Acórdão nº 1909/18.0T8TVD-A.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-07-13

Ano2023
Número Acordão1909/18.0T8TVD-A.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam no Tribunal da Relação de Lisboa os juízes abaixo assinados:

Em 12/5/2022 HP intentou acção especial de cessação da obrigação de prestação de alimentos contra HM, pedindo que seja reconhecida a quebra de rendimentos do A. e que seja declarada a cessação da obrigação em questão, nos termos e para os efeitos da al. b) do nº 1 do art.º 2013º do Código Civil.
Alega para tanto, e em síntese, que:
. Por sentença de 12/4/2019 foi condenado a pagar à R. a quantia mensal de €115,00, a título de alimentos devidos à mesma, na sua qualidade de ex-cônjuge;
. Ficou aí provado que o A. apresentava despesas no valor mensal de €480,00, às quais fazia face com o valor do seu rendimento, que rondava a quantia mensal de €703,17;
. Teve um aumento significativo das suas despesas mensais em razão dos problemas de saúde da sua filha MCP, nascida em 22/7/2020, deixando assim de ter condições financeiras para pagar a pensão mensal em que foi condenado.
Em conferência realizada em 11/7/2022 as partes não lograram chegar a acordo.
A R. apresentou contestação, aí sustentando, em síntese, que não se alteraram os pressupostos da obrigação do A. de lhe prestar alimentos, uma vez que sofre de uma incapacidade permanente de 71% e tem rendimentos mensais de €307,00, pagando mensalmente €220,00 de renda de casa e tendo encargos com alimentação de €150,00 mensais, pelo que só com o apoio dos filhos consegue sobreviver. Mais impugna a factualidade alegada pelo A. e relativa à alteração da sua situação económica, concluindo pela improcedência da acção.
Com dispensa de audiência prévia foi fixado o valor da causa, proferido despacho saneador tabelar, fixado o objecto do litígio e enunciados os temas da prova, sem reclamações.
Realizou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo:
Em face do exposto, e ao abrigo das citadas disposições normativas, julgo parcialmente procedente, por provado, o pedido do Requerente HP (…) e reduzo o pagamento da pensão de alimentos em relação à Requerida HM (…) fixada na sentença de 18.4.2019 para 40,00€ mensais.
Custas da acção a cargo do requerente e da requerida na proporção do decaimento que se fixa, respectivamente, em 35% e 65%, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário (art.º 527.º, n.ºs 1 e 2 do CPC)”.
A R. recorre desta sentença, terminando a sua alegação com as seguintes conclusões, que aqui se reproduzem integralmente:
1.À data do início da obrigação alimentar, o Requerente auferia 620,00€ acrescido de subsídios e estava obrigado a prestar 115 euros mensais à Requerida.
2.Após a fixação daquela obrigação, o Requerente passou a ter uma filha menor, para cujos encargos concorre também a mãe desta companheira do Requerente.
3.Após auferir quantias superiores, o Requerente aufere presentemente 818,55€, de subsídio de desemprego.
4.A situação económica da Requerida não se alterou substancialmente após a sentença que determinou o pagamento da pensão de 115 euros, auferindo actualmente um montante mensal médio de 346€.
5.A sentença recorrida reduziu para 40 euros (35% do valor inicial, de 115 €) o montante da pensão de que a Requerida é credora.
6.A sentença viola o disposto nos art.ºs 2004.º/1 e 2012.º CC, na medida em que faz um desadequado juízo de proporcionalidade entre a situação inicial (sentença na acção de divórcio) e a presente (sentença nestes autos) referente a ambas as partes.
7.A sentença viola o disposto no art.º 2004.º/2, porque ignora que a credora dos alimentos sofre de uma incapacidade global e permanente de 71%, que a impossibilita de prover à sua subsistência.
8.A sentença recorrida premeia o litigante incumpridor, passando -certamente sem essa intenção, mas com esse efeito- uma imagem erradamente complacente da Justiça.
9.A sentença deve ser revista, indeferindo-se o pedido formulado pelo Requerente.
Não foi apresentada alegação de resposta.
***
Sendo o objecto do recurso balizado pelas conclusões do apelante, nos termos preceituados pelos art.º 635º, nº 4, e 639º, nº 1, ambos do Código de Processo Civil, a única questão submetida a recurso, delimitada pelas aludidas conclusões, prende‑se com a determinação da medida da obrigação alimentar do A.
***
Na sentença recorrida considerou-se como provada a seguinte matéria de facto (entre parênteses consta a numeração original; eliminam-se ainda referências probatórias documentais e corrigem-se as referências processuais):
1.(3.1.1.) A. e R. contraíram casamento católico em 20.12.1986.
2.(3.1.2.) A. e R. são pais de AP, nascida em 16.6.1987 e de SP nascida em 25.3.1989.
3.(3.1.3.) Por sentença de 18.4.2019, transitada em julgada, proferida nos autos de divórcio n.º 1909/18.0T8TVD foi julgado parcialmente procedente, por provado, o pedido da R. e fixada a pensão de alimentos a cargo do A. em relação àquela, no montante mensal de €115,00, sendo a mesma devida desde 16.10.2018 a 30.1.2019 e a partir de 6.2.2019.
4.(3.1.4.) Na sentença referida em (3.1.3.) foi, nomeadamente, dado por provado que:
4.1. (3.1.4.1.) Na constância do ano de 1992, os ora AA. e R. sofreram um acidente de viação, do qual resultaram lesões graves para a ora R., sendo na altura submetida a intervenções cirúrgicas e períodos de internamento e tratamento, sendo portadora de revisão de prótese total da anca direita, já com alguns sinais de deslocamento do acetábulo. Tem rigidez dolorosa e atrofia muscular da nádega e coxa. Foi-lhe atribuída de acordo com a Tabela Nacional de Incapacidades uma incapacidade definitiva de 60,5%;
4.2. (3.1.4.2.) Na sequência do acidente, e por o ora A. lhe ter dito que assegurava o sustento da casa, a ora R. deixou de trabalhar;
4.3. (3.1.4.3.) Pela incapacidade com que ficou, a qual se tem agravado com o passar dos anos e ainda pelas deslocações frequentes do agregado familiar resultantes da situação da emigração, a ora R. afastou-se do mercado de trabalho, contudo sempre foi ela quem cuidou do lar, da educação e dos cuidados dos filhos, ao tempo menores;
4.4. (3.1.4.5.) Nomeadamente, tratando e cuidando da casa, preparando as refeições, tratando das roupas, fazendo as compras, em suma, tratando e cuidando de toda a economia doméstica;
4.5. (3.1.4.6.) A ora R. aufere uma pensão de invalidez no valor mensal de €273,84;
4.6. (3.1.4.7.) Tem despesas com:
- Renda de casa no valor mensal de €220,00;
- Água na quantia mensal de €18,00;
- Luz na quantia mensal de €18,00;
- Gás aproximadamente €29,00;
- Medicamentosas em Janeiro de 2019 no valor de €33,00;
– Telefone;
4.7. (3.1.4.8.) A que acrescem as despesas básicas e essenciais necessárias e indispensáveis, como, com a alimentação, higiene pessoal e da habitação.
4.8. (3.1.4.9.) O ora A. celebrou contrato de trabalho temporário a termo incerto em 3 de Setembro de 2018, com a sociedade Kelly Services – Empresa de Trabalho Temporário Unipessoal, Lda, auferindo como retribuição €620,00, o qual corresponde o valor de hora de referência de €3,58, a que acrescem outros subsídios regulares e periódicos que pelo utilizador sejam devidos aos seus trabalhadores por idêntica prestação de trabalho.
4.9. (3.1.4.10.) O ora A. sofre de uma hérnia inguinal direita redutível já tendo sido intervencionado cirurgicamente a uma hérnia discal lombar, tendo estado incapacitado para o trabalho no período de 31.1.2019 a 5.2.2019 e está a aguardar de ser novamente operado a uma hérnia;
4.10. (3.1.4.11.) O ora A. também já pediu dinheiro à sua progenitora;
4.11. (3.1.4.12.) O ora A. dá apoio à sua companheira nascida em 8.5.1982 com quem vive e à filha desta com 5 anos de idade, em semanas alternadas, estando a sua companheira desempregada, após ter tido uma gravidez de risco e está inscrita no Centro de Emprego desde 8.2.2019, efectuando anteriormente limpezas e estando à procura de novo emprego;
4.12. (3.1.4.13.) O ora A. tem de fazer face mensalmente em média às seguintes despesas:
a) Alimentação e produtos de higiene;
b) Água, luz e gás: €120;
c) Deslocações da filha da companheira no valor de €27,55;
d) Pacote da NOS: €34,94;
e) Jardim de infância com a filha da companheira: €30,25;
f) Roupa e calçado;
4.13. (3.1.4.14.) O agregado do ora A. teve despesas em farmácia no valor de cerca de €57,00 em Janeiro de 2019 sendo cerca de €50,00 com medicamentos com a filha da companheira e em Outubro e Dezembro de 2018 cerca de €12,50 com medicamentos para a companheira (do ora A.) e em 1.2.2019 o valor de €3,55 com medicamentos para o ora A. e foi-lhe prescrita uma ecografia às partes moles. Teve ainda despesas em consultas médicas em Novembro de 2018 no valor de €19,09, Janeiro de 2019 no valor de €34,09 com a AK, filha da companheira;
4.14. (3.1.4.15.) O ora A. vive actual e temporariamente numa casa que lhe foi emprestada pelo seu irmão MD que se encontra a residir no estrangeiro e comparticipa no pagamento das despesas de água, luz e gás;
4.15. (3.1.4.16.) Encontra-se pendente o processo de execução n.º 13764/18.6T8SNT no Juízo de Execução de Sintra – Juiz 3 em que é exequente Union de Créditos Imobiliários, SA e executados os ora A. e R., sendo o valor da quantia exequenda de €81.761,96 acrescida das despesas prováveis no valor de €8.176,20, tendo sido penhorado o imóvel (…).
5.(3.1.5.) O A. teve um aumento nas suas despesas mensais em decorrência da sua filha MCP, nascida em 22/7/2020.
6.(3.1.6.) A menor MCP tem uma postura cefálica preferencial e plagiocefalia
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