Acórdão nº 244/09.0BEFUN de Tribunal Central Administrativo Sul, 23-06-2022

Data de Julgamento23 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão244/09.0BEFUN
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

I. Relatório

V…, contrainteressado na ação, e a Secretaria Regional da Saúde/Região Autónoma da Madeira, vieram interpor recurso jurisdicional da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Funchal, de 13.07.2015, que julgou procedente a ação intentada contra ambos por M…, anulando o despacho de 18.06.2009 do então Secretário Regional dos Assuntos Sociais, proferido em sede de recurso hierárquico, que havia homologado a lista de classificação final do Concurso de Provimento Interno Geral para Chefe de Serviço de Pneumologia da Carreira Médica Hospitalar do quadro do Centro Hospitalar do Funchal, por omissão de uma formalidade essencial, consubstanciada na falta de audiência prévia, e vício de falta de fundamentação.

O primeiro Recorrente, nas alegações de recurso que apresentou, concluiu da seguinte forma – cfr. fls. 564 e ss. e fls. 698 e ss., ref. SITAF:

«A. A audiência prévia, no caso “sub judicio” é dispensável nos termos da alínea a) do n.° 2 do artigo 103.° do CPA, porquanto a Recorrida já se pronunciou no procedimento sobre as questões que importam à decisão e sobre as provas produzidas, uma vez que tanto o Recorrente como a Recorrida, foram chamados para defender o seu currículo, tendo assim oportunidade de se pronunciarem sobre todas as questões que foram relevantes para a deliberação final, o que consubstancia a realização da audiência prévia. A sentença recorrida violou, pois, o disposto no art 103.°, n.° 2, a) do CPA.

B. Mesmo que assim não se entendesse, a falta de audiência prévia, no presente caso, não passaria de uma formalidade não essencial, por a mesma ser dispensável e tendo tal qualidade, vigoraria o princípio do aproveitamento do ato administrativo, princípio que a sentença recorrida violou.

C. Mesmo que se tivesse assistido à audição prévia da ora Recorrida, o resultado final seria o mesmo, i.e., a Recorrida seria sempre colocada em 2.° lugar e o Recorrente em 1.°, pelo que esse vício seria irrelevante, pelo que não daria lugar à anulação do ato administrativo praticado na sequência da omissão da audiência prévia.

D. O Tribunal a quo entendeu que o ato impugnado não está fundamentado por inexistirem documentos que comprovem que o Recorrente foi chefe de equipa de urgência, que exerceu funções de docência e que foi chefe das unidades médicas funcionais e bem assim porque o júri não fundamenta a valoração e os critérios aplicados à lista de classificação final, o que viola o regime de direito probatório aplicável no nosso ordenamento jurídico.

E. A prova documental é uma das muitas provas admissíveis em Direito, cfr. n.° 1 do artigo 87.° do CPA e a verdade é que o júri poderia, se assim o entendesse, ao abrigo do n.° 43.1 do Regulamento do Concurso e do artigo 89.° do CPA, exigir que o Recorrente apresentasse documentos comprovativos dos elementos referidos no seu currículo,

F. Tal corresponde a uma mera faculdade que a lei atribui ao júri, que a exerce de acordo com o seu poder discricionário, sendo que o não exercício dessa faculdade não consubstancia qualquer vício do procedimento concursal que culmine no alegado vício de falta de fundamentação.

G. O júri fundamentou a valoração da classificação atribuída, constando a mesma do anexo à ata n.° 8, valorações essas que foram realizadas de acordo com os critérios previamente estabelecidos e conhecidos da Recorrida pelo que, também aqui, se tem que concluir que não há vício por falta de fundamentação - cfr. artigo 124.° CPA; Ao entender o contrário, a sentença recorrida violou o disposto no artigo 124.° do CPA.

H. No presente processo, a Recorrida conhece perfeitamente os fundamentos da deliberação do júri, conhece os critérios adotados e bem assim foi ouvida por diversas vezes, só que apenas e simplesmente não aceita o facto de o seu currículo ser menos competitivo que o do Recorrente; o que só por si afasta a existência do vício de falta de fundamentação.

I. Mais, mesmo que se entenda que o ato ora em crise não está fundamentado, o que apenas se concede por mera cautela de patrocínio, sempre se dirá que, caso assim fosse, vigoraria o princípio do aproveitamento do ato administrativo, princípio jurídico que o Tribunal recorrido violou pois é de aproveitar o ato não fundamentado, quando o seu conteúdo não pudesse ou não devesse ser outro, o que ocorre neste caso, pois, independentemente de todos os vícios alegados, o resultado final do concurso seria sempre o mesmo, ou seja, mesmo que esses vícios não existissem o Recorrente ficaria sempre em primeiro lugar.

J. Salvo o devido respeito, andou mal o douto Tribunal ao considerar que o ato administrativo ora em crise era anulável, porque o não era.

K. Ao decidir como decidiu, o Tribunal a quo violou a alínea a) do a° 2 do artigo 103.° do CP A, o n.° 1 do artigo 87.° do CP A, o n.° 43.1 do Regulamento do Concurso, o artigo 89.° do CPA e o artigo 124.° CPA. (…)».

Também a Recorrente Secretaria Regional apresentou alegações de recurso, tendo ali concluído como se segue – cfr. fls. 592 e ss. e fls. 698 e ss., ref. SITAF:

«(…)

A) O douto Tribunal a quo proferiu Acórdão que decidiu pela anulação do despacho de 18/06/2009 do então Secretário Regional dos Assuntos Sociais, que indeferiu o Recurso Hierárquico interposto em 27/03/2009, da homologação da lista de classificação final do Concurso de Provimento Interno Geral para Chefe de Serviço de Pneumologia da Carreira Médica Hospitalar do quadro do Centro Hospitalar do Funchal, por vício de violação de lei por omissão de uma formalidade essencial (falta de audiência prévia); e vício de falta de fundamentação;

B) É desta decisão, que se reputa ilegal e contrária aos princípios de direito aplicáveis, que vem a Entidade Demandada recorrer;

C) Em matéria de direito, entendeu o Tribunal a quo, no seu douto Acórdão, que a Audiência Prévia, para cumprimento do estabelecido no art. 63.° da Portaria (que remete para o art. 100.° do CPA, hoje art.s 121.° e 122.° do CPA de 2015) no caso foi omitida, atendendo a que a anterior audiência prévia efetuada no âmbito do concurso tinha como suporte a classificação final com critérios diversos e uma determinada fundamentação, sendo certo que a lista de classificação final anexa à acta n° 8, tem fundamentação diversa, e assim o acto praticado também, desde logo uma outra valoração, sendo de entender que a Audiência Prévia era, no caso, uma formalidade essencial;

D) Julgou, assim, pela anulabilidade do acto impugnado, por vício de violação de lei, por omissão de uma formalidade essencial, uma vez que não foi dado à Autora oportunidade de exercer o direito de audiência prévia;

E) No entanto, quanto a nós, julgou erradamente, e em violação da lei, porquanto consta dos factos considerados provados (ponto Q) no douto Acórdão do qual ora se recorre, aquando do recurso hierárquico apresentado pela Autora, ora Recorrida, em outubro de 2006, que a mesma reclamou que o Júri procedera em violação da Portaria n.° 177/97, de 11 de março, ao estabelecer como critérios de avaliação a contagem exclusiva do tempo prestado na categoria de assistente graduado, quando a lei manda considerar o tempo prestado na categoria de assistente e assistente graduado; e a consideração do regime de dedicação exclusiva (regime de horário de trabalho específico na carreira médica);

F) O referido Recurso Hierárquico da A. mereceu provimento, tendo o Despacho da Secretária Regional dos Assuntos Sociais de 12 de março de 2007, determinado a revogação do ato de homologação da lista de classificação final do concurso, ordenando-se a repetição das operações concursais a partir da ata de definição dos critérios (pontos R e A dos factos provados);

G) Na sequência de tal Despacho, e para cumprimento do mesmo, o Júri deliberou por unanimidade proceder em conformidade e decidiu alterar os critérios de avaliação curricular (cfr. ponto F. dos factos provados), corrigindo o Júri os critérios de classificação apenas e tão-somente quanto a estes aspectos, em conformidade com o que reclamara a Autora, ora Recorrida, e em seu próprio benefício;

H) O artigo 103.°, n.° 2, al. b) do CP A, para o qual remete o seu artigo 100.°, n.° 1, determina que o órgão instrutor pode dispensar a audiência dos interessados se os elementos constantes do procedimento conduzirem a uma decisão favorável aos interessados:

I) Tendo em conta que os critérios de classificação, reclamados pela Autora, ora Recorrida, foram alterados e conduziram a uma decisão favorável à própria, sendo certo que os demais critérios não foram alterados, e a A., ora recorrida, já se tinha pronunciado sobre os mesmos;

J) A audiência dos interessados, neste caso, era dispensável, ao abrigo do disposto na al. b), n.° 2, do artigo 103.° do CPA;

K) Mal andou o Tribunal a quo, ao anular o acto impugnado por considerar haver vício de violação de lei, por omissão da audiência prévia, pois, além de a classificação final com critérios diversos e uma determinada fundamentação só terem beneficiado a Autora, ora Recorrida, não atendeu ao preceituado no artigo 103.° do CPA;

L) Mas mesmo que assim não se entendesse, sempre se dirá que a audiência prévia deveria, no caso, ser degradada em formalidade não essencial;

M) Como se referiu, a alteração dos critérios de classificação incidiu apenas em dois aspetos (a contagem exclusiva do tempo prestado na categoria de assistente graduado; e a consideração do regime de dedicação exclusiva), com vista à reposição da legalidade, aspetos esses que o Júri alterou;

N) E que beneficiou exclusivamente a A., ora Recorrida, que aumentou a sua classificação final (de 14,8 valores para 15 valores), enquanto que a classificação do Contra-Interessado manteve-se inalterada (16,86 valores);

O) Ainda que fosse praticada a audiência prévia dos interessados, por causa dos tais...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT