Acórdão nº 22114/22.6YIPRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-12-14

Ano2022
Número Acordão22114/22.6YIPRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 22114/22.6YIPRT.P1

Relator: José Eusébio Almeida; Adjuntos: Carlos Gil e Mendes Coelho.

Recorrente - V..., Lda.

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto:

I - Relatório
Através de Requerimento de Injunção, veio a sociedade V..., Lda. requerer a notificação da sociedade P..., SA, no sentido de lhe ser paga as quantias de 27.001,59€ (capital), 1.419,34€ (juros de mora), 40,00€ (outras quantias) e 153,00€ (taxa de justiça paga), invocando um contrato de “fornecimento de bens ou serviços”, datado de “14.04.2021”, para tanto expondo, ora em síntese, a seguinte factualidade: “(...) exerce a atividade de fabricação de Componentes para Calçado e arrendamento de bens imobiliários. No exercício de tal atividade, a Requerente e Requerida estabeleceram uma relação comercial, através da qual Requerente forneceu artigos do seu fabrico à Requerida. Especificamente, os constantes das seguintes faturas, que remeteu à Requerida (...) que perfazem a quantia de 27.001,09€. Decorridas as datas de vencimento, a Requerida não procedeu a qualquer pagamento. Como até esta data não pagou qualquer quantia, pretende obter o pagamento da quantia de 27.001,09€, à qual acresce juros de mora comerciais, vencidos e vincendos, que nesta data se computam em 1.419,34 €. Peticiona ainda a Requerente a quantia de 40,00€ a título de indemnização pelos custos suportados com a cobrança da dívida ao abrigo do art. 7.º, do Decreto-Lei n.º 62/2013 de 10 de Maio. Cálculo de Juros: (...) Capital Inicial: 27.001,59€. Total de Juro: 1.419,34€. Capital Acumulado: 28.420,93€”.

A requerida deduziu oposição, sustentando, além do mais, o incumprimento definitivo (pela requerente) e concluindo que “deve a presente ação ser julgada totalmente improcedente por não provada e em consequência absolver-se a requerida do pedido”.

Analisando os autos, o tribunal entendeu que “Compulsado o teor do requerimento de injunção e da oposição, resulta que a indemnização peticionada poderá não corresponder a mera dívida pecuniária emergente de obrigação contratual, já que se discute as características dos bens fornecidos, bem como a existência de defeitos, com a análise de toda a relação jurídica subjacente entre ambas as partes. Assim, notifique Autora e Ré para em dez dias, querendo, se pronunciarem sobre a exceção dilatória de erro na forma do processo”.

A requerente pronunciou-se no sentido de não existir erro na forma do processo, argumentando em sentido semelhante ao que apresenta em sede de recurso e salientando, como o faz agora, que, uma vez deduzida oposição pela requerida e convolado o procedimento de injunção, irrelevam as limitações formais anteriores e não ocorre, por maioria de razão, o erro na forma do processo. Igualmente, e em sentido semelhante, pronunciou-se a requerida, citando jurisprudência, salientando que deduziu oposição, e concluindo que não existe erro na forma do processo.

Na sequência, a 21.06.2022, veio a ser proferido o seguinte despacho (ora recorrido):
“Questão prévia – do erro na forma do processo. Após os articulados iniciais, foram as partes convidadas a pronunciar-se acerca da exceção dilatória de erro na forma do processo. Notificadas as partes para se pronunciarem sobre a invocada exceção, as mesmas pugnaram pela sua não verificação. De qualquer modo, tendo sido dado cumprimento ao art. 3.º, n.º 3, do CPC, mostra-se desde já possível a apreciação da aludida exceção. Vejamos.
O art. 1.º do Decreto-Lei n.º 269/98, de 1/09 prevê a aprovação do “regime dos procedimentos destinados a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a (euro) 15 000, publicado em anexo, que faz parte integrante do presente diploma”. Por sua vez, o artigo 7.º define o conceito de injunção, no sentido de ser “a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento das obrigações a que se refere o artigo 1.º do diploma preambular, ou das obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17 de fevereiro”. A providência injuntiva é, deste modo, aplicável: a) A requerimento destinado a exigir o cumprimento de obrigações pecuniárias emergentes de contratos de valor não superior a 15.000,00€; b) A obrigações emergentes de transações comerciais abrangidas pelo Decreto-Lei n.º 32/2003, de 17.02 (entretanto revogado pelo DL. 62/2013, de 10.05).
No caso, a Autora recorreu ao requerimento de injunção, posteriormente transmutado em ação declarativa especial, com vista ao pagamento da quantia global de 28.613,93€. Tendo sido este o mecanismo ou meio processual escolhido, cumpre então aferir e ajuizar se o procedimento injuntivo constitui procedimento processual adequado a peticionar a restituição de determinado valor, despendido a título de prestação de bens, em virtude da existência de defeitos na execução de tal contrato. Conforme resulta do já exposto, a injunção constitui um “mecanismo marcado pela simplicidade e celeridade, vocacionado para a cobrança simples de dívidas, de molde a aliviar os Tribunais da massificação decorrente de um exponencial aumento de ações de pequena cobrança de dívida.” No caso concreto, todavia, a questão em litígio não constitui um simples e mero (in)cumprimento de uma obrigação pecuniária emergente do contrato de entrega de bens. De facto, a aparente simplicidade do articulado inicial oculta uma discussão complexa relativa à apreciação dos trabalhos realizados e existência de defeitos e outros danos em consequência da má execução do trabalho pela Autora, bem como toda a relação comercial prévia subjacente entre ambas as partes. Em situação similar, decidiu acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 30 de maio de 2019, proc. n.º 72782/18.6YIPRT.L1, disponível in dgsi, cujo entendimento perfilhamos “A controvérsia em equação nos presentes autos [discussão relacionada com contrato de empreitada, designadamente no que se refere ao seu não cumprimento ou conclusão por parte da empreiteira, e na não eliminação de desconformidades] está longe do processo simplificado que o legislador teve em vista com a criação do regime especial de injunção, com vista a facultar ao credor de forma célere a obtenção de um título executivo, em ações que normalmente se revestem de grande simplicidade”.
Pelo exposto, conclui-se que, pelas questões a decidir – eventual cumprimento defeituoso do contrato – a forma de processo escolhida não é a adequada, o que configura exceção inominada, impeditiva do conhecimento do mérito da
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