Acórdão nº 2014/21.8T8AGD-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-10-10

Ano2022
Número Acordão2014/21.8T8AGD-A.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 2014/21.8T8AGD-A.P1

Recorrente – A..., SA
Recorrido – AA

Relator: José Eusébio Almeida; Adjuntos: Carlos Gil e Mendes Coelho.

Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação do Porto:

I - Relatório
AA deduziu os presentes embargos de executado contra A..., SA, invocando a nulidade da citação, uma vez que em outubro de 2018 sofreu um AVC hemorrágico, encontrando-se impossibilitado de exercer plena, pessoal e conscientemente os seus direitos e cumprir os seus deveres. Assim, a citação na execução deveria ter observado o disposto no artigo 234 do Código de Processo Civil, o que não se verificou, pelo que a citação é nula. Mais invoca a ineficácia dos dois contratos de cessão de créditos, datadas de 27.12.2018 e de 12.04.2019, por os desconhecer e porque, sendo nula a citação, não se tornaram eficazes. Alega, ainda, a prescrição da ação cambiária, prevista no artigo 70 da LULL, uma vez que a livrança dada à execução tem a data de vencimento de 3.02.2006, não podendo a mesma servir de título executivo, enquanto quirógrafo, dado que a exequente não alegou com suficiência a relação jurídica a ela subjacente. Invoca, ainda, a prescrição dos juros de mora.

Admitidos liminarmente os embargos, a exequente contestou. Alegou, em síntese, que não se verifica a invocada nulidade de citação e, acrescenta, que a sua invocação é intempestiva, devendo considera-se, por isso, sanada. Quanto aos contratos de cessão de créditos, entende que o embargante foi notificado dos mesmos, pelo que são válidos e eficazes. A livrança foi apresentada à execução enquanto quirógrafo, tendo alegado, no requerimento executivo, os factos constitutivos da relação jurídica subjacente, pelo que é título executivo válido, ao abrigo do disposto no artigo 703, n.º 1, alínea c) do Código de Processo Civil. Não se verifica a prescrição dos juros, porquanto a estes se aplica o prazo ordinário de 20 anos.

Procedeu-se à realização da audiência prévia, tendo-se frustrado a conciliação das partes, as quais produziram alegações por remissão para o que haviam alegado em sede de articulados.

O tribunal, considerando o “requerimento executivo, os autos principais e os documentos juntos”, fixou a seguinte factualidade:
A) Foi dada à execução a livrança cujo original se encontra junto aos autos principais e cujo teor se dá aqui por reproduzido.
B) A livrança tem aposto como local de emissão ..., data de emissão 19.12.2000, o valor de 28.015,84€, a data de vencimento de 3.02.2006 e encontra-se subscrita pela sociedade H..., Lda.
C) No verso da livrança, após a expressão “Bom para aval”, encontra-se aposta a assinatura do embargante.
D) Subjacente à emissão da livrança está o contrato celebrado em 29.12.2000 entre a Banco 1... e a sociedade H..., Lda., representada pelo embargante e BB.
E) A cláusula 6.ª do contrato, com a epígrafe “Incumprimento do Contrato”, prevê o seguinte: “1 – Em caso de incumprimento do contrato, a Banco 1... e a parte devedora acordam expressamente que a Banco 1... poderá substituir as obrigações da parte devedora mediante novação, por uma obrigação cambiária constante de uma livrança em branco, a qual neste ato é entregue à Banco 1..., subscrita pela parte devedora e avalizada pessoalmente pelos terceiros outorgantes. 2 – A livrança será oportunamente preenchida quando a Banco 1... o entender, com indicação do montante que será de valor igual ao saldo devedor na conta corrente, composto por capital, juros e demais encargos, apurados na data de encerramento da conta, que coincidirá, em caso de não prorrogação, com a data do termo do período contratual, acrescido de todos e quaisquer encargos de natureza fiscal. (...)”
F) Por Contrato de Cessão de Carteira de Créditos, outorgado em 27.12.2018, a Banco 1..., SA cedeu à M... os créditos decorrentes daquela operação e todas as garantias a eles inerentes.
G) Em 12.04.2019, a M... cedeu à A... SA o presente crédito, bem como todas as garantias a eles inerentes.
H) Em sede de requerimento executivo, a exequente alegou o seguinte: “(...)
3 - A Exequente é dona e legítima portadora da seguinte livrança, a saber: i. Livrança no valor de €28.015,84 vencida em 03.02.2006, a qual foi entregue ao Exequente como garantia do bom pagamento das responsabilidades constituídas e assumidas pela sociedade "H..., Lda." decorrentes do Contrato Particular, celebrado em 29.12.2000, tendo sido estipulado que em caso de incumprimento das obrigações a que estavam adstritos, o banco cedente reservava-se no direito de proceder ao seu preenchimento.
4 - A livrança foi subscrita pela sociedade "H..., Lda." e devidamente avalizada pelo executado AA.
5 - Assim como consta do verso da livrança, pelo seu próprio punho o avalista AA prestou o seu aval.
6 - Sendo, na qualidade de avalista solidariamente responsável perante o exequente, conforme dispõe os artigos 47.º e 48.º da LULL.
7 - Apresentada a pagamento, a livrança não foi paga, sequer parcialmente, na data de vencimento.
8 - Nem até à presente data, não obstante o executado ter sido interpelado para o efeito.
9 - Para além do capital em dívida de €24.939,89 a exequente é ainda credora dos juros de mora, à taxa legal de 4% ao ano e imposto selo da livrança.
10 - Juros contados desde a data de vencimento, 20.03.2005, até à presente data, 4.06.2021, ascendendo ao montante de €5.079,80.
11. Totaliza, assim, a quantia exequenda no montante de €30.019,69, valor ao qual mais acrescerá os juros vincendos e imposto selo que venham a ser devidos até efetivo e integral pagamento.
12. O crédito exequendo é certo, líquido e exigível, estando nos termos da alínea c) do art. 703.º n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC) suficientemente titulado.
13. Os documentos supra referidos constituem título executivo, nos termos da alínea c) do n.º 1 artigo 46 do antigo C.P.C., cuja validade deste documento como título executivo foi confirmada pelo Tribunal da Relação de Lisboa e pelo Tribunal da Relação de Évora, bem como pelo Acórdão do Tribunal Constitucional no 847/2014, o qual considerou inconstitucional a norma que retirou a força de exequibilidade a estes documentos.
I) O embargante sofreu um AVC hemorrágico em outubro de 2018 e, desde essa data, encontra-se impossibilitado de exercer plena, pessoal e conscientemente os seus direitos e de cumprir os seus deveres.
J) Em 3.11.2021, a Sra. Agente de Execução enviou nota de citação através de carta registada com aviso de receção dirigida ao embargante para a rua ... ....
K) A carta de citação foi rececionada em 08.11.2021 por pessoa diversa do embargante.
L) Em 29.11.2021, CC dirigiu o seguinte requerimento aos autos de execução com o seguinte teor: “(...) CC, possuidora do cartão de cidadão com o número ..., válido até 19/03/2031, no seguimento de recebimento de notificação dirigida ao meu pai, AA, para deduzir oposição no âmbito do processo em assunto melhor identificado, informa que após este ter sofrido AVC hemorrágico em outubro de 2018, ficou impossibilitado de exercer plena, pessoal e conscientemente os seus direitos e de cumprir os seus deveres, motivo pelo qual foi requerido a 26 de novembro de 2021 apoio judiciário no
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