Acórdão nº 19710/21.2T8PRT-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-09-15

Ano2022
Número Acordão19710/21.2T8PRT-A.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo: 19710/21.2T8PRT
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Sumário:
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1. Relatório
O autor intentou a presente acção contra M... Limited, ..., ..., ..., ..., Irlanda, registada na Conservatória do Registo Comercial da Irlanda com o número ..., com a morada registada ... ..., Irlanda. K..., Lda., NIPC ..., sociedade por quotas com sede na Rua ..., ..., ..., Lisboa.
Alegando que: “olhando para os vários Contratos de Serviços da M..., se retira que será o local para onde os serviços do Cliente são encaminhados pela M... e que o Contrato de Serviços M... de abril de 2021 especifica como sendo o local onde o Cliente tem residência habitual”, devendo a competência territorial situar-se, por isso, no Tribunal Judicial da Comarca do Porto (cfr. §§ 36 e 37 da Réplica)
As RR invocaram a incompetência internacional do tribunal dizendo que ““o local do cumprimento da obrigação não se localiza no Porto, pois a especificidade e desmaterialização atinentes à mesma implicam que, caso as Rés fossem condenadas a conceder ao Autor a recuperação do acesso à sua alegada conta de email (o que não se concede e não poderia, em qualquer caso, suceder, dado que a conta foi eliminada dados os anos de inatividade), essa “permissão” de acesso possa ser cumprida em qualquer um dos data centres localizados por toda a Europa.
Foi proferido despacho que julgou a excepção improcedente.
Inconformadas vieram as RR recorrer o qual foi admitido como de apelação, a subir em separado e com efeito meramente devolutivo (artigos 644º, nº 2, alínea b), 645º, nº 2 e 647º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil).
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2.1. Foram apresentadas as seguintes CONCLUSÕES
1. Na sequência da sua citação, as Rés contestaram e aduziram, entre outras, verificação da exceção de incompetência internacional dos tribunais portugueses para julgarem e decidirem a presente ação, em virtude de ter sido celebrado um pacto de jurisdição que atribui competência internacional aos tribunais do Luxemburgo para quaisquer litígios decorrentes de, ou relacionados com, o Master Services Agreement (“MSA”) – o contrato ao qual o Autor se vinculou ao, alegadamente, ter criado um endereço de email Hotmail e utilizar os serviços da M....
2. Tendo o Autor respondido às exceções aduzidas pelas Rés, o douto Tribunal a quo proferiu um Despacho Liminar no qual apenas decidiu sobre a exceção de incompetência internacional dos tribunais portugueses e, ainda, sobre a exceção de incompetência territorial do Juízo Local Cível da Comarca do Porto.
3. O douto Tribunal a quo julgou improcedente a exceção de incompetência internacional dos tribunais portugueses, com fundamento no critério da alínea a) do artigo 62.º do CPC, nos termos da qual os tribunais portugueses são internacionalmente competentes quando a ação possa ser proposta em tribunal
4. português segundo as regras de competência territorial internas (o denominado “critério da coincidência”).
5. Ainda segundo o douto Tribunal a quo, pelo facto de o artigo 81.º, n.º 2, do CPC atribuir competência territorial ao tribunal do local da sede quando o Réu seja uma sociedade comercial, é territorialmente competente para conhecer da presente ação o Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa (local da sede da Ré K..., Lda.) e, por isso, verifica-se o critério da alínea a) do artigo 62.º do CPC, do que resulta que os tribunais portugueses são internacionalmente competentes.
6. Sucede, porém, que o entendimento do douto Tribunal a quo quanto à competência internacional dos tribunais portugueses é, salvo o devido respeito, equivocado.
7. Em primeiro lugar, porque não considera que entre o Autor e a M... Luxembourg S.à.r.l foi celebrado o MSA, em virtude da criação da conta de email e da utilização dos serviços da M..., nos termos do qual são competentes para dirimir os litígios emergentes de, ou relacionados com, o MSA os tribunais do Luxemburgo – ou seja, não considera a existência de um pacto de jurisdição que se sobrepõe às normas legais supletivas sobre competência internacional.
8. Sendo impossível determinar – porque o próprio Autor não o sabe/não o faz na sua alegação – os anos da alegada criação e cessação de uso da conta de email Hotmail, podem ter-se por referência o MSA fevereiro 2007 ou o MSA outubro 2007 – uma vez que o Autor refere que no ano de 2007 realizou um backup à referida conta de email e tem registos dessa altura – ou, ainda, o MSA 2014, pois o Autor refere que este terá sido o ano em que, alegadamente, perdeu o acesso à conta.
9. Conforme resulta do teor de cada um destes MSA, que são celebrados com a M... Luxembourg S.à.r.l (e não com as Rés, e por isso se encontra pendente de decisão verificação de uma exceção de ilegitimidade passiva das Rés), os tribunais competentes para dirimir litígios emergentes de, ou relacionados com, o MSA é dos tribunais luxemburgueses.
10. A utilização dos serviços da M... e, designadamente, da conta Hotmail que o Autor diz ter criado e da qual se arroga titular implica a celebração de termos contratuais com a M... (rectius, com determinada sociedade do “grupo”) e o cumprimento das obrigações naqueles contidas – de entre as quais se encontra a obrigação mútua de submeter quaisquer litígios à resolução pelos tribunais luxemburgueses.
11. Em segundo lugar, porque analisa esta exceção à luz de normas legais que não são as aplicáveis no caso concreto, recorrendo às normas do CPC que regulam a competência internacional dos tribunais portugueses, ao invés de recorrer às normas do Regulamento n.º 1215/2012.
12. O Regulamento n.º 1215/2012 regula a determinação da (in)competência internacional dos tribunais portugueses na presente ação pois os seus pressupostos de aplicação objetivo, subjetivo, temporal e espacial estão verificados no caso em apreço, sendo a sua aplicação convocada por estar em causa um litígio plurilocalizado.
13. Segundo o artigo 8.º, n.º 4, da CRP, o artigo 288.º do TFUE e, ainda, o princípio do primado do direito eurocomunitário, o Regulamento n.º 1215/2012, conquanto estão preenchidos os seus âmbitos de aplicação no caso concreto, prevalece sobre as normas internas – neste caso, sobre os artigos 62.º e 63.º do CPC.
14. Nos termos do artigo 25.º do Regulamento n.º 1215/2012, quando as partes, independentemente do seu domicílio, tenham convencionado que um tribunal ou os tribunais de um Estado-Membro têm competência para decidir quaisquer litígios que tenham surgido ou possam surgir de uma determinada relação jurídica, esse tribunal ou esses tribunais terão competência.
15. Conforme resulta do preceito transcrito, a existência de um pacto de jurisdição (neste caso, atributivo) celebrado entre as partes para dirimir determinado(s) litígio(s), ou um certo tipo de litígios, é o critério determinante para definir o tribunal internacionalmente competente num caso, que prevalece sobre os demais critérios legais supletivos.
16. Ainda nos termos do artigo 25.º, n.º 1, 2ª parte do Regulamento n.º 1215/2012, o pacto de jurisdição celebrado pelas partes deve cumprir dois requisitos para ser considerado válido e eficaz à luz do Regulamento, estando ambos
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