Acórdão nº 18588/16.2T8LSB-DU.L1-1 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-06-21

Ano2022
Número Acordão18588/16.2T8LSB-DU.L1-1
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na Secção do Comércio do Tribunal da Relação de Lisboa.

I - RELATÓRIO
Por apenso aos autos de liquidação judicial do Banco Espírito Santo, SA (BES) – liquidação judicial essa determinada por sentença proferida em 21/07/2016 (já transitada em julgado) - foi apresentada, entre outras, reclamação de créditos por A …
Após a publicação da lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos, em 23/08/2019 (ref.ª/Citius 23781653), veio a reclamante, ao abrigo do disposto no artigo 130.º do Código da Insolvência e da Recuperação de Empresas (CIRE), impugnar a mesma (uma vez que o crédito reclamado apenas foi parcialmente reconhecido, tendo sido integrado na lista de credores não reconhecidos a quantia de 2.204.634,30€).
Por notificação do dia 21/10/2021, foi a impugnante notificada do despacho proferido no dia 19 do mesmo mês, pelo qual se determinou que, em 5 dias, deveria a mesma proceder ao pagamento da taxa de justiça devida pela apresentação da impugnação, sem acréscimo de multa (ref.ªs/Citius 409438255 e 409686735).
Em 16/12/2021 (ref.ª/Citius 411425970), pelo tribunal a quo foi proferido despacho através do qual se determinou o desentranhamento da impugnação apresentada pela reclamante por não ter sido paga a taxa de justiça inicial devida pela mesma.
Consta de tal despacho, na parte respeitante à reclamante – “Fls. 37443v (A…)” – uma vez que o despacho tem igualmente por destinatários outros credores reclamantes:
Nos termos do art. 6.º, n.º 1, do RCP, a taxa de justiça corresponde ao montante devido pelo impulso processual do interessado e é fixada em função do valor e complexidade da causa de acordo com o presente Regulamento, aplicando-se, na falta de disposição especial, os valores constantes da tabela I-A, que faz parte integrante do presente Regulamento.
Do mesmo modo, dispõe o art. 7.º do RCP: (…)
Por seu turno, o art. 303.º do CIRE dispõe que (...)
E, finalmente, nos termos do art. 304.º do CIRE, as custas do processo de insolvência são encargo da massa insolvente ou do requerente, consoante a insolvência seja ou não decretada por decisão com trânsito em julgado.
Como compatibilizar estas normas no que tange às impugnações da lista de créditos reconhecidos e não reconhecidos?
Como se refere no Acórdão do STJ de 29/04/2014, in www.dgsi.pt, cujas palavras fazemos nossas, «Não existem dúvidas de que os processos de insolvência, então como agora, estão sujeitos a custas e ao pagamento da correspondente taxa de justiça, artigos 301º a 304º do CIRE.
Também não existem dúvidas que nos termos do artigo 1º, nº1 do Regulamento das Custas Processuais todos os processos estão sujeitos a custas, sendo considerados como processos, nos termos do seu cautelar ou recurso, corram ou não por apenso, desde que o mesmo possa dar origem a uma tributação especial.».
De harmonia com o disposto no artigo 3º, nº1 do mesmo diploma, as custas abrangem, a taxa de justiça, isto é a prestação pecuniária que o Estado exige em regra aos utentes do serviço judiciário no quadro da função jurisdicional por eles causada ou de que beneficiem, os encargos e as custas de parte.
As excepções a tais regras gerais de pagamento das aludidas despesas, sempre na óptica da problemática aqui suscitada, vêm consignadas no Regulamento, maxime, no artigo 4º.
No que à sua economia concerne, iremos convocar dois dos segmentos normativos, constantes do seu nº1, alíneas h) e u):
(…)
Daqui deflui, prima facie, reportando-nos ao processo de insolvência que nos ocupa, que no mesmo apenas a sociedade insolvente, porque assim foi declarada e enquanto empresa, está isenta de custas, alínea u) e em igual situação estariam os aqui Reclamantes se tivessem sido eventualmente representados pelo Ministério Público ou pelos serviços jurídicos do sindicato (…), o que se não mostra ter ocorrido no caso dos autos.
Porém, mesmo nas apontadas situações de isenção inicial de custas, os nºs 4 e 6 do citado artigo 4º, fazem afastar a manutenção da mesma, caso ocorra a desistência do pedido de insolvência, ou quando este seja indeferido liminarmente; e no caso da alínea h), quando a respectiva pretensão dos trabalhadores assim representados, for completamente vencida.
Podemos assim concluir que neste processo de reclamação de créditos, instaurado por apenso ao processo de insolvência de G, Lda, os Recorridos, aqui Reclamantes, não estão isentos de custas, nem objectiva nem subjectivamente.
(…)
Inexistindo qualquer disposição no Regulamento das Custas Processuais que dispensasse, por qualquer meio, os aqui Reclamantes do pagamento da taxa de justiça devida, pelos actos praticados e a praticar, no âmbito dos presentes autos e a ela sujeitos, com a ressalva do Reclamante A por via do beneficio de apoio judiciário que lhe foi concedido, vejamos se existe qualquer outra norma geral ou especial que conduza ao resultado propugnado por aqueles.
Começamos por afirmar que os processos de insolvência estão sujeitos a custas e ao pagamento da correspondente taxa de justiça, o que decorre dos artigos 301º a 304º do CIRE.
Dispõe o artigo 303º daquele diploma que «Para efeitos de tributação, o processo de insolvência abrange o processo principal,(...) a verificação do passivo, (...) e quaisquer outros incidentes cujas custas hajam de ficar a cargo da massa, ainda que processados em separado.», acrescentando o artigo 304º que «As custas do processo de insolvência são encargo da massa insolvente ou do requerente, consoante a insolvência seja ou não decretada por decisão com trânsito em julgado.».
Quer dizer, ao invés do que nos é esgrimido em sede de argumentário reivindicativo por parte dos Reclamantes, o processo de insolvência, na esteira do que se encontra legalmente estipulado para qualquer outro tipo de processo, não é tendencialmente gratuito para os respectivos intervenientes, pois, existem regras especiais e específicas que afastam expressis verbis essa asserção, a começar por aquele artigo 303º do CIRE quando nos diz que para efeitos de tributação o processo de insolvência abrange todo o processado autónomo ali referenciado cujas custas tenham de ficar a cargo da massa, o que significa que não são todas e quaisquer custas que estarão a cargo da massa, mas apenas aquelas que esta haja de suportar e a massa insolvente só suportará as custas na medida da sua sucumbência, por força das disposições processuais gerais aqui aplicáveis subsidiariamente, ex vi do artigo 17º do CIRE que para elas nos remete.
Ora, tendo em atenção a regra geral que rege a condenação em custas decorrente do disposto no artigo 527º do NCPCivil, temos que será condenada em custas a parte que a elas der causa, ou não havendo vencimento na acção, quem da mesma tirou proveito, entendendo-se que dá causa às custas do processo a parte vencida na proporção em que o for, tratando-se aqui da consagração do principio da causalidade entre a conduta de quem acciona ou é accionado e a lide respectiva, o que implica que a condição de vencido é determinante para a condenação no pagamento das custas (…)
Aliás se assim não fosse entendido, cairíamos numa completa subversão do sistema instituído, onde o princípio geral nesta matéria é o de que a responsabilidade pelo pagamento das custas assenta na ideia de que não deve pagar custas a parte que tem razão, passando o mesmo a conter desvios, nomeadamente no âmbito do processo de insolvência, fazendo-se recair sobre a massa insolvente toda e qualquer responsabilidade das custas, independentemente de a mesma poder obter ganho de causa nos processos e incidentes por aquele abrangidos nos termos do artigo 303º do CIRE.
O facto de o normativo inserto no artigo 304º do CIRE fazer consignar que as custas no processo ficam a cargo da massa insolvente, não poderá ser interpretado isoladamente, sem o apelo aos outros ínsitos legais existentes na ordem jurídica sob pena de se criarem brechas, incongruências e contradições insanáveis no sistema jurídico, o qual se pretende uno (…)
A primeira das quebras, a entender-se do modo aventado pelos Reclamantes, seria desde logo fazer tábua rasa do preceituado no artigo 303º do CIRE, na parte em que acentua que «Para efeitos de tributação, o processo de insolvência abrange o processo principal (...) a verificação do passivo (...) e quaisquer outros incidentes cujas custas hajam de ficar a cargo da massa, concatenado com o preceituado no artigo 527º, nº1 do NCPCivil, a não se entender assim, então bastar-nos-ia a formulação do artigo 304º do CIRE, na interpretação de que esta norma seria, afinal das contas, em relação àquela, bem como à processual, uma norma excepcional, por forma a que às regras estabelecidas pelos artigos 303º do CIRE e 527º do NCPCivil a mesma se opusesse contrariando a valoração ínsita nesta para atingir finalidades particulares, o que como já vimos, se não vislumbra, (…).
Tendo em atenção tudo o que se deixou exposto, poderemos retirar alguns corolários.
Primeiro: o processo de insolvência está sujeito a custas;
Segundo: as isenções subjectivas neste processo são unicamente as referidas nas alíneas h) e u) do artigo 4º do Regulamento das Custas Processuais;
Terceiro: todos os demais intervenientes processuais pagarão a taxa de justiça devida pelos actos a ela sujeitos.
Quarto: para efeitos de tributação são abrangidas as reclamações de crédito, entre outro processado e incidentes, desde que as custas devam (na letra da lei hajam) de ficar a cargo da mesma, sendo que, prima facie, as custas da insolvência ficarão a cargo da massa insolvente, caso esta venha a ser decretada por decisão transitada em julgado.
Quinto: as custas da insolvência que devam ficar a seu cargo são apenas aquelas em que a massa insolvente decaia e na medida de tal decaimento, sendo as restantes pelas partes intervenientes e na proporção da respectiva sucumbência.
Daqui decorre a sem razão dos Reclamantes no que diz respeito à
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