Acórdão nº 2437/20.0T8PTM.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26-10-2023

Data de Julgamento26 Outubro 2023
Ano2023
Número Acordão2437/20.0T8PTM.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

I.RELATÓRIO

1. AA intentou contra BB, acção declarativa de condenação peticionando que:

“a) Seja declarado e o réu condenado a reconhecer que a fração descrita sob a letra “A” destinada a habitação do prédio constituído em propriedade horizontal sito no ..., ..., freguesia da Guia, descrito na CRP de Albufeira sob o n.º ...87 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...48 daquela mesma freguesia, é bem comum do dissolvido casal e como tal devendo ser partilhado e
b) Seja o registo predial rectificado no sentido de a autora ser inscrita como proprietária do prédio melhor identificado na al. a).
Caso assim se não entenda, deverá, subsidiariamente ao pedido principal:
a) Ser declarado e o réu condenado a reconhecer que a moradia com piscina edificada sobre a parcela de terreno propriedade do réu e a que veio a corresponder a fração “A” foi construída na pendência do casamento e paga pelo casal formado por autora e réu, no montante total de, pelo menos, 229.500,00€ (duzentos e vinte e nove mil e quinhentos euros);
b) Ser declarado e o réu condenado a reconhecer como bem comum as benfeitorias realizadas pela autora e réu e correspondentes à construção da referida moradia composta por cave, destinada a garagem; rés-do-chão, com sala comum, cozinha, despensa, quarto e casa de banho; e primeiro andar, com duas suites com uma casa de banho cada, com a superfície coberta de 249,50m2, piscina, alpendre e barbecue, no lote de terreno propriedade do réu entre 2002 e 2008;
c) Ser declarado e o réu condenado a reconhecer e a pagar à autora, por essa via, um crédito de benfeitorias no valor correspondente a ½ do valor aportado ao imóvel de sua pertença por força das obras de construção feitas na pendência do casamento, correspondente ao valor que resultar da perícia realizada nos presentes autos ou, caso o mesmo se não apure, a liquidar em incidente posterior e que, no mínimo, corresponde ao valor dos empréstimos aplicados na construção e
d) Ser declarado e reconhecido que a autora goza de direito de retenção sobre a fração “A” nos termos do artigo 754.º do Código Civil pelo direito de crédito por benfeitorias”.

Para tanto alegou ter sido casada com o réu desde 2002 até 2017, sendo que o casal, em comunhão de esforços e intenções, edificou uma moradia num terreno que havia sido doado pelos pais do réu a este, pelo que, perante tal circunstância esse bem deve ser considerado um bem comum.

O réu contestou, alegando que o bem não tem natureza comum, tendo a moradia sido construída apenas com investimento seu, em terreno que lhe havia sido doado pelos seus pais, a si e seu irmão, e custeado através de um empréstimo bancário, contraído pelo réu e custeado por si e sua família exclusivamente. Acrescentou que, subsequentemente, a moradia, que nunca se destinou a ser usada para habitação do casal, foi sendo arrendada por curtos períodos de tempo a turistas, o que permitiu ir pagando as prestações correspondentes aos empréstimos bancários contraídos. Considerando que o bem não se tornou comum e se mantém próprio seu, concluiu pela improcedência da acção.

Julgada a causa foi, subsequentemente, proferida sentença que culminou com o seguinte dispositivo:
“Pelo exposto, o tribunal julga procedente a presente acção e:
Declara e condena o réu a reconhecer que a fração descrita sob a letra “A” destinada a habitação do prédio constituído em propriedade horizontal sito no ..., ..., freguesia da Guia, descrito na CRP de Albufeira sob o n.º ...87 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...48 daquela mesma freguesia, é bem comum do dissolvido casal que este formou com a autora e como tal devendo ser partilhado e determina seja o registo predial alterado no sentido de a autora ser inscrita como proprietária do prédio”.

2. É desta sentença que recorre o Réu, formulando na sua apelação as seguintes conclusões:

A)“A edificação de obra (casa) por dois cônjuges, casados sob o regime de comunhão de bens adquiridos, em terreno próprio de um deles, constitui benfeitoria e dá lugar a um crédito de compensação (um crédito do património comum sobre o património próprio) com vista à reposição do equilíbrio patrimonial, pois de outra forma haveria um injustificado enriquecimento sem causa. – Acórdão do STJ de 29 de Novembro de 2022 tirado em recurso de revista no Proc. nº 1530/20.3T8VNF.G1.S.

B) Na situação em recurso trata-se da edificação de uma moradia, pelo Apelante e Apelada, enquanto casados sob o regime de bens adquiridos desde 12 de Abril de 2002, sobre um lote de terreno para construção que foi doada ao Apelante, ainda solteiro, em 27 de Janeiro de 1998.

C). A sentença recorrida declarou (e condenou o Apelante a reconhecer) que essa moradia, agora fracção ´A’ do prédio urbano constituído em propriedade horizontal sito na ..., na freguesia da Guia, concelho de Albufeira, descrito na Conservatória do Registo Predial de Albufeira sob o nº ...87 e inscrito na matriz predial urbana sob o artigo ...48 daquela mesma freguesia, é bem comum daquele já dissolvido casal (Apelante e Apelada) e como tal deverá ser partilhado, tendo também determinado que o registo predial fosse alterado no sentido de a Autora/Apelada ser inscrita como proprietária do prédio.

D). Em face da factualidade provada a moradia construída só pode ser apenas considerada como uma benfeitoria do casal sobre um bem próprio do Apelante, devendo o seu apurado valor determinar um direito creditício do casal sobre o Apelante, a ocorrer em processo de inventário decorrente da dissolução, por divórcio, do casal.

E). Ao Tribunal “a quo” está legalmente vedado, por força do disposto nos arts. 1316º (modos de aquisição do direito de propriedade) e 1714º e segs. (regime matrimonial de bens) integrar, por sentença e sem qualquer válido fundamento, um bem próprio na comunhão conjugal.

F).- Ao decidir como decidiu, o Tribunal recorrido violou, por errada análise crítica das provas, por incorrecta interpretação e por desajustada subsunção e aplicação das normas jurídicas correspondentes, o disposto no art. 607º do Código de Processo Civil e os arts. 1316º e segs. e arts. 1714º, 1717º e 1722º, todos do Código Civil.

G).- Tanto mais que a própria Autora/Apelada, no seu petitório inicial considerou a construção da moradia como benfeitoria efectuada e requereu prova pericial, efectivamente realizada, para apuramento do seu valor, tendo efectuado um pedido subsidiário de pagamento de determinado valor.

H).- A Tribunal “a quo”, considerando o valor da moradia apurado pela prova pericial realizada, todavia ignorou ostensivamente o valor que o mesmo relatório pericial apontava para o lote de terreno sem a construção da moradia, atribuindo-lhe um valor de € 7.500,00 contra o valor de € 475.669,50 referido nesse relatório.

I). A sentença recorrida, ao decidir como decidiu,...

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