Acórdão nº 179/19.8PWPRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 08-06-2022

Data de Julgamento08 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão179/19.8PWPRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 179/19.8PWPRT.P1
1ª secção


Acordam, em conferência, na 1ª secção do Tribunal da Relação do Porto


I - RELATÓRIO
Nos autos de Processo Comum com intervenção do Tribunal Singular que correm termos no Juízo Local Criminal do Porto - Juiz 6, Comarca do Porto, com o nº 179/19.8PWPRT, foi submetido a julgamento o arguido AA, tendo a final sido proferida sentença, depositada em 18.11.2021, que condenou o arguido, pela prática de um crime de falsificação de documento p. e p. no artº 256º nº 1 al. a), d) e e) e nº 3 do Cód. Penal, na pena de 140 dias de multa à taxa diária de € 8,50.
Inconformado com a sentença condenatória, veio o arguido interpor o presente recurso, extraindo das respetivas motivações as seguintes conclusões:
1. O recorrente, não se conforma com a decisão proferida pelo douto tribunal “a quo”, que padece de erro de julgamento da matéria de facto e de direito, porquanto para além de matéria de facto da acusação ter sido julgada erradamente como provada, a prova produzida impunha que fosse dado como provados factos que constam como não provados, o que compromete irremediavelmente a solução jurídica dada pelo tribunal a quo.
2. Tal como já havia sucedido aquando a dedução da acusação, se bem que esta assente em meros indícios, também a decisão em crise descurou, além do mais, em absoluto, as imagens vídeo extraídas no local dos factos, pois que, além do mais, delas não se extrai o comportamento que se narra na acusação, - como, por exemplo, que o arguido circulou com o veículo e o fez na via pública -, muito menos a descrição dos agentes da PSP envolvidos, e/ou comprometidos, na operação em causa.
3. Concretamente, da prova produzida e constante dos autos, não pode o Tribunal a quo decidir como decidiu, além do mais, da matéria dada como provada que o arguido, “ao colocar as matrículas, teve precisamente a intenção de fazer circular o veículo de modo a evitar que as autoridades fiscalizadoras o autuassem por estar sem matrículas, bem assim, que, por mais curto que fosse o percurso, o arguido usou as matrículas de outro veículo”…
4. Sobre a discordância quanto ao julgamento da matéria de facto, chama à colação o que resulta dos autos, contextualizado com o momento/dia a que se atribui a prática dos factos, em termos de prova documental, como seja, o AUTO DA PSP e as citadas imagens das câmaras de VÍDEO, estas últimas que o tribunal a quo dá a entender, senão expressamente, pelo menos, implicitamente, que não visualizou, mas que se revelam esclarecedoras para a compreensão e contextualização da factualidade relevante.
5. Quanto ao primeiro, (auto de notícia da PSP), da autoria da testemunha, agente BB, resulta o seguinte que, contextualizado em dois momentos distintos, se afigura, desde logo, contraditório, bem assim, como se verá adiante, com a versão em depoimento destes, do arguido e das demais testemunhas: (…) “Data/Hora da Intercepção: 2019-02-28 11:30h” Confrontado com os factos acima relatados, o suspeito de imediato admitiu que havia sido ele a instalar as matrículas, refutando que havia invertido a marcha por ter constatado a presença desta Polícia. Perante os factos, foi o suspeito conduzido por esta Esquadra, juntamente com o veículo, a fim de realizar as diligências processuais tidas por convenientes”. O suspeito deu entrada nesta Esquadra às 11:55.
Já nesta Esquadra, o suspeito confirmou novamente que foi este que instalou as matrículas no trator e que a pretensão de tal ato era de levar o veículo para a oficina da Scania a circular na via pública com aquelas chapas de matrícula”.
6. Quanto ao segundo, “imagens extraídas pela PSP das câmaras de vídeo”, como se expressa e ilustra na motivação, nenhuma imagem mostra que o arguido, muito menos aquando a interpelação pelos agentes da PSP., (que, por mais estranho que pareça, nem sequer é observada), deu a volta ao veículo, de modo a inverter a marcha, e/ou, muito menos, ia sair com o veículo das instalações onde se encontrava…
7. Apesar das inúmeras horas de gravação (+ de 48 horas), as mesmas acabam precisamente no momento que, atento a descrição, relevaria, para sustentar a tese da acusação, não se extraindo delas sequer o episódio/momento da alegada abordagem pela PSP., o que se afigura incompreensível, ademais, se foi a própria PSP que as apreendeu e que, seguramente, a fez juntar aos autos, sendo certo que nenhuma imagem expressa o comportamento evasivo que, em maior ou menor grau, mesmo assente em “presunções”, os agentes da PSP imputam ao arguido.
8. O arguido, de todo o modo, não pode ser condenado pelo que, alegadamente, queria inicialmente fazer (estacionar no parque, até vir o camião “zorra”), e não fez, (com indicação para o colocar no parque das traseiras).
9. Sem prejuízo do que resulta do já referido supra, encontra-se incorretamente julgados os pontos 4, 5, 6 e 7 da matéria de facto provada, bem assim as alíneas B) a F) da matéria de facto não provada.
10. A respeito dos pontos 4 e 5 dos factos provados, tal como os demais infra expostos em discordância, os primeiros que referem, 4.º O arguido ao colocar naquele veículo as matrículas com os dizeres “..-OE-..” e ao usar aquele veículo onde havia aposto aquelas matrículas, fê-lo bem sabendo que aquelas não atestavam factos verdadeiros na medida em que não correspondiam às matrículas atribuídas àquele veículo pela respectiva entidade competente, bem sabendo, além do mais, que aquelas matrículas pertenciam a outro veículo; 5.º O arguido ao colocar naquele veículo as matrículas com os dizeres “..-OE-..” e ao usar aquele veículo onde havia aposto aquelas matrículas, pretendia circular com aquele na via pública de modo a ludibriar as autoridades, policiais ou outras, obtendo, dessa forma, benefício ilegítimo para si e, simultaneamente, prejudicando o Estado, garante da fé pública de tal documento, pondo em causa a segurança e credibilidade atribuídos a tais documentos, o tribunal formou a convicção, como se depreende, do que foi dito pelas testemunhas, porém, reapreciada a prova, de modo algum se pode dar como provada tal matéria.
11. As declarações do arguido, AA, sessão de julgamento de 18.10.2021, depoimento gravado através do sistema integrado de gravação digital, – Duração: 9h52m às 9h54m. – assim o contrariam, como se extrai das passagens assinaladas nas rotações 00:00:01 a 00:01:31 “Meti as matrículas, mas não circulei”; 00:01:32 a 00:03:08; 00:04:14 a 00:04:47; 00:04:50 a 00:06:55; 00:08:03 a 00:08:28; 00:10:53 a 00:11:45; 00:15:03 a 00:15:14; 00:15:37 a 00:16:24;
12. O depoimento da testemunha, BB, Agente da PSP, gravado através do sistema integrado de gravação digital já identificado supra, rotação 00:01:39 a 00:02:37; 00:01:39 a 00:03:19; 00:03:20 a 00:04:14; 00:04:15 a 00:04:52; 00:04:53 a 00:05:53; 00:05:54 a 00:06:19, 00:06:20 a 00:07:11; 00:07:44 a 00:08:22; 00:09:29 a 00:10:03; 00:10:04 a 00:11:36; 00:11:37 a 00:12:25; 00:12:26 a 00:12:51; 12:52 a 00:13:55, “Foi uma coisa que eu ia dizer, é que ele não conduziu; 00:13:56 a 00:14:44, “…, eu só posso presumir; 00:15:34 a 00:16:40, é ainda mais elucidativo do erro de julgamento;
13. O depoimento do outro agente da PSP, CC, sistema integrado de gravação digital, já referenciado, duração: 10h54m às 11h07, - que, afinal, ao contrário do que sustentou, nem contacto ou aproximação teve com o arguido -, revelou-se pouco credível, deveras comprometido, e contrariou o prestado antes pelo seu colega, pelo que devia ter determinado o tribunal a quo, no mínimo, a desvalorizar a sua (já de si insustentável) tese de que o arguido disse, na ocasião, queria levar o camião “embora, para circular”, como se infere, em maior grau, das passagens com rotação 00:02:25 a 00:02:54; 00:04:45 a 00:05:25, procurando, a certa altura, proteger-se, dizendo “o meu colega é que teve contacto...”, 00:05:26 a 00:06:32; 00:06:41 a 00:07:15; 00:07:16 a 00:08:39; 00:09:30 a 00:10:09; 00:11:00 a 00:11:30; 00:11:31 a 00:12:36.
14. O depoimento da testemunha, DD, viúvo, dono de uma agência de regularização automóvel, de 86 anos de idade, gravado no referido sistema integrado de gravação digital, com início pelas 10.26.02 horas e termo pelas 10.43.57 horas, foi claro, convincente e contrariou a matéria fática cuja impugnação se pretende, como resulta, em maior grau, das passagens com rotação, 00:04:49 a 00:05:32; 00:05:33 a 00:06:24; “Para ele o pôr na retaguarda, mas aquilo foi assim instantâneo…para o carregar, para o levar”, 00:06:50 a 00:08:19; 00:08:20 a 00:09:20, “Passado três dias já tinha matrículas para ele. Eu já tinha dado entrada da papelada, só estava à espera”, 00:09:21 a 00:09:54; 00:09:55 a 00:10:20; 00:10:55 a 00:11:51; 00:13:16 a 00:13:51; 00:13:52 a 00:14:22; 00:14:23 a 00:14:39.
15. O depoimento da testemunha, EE, casado, condutor manobrador, 36 anos, gravado através do referido sistema integrado de gravação digital, com início pelas 10.44.46 horas e termo pelas 10.53.08 horas, foi igualmente claro, convincente e contrariou a matéria fática cuja impugnação se pretende, como resulta, em maior grau, das passagens com a rotação que se indica, revelando que o arguido tinha combinado, de manhã, o transporte por camião zorra do veículo em causa: 00:02:01 a 00:02:39, 00:02:43 a 00:03:18; 00:03:53 a 00:04:26; 00:04:27 a 00:05:04; 00:05:57 a 00:06:24; 00:08:07 a 00:08:22.
16. A testemunha, FF, esposa do arguido, cujo depoimento, como as demais, foi gravado no sistema integrado de gravação digital, com início pelas 10.53.38 horas e termo pelas 11.06.35 horas, refere que o arguido comentou que tinha cometido um “ato irrefletido”, o que bem demonstra a humildade deste, salientando que “depois lhe arranjaram um sítio onde ficar o camião”, rotação 00:01:38 a 00:02:42.
17. Dos esclarecimentos solicitados ao arguido, na sessão de julgamento de 09.11.2021, registados no sistema áudio já referenciado,
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