Acórdão nº 186/22.3T8SNS.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 07-03-2024

Data de Julgamento07 Março 2024
Número Acordão186/22.3T8SNS.E1
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 186/22.3T8SNS.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
AA (Autora) intentou a presente ação declarativa de condenação, emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, contra “LGCE – Logística e Construção Portugal, Lda.”[2] (Ré), solicitando, a final, que a ação seja julgada procedente por provada e, em consequência:
Seja declarado que o contrato de trabalho da Autora se transmitiu, com a mesma categoria, antiguidade e condições salariais, da entidade patronal “Plasticarga” a favor da sociedade “LGCE”, nos termos dos arts. 285.º a 287.º do Código de Trabalho;
Que a resolução com justa causa realizada pela Autora, pelo facto de existir violação grosseira do dever de ocupação efetiva por parte da Ré, nos termos do art. 394.º, nº. 2, al. b) do Código do Trabalho, seja considerada lícita e, consequentemente, seja a Ré condenada a pagar:
- O valor de €849,23 a título de créditos de formação dos últimos 5 anos e os proporcionais de 2022;
- O valor de €1.349,86 Ilíquido referente aos mês de março, quanto ao salário, proporcionais de subsídios de férias e Natal e subsídio de alimentação;
- O valor de €1.189,49, a título de Férias não gozadas;
- Indemnização pela resolução do contrato de trabalho de 45 dias por cada ano de trabalho completo, no valor de €27.600,00, tendo em conta o grau de culpa elevado da Ré;
- O valor não inferior a uma indemnização de 15.000,00€ a título de danos não patrimoniais.
Alegou, em síntese, que a Autora foi admitida ao serviço da “Plasticarga – Movimentação de Cargas, Lda.”, por contrato de trabalho sem termo, em 01-08-2001, com as funções de assistente administrativa, exercendo as suas funções nos escritórios da referida sociedade, em ..., juntamente com o seu companheiro BB, sendo que os restantes trabalhadores exerciam as suas funções nas instalações da “R..., S.A.”, em ..., executando a parte relativa à operação logística nestas instalações.
Mais referiu que a “Plasticarga” apenas tinha como cliente a “Repsol”, sendo esta a destinatária última e quase exclusiva do trabalho dos 18 trabalhadores da “Plasticarga”.
Alegou, de igual modo, que, por a Repsol não ter disponibilizado nas suas instalações um espaço para a “Plasticarga” ter o seu apoio administrativo, contrariamente ao que agora ocorre com a Ré, todo o trabalho administrativo essencial à “Plasticarga” era exercido fora do complexo industrial da “Repsol”.
Alegou ainda que na sequência do concurso promovido pela “Repsol” para escolher operador logístico no complexo petroquímico em ..., o qual era até então exercido pela “Plasticarga”, foi escolhida a Ré, tendo ocorrido a transmissão do estabelecimento a que a Autora estava afeta para aquela, e, apesar de a Ré, num primeiro momento, a ter informado que o seu posto de trabalho passaria a ser exercido nas instalações da “Repsol”, posteriormente, porque não detinha posto igual ou semelhante ao seu, propôs-lhe a alteração de funções para operadora logística, o que a Autora recusou, altura em que a Ré lhe comunicou não ter existido transmissão de estabelecimento, sendo que a Autora, em 02-03-2022, se apresentou nas instalações da “Repsol” para reocupar o seu posto de trabalho, tendo, porém, sido impedida pela Ré de entrar em tais instalações.
Alegou, igualmente, que em virtude do comportamento da Ré, a Autora, por carta de ../../2022, veio a resolver o contrato de trabalho com a Ré por justa causa, sendo de concluir que exerceu ininterruptamente as suas funções para a “Plasticarga” e para a Ré entre ../../2001 e ../../2022, encontrando-se diversos créditos laborais por liquidar, sendo-lhe ainda devida uma indemnização por antiguidade.
Referiu, por fim, que o comportamento da Ré lesou a sua dignidade, a sua vida pessoal e profissional, causando-lhe graves consequências para a sua saúde física e psíquica, sendo que o seu companheiro também ficou sem emprego, tendo ambos três filhos para sustentar.
Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver o litígio por acordo.
A Ré “LGCE” apresentou contestação, requerendo, a final, que a ação fosse julgada totalmente improcedente e, em consequência, fosse absolvida de todos os pedidos.
Alegou, em súmula, que a Autora vive maritalmente com BB, que foi sócio e gerente da “Plasticarga”, entre 2007 e março de 2022, tendo esta empresa em 2000 celebrado um contrato de prestação de serviços de logística com a “Repsol”, a prestar nas instalações desta, dispondo, para o efeito, de um armazém, sendo que tal contrato cessou, por iniciativa da “Repsol”, em 28-02-2022, tendo sido adjudicado à Ré, por concurso, nessa altura, o mesmo tipo de prestação de serviços.
Alegou ainda que a “Repsol” não era a única cliente da “Plasticarga” e a Autora não desempenhava quaisquer funções relacionadas com o contrato da “Repsol”, cabendo as funções administrativas à funcionária CC, que as exercia nas instalações da “Repsol”, integrando a Autora, na realidade, o quadro de pessoal da “Plasticarga” por força das relações familiares que tinha com um dos sócios gerentes, não lhe sendo exigida qualquer contrapartida pelo pagamento do salário que auferia.
Alegou, por fim, que não houve qualquer transmissão da unidade económica para a Ré relativamente à Autora, uma vez que, mesmo que a Autora desempenhasse funções administrativas, tais funções não estavam relacionadas com o desempenho de funções de logística e transporte que eram levadas a cabo, pelos trabalhadores da “Plasticarga”, no complexo da “Repsol”, pelo que, não sendo a Ré entidade empregadora da Autora, é alheia a qualquer decisão da Autora de resolução do seu contrato de trabalho.
A Autora veio responder às exceções invocadas pela Ré, pugnando pela sua improcedência.
Proferido despacho saneador, foi fixado o valor da ação em €45.786,19, dispensada a audiência prévia, efetuado o saneamento do processo e enunciado o objeto do litígio.
Após realização da audiência de julgamento, foi proferida sentença em 12-09-2023, com a seguinte teor decisório:
Em face de tudo quanto se deixou exposto, o Tribunal julga a acção totalmente improcedente e, em consequência, absolve a ré “LGCE – Logística e Construção Portugal, Lda.” dos pedidos deduzidos pela autora AA.
*
Custas a cargo da autora (artigo 527.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).
*
Registe e notifique.
Não se conformando com a sentença, veio a Autora interpor recurso de apelação, terminando com as seguintes conclusões:
A) Ao dar como provado que:
6. Os restantes colegas da autora, com funções operacionais, exerciam funções nas instalações da “R..., S.A.” no complexo Petroquímico em ..., ....
12. Todo o trabalho exercido pelos dezoito trabalhadores da “Plasticarga” que se encontravam a laborar nas instalações da “Repsol” era prestado em exclusivo para esta.
13. Estes trabalhadores executavam toda a parte de operação logística das instalações, em concreto: embalamento, armazenagem, movimentação, carregamento e transporte de Polímeros.
14. Com excepção do encaminhamento de algumas questões administrativas, a Repsol não disponibilizou nas suas instalações um espaço para que a “Plasticarga” aí tivesse o seu apoio administrativo que era prestado no seu escritório em ..., onde a autora trabalhava.
15. A Plasticarga carecia de serviços de apoio administrativo para faturação, recebimentos, processamento de salários, pagamento de impostos e segurança social, contratação de seguros,
contratação e pagamento de fornecedores, tratamento de aspectos relativos à formação dos trabalhadores, marcação de férias dos trabalhadores, entre outros.
A sentença recorrida terá que concluir que a atividade da A. é necessária à execução do contrato entre a Plasticarga e a Repsol, por ser acessória dessa actividade.
B) Não o fazendo viola o disposto no art.º 285.º do CT
C) A exclusão da transmissão do contrato de trabalho porquanto o adquirente de uma unidade de negócio de cariz essencialmente de prestação de serviços não detinha posto de assistente administrativa ou semelhante disponível, não leva a que não se transmita o contrato de trabalho, poderá levar sim a que o trabalhador cujo posto de trabalho seja transmitido fique sujeito conjuntamente com quem execute já para a transmissária exercia essas funções aos mecanismos de cessação do contrato de trabalho e não à exclusão da transmissão do contrato;
D) Transmitido o contrato de trabalho e considerando os factos provados nos n.º 27 a 30 da matéria de facto deverá o despedimento da A. com justa causa ser verificado – aliás por não impugnado, com as consequências previstas na petição inicial.
Devendo assim ser o presente recurso julgado procedente e em consequência concluir-se como na Petição Inicial, julgando-se transmitido o contrato de trabalho da A. para a R. e resolvido pela A. o contrato de trabalho com justa causa com as indemnizações aí referidas..
A Ré apresentou contra-alegações, pugnando pela improcedência do recurso, devendo ser mantida a sentença recorrida.
O tribunal de 1.ª instância admitiu o recurso como sendo de apelação, a subir imediatamente, nos próprios autos e com efeito meramente devolutivo, e, após a subida dos autos ao Tribunal da Relação, foi dado cumprimento ao preceituado no n.º 3 do art. 87.º do Código de Processo do Trabalho, tendo a Exma. Sra. Procuradora-Geral Adjunta emitido parecer, pugnando pela improcedência do recurso, devendo ser mantida na íntegra a sentença recorrida.
Não houve respostas a tal parecer.
O recurso foi admitido nos seus precisos termos, e, após a ida dos autos aos vistos, cumpre apreciar e decidir.
II – Objeto do Recurso
Nos termos dos arts. 635.º, n.º 4, e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil, aplicáveis por remissão do art. 87.º, n.º 1, do Código de Processo de Trabalho, o objeto do recurso é delimitado pelas conclusões da recorrente,
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