Acórdão nº 1755/22.7T8STB-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-10-12

Ano2023
Número Acordão1755/22.7T8STB-A.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Processo n.º 1755/22.7T8STB-A.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Setúbal[1]
*****
Acordam na 1.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora[2]:

I – Relatório
1. AA e BB, Autores nos autos em epígrafe identificados, em que é Ré CC, notificados do despacho proferido na Audiência Prévia, que rejeitou a admissão da ampliação do pedido que haviam apresentado por requerimento de 31.01.2023, e não se conformando com a referida decisão, apresentaram o presente recurso de apelação, formulando as seguintes conclusões:
«1) O presente recurso vem interposto do douto despacho a quo, de 18/05/2023, que indeferiu o requerimento de ampliação do pedido deduzido pelos AA. Ora,
2) O nº 2 do artigo 265º do CPC prescreve que “o autor pode, em qualquer altura, reduzir o pedido e pode ampliá-lo até ao encerramento da discussão em 1.ª instância se a ampliação for o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo”.
3) A ampliação do pedido constitui o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo ”quando esse (novo) pedido esteja virtualmente contido no âmbito do pedido primeiramente deduzido, por forma a que pudesse tê-lo sido também aquando da petição inicial, sem a dedução de novos factos. Dito de outro modo, a ampliação do pedido constitui o desenvolvimento ou a consequência do pedido primitivo, quando o pedido formulado esteja virtualmente contido no pedido inicial e na causa de pedir da ação, isto é, que dentro da mesma causa de pedir o pedido primitivo se modifique para mais.”. No caso sub judice,
4) A causa de pedir “radica essencialmente na propriedade sobre o imóvel descrito sob o nº ...7 e inscrito sob o artigo matricial ...7º...” (in pág. 7 do despacho, a quo, proferido em sede de audiência prévia) e, acrescentaríamos nós, na lesão desse direito. Ora,
5) Conforme alegado (cf. artigo 85º e ss da P.i. e doc. nº 49 junto com a P.i. e artigo 65º da Contestação e Doc. 13 da mesma peça) o prédio reivindicado pelos AA. (prédio descrito sob o nº ...7 da freguesia de São Lourenço, concelho de Setúbal e inscrito na matriz artigo matricial ...7º... da freguesia de S. Lourenço, concelho de Setúbal), corresponde, hoje, a duas descrições prediais e inscrições matriciais, ou seja, deu origem a dois prédios distintos (prédio descrito sob o nº ...16, da freguesia de São Lourenço, concelho de Setúbal e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...09..., da freguesia de S. Lourenço, concelho de Setúbal e prédio descrito sob o nº ...83, da freguesia de São Lourenço, concelho de Setúbal e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...10..., da freguesia de S. Lourenço, concelho de Setúbal).
6) Sendo que, no pedido original, apenas foi feita menção a um dos prédios, no caso, o prédio descrito sob o nº ...16, da freguesia de São Lourenço, concelho de Setúbal e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...09..., da freguesia de S. Lourenço, concelho de Setúbal.
7) Quando, de facto, a realidade material correspondente ao prédio reivindicado, está hoje cindida em 2 prédios.
8) Razão porque a demonstração probatória que os AA. farão dos factos alegados – que constituem a causa de pedir original – levará a que as consequências dessa procedência, reflectir-se-ão necessariamente na realidade do segundo prédio (descrito sob o nº ...83, da freguesia de São Lourenço, concelho de Setúbal e inscrito na respectiva matriz predial urbana sob o artigo ...10..., da freguesia de S. Lourenço, concelho de Setúbal), fruto da desanexação promovida pela R.
9) E, assim, sempre os pedidos, ora, formulados (na ampliação), relativos aos dois prédios, cabem virtual (e dir-se-ia, necessariamente) no pedido inicial, sem a necessidade de aduzir quaisquer factos adicionais. Ou seja,
10) Estamos perante uma situação em que os AA., com o mesmo quadro fáctico, poderiam ter formulado a sua pretensão ampliada, logo na petição inicial.
11) Sendo então, pois, consequência e desenvolvimento da pretensão original.
12) O que faz com que a ampliação, ora, requerida, seja enquadrada na previsão do nº 2 do artigo 265º do CPC e, consequentemente, admissível.
13) Razões porque o despacho, a quo, violou, assim, o disposto nos artigos 260º e nº 2 do 265º, ambos do Código de Processo Civil.
14) Razões porque deverá ser admitida a ampliação do pedido formulado pelos AA., revogando-se, consequentemente, o mesmo despacho, em conformidade.».

2. Não foram oferecidas contra-alegações.

3. Observados os vistos, cumpre apreciar e decidir.
*****
II. O objeto do recurso.
Com base nas disposições conjugadas dos artigos 608.º, n.º 2, 609.º, 635.º, n.º 4, 639.º, e 663.º, n.º 2, todos do Código de Processo Civil[3], é pacífico que o objeto do recurso se limita pelas conclusões das respetivas alegações, sem prejuízo daquelas cujo conhecimento oficioso se imponha, não estando o Tribunal obrigado a apreciar todos os argumentos produzidos nas conclusões do recurso, mas apenas as questões suscitadas, e não tendo que se pronunciar sobre as questões cuja decisão esteja prejudicada pela solução dada a outras.
Assim, a única questão que importa decidir é a de saber se a deduzida ampliação do pedido deveria ter sido admitida.
*****
III – Fundamentos
III.1. – A tramitação processual relevante para apreciação do recurso é a seguinte:
1. Na petição inicial, os autores, invocando em síntese que «o acervo patrimonial de tais heranças, faz parte o prédio rústico, situado em “...”, sito na freguesia de S. Lourenço, do concelho de Setúbal, descrito na 1ª Conservatória sob o nº ...7 e inscrito na respectiva matriz predial rústica artigo matricial ...7º...», com a área de 24.500m2[4], que descreveram, alegando que desde 1957 sempre usaram e fruíram o referido prédio, de forma ininterrupta; e que a Ré, «de forma consciente e dolosa, iniciou um processo junto da Câmara Municipal de Setúbal, em 8 de Outubro de 2021, (…) visando a desanexação de uma parte urbana e onde cede, simultaneamente, para domínio público, uma parte do imóvel, o que concretizou, através da alteração vertida no Registo Predial, no início de 2022», formularam a seguinte pretensão:
«a) A R. condenada no reconhecimento de que o prédio, ora, identificado com o artigo 11709º-P, da freguesia de S. Lourenço, Setúbal, actualmente, correspondente à descrição nº ...16 da freguesia de São Lourenço, Setúbal, da 1ª Conservatória do Registo Predial, faz parte do acervo patrimonial das heranças indivisas abertas por óbito de DD e EE;
b) Restituir tal prédio totalmente livre e devoluto aos acervos hereditários referenciados, de molde a que o mesmo seja partilhado;
c) A R. condenada na abstenção da prática de qualquer acto próprio de um proprietário e, nomeadamente, que impeça ou diminua a disponibilidade de tal prédio;
d) Ordenada a actualização registral do prédio descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Setúbal sob o nº ...7, da freguesia de São Lourenço, concelho de Setúbal, com a inclusão da inscrição matricial nº ...09..., em face da efectiva correspondência;
e) Ordenado o cancelamento da inscrição a favor da R. do prédio correspondente ao artigo matricial nº ...09..., e, concomitantemente, ordenada a devida correcção do artigo matricial do prédio propriedade da R., descrito na 1ª Conservatória do Registo Predial de Setúbal sob o nº ...16, da freguesia de São Lourenço, concelho de Setúbal, anteriormente, correspondente ao artigo ...00º (rústico)».
2. Por seu turno, nos artigos 42.º, 56.º e 65.º da contestação a Ré invocou que «no final da década de ’70 do século passado, com a introdução do cadastro geométrico dos prédios rústicos, o antigo artigo 200.º foi substituído pelo artigo 77.º da secção “B”; a R. procedeu ao destaque de duas parcelas destinadas a construção urbana – Cf. Doc. 11 (informação técnica da Câmara Municipal de Setúbal); após mais de 2 anos de esforços intensivos junto dos serviços camarários e tributários, a R. conseguiu o destaque do artigo matricial ...7º... em duas parcelas – Cf. Doc. 13 (notificações da A.T.)».
3. Estas notificações da Autoridade Tributária respeitam à avaliação efetuada aos terrenos para construção, inscritos na matriz predial urbana sob o artigo ..., com “área total do terreno” de 13002,0000m2, e ..., com “área total do terreno” de ...,000m2, encontrando-se nas mesmas a referência a 19.11.2021, comos sendo a “data de passagem a urbano”.
4. Em fundamento da deduzida ampliação do pedido, os Autores invocaram que:
«A pretensão dos AA. assenta, na sua origem, na invocação (e reconhecimento) do Direito de propriedade do prédio inscrito na matriz predial, artigo matricial ...7º..., freguesia de S. Lourenço, concelho de Setúbal, que a partir de Dezembro de 2010, sem qualquer razão justificativa, passou a corresponder à descrição ...16º, propriedade da R. (cf. artigo 55º e ss da P.i.).
Quando, na realidade, corresponde à descrição ...77º da freguesia de S. Lourenço, concelho de Setúbal, titularidade dos AA..
Sucede que, tal como alegado (cf. artigo 85º e ss), a R., entretanto, iniciou (e concluiu) um processo junto da Câmara Municipal de Setúbal, visando a desanexação de uma parte urbana, criando outro(s) artigo(s).
Desse modo, a R. criou uma realidade fictícia, onde surge, agora, como proprietária do prédio descrito sob o nº ...16, freguesia de S. Lourenço, concelho de Setúbal, agora, inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo ...09....
E também, do prédio descrito sob o nº ...83, freguesia de S. Lourenço, concelho de Setúbal e inscrito na respectiva matriz predial sob o artigo ...10..., conforme consta da desanexação referenciada na descrição nº ...16. (cf. Doc. nº 1)
Ou seja, o prédio inscrito, anteriormente, artigo matricial ...7º..., de que o A., na qualidade invocada, invoca ser propriedade das identificadas heranças, deu origem a dois prédios, com artigos distintos.
Como se evidencia, por ex., somando as áreas constantes dos 2
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT