Acórdão nº 2085/16.9T8ALM.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 22-02-2024

Data de Julgamento22 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão2085/16.9T8ALM.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os juízes da 2ª secção cível do Tribunal da Relação de Lisboa que compõem este coletivo:

I - RELATÓRIO

1.1– A primitiva exequente “(...)”, identificada nos autos, instaurou em 10-03-2016 a presente execução sumária contra a executada (...), também identificada nos autos alegando que por escritura pública celebrada em 21-10-2004 lhe mutuou a quantia de €122.500,00, que esta se obrigou a restituir no prazo de 40 anos, tendo sido constituída para garantia do crédito, hipoteca sobre fração habitacional da executada .
Porém, a executada cessou o pagamento das prestações devidas em agosto de 2013, cifrando-se a dívida exequenda à data da apresentação do requerimento executivo em €140.377,87.
Concluiu a exequente solicitando a citação da executada para, no prazo legal, lhe pagar a referida quantia, acrescida de juros sobre o capital.

1.2 – Prosseguindo os autos os seus termos, foi deduzido por apenso incidente de habilitação de cessionário, no qual foi proferida decisão em 25-10-2018 que julgou habilitada como cessionária do crédito exequendo a aí requerente “...”.

1.3 - A executada, por requerimento de 25-09-2023 (referência 37078523), arguiu exceção dilatória inominada relativa a falta de condição objetiva de procedibilidade, considerando que a primitiva exequente (…), não deu cumprimento às obrigações que para si resultam do DL 227/2012, de 25/19, designadamente no que se reporta à implementação do “Plano de Ação para o Risco de Incumprimento” (PARI”) e à execução do “Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento” (PERSI). Efetivamente, no seu requerimento executivo, a exequente nem sequer efetuou qualquer alusão a tal procedimento pelo que lhe estava vedada a interposição da presente ação executiva, bem como a resolução do contrato de mútuo, ocorrendo, em consequência, falta de uma condição objetiva de procedibilidade, insanável, que deverá ser apreciada pelo tribunal, tanto mais que a venda executiva ainda não foi consumada.
Concluiu a executada que a primitiva exequente violou normas com caráter imperativo, às quais a cessionária também se encontra vinculada, não devendo os autos prosseguir, por carência de condição objetiva de procedibilidade, configuradora de exceção dilatória, que determina a sua absolvição da instância.

1.3 – Exercendo contraditório relativamente a tal pretensão, invocou a exequente ser extemporânea a arguição da falta de integração em PERSI, dado que deveria ter fundamentado a dedução de embargos à execução. Caso assim não se entenda, sempre se deverá considerar que a executada foi integrada em PERSI, que veio a ser extinto, factos de que teve conhecimento por cartas que lhe foram enviadas para o seu domicílio em 17-02-2013 e 20-05-2013.

1.4 – Foi designada data para inquirição das testemunhas arroladas no âmbito do incidente suscitado e dirigido convite à exequente para juntar os talões de registo postal comprovativos do envio de cartas para integração e extinção de PERSI (Referência 429419270).

1.5 – A exequente, por requerimento apresentado em 23-10-2023, declarou prescindir da testemunha que havia indicado com vista à instrução do incidente, tendo ainda considerado que a regulamentação legal do PERSI não exige que as comunicações de integração e extinção de PERSI sejam enviadas por carta registada com aviso de receção, sendo admissível o seu envio por correio simples ou até por correio eletrónico, dado que apenas se exige tal envio em “suporte duradouro”. Concluiu que a integração da executada no procedimento de PERSI deveria considerar-se demonstrado, tendo por base as cartas por si juntas no requerimento de 05-10-2023.

1.6 – Respondendo ao convite que lhes foi dirigido pelo tribunal, ambas as partes alegaram por escrito, mantendo, no essencial as posições anteriormente assumidas (requerimentos com as referências 46975454 e 46990433).

1.7 – Em 13-11-2023, foi proferida decisão na qual foi julgada verificada a exceção de falta de integração da executada em PERSI e determinada a sua absolvição da instância executiva, que foi julgada extinta, tendo ainda sido ordenado o levantamento da penhora de imóvel (referência 430238066).

2 - Não se conformando com a decisão proferida, a exequente da mesma interpôs recurso, pugnando pela sua revogação e substituição por outra que considere estar demonstrado nos autos que as cartas de integração e extinção PERSI foram enviadas e recebidas pela executada, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem:
“1.A apelante não se conforma com a Sentença proferida pelo Tribunal de 1ª instância, pelo que dela decorre;
2. O Tribunal de 1ª instância não considerou como prova, a junção aos autos do envio das cartas de integração e extinção de PERSI, enviadas à executada.
3. O Tribunal a quo, faz uma interpretação errada dos factos carreados aos autos, nomeadamente da aplicação do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro;
4. Não resulta deste artigo que as comunicações referentes ao PERSI devem ser feitas através de carta registada com aviso de receção.
5. O Acórdão do T.R. Évora de 14/10/2021, com o processo n.º 2915/18.0T8ENT.E1, relator Mário Coelho refere que se fosse intenção do legislador sujeitar as partes do procedimento a comunicar através de correio registado, tê-lo-ia consagrado expressamente na lei, o que não fez.
6. «A letra da lei não exige que as cartas dirigidas aos clientes tenham que obedecer a qualquer formalidade, maxime, registo com A/R, bastando o envio em conformidade com o estabelecido no contrato para a comunicação entre as partes, admitindo-se o envio de e-mail ou de cartas simples para a morada contratualmente convencionada».
7. De igual entendimento perfilha o Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, de 05/01/2021, Relatora: Maria da Conceição Saavedra, proc. n.º 105874/18.0YIPRT.L1-7, disponível em www.dgsi.pt, o Tribunal da Relação de Lisboa, de 17/06/2021, proc. n.º 2738/21.0T8SNT.L1, disponível em www.dgsi.pt.
8. É facto que é prova suficiente o envio de cartas de integração e extinção PERSI com registo simples.
9. A Executada foi integrada no PERSI, conforme a junção aos autos das cartas de integração e extinção PERSI;
10. O procedimento do PERSI ficou cumprido através do envio das cartas que se encontram nos autos;
11. Andou mal, portanto, o Tribunal a quo ao entender que não houve prova da receção das cartas pelos executados, quando este confessaram a sua receção, e quando estas foram juntas nos autos, (cartas de integração e extinção do PERSI);
12. Não está legalmente expresso na lei, que estas cartas deverão seguir registadas com aviso de receção, como provado ao longo do recurso”

3. A executada (...), pronunciou-se, apresentando contra-alegações, nas quais pugnou pela manutenção da decisão recorrida, e apresentou as seguintes alegações que se passam a transcrever:
“I – A exequente instituição bancária (…) e a recorrente não deram cumprimento ao regime imperativo introduzido pelo DL n.º 227/2012, de 25 de outubro, que entrou em vigor a 01 de Janeiro de 2013.
II - As alegações apresentadas, vêm apenas confirmar e reafirmar a violação por parte da Recorrente do regime do “PERSI” relativamente à mutuária/recorrida
III – A recorrente não impugnou a matéria de facto dada como provada pelo Tribunal “a quo” no douto despacho ou se pronunciou relativamente aos factos não provados.
IV – Tais factos devem ser dados como provados e não provados nos moldes preconizados pelo Tribunal “a quo”.
V – O contrato sob que versam os autos trata-se de um mútuo bancário “crédito habitação” para aquisição de 1 imóvel para habitação com hipoteca, onde interveio a recorrida como mutuária e a instituição bancária como mutuante.
VI - Tal contrato está abrangido pelo DL n.º 227/2012, de 25 de outubro, que entrou em vigor a 01 de janeiro de 2013, atento o disposto no artigo 2.º, Nº 1, al. a).
VII - O contrato deixou de ser cumprido pela recorrida em 10.03.2016 tendo deixado de pagar as prestações mensais, entrando em incumprimento e mora.
VIII – A recorrente e a Ex exequente, NUNCA integraram a recorrida no PERSI.
IX - Violando grosseiramente tal regime legal.
X – A recorrente nunca enviou qualquer missiva para a recorrida dando-lhe conhecimento do PERSI, integrando-a em tal regime legal ou extinguindo tal regime legal.
XI - Em 10 de Março de 2016 a Ex exequente interpôs a presente ação sem, contudo, ter integrado previamente no PERSI a recorrida.
XII – Não o fazendo igualmente a atual exequente
XIII - Estava obrigada perante a mutuária, a integrá-la, mediante comunicação em suporte duradouro, em Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) entre o 31.º dia e o 60.º dia subsequentes à data do vencimento da obrigação – art.º 12.º, e 14.º ou seja, entre 21 de Setembro de 2013 e
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