Acórdão nº 23259/23.0YIPRT.P2 de Tribunal da Relação do Porto, 2024-02-05

Ano2024
Número Acordão23259/23.0YIPRT.P2
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
APELAÇÃO N.º 23259/23.0YIPRT.P2


SUMÁRIO (art.º 663.º, n.º 7, do C.P.C.)

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Acordam os Juízes na 3.ª Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto, sendo

Relator: Jorge Martins Ribeiro;
1.º Adjunto: Manuel Fernandes e
2.ª Adjunta: Fernanda Almeida

ACÓRDÃO

I – RELATÓRIO

Nos presentes autos é autora (A.) “A... SA”, titular do N.I.F. ...84, com sede na Rua ..., ... Vila Real, e é réu (R.) AA, titular do N.I.F. ...36, residente na Rua ..., ... Santo Tirso.


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Procedemos agora a uma síntese do processado, e factual, destinada a facilitar a compreensão do objeto do presente recurso.

1) Trata-se de autos de injunção, em que a A. veio, aos 08/03/2023, pedir a condenação do R. a pagar o total de 99,41 Euros, sendo: “capital: €98,54; juros de mora: €0,87 à taxa de: 4,00%, desde 20/10/2022” e até pagamento, invocando um contrato de prestação de serviço, saneamento, nos precisos termos constantes do requerimento inicial.


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2) Aos 0405/04/2023 o R. apresentou oposição, defendendo-se por exceção e por impugnação.

Nas várias exceções que deduziu, insere-se a dilatória de caso julgado (in casu, material), nos termos do artigo (art.º) 576.º, n.º 2, do Código de Processo Civil (C.P.C.) e do art.º 577.º, al. i), do C.P.C., tal como a perentória de autoridade de caso julgado, nos termos do art.º 576.º, n.º 3, do C.P.C., porquanto noutro processo em que as partes eram as mesmas (Tribunal Judicial da Comarca do Porto Juízo Local Cível de Santo Tirso - Juiz 1, processo n.º 2620/19.0YIPRT), ainda que respeitante a outros momentos (períodos de tempo, faturas), o R. foi absolvido do pedido, por inexistência de um contrato entre as partes.

3) No dia 25/06/2023 (depois de exercido o contraditório quanto às invocadas exceções) foi proferido o despacho saneador (cujo teor damos por reproduzido), em que o tribunal a quo julgou improcedentes as exceções invocadas, designadamente, a excepção de autoridade de caso julgado (e da ilegitimidade ativa substancial fundada na falta de contrato entre a autora e ré.

4) No dia 24/10/2023 (em que se realizou a audiência de julgamento com produção de prova testemunhal e alegações orais) viria a ser proferida sentença (cujo teor damos integralmente por reproduzido) em que o R. foi condenado no pedido, tendo a ação sido julgada totalmente procedente.

5) O R. interpôs recurso aos 22/11/2023 no atinente à configurada violação da autoridade de caso julgado.

Das alegações constam as seguintes conclusões:

A- A douta sentença não se fundamentou correctamente nos factos alegados e dados como provados e não provados, estando arredada do melhor direito aplicável.

B- Resulta claramente dos documentos 1,2,3 juntos pela requerida, e não impugnados , nem contraditados pela requerente de que o objecto da presente acção foi já decidido por sentença transitada em julgado em 18/09/2021 no âmbito de uma injunção/acção especial de cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contrato, a qual correu termos no proc. Nº 2620/19.0 YIPRT do Juizo Local Cível de Santo Tirso-Juiz 1, em que a causa de pedir ali alegada corresponde essencialmente á da presente causa, o suposto contrato de fornecimento de bens ou serviços feito em 27/03/1997.

C- O objecto da presente acção e o do Proc. 2620/19.0YIPRT tem por verificada, além da identidade de sujeitos e da causa de pedir, a coincidência das respectivas pretensões na parte em que versam sobre o alicerçado no mesmo contrato.

D- Atendendo a que a anterior acção foi totalmente julgada improcedente por o R. não ter celebrado qualquer contrato com a A. e que tendo havido cessão da posição contratual a mesma não foi consentida pelo recorrente, pelo que consequentemente não está obrigado ao pagamento do serviço, devendo ser considerado o efeito de autoridade de caso julgado por na presente acção o valor peticionado radica precisamente na mesma causa de pedir/facto jurídico a existência e celebração de um eventual contrato de prestação de serviços datado de 27/03/1997.

E- A autoridade de caso julgado tem o efeito positivo de impor a primeira decisão, como pressuposto indiscutível da segunda decisão de mérito. Este efeito positivo assenta numa relação de prejucialidade: o objecto da primeira decisão constitui questão prejudicial da segunda acção, como pressuposto necessário da decisão de mérito que nesta há-de ser proferida.

F- No caso em apreço o pedido formulado na presente acção contra o requerido funda-se além do mais também no mesmo facto jurídico/contrato de prestação de serviços, com a mesma data, e dado como não provado na anterior acção. Temos por assente que a decisão absolutória do pedido proferida na acção anterior traduz-se em decisão de questão fundamental que constitui precedente lógico indiscutível da peticionada extensão do serviço de saneamento anteriormente invocado e negado o direito ao seu pagamento.

G- Nessa medida não pode deixar de se considerar o efeito de autoridade de caso julgado material decorrente da decisão absolutória proferida na acção nº 2620/19.0YIPRT, como radical e substantivamente impeditivo da procedência da pretensão deduzida na presente acção, pese embora a não coincidência integral do petitório formulados nas duas acções.

H- Acresce ainda que em parte alguma da sentença ora posta em crise a referencia ao dito contrato que a A. diz ter celebrado com o R., porque efectivamente ele não existiu, nada dos autos e da sentença resulta qualquer vinculo contratual entre A. E R., e só pela constatação deste facto impunha-se a absolvição da R. do pedido.

I- E mais, não existindo contrato a pretensão da A. não se reporta a uma obrigação pecuniária emergente de contrato, logo não se enquadra nos limites e finalidades legalmente definidos para a providencia de injunção, daí o requerimento inicial ser inepto por força do Artº 186º do C.P.C.

J- Aínda outra nossa discordância quanto á sentença diz respeito ao facto de ter sido ado como não provado que a A. tivesse enviado mensalmente para o R. as facturas e respectiva cobrança, aludidas no requerimento de injunção, e tal impunha-se como obrigatório nos termos do Artº 63º do DL. 194/2009 de 20 de Agosto.

K- Foram assim violados entre outros o Artº 63º do DL 194/2009, ARTºs 186º,580º, 619ºe 621º do C.P.C.”.

6) A A., no dia 13/12/2023, apresentou contra-alegações, concluindo pela total improcedência do recurso.

7) No dia 16/12/2023, foi proferido o despacho a admitir o requerimento de interposição de recurso.


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O objeto do recurso é delimitado pelas conclusões das alegações do recorrente, nos termos dos artigos 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1 e n.º 2, do C.P.C., não podendo este Tribunal conhecer de matérias nelas não incluídas, a não ser que as mesmas sejam de conhecimento oficioso (como expresso nos artigos 608.º, n.º 2, in fine, aplicável ex vi do art.º 663, n.º 2, in fine, do C.P.C.).

Também está vedado a este Tribunal conhecer de questões novas (que não tenham sido objeto de apreciação na decisão recorrida), uma vez que os recursos são meros meios de impugnação de questões prévias judiciais, destinando-se, por natureza, à sua reapreciação e consequente confirmação, revogação ou anulação.


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II – FUNDAMENTAÇÃO

Os factos

A matéria de facto dada como provada e como não provada na sentença recorrida é a seguinte([1]):

“Factos Provados:

A. A A..., S.A. é uma sociedade anónima que presta serviços públicos essenciais de água e saneamento aos utilizadores finais, constituída pelo Decreto-Lei n.º 93/2015, de 29 de Maio, alterado pelo Decreto-lei n.º 72/2016, de 4 de novembro, a qual sucedeu nos direitos e obrigações das sociedades extintas, “B..., S.A.” e “C..., S.A.”, sem necessidade de qualquer formalidade, de forma plenamente eficaz e oponível a terceiros, a partir da sua data de entrada em vigor, ou seja, a partir do dia 30 de junho de 2015, nos termos dos n.ºs 3 e 4, do artigo 4.º do referido diploma legal.

B. Através de um Contrato de Parceria celebrado em 5 de julho de 2013 entre o Estado Português e os municípios de Amarante, Arouca, Baião, Celorico de Basto, Cinfães, Fafe, Santo Tirso e Trofa, foi criado o Sistema de Águas da Região do Noroeste que agregou os respetivos sistemas municipais de abastecimento de água para consumo público (com exceção dos municípios de Fafe, Santo Tirso e Trofa) e de saneamento de águas residuais urbanas. Em virtude do Contrato de Gestão da Parceria celebrado em 26 de julho de 2013, foi atribuída à aqui Requerente a gestão e exploração do Sistema de Águas da Região do Noroeste.

C. A gestão dos serviços municipais é uma atribuição dos municípios, sendo que, por opção destes, é a Requerente que, em regime de parceria, gere e explora os serviços públicos de abastecimento de água para o consumo público e saneamento de águas residuais urbanas, assim como outros serviços decorrentes destas atividades, aos utilizadores finais nos municípios de Amarante, Arouca, Baião, Celorico de Basto e Cinfães. No que concerne aos Municípios de Fafe, Santo Tirso e Trofa, estes agregam exclusivamente os sistemas municipais de saneamento de águas residuais, nos termos da Cláusula 1.ª, n.º 5 do Contrato de Parceria e do disposto no n.º 8, da cláusula 4.ª Contrato de Gestão.

D. No exercício da sua atividade e no âmbito da relação contratual aqui subjacente, a Requerente prestou serviços ao Requerido, e, consequentemente, foram-lhe emitidas as seguintes faturas:

FT 202210813229, de 22.81 EUR+juros de 20.10.2022 a 07.03.2023 (0.35);

FT 202210908515, de 18.62 EUR+juros de 22.11.2022 a 07.03.2023 (0.22);

FT 202310082294, de 17.64 EUR+juros de 17.02.2023 a 07.03.2023 (0.04);

FT 202211092776, de 20.01 EUR+juros de 20.01.2023 a 07.03.2023 (0.10) e

FT 202210995720, de 19.46 EUR+juros de 22.12.2022 a 07.03.2023 (0.16).

E. Não obstante se encontrar interpelado para pagar, o Requerido não procedeu ao pagamento da quantia em dívida, sendo que o mesmo não...

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