Acórdão nº 20831/22.0T8LSB.L1-4 de Tribunal da Relação de Lisboa, 10-04-2024

Data de Julgamento10 Abril 2024
Ano2024
Número Acordão20831/22.0T8LSB.L1-4
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os juízes no Tribunal da Relação de Lisboa

RELATÓRIO
Autor (adiante, por comodidade, designada abreviadamente por A.) e recorrente: AA.
Ré (também designada por R.): TAP – Transportes Aéreos, SA.
O A. pede a condenação da R. a pagar-lhe as seguintes diferenças salariais: €23.548,00 a título de diferenças sobre o vencimento base e €4.656,00 a título de diferenças de subsídios de férias e subsídios de Natal; e €5.000,00 a título de danos não patrimoniais, acrescidos dos respetivos juros de mora vencidos e vincendos até efetivo e integral pagamento.
Alega que foi trabalhador de terra da R. e depois concorreu e foi aprovado para comissário de bordo. Auferia o vencimento base de €1.416 e, quando passou para funções de ar, foi-lhe dito que não haveria perda salarial, o que, porém, se verificou, passando a auferir €941,00. Ora, a redução salarial é proibida. Pugna pela aplicação do art.º 6º do AE que identifica, que veda a redução da retribuição quando se muda de categoria. A atitude da R. causou-lhe danos, cujo ressarcimento peticiona.
Não havendo acordo em audiência de partes, a R contestou e pediu a improcedência da ação, sustentando que o AE invocado não é aplicável ao A. por já não pertencer a esse grupo profissional. Além disso, o A. aufere outras prestações mensais ao abrigo do SNPVAC, que acrescem à remuneração base e fazem parte das funções que desempenha. Por outro lado, e quanto à irredutibilidade da remuneração, tendo passado a desempenhar outras funções tal princípio não lhe é aplicável. Elenca todos os valores pagos ao A. enquanto trabalhador de terra e os valores pagos enquanto trabalhador comissário de bordo e conclui que nunca o valor peticionado pode proceder, mas sim o valor inferior que indica.
*
Saneado o processo e realizado o julgamento, o Tribunal julgou a ação improcedente e absolveu a R. do pedido.
Mais fez ainda constar:
“O tribunal convida o A. a, querendo, pronunciar-se sobre a eventual condenação como litigante de má fé posto que invoca factos que sabe serem falsos como forma de obter um beneficio a seu favor, nomeadamente no art.º 5º da p.i, quando das declarações de parte do próprio A. se provou exatamente o inverso”.
Posteriormente, o Tribunal a quo proferiu despacho condenando-o, como litigante de má fé, no pagamento da multa de 4 UCs.
*
Inconformado, o A. apelou, formulando as seguintes conclusões:
1, 2. Pediu, em suma, o pagamento de diferenças salariais em virtude de ter alterado a sua categoria profissional e ter visto a remuneração unilateralmente reduzida, sem que para tal tenha dado o seu acordo, (para o que) explicou que foi trabalhador de terra e que quando, por concurso interno, passou a ser Tripulante de Cabine, o seu vencimento base foi reduzido, ao contrário do disposto na regulamentação coletiva que lhe era aplicável.
3, 4. O Tribunal a quo considerou que o trabalhador mudou de carreira profissional por sua iniciativa, logo não tinha a obrigação de manter a sua remuneração antiga, mas sim a retribuição vigente para a categoria que o trabalhador atualmente exerce (e que ) apesar do trabalhador não ter dado o seu acordo para que fosse reduzida a sua retribuição, e mesmo tendo sido a passagem de categoria formalizada por via de adenda ao seu contrato de trabalho, tudo se passa como se uma nova realidade contratual existisse, concluindo que o princípio da irredutibilidade da retribuição não é aplicável, absolvendo do pedido a Recorrida.
5. O Recorrente celebrou em 4 de Dezembro de 2009 um contrato de trabalho sem termo para o exercício das funções de Técnico Comercial.
6. Na sequência de concurso interno passou a exercer, desde 4 de Junho de 2017, as funções inerentes à categoria de Comissário de Bordo, efetuando uma adenda ao seu contrato de trabalho.
7. Nos termos da cláusula 17.ª do Acordo de Empresa em vigor, aquando da sua passagem, supra identificado, estipula-se que no caso de o trabalhador auferir remuneração base superior à do grau inicial da nova categoria, manterá essa remuneração enquanto ela for superior à que corresponde à evolução na nova categoria, conforme cópia da parte inicial do A.E. que se juntou como doc. 5
8. Este facto não foi considerado provado, apesar de resultar de toda a documentação junta ao processo pelo que desde já se requer a sua inclusão na factualidade dada como provada.
9. Mais, a Recorrida reduziu unilateralmente o valor da retribuição base do Recorrente conforme é visível nos recibos de vencimento juntos como doc. 4.
10. O Tribunal apesar de remeter para os recibos de vencimento onde é visível a redução, não dá como provado que houve essa redução unilateral, o que é indiscutível, pelo que esse facto também deverá ser dado como provado.
11. Tal resulta também das declarações de Parte do Recorrente, onde fica patente, quer das respostas, quer das perguntas, que houve uma redução unilateral do valor da sua retribuição.
12. O Recorrente já tinha interpelado a empresa para pagamento das quantias em dívida, tendo a Recorrida alegado nada ser devido, conforme carta que se juntou.
13. Este facto, apesar da documentação junta ao processo, não foi dado como provado, o que também terá de ser alterado.
14. O Recorrente estava afecto ao AE aplicável aos trabalhadores de terra.
15. Nos termos da cl.ª 17.ª do A.E. em vigor no momento do concurso interno, estipulava-se que no caso de o trabalhador auferir já remuneração base superior à do grau inicial da nova categoria, manterá essa remuneração enquanto ela for superior à que corresponde à evolução na nova categoria.
16. Apesar de, nos termos da cláusula 6.ª do referido A.E., ser proibido à Ré diminuir a retribuição do trabalhador, salvo nos casos previstos na lei.
17. Os casos previstos na Lei e que se encontram tipificados no Código do Trabalho são:
- mudança do trabalhadora para categoria inferior (art.º 119)
- passagem de regime de trabalho a tempo completo para parcial (art.º 150.º e ss)
- prestação de trabalho em regime intermitente durante o período de inatividade (art.º 157.º e ss)
- cessação do exercício em funções em regime de comissão de serviço e regresso às anteriores funções (art.º 161 e ss)
- redução do trabalho ou suspensão de contrato de trabalho por facto respeitante ao empregador (lay off) – art.º 305.º e ss.
18.Ou seja, a legislação laboral portuguesa estabelece, como princípio, que é proibido ao empregador reduzir a retribuição (unilateralmente e mesmo que exista acordo do próprio trabalhador) conforme artigo 129.º n.º 1 d).
19. Analisando as exceções importa esclarecer que apenas poderíamos estar a falar de uma mudança para uma categoria inferior, o que nem sequer é o caso.
20. E, ainda que assim fosse, quando a alteração de categoria profissional implica redução salarial tem de ser autorizada pela Autoridade das Condições de Trabalho, o que não se demonstrou, pois, nenhuma prova nesse sentido foi junta pela R.
21. Pelo que foi violado o art.º 129.º do CT, tendo a atuação da R. levado a uma diminuição unilateral da retribuição, em manifesta infração do princípio da irredutibilidade.
22. Pelo que mal andou o Tribunal a quo ao considerar que estamos perante um novo contrato laboral, logo, que se aplicam as condições em vigor para os Comissários de Bordo.
23. É importante relembrar que o Acordo de Empresa (AE) ao abrigo do qual o A. se candidatou refere expressamente que o trabalhador deve manter a remuneração antiga até atingir a progressão para vencimento superior na nova categoria.
24. Houve, assim, violação quer da legislação laboral em vigor, quer do instrumento de regulamentação coletiva aplicável à data da alteração da categoria profissional.
25. Sendo certo que é indiscutível que, no momento do concurso interno e que decorreu por algum tempo, foi com base nesses pressupostos que o Recorrente se candidatou, pelo que deixando os mesmos de ser aplicáveis, competia à empresa, ora Recorrida, esse dever de informação.
26.Não o tendo feito, com a sua conduta, é a R. que viola, também, o disposto nos art.º 106.º e 107.º do CT por não ter informado o trabalhador do valor da sua remuneração e respetiva periodicidade.
27, 28. A lei laboral especifica que deve prestar pelo menos o valor e a periodicidade da retribuição (al. h do n.º 3 do art.º 106.º do Código do Trabalho). O n.º 4 do mesmo artigo diz que esta informação pode ser substituída pela referência às disposições pertinentes da lei, do IRCT ou do regulamento interno da empresa.
29. Analisando em detalhe a adenda contratual verificamos que nenhuma referência é feita ao valor da retribuição e inexiste qualquer remissão para outro documento.
30. Aliás, nada se diz relativamente ao contrato primitivo, não sendo revogado, substituída ou alterada qualquer outra condição, que não seja a da categoria profissional em si mesma.
31. Sendo que a violação deste dever de informação importa que seja aplicada uma contraordenação grave, por violação dos normativos legais.
32. Ou seja, apesar do trabalhador ser a parte “fraca” no âmbito da relação laboral, não tendo qualquer intervenção na adenda que lhe é dada a assinar e de existir uma normal legal que obriga a empresa a prestar todas as informações relevantes, onde se inclui, a remuneração, o Tribunal considerou que estamos perante um novo contrato de trabalho e, consequentemente, que não há redução da remuneração.
33. O art.º 107.º do CT obriga a que esta informação conste de documento escrito, o que não sucedeu e que também consubstancia uma contraordenação grave.
34. O Tribunal sustenta, ainda, a sua posição no facto de ser estipulado período experimental num documento que a própria Recorrida designa de adenda.
35. Ou seja, um trabalhador sem termo, com uma antiguidade de mais de 10 anos, assina uma adenda contratual, apresentada pela empregadora, onde esta refere, ilegalmente, que irá sujeitá-lo a um novo período experimental e, o tribunal, com o devido
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