Nacional da Propriedade Industrial (INPI) que recusou o registo da marca nacional nº 628179 POUSADA NOSSA SENHORA DOS NAVEGANTES, pedindo que seja revogado o despacho recorrido.
Alegou, em síntese, inexistir imitação das marcas nacionais nº 284804 POUSADAS DE PORTUGAL, nº 497126, nº 402806, da União Europeia (UE) nº 10742559 POUSADAS DE PORTUGAL e nº 10738871, bem como dos logótipos nº 235 e nº 26294, registadas em nome de Enatur – Empresa Nacional de Turismo, S.A., pessoa colectiva nº 5.......3 com sede na Av. ..... ..... ....., Nº ... D, 2º, 1...-... - L_____ (adiante também designada ‘recorrida’), que lhe foram opostos em sede de reclamação perante o INPI, ou possibilidade de concorrência desleal, devendo assim o respectivo registo ter sido concedido, contrariamente ao entendimento sufragado no despacho recorrido. [imagens não reproduzidas]
Citada a parte contrária, respondeu sustentando a improcedência do recurso. Alega em síntese que existe imitação, sendo o elemento comum POUSADA suficiente para induzir o consumidor em erro ou confusão sobre a origem comercial dos serviços respectivamente assinalados, que considera afins.

Foram realizadas a instrução, a discussão e o julgamento da causa, tendo sido proferida sentença que decretou:
Pelo exposto, e nos termos das disposições citadas, julgo o presente recurso improcedente e mantenho a decisão do INPI de 30.04.2020, publicada no BPI de 11.05.2020, que recusou o registo da marca nacional n.º 628179 POUSADA NOSSA SENHORA DOS NAVEGANTES.

É dessa sentença que vem o presente recurso interposto por MISERICÓRDIA – OBRA DA FIGUEIRA, IPSS, que alegou e apresentou as seguintes conclusões e pedido:
A.–Salvo o devido respeito, que é muito, entende a Recorrente que andou mal o Tribunal a quo ao manter a decisão proferida pelo INPI, a decisão do INPI de 30.04.2020, que recusou o registo da marca nacional n.º 628179 POUSADA NOSSA SENHORA DOS NAVEGANTES;
B.–Considerou o Tribunal a quo que os serviços assinalados pelas marca registanda nas classe 41, 43 e 45, “destinam-se a satisfazer as mesmas necessidades (de divertimento/lazer, ou de alojamento/acolhimento (incluindo restauração), do mesmo público-alvo (viajantes ou pessoas que pela idade, afastamento do domicílio ou outro interesse ou circunstância procuram abrigo, restauro ou alojamento em estruturas de acolhimento/entretenimento adequadas para o efeito, normalmente por períodos limitados de tempo, sendo igualmente substituíveis ou complementares entre si”;
C.No entanto, os produtos e serviços para os quais as marcas e logótipo prioritárias da Recorrida estão registados não são semelhantes nem afins dos produtos e serviços para os quais a Recorrente pretende registar a sua marca n.º 628179;
D.Não estando em causa o regime excecional da marca de prestígio (art. 235.º CPI), a recusa do registo da marca da Recorrente teria de respeitar o princípio da especialidade, que pressupõe uma identidade entre os serviços e/ou os produtos em causa ou, pelo menos, uma afinidade entre os mesmos, que possa induzir em erro ou confusão o consumidor;
E.Sendo evidente que os serviços aqui em questão não são os mesmos (“idênticos”), uma vez que não existe qualquer afinidade entre os mesmos, já que a Recorrente pretende registar a sua marca para “serviços recreativos para idosos; serviços de lazer; fornecimento de instalações de lazer; serviços de acolhimento (divertimento)”, no âmbito da classe 41.ª da Classificação de Nice; “lares de idosos; serviços de lares de idosos; centros de dia; serviços de centros de dia”, classe 43.ª da Classificação de Nice; e ainda “acolhimento familiar”, classe 45.ª da Classificação de Nice;
F.As marcas e outros sinais distintivos anteriores de que a Recorrida é titular “mais próximas” referem-se exclusivamente a “serviços hoteleiros” (marca nacional n.º 284804);
G..Ou à “manutenção de unidades hoteleiras, bem como de locais para o desenvolvimento de empreendimentos turísticos e hoteleiros; gestão comercial de hotéis” (...) “supervisão da exploração dos estabelecimentos hoteleiros” (...) “educação; formação; divertimento; atividades desportivas e culturais” (...) “serviços de restauração (alimentação); alojamento temporário; serviços de assessoria e de informações sobre actividades na área da restauração e hotelaria” (marca nacional n.º 497126 e marcas da União Europeia n.os 010738871 e 010742559); “desenvolvimento e exploração de actividades no sector turístico” (logótipo n.º 26294); “aplicação nos estabelecimentos hoteleiros do termo POUSADA” (logótipo n.º 235);
H..A Recorrente pretende, sob a marca “Pousada Nossa Senhora dos Navegantes”, prestar serviços de acolhimento em lares e centros de dia para idosos, em que se proporcione, ao mesmo tempo, o entretenimento, ocupação e divertimento destes idosos, num ambiente com características de “acolhimento familiar”;
I..Sendo que as marcas e logótipos anteriores da Recorrida se destinam, no que aqui pode estar em causa, à prestação de serviços de hotelaria em edifícios com especiais características arquitectónicas ou históricas;
J..Os serviços e produtos em confronto não são, portanto, semelhantes ou afins;
K..O seu público alvo é totalmente diferente: no caso da marca da Recorrente, os idosos e reformados em busca de uma residência permanente ou de um centro de dia onde possam passar o seu tempo; no caso das marcas e logótipos da Recorrida, o público em geral, carecido de serviços indiferenciados e transitórios de hotelaria, prestados em locais – hotéis – com características particulares:
L..Não existe qualquer proximidade de significado económico, destino ou finalidade, não se verificando, também, qualquer relação de concorrência ou de complementaridade entre estes produtos ou serviços: nem os idosos vêem nas “Pousadas de Portugal” uma solução alternativa ou complementar às suas necessidades de um lar de acolhimento ou de um centro de dia, nem os actuais ou potenciais clientes das ditas “Pousadas de Portugal” equacionarão, por troca, fazer férias ou passar uns momentos de lazer num lar da terceira idade ou num centro de dia;
M..Em conclusão: respeitando o princípio da especialidade, o registo da marca da Recorrente, destinada a serviços bem diferentes, não semelhantes nem afins dos serviços e produtos abrangidos pelas marcas anteriores invocadas pela Recorrida na sua douta Oposição, nunca deveria ter sido recusado;
N..Se, porém, se considerar existir alguma semelhança ou afinidade entre os “serviços de acolhimento (divertimento)” da marca da Recorrente e os serviços de “divertimento” em geral, das marcas da Recorrida, no âmbito da classe 41.ª, então a recusa da marca da Recorrente deverá ser parcial, afetando apenas estes últimos serviços (divertimento), e não total, conforme dispõe o art. 237.º CPI;
O..No que respeita aos símbolos em confronto, é evidente que o único elemento comum a ambas é o substantivo “Pousada”, utilizado pela Recorrida no plural e pela Recorrente no singular.;
P..Como resulta dos autos, as marcas e logótipos da Recorrida pretendem assinalar um determinado tipo de estabelecimento hoteleiro ou uma cadeia de estabelecimentos hoteleiros do mesmo género e, daí, o plural do substantivo “Pousadas”;
Q..Esta preocupação de identificação de um tipo ou de uma cadeia de estabelecimentos com determinadas características comuns não se manifesta, ao invés, em relação aos serviços de lares e centros de dia para idosos para os quais a Recorrente pretende registar a sua marca e, daí, a utilização do substantivo “Pousada” fazer todo o sentido no singular: “Pousada Nossa Senhora dos Navegantes”, tão simplesmente;
R..No mais, todos os elementos, gráficos e nominativos, são absolutamente distintos nos sinais em confronto;
S..Assim, e como referido pelo próprio Tribunal recorrido “os sinais têm de semelhante, a palavra POUSADA[S], não se vislumbrando outras semelhanças gráficas, fonéticas ou conceptuais, à parte a evocação comum do conceito ‘pousada’, de reduzido valor distintivo, enquanto parcialmente descriptivo dos serviços respectivamente assinalados.”;
T..Com exceção do substantivo “Pousada” ou “Pousadas”, todos os demais elementos que entram na composição das marcas em confronto são diferentes.
U..Em relação aos produtos e serviços cobertos pelos registos invocados pela Recorrida, o termo “pousada” ou “pousadas” é claramente a designação genérica, o que significa que este é um elemento com muito pouca capacidade distintiva;
V..A qual residirá, por isso, essencialmente, nos demais elementos que compõem os sinais da recorrida;
W..Já no que se refere aos produtos e serviços para os quais se pretende registar a marca nacional n.º 628179, a palavra pousada é uma expressão de fantasia, ainda que sugestiva de uma ideia de repouso, tranquilidade e estabilidade (“aposentadoria”), que nada tem a ver com o seu sentido literal de um local de passagem ou de pernoita (transitório), que assume, como vimos, em relação
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT