Acórdão nº 192/23.0T8ENT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 11-01-2024

Data de Julgamento11 Janeiro 2024
Ano2024
Número Acordão192/23.0T8ENT.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
RECURSO n.º 192/23.0T8ENT.E1
Tribunal recorrido: Juízo de Execução do Entroncamento – J1
Apelante: Caixa Económica (…)
Apelada: (…)

Sumário (elaborado pela relatora – artigo 663.º, n.º 7, do Código de Processo Civil):
(…)
*
Acordam os Juízes que integram a 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora:
I – RELATÓRIO
1.1. Em 12 de janeiro de 2023, a Caixa Económica instaurou contra (…) a presente ação executiva para pagamento de quantia certa, apresentando como títulos executivos dois contratos de mútuo garantidos por hipotecas e uma livrança com o valor aposto de € 5.019,97 (cinco mil e dezanove euros e noventa e sete cêntimos).
Por despacho proferido em 31 de janeiro de 2023, foi a exequente, ora apelante, notificada para esclarecer o que tivesse por conveniente acerca do cumprimento do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), estipulado no Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro.
A apelante, por requerimento de 27 de fevereiro de 2023, veio aos autos “informar que (…) deu cumprimento ao Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) estipulado no Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10 conforme missivas remetidas à Executada e que ora se juntam como Doc. 1 e Doc. 2 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido.
Missivas estas que foram devidamente rececionadas pela Executada conforme captura de tela do site dos CTT que ora se junta como Doc. 3 e cujo teor se dá por integralmente reproduzido para todos os efeitos legais.
Nestes termos, e porque se encontra provado o cumprimento do PERSI por parte da Exequente, deverá a presenta instância prosseguir os ulteriores tramites processuais, o que se requer”.
Juntou cópias de duas cartas, transcritas parcialmente na decisão sob recurso, e que damos por reproduzidas.
O tribunal a quo proferiu o despacho datado de 09 de março de 2023, com o seguinte teor:
«(…) analisados os teores dos documentos juntos pela exequente através da ref.ª 9469348 de 27-02-2023, faculto-lhe o mesmo prazo de 10 (dez) dias para exercer, querendo, o respectivo contraditório acerca da eventual adopção do entendimento de acordo com o qual a carta de comunicação de extinção do PERSI não é susceptível de traduzir o cabal cumprimento do disposto no artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10, por não indicar o concreto fundamento legal da extinção nem, de forma conveniente, as concretas razões de facto pelas quais foi considerada inviável a manutenção do procedimento».
A exequente veio exercer o contraditório, aduzindo, entre outros, os seguintes factos:
24. Quanto à questão suscitada pelo Tribunal sobre a carta de extinção do PERSI não indicar o concreto fundamento legal de extinção, entende a ora Exequente que a carta é bastante para produzir os efeitos do artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25/10.
25. A missiva de extinção do procedimento, do requerimento apresentado a 27.02.2023 e junta aos autos sob ref.ª 9469348, informa que a causa de extinção foi a “ FALTA DE COLABORAÇÃO”, fazendo referência expressa ao artigo 17.º do diploma aqui em causa que sempre estaria ao alcance da devedora consultar.
26. Sendo que o n.º 2 do artigo 17.º do diploma acima invocado na alínea d) dispõe: (…) 2 - A instituição de crédito pode, por sua iniciativa, extinguir o PERSI sempre que: (…) O cliente bancário não colabore com a instituição de crédito, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem, bem como na resposta atempada às propostas que lhe sejam apresentadas, nos termos definidos no artigo anterior” (…).
27. Ora a entrega de documentos que foi solicitada pressupõe necessariamente a colaboração da devedora para o efeito, pelo que a remessa da carta onde se menciona que a extinção se deve a falta de colaboração, será adequada a ser compreendida pelo destinatário cuja diligência terá que ser aferida por aquele que se considera o homem normal.
28. Mais, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 6.º do CC, o desconhecimento da lei não pode ser aproveitado.
29. Assim, a Executada foi devidamente informada através de comunicação em suporte duradouro da extinção do PERSI invocando expressamente a razão pelo qual se considerou o procedimento inviável tendo a mesma produzido os efeitos legais previsto no artigo 17.º, n.ºs 3 e 4, do diploma já mencionado.
30. Face ao exposto, dúvidas não restam que a ora Exequente deu cumprimento ao Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) cumprindo as missivas remetidas todas as disposições legais.
*
1.2. Por decisão de 13 de junho de 2023, o tribunal recorrido julgou verificada oficiosamente a exceção dilatória inominada insanável decorrente do desrespeito, pela exequente, Caixa Económica (…), da demonstração do válido cumprimento da comunicação de extinção do Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento, instituído pelo Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, e, em consequência, absolveu a executada da instância executiva, determinando a extinção da execução nos termos dos artigos 551.º, n.º 3, 573.º, n.º 2, 576.º, n.ºs 1 e 2, 578.º, 726.º, n.º 2, alínea b), e 734.º, n.º 1, todos do Código de Processo Civil, a qual se transcreve no que para a presente decisão releva:
“(…)
Revertendo à situação dos autos, a questão que se nos coloca é a de saber se a supra citada comunicação de extinção datada de 18-07-2022 satisfaz os requisitos enunciados naquelas disposições, mormente os que acima foram objecto de negrito e sublinhados nossos.
Do nosso ponto de vista, a resposta é negativa.
Vejamos porquê.
(…)
Com efeito, em tal missiva foi transmitido à executada o seguinte: «Nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro, informamos que o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) n.º (…), no qual estava incluído, encontra-se extinto com o seguinte fundamento:
FALTA DE COLABORAÇÃO».
Ora, fazendo-se uma remissão genérica para o «artigo 17.º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de outubro», somos de parecer que não foi devidamente indicado o fundamento legal para a extinção do PERSI, sobretudo quando se sabe que essa extinção pode ter uma plêiade diversificada de fundamentos plasmados nos n.ºs 1 e 2 daquele mesmo preceito legal.
Acresce que, do nosso ponto de vista, a aqui executada não foi informada, «em termos claros, rigorosos e facilmente legíveis», sobre quais as concretas razões em que se terá baseado a inviabilidade da manutenção do procedimento, não se lhe dando a conhecer os factos que determinaram a extinção ou que justificaram a decisão de pôr termo ao mesmo.
Apontar como motivo de extinção, sem mais, a «FALTA DE COLABORAÇÃO» é quase o mesmo que nada dizer.
Tal como, em situação em tudo similar, foi judiciosamente explanado no Acórdão do Tribunal da Relação de Évora de 14-07-2021 (consultável, como todos os demais que citaremos, em www.dgsi.pt, neste caso sob Processo n.º 613/19.7T8MMN-A), «[u]m dos motivos de extinção do PERSI é, precisamente, a falta de colaboração do cliente, nomeadamente no que respeita à prestação de informações ou à disponibilização de documentos solicitados pela instituição de crédito ao abrigo do disposto no artigo 15.º, nos prazos que aí se estabelecem (artigo 17.º, n.º 2-d), do DL 227/12).
A extinção do PERSI e o respectivo fundamento legal e concreto devem ser comunicados ao devedor (nºs 3 e 4 do citado artigo 17.º).
(…)
Entendeu (…) a sentença que a carta de extinção não respeitava as exigências do n.º 3 do artigo 17.º do DL 227/12, uma vez que não especificara claramente o motivo que a determinava.
Concordamos.
De acordo com o n.º 3 do artigo 17.º do DL 227/12, a instituição de crédito deve informar o cliente da extinção do PERSI, “descrevendo o fundamento legal para essa extinção e as razões pelas quais considera inviável a manutenção deste procedimento”. E que a lei pretende que tais aspectos sejam conhecidos pelo devedor resulta da circunstância de negar eficácia à extinção (à excepção do caso em que a instituição bancária e o devedor chegam a um acordo no âmbito do PERSI) enquanto lhe não for comunicada (artigo 17.º, n.º 4, do DL 227/12).
Com efeito, o cliente bancário deve ter o direito de aferir da regularidade e legalidade de todo o procedimento, em particular quando é demandado judicialmente pela instituição (como sucedeu no presente caso). E, tratando-se da extinção do PERSI, só conhecendo os concretos motivos que levaram à decisão da instituição bancária se podem, efectivamente, defender, seja no plano factual, seja em sede de cabimento legal.
Neste conspecto, invocar, simplesmente, o artigo 17.º do DL 227/(…) é praticamente o mesmo que nada dizer, já que tal preceito cobre todas as situações de extinção do PERSI.
E invocar que o motivo da extinção do PERSI é “falta de colaboração, nomeadamente na prestação de informações ou na resposta atempada às propostas apresentadas pelo banco” é, em primeiro lugar, deixar o cliente na dúvida. Em primeiro lugar, porque fica sem saber se a sua falta de colaboração se prendeu com a prestação de informações ou com a resposta a propostas apresentadas, sendo certo que se trata de diferentes realidades; em segundo lugar, fica sem saber se a falta de colaboração se prende com omissões ou com atrasos. Sem saber exactamente quais foram as informações que deixou de prestar ou as respostas que deixou de apresentar e, no caso de as ter prestado/apresentado, o atraso com que o fez, o devedor fica, repetimos, sem poder contrariar tais factos e/ou discutir a sua subsunção jurídica.
Não é, aliás, difícil para a instituição bancária
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