Acórdão nº 1862/21.3T8VCD.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 08-02-2024

Data de Julgamento08 Fevereiro 2024
Ano2024
Número Acordão1862/21.3T8VCD.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 1862/21.3T8VCD.P1
Tribunal Judicial de Porto
Juízo Local Cível de Vila do Conde – Juiz 2


Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I. RELATÓRIO

AA, casado, residente na Rua ..., ... ..., propôs acção declarativa comum contra:

1. A..., Companhia de Seguros, S.A., com sede na Rua ..., ... Porto;

2. B..., S.A., com sede na Rua ..., A, ... Porto; e

3. Fundo de Garantia Automóvel, com sede na Av. ..., ... Lisboa,

pedindo a condenação solidária dos Réus no pagamento do valor de €7.974,32, acrescido dos respectivos juros de mora, à taxa legal, desde a citação até efectivo e integral pagamento.

Para tanto, alegou o Autor que ocorreu um acidente de viação que causou danos à sua viatura, tendo sido intervenientes em tal acidente, entre outros, o veículo seguro pela primeira Ré, bem como o veículo propriedade da segunda Ré, o qual não dispunha de seguro válido à data do acidente, motivo pelo qual é responsável pela indemnização a terceira Ré.

Ainda segundo o Autor, o acidente foi causado devido à acção dos condutores do veículo seguro pela primeira Ré, bem como pelo veículo propriedade da segunda Ré, acrescentando que, em consequência de tal acidente, o seu veículo sofreu danos e o respectivo condutor perturbações psicológicas, encontrando-se, desde o acidente, privado de utilizar a sua viatura, o que igualmente lhe causou danos.

Referiu ainda o Autor que os Réus rejeitaram qualquer responsabilidade no acidente.

Citados os Réus, os mesmos apresentaram contestação.

A Ré A... pugnou pela culpa exclusiva do acidente por parte do condutor do veículo propriedade da segunda Ré, impugnando a privação do uso e alegando desconhecer a veracidade do demais alegado pelo Autor, referindo, porém, que os montantes peticionados se mostram excessivos, com excepção do valor referente à reparação do veículo.

Por seu turno, o Réu Fundo de Garantia Automóvel pugnou pela culpa exclusiva do acidente por parte do condutor do veículo segurado pela Ré A..., igualmente salientando que os valores peticionados pelo Autor são excessivos, com excepção do valor referente à reparação do veículo.

A Ré B..., por sua vez, pugnou pela extinção da instância relativamente a si, em virtude da sua prévia declaração de insolvência.

Foi proferida decisão, na qual foi julgada extinta a instância, por inutilidade superveniente da lide, quanto à Ré B....

Realizada audiência prévia, foi proferido despacho saneador e fixados os termos do litígio e temas de prova.

O Autor requereu, entretanto, a ampliação do pedido formulado, peticionando o pagamento adicional da quantia de €6.750,00 em virtude dos novos danos decorrentes da privação do uso do veículo.

Os Réus Fundo de Garantia Automóvel e A... responderam, não se opondo à sua admissão, mas impugnando os novos factos alegados, bem como os respectivos fundamentos.

Foi proferido despacho no qual foi admitida a ampliação do pedido.

Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento, e, concluída a mesma, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:

“Nos termos e pelos fundamentos expostos, o Tribunal decide julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência:

a) Condenar o Réu, Fundo de Garantia Automóvel, no pagamento ao Autor, AA., do valor de €7.030,32 (sete mil e trinta euros e trinta e dois cêntimos), acrescido de juros de mora à taxa legal de 4%, contados desde a citação até efectivo e integral pagamento;

b) Absolver o Réu Fundo de Garantia Automóvel do demais peticionado pelo Autor; e

c) Absolver integralmente a Ré A..., Companhia de Seguros, S.A., do pedido formulado pelo Autor.

Custas pelo Autor e pelo Réu Fundo de Garantia Automóvel, na proporção do respectivo decaimento (nos termos do art.º 527.º, n.ºs 1 e 2, do Cód. Proc. Civil).

Registe e notifique”.

Inconformado com tal decisão, dela interpôs o Réu Fundo de Garantia Automóvel (FGA) recurso de apelação para esta Relação, formulando com as suas alegações as seguintes conclusões:

“1) Em virtude de a Ré B..., S.A ser a legitima proprietária do veículo responsável pela produção do sinistro em causa na presente lide, é imperativo presumir a direção efetiva e o interesse na sua utilização pela dita proprietária;

2) A Ré B..., S.A omitiu a celebração do contrato de seguro automóvel obrigatório, dando, assim, causa à intervenção do Recorrente Fundo de Garantia Automóvel;

3) Da consagração do litisconsórcio necessário passivo decorre que a condenação dos demandados – FGA e responsável/responsáveis civis – quando deva ter lugar, é uma condenação solidária, dada a existência de uma concorrência de responsabilidades.

4) A legitimidade do FGA tem de ser considerada pela conjugação dos artigos 54.º e 62.º, ambos do Dec. Lei n.º 291/2007. Sendo que, este último, prevê a condenação conjunta e solidária do FGA e os responsáveis civis.

5) A obrigação do FGA não é própria, mas sim acessória, de garantia, sendo um responsável subsidiário face ao responsável próprio e principal que é sempre o responsável civil pela eclosão do sinistro.

6) Tal como refere o Acórdão do STJ datado de 23.09.2008: “perante a subsidiariedade da obrigação de garantia, a responsabilidade do garante haverá de aferir-se pela existência e pela medida da obrigação garantida, de sorte que, extinta a obrigação do responsável civil, com ela se extingue a posição de seu garante encabeçada pelo FGA”.

7) O FGA, não tendo qualquer responsabilidade pela eclosão do acidente, intervém na relação controvertida tão só como mero garante de uma obrigação de terceiro e, por este motivo o litisconsórcio necessário passivo entre ele e o responsável civil configure um litisconsórcio unitário.

8) Não faz sentido algum que, a mera declaração de insolvência do responsável civil determine, a final, que o FGA passe da qualidade de garante a devedor principal.

9) Conclui-se, assim, inevitavelmente, que não pode o ora recorrente FGA ser condenado isoladamente, mesmo quando se verifique a extinção da instância relativamente ao responsável civil, ainda que essa extinção advenha da declaração de insolvência.

10) O Tribunal a quo violou o disposto no artigo 503.º do Código Civil e ainda, sem conceder, os artigos 54.º e 62.º do Dec. Lei n.º 291/2007 de 21 de agosto e o artigo 33.º do Código de Processo Civil.

Nestes termos, e nos melhores de Direito que V. Exas. Doutamente suprirão, deve o presente recurso ser julgado procedente, por provado, nos termos supra expostos, absolvendo o Réu FGA da presente instância”.

O recorrido AA apresentou contra-alegações, pugnando pela manutenção do decidido.

Colhidos os vistos, cumpre apreciar.

II. OBJECTO DO RECURSO

A. Sendo o objecto do recurso definido pelas conclusões das alegações, impõe-se conhecer das questões colocadas pelo recorrente e as que forem de conhecimento oficioso, sem prejuízo daquelas cuja decisão fique prejudicada pela solução dada a outras, importando destacar, todavia, que o tribunal não está obrigado a apreciar todos os argumentos apresentados pelas partes para sustentar os seus pontos de vista, sendo o julgador livre na interpretação e aplicação do direito.

B. Considerando, deste modo, a delimitação que decorre das conclusões formuladas pelo recorrente, no caso dos autos cumprirá apreciar se, face à absolvição da Ré B..., S.A., por inutilidade superveniente da lide, devia o Réu Fundo de Garantia Automóvel também ter sido absolvido da instância.

III - FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO.

III.1. Pelo tribunal recorrido foram considerados provados os seguintes factos:

Do acidente:

1. No dia 13 de Junho de 2021, pelas 18h25 horas, na Rua ..., freguesia ... e ..., no Concelho de Vila do Conde, ocorreu um acidente de viação.

2. Em tal acidente foram intervenientes os seguintes veículos:

> Veículo ligeiro de passageiros da marca Alfa Romeo (...), matrícula ..-UG-.., pertencente ao Autor e conduzido...

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