Acórdão nº 1918/15.1 BEALM de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-02-17

Ano2022
Número Acordão1918/15.1 BEALM
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
*
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

O Fundo de Garantia Salarial vem interpor recurso da sentença proferida pelo TAF de Almada que julgou procedente a acção que contra ele foi intentada por M... e o condenou a pagar os créditos laborais por este reclamados “até ao limite máximo de € 8.730,00, incluindo os valores atinentes às férias vencidas e não gozadas e respetivo subsídio de férias de 2014 e o proporcional do subsídio do Natal.”.
Apresentou as seguintes conclusões:
1 - O presente recurso circunscreve-se ao facto de o Tribunal “a quo” ter julgado procedente a presente acção e em consequência, ter decidido anular o despacho de deferimento parcial proferido em 31/03/2015 pelo Senhor Presidente do Conselho de Gestão do Fundo de Garantia Salarial, com as devidas consequências legais.

2 - Ora, salvo o devido respeito pelo entendimento sufragado pela decisão recorrida, entendemos que o Tribunal “a quo” fez uma errada interpretação da lei processual aplicável ao caso em apreço.

3 - Entende o ora recorrente que a sentença proferida pelo Tribunal “a quo” contraria legislação vigente, nomeadamente, o artigo 320.° da Lei n.° 35/2004, de 29 de julho.
E,
4 - Que existe base legal para o Fundo de Garantia Salarial recusar o pagamento da totalidade dos créditos peticionados pelo Recorrido.

5 - Na verdade, o regime legal de acesso ao Fundo de Garantia Salarial encontrava- se, então, previsto nos artigos 317.° a 326.° do anterior Regulamento do Trabalho, aprovado pela Lei n.° 35/2004, de 29/07.

6- O artigo 320.° da Lei n.° 35/2004, de 29 de julho, sob a epígrafe “Limites das importâncias pagas”, estatui, no seu n° 1, que “Os créditos são pagos até ao montante equivalente a seis meses de retribuição, não podendo o montante desta exceder o triplo da retribuição mínima mensal garantida. ”

7 - Ora, sobre este preceito, alegadamente afrontado pela decisão, entendeu, entre outros, o Acórdão do TCAN, de 16/12/2016, no proc. 00488/15.5BEPRT, o seguinte: “(...) O Fundo de Garantia Salarial tem uma finalidade social que justifica que sejam adotados limites à sua intervenção, não só limites temporais que decorrem do enquadramento comunitário que lhe está subjacente (Diretiva 80/987/CC, de 20.10), como também, limites às importâncias pagas.
O Fundo apenas garante um montante, duplamente limitado, conforme resulta do disposto nos artigos 319° e 320° da Lei 35/2004 de 29.07, que o legislador entendeu ser adequado e justo para, por um lado, proteger o trabalhador numa situação de perda de rendimentos que não lhe é imputável, com complemento do sistema de segurança social e, por outro, garantir a sustentabilidade do próprio Fundo. ”

8 - Do artigo 320.°, n.° 1 da Lei 35/2004, de 29/07, resulta que se mostram fixados 2 tipos de limites quanto às quantias a assegurar pelo Fundo de Garantia Salarial, designadamente:

- Um limite mensal correspondente ao montante requerido e vencido em determinado mês, que não pode exceder o triplo da retribuição mínima garantida - ou seja, por mês, o Fundo de Garantia Salarial pagará até 3 vezes o salário mínimo nacional que estava em vigor na data em que a entidade empregadora devia ter pago ao trabalhador.
- Um limite global correspondente aos montantes requeridos e abrangidos na sua totalidade, que não podem ultrapassar 6 meses de retribuição, que tendo em conta o limite mensal, corresponde a 6 (seis) vezes o triplo da retribuição mínima garantida - ou seja, o limite global garantido é igual a 18 (dezoito) vezes o salário mínimo nacional que esteja em vigor, limite que é atualizado anualmente em função do salário mínimo que venha a ser fixado em cada ano.

9 - Daí que a intervenção do Fundo de Garantia Salarial em sede de pagamento dos créditos reclamados, no caso pelo Recorrente, encontra-se condicionada, entre o demais, à verificação cumulativa dos seguintes pressupostos:
- Que a acção de declaração de insolvência tenha sido proposta;
- Que os créditos reclamados se tenham vencido nos seis meses anteriores à data da instauração da acção de insolvência (e não a acção judicial a propor pelo trabalhador para verificação dos seus créditos), excepto para o caso das situações previstas no n° 2 do artigo 319.°, ou se vencidos posteriormente, não haja créditos vencidos nesse período, ou o seu montante seja inferior ao limite máximo definido no n.° 1 do artigo 320.°;
- Que o montante reclamado a título de retribuição mensal não ultrapasse o correspondente a 3 salários mínimos mensais por cada mês;
- Que o montante total dos créditos reclamados não ultrapasse o correspondente a 18 salários mínimos mensais,

10 - No caso sub judice, verifica-se que o ora recorrido cessou o contrato de trabalho do em 28/07/2014 e auferia uma remuneração ilíquida de 1.404,52 €.

11 - Deste modo, decorrendo do art.° 1.° do Decreto-Lei n.° 143/2010, de 31/12, que “O valor da retribuição mínima mensal garantida a que se refere o n.° 1 do artigo 273.º do Código do Trabalho, aprovado pela Lei n. ° 7/2009, de 12 de Fevereiro, é de € 485”, em 2014, o limite mensal das quantias a assegurar pelo Fundo de Garantia Salarial fixou-se em € 1.455,00 e o limite global em € 8.730,00.

12 - Posto isto, é, pois, patente que o valor da remuneração mensal a considerar para efeito de cálculo dos créditos salariais a que o Recorrido tem direito é de € 1.455,00 (€ 485,00x3).

13 - Na data da cessação do contrato do ora recorrido (julho de 2014) venceram-se créditos retributivos de diversa natureza, nomeadamente, a retribuição referente ao trabalho prestado nesse mês e respetivo subsídio de alimentação e proporcional de subsídio de natal, o que obrigou à sua redução por força da aplicação do critério limite mensal de créditos assegurados pelo FGS.

14 - E ainda que se entendesse que os créditos por férias vencidas em 01/01/2014 e correspondente subsídio de férias se venceram também em julho de 2014, sempre se diria que os créditos vencidos naquele mês já ultrapassam o plafond legal, no seu limite mensal, pelo que o Recorrente não pode assegurar o seu pagamento.
15 - Assim e considerando que a soma dos créditos reclamados que se venceram em julho de 2014, mês em que o contrato de trabalho do Recorrido cessou, ultrapassa o valor máximo que poderia ser pago ao Recorrido com referência a esse mês, o ora Recorrente deferiu o pagamento do montante mensal máximo, ou seja, correspondente ao triplo da remuneração mínima garantida em vigor à data de cessação do contrato de trabalho.
Assim,
16. Ora Recorrente deferiu parcialmente o requerimento para pagamento dos créditos apresentado pelo Recorrido, pelo montante de 1.455,00 €. valor sujeito a retenção de IRS e dedução de TSU.

17 - Pelo que, o ponto da discordância reside, exactamente, na interpretação que se deve reputar como mais adequada do n.° 1 do artigo 320.° do RCT.

18-O Tribunal a quo, na decisão proferida, parece ter desconsiderado que o artigo 320.° n.° 1 do RCT, estabelece um duplo limite de créditos assegurados pelo FGS: o do montante máximo (primeira parte do preceito) e o do plafond mensal que o FGS assegura (segundo trecho na norma), tendo tomado em consideração apenas o primeiro deles, o que não parece corresponder ao espírito do legislador, tendo, por isso, efectuado uma incorrecta interpretação de tal preceito legal;

19 - Se dúvidas existissem a respeito da existência destes dois limites, o legislador veio clarificar o seu pensamento no Novo Regime do Fundo de Garantia Salarial (NRFGS) quando, no artigo 3.° do Decreto-Lei n.° 59/2015, de 21 de abril consagrou que “O Fundo assegura o pagamento de créditos emergentes do contrato de trabalho, referidos no n.° 1 do artigo anterior, com o limite máximo global equivalente a seis meses de retribuição, e com o limite máximo mensal correspondente ao triplo da retribuição mínima mensal garantida”.

20 - Da análise efectuada ao preâmbulo do NRFGS não parece resultar ter ocorrido qualquer mudança de pensamento legislativo, no que tange ao que deve entender-se por limites de importâncias pagas.

Assim, a sentença proferida pelo Tribunal “a quo” contraria legislação vigente, nomeadamente, o artigo 320.°, n.° 1, da Lei n.° 35/2004, de 29 de julho, devendo a mesma ser revogada.”


*
O Recorrido formulou as seguintes conclusões:

1. O Recorrente alega ter ocorrido uma incorreta interpretação e aplicação do direito na prolação da douta sentença, por não ter o Tribunal “a quo” feito uma correta interpretação da lei processual aplicável ao caso em apreço, nomeadamente o art.º 320.º da Lei n.º 35/2004, de 29 de Julho;

2. Pretendendo assim o Recorrente que, houvesse base legal para...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT