Acórdão nº 1742/17.7T8PVZ.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 15-06-2022

Data de Julgamento15 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão1742/17.7T8PVZ.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Apelação nº 1742/17.7T8PVZ.P1
Tribunal recorrido: Tribunal Judicial da Comarca do Porto
Juízo Local Cível de Vila do Conde
Relator: Carlos Portela
Adjuntos: António Paulo Vasconcelos
Filipe Caroço

Acordam na 3ª Secção do Tribunal da Relação do Porto

I.Relatório:
O Condomínio do Edifício ..., Bloco ..., sito na Rua ..., concelho de Vila do Conde, instaurou a presente acção de prestação de contas contra AA, residente na Rua ..., concelho de Vila do Conde.
Para tanto alega, em síntese, que por Assembleias Gerais de Condóminos do prédio Autor foi a Ré nomeada como administradora do Condomínio por anos sucessivos pelo menos desde 2011, tendo-lhe sido atribuídas funções administrativas e executivas referentes a todos os actos de administração do Condomínio Autor. Mais, alega que a Ré se recusa a prestar contas relativamente aos anos de 2015 e 2016.
Termina pedindo que a Ré seja citada para, num prazo de 30 dias, apresentar as contas do período em que exerceu a administração do condomínio sito na Rua ..., em Vila do Conde, sob pena de não o fazendo, não poder deduzir oposição às contas que o Autor venha a apresentar.
A ré foi citada para contestar e veio apresentar a contestação, onde alega que nunca exerceu, verdadeiramente, as funções de administradora, o que era do conhecimento de todos os condóminos do prédio, pugnando pela improcedência da presente acção.
Veio ainda deduzir incidente de Intervenção Principal Provocada de BB.
Tal pedido de intervenção principal provocada foi indeferido nos termos da decisão proferida a 28.06.2018 (cf. fls. 58 e seguintes), por se entender que no caso não se está perante uma situação de litisconsórcio nem necessário nem voluntário.
E tal decisão transitou já em julgado.

Uma vez que a ré contestou a obrigação de prestar contas, e ao abrigo do disposto no art.º 942.º, nº3 do Código de Processo Civil, os autos prosseguiram com a produção de prova, decidindo-se com data de 22.07.2020 que a Ré está obrigada a prestar contas ao Condomínio Autor, relativamente ao período compreendido entre 01/01/2016 e até 17 de Outubro 2016, no que concerne aos pontos 16, 17, 20. 21. 22. 29. 31. e 32. dos factos provados e, em consequência, se ordenou a sua notificação nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 942º n.º 5 do CPC.
Na sequência de tal decisão, a Ré apresentou as contas conforme fls. 136 e seguintes dos autos, de onde resulta um saldo final no valor de 840,24€.
O Autor, veio contestar as contas apresentadas pela Ré, dizendo que a Ré não esclarece qual o destino dado a vários valores enumerados como despesas, despesas essas que o Autor sempre se debateu para ver esclarecidas. Mais alega que a Ré não justifica os levantamentos que fez com o cartão multibanco, sendo certo que há uma transferência de 2000,00€ que não justifica a que se deveu tal pagamento, não indicando os serviços pagos ou a quem o mesmo foi efectuado, nem apresenta recibo de quitação. Termina requerendo que a Ré venha esclarecer a que se reporta a referida despesa, explicando qual o bem ou serviço que foi pago e quem recebeu tal valor.
Foi então proferido despacho saneador, foi fixado o valor da causa, foi identificado o objecto do litígio e os temas da prova.
Realizou-se a audiência de discussão e julgamento no culminar da qual se proferir decisão onde se julgou a presente acção parcialmente procedente e, em consequência, julgaram-se parcialmente boas as contas apresentadas pela Ré, com o saldo de 5.225,61€, valor que se condena a Ré a pagar ao autor Condomínio.
A Ré veio interpor recurso desta decisão, apresentando desde logo e nos termos legalmente prescritos as suas alegações.
O Autor respondeu.
Foi proferido despacho no qual se considerou o recurso tempestivo e legal e se admitiu o mesmo como sendo de apelação, com subida imediata, nos autos e efeito meramente devolutivo.
Recebido o processo nesta Relação emitiu-se despacho que teve o recurso por próprio, tempestivamente interposto e admitido com efeito e modo de subida adequados.
Colhidos os vistos legais, cumpre decidir.
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II. Enquadramento de facto e de direito:
Ao presente recurso são aplicáveis as regras processuais da Lei nº41/2013 de 26 de Junho.
É consabido que o objecto do recurso, sem prejuízo das questões que sejam de conhecimento oficioso obrigatório, está definido pelo conteúdo das conclusões vertidas pela ré/apelante nas suas alegações (cf. artigos 608º, nº2, 635º, nº4 e 639º, nº1 do CPC).
E é o seguinte o teor dessas mesmas conclusões:
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Por seu turno nas conclusões das suas contra alegações vem autor/apelado defender o seguinte:
Que a decisão sobre a matéria de facto apenas pode ser alterada se a prova aduzida pela Ré, não apenas indiciar ou sugerir, mas antes claramente impuser decisão diversa.
Que o dever de prestar contas pela forma legal - em forma de conta corrente, com deve e haver e concluindo-se por um saldo -, emerge quando alguém administra bens alheios – art.º 941º do CPC – e conexiona-se com o dever de informação do art.º 573º do CC.
Que valorando a prova produzida, no seu conjunto e a matéria de facto dada como provada, outra não poderia ser a interpretação e decisão que não a proferida na sentença recorrida.
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Perante o antes exposto, resulta claro que são as seguintes as questões suscitadas no presente recurso:
1ª) A impugnação da decisão da matéria de facto proferida;
2ª) A contradição entre o agora decidido na sentença recorrida e o exarado na decisão proferida a 22.07.2020.
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Antes do mais, impõe-se recordar aqui qual o conteúdo da decisão de facto que foi proferida nos autos e que é o seguinte:
Factos Provados
Em consequência da prova produzida em audiência de julgamento, resultou provado que:
Do julgamento inicial:
1) Na assembleia do condomínio do prédio sito na Rua ..., Vila do Conde, realizada no dia 19 de Fevereiro de 2016, pelas 18:50 horas, foi eleita nova administração para o ano de 2016 e até 31 de Janeiro de 2017, constando da respectiva ata: “Ponto 3 (…) foram reeleitos os dois membros em exercício respectivamente como, Administradora Presidente AA Administrador Vogal BB, cujo mandato cessará em 31/01/2017” – conforme ata n.º 24. [facto provado em 7.]
2) Na assembleia do condomínio do prédio sito na Rua ..., Vila do Conde, realizada no dia 17 de Outubro de 2016, pelas 19 horas, foi aprovada, por unanimidade dos condóminos presentes, a exoneração da administradora – conforme ata avulsa. [facto provado em 8.]
3) A intervenção da Ré restringia-se ao exercício dos cuidados relativos ao bom funcionamento do prédio. [facto provado em 16.]
4) A Ré procedia ao pagamento da limpeza, recepção de correspondência; troca de lâmpadas, etc. [facto provado em 17.]
5) A Ré tinha acesso à correspondência do Banco (Banco 1...). [facto provado em 20.]
6) Também as facturas para pagamento da EDP e Indaqua eram recepcionadas pela Ré, sendo os respectivos pagamentos efectuados através de débito directo da Conta bancária. [facto provado em 21.]
7) A Ré recebia e dava nota de quitação a quem lhe pagava o condomínio em numerário. O montante era mantido pela Ré, em numerário, para fazer face às despesas com a empregada de limpeza, com os produtos de limpeza e ainda com outras pequenas despesas que fossem necessárias. [facto provado em 22.]
8) Nesse mesmo dia, a Ré referiu à nova Administradora, que no Banco 1... a conta do condomínio apresentava um saldo de €946,69 (novecentos e quarenta e seis euros e sessenta e nove cêntimos). [facto provado em 29.]
9) Nesse momento, a Ré entregou à nova administradora de condomínio, Dra. CC, €2.645,24 (dois mil, seiscentos e quarenta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos), desse montante, €1.500,00 (mil e quinhentos euros) diziam respeito à quota parte que a Ré, como condómina, pagou em virtude das obras realizadas no interior do edifício e a restante importância de €1.145,24 (mil, cento e quarenta e cinco euros e vinte e quatro cêntimos), representava as sobras das quantias por ela recebidas a título de quotas de condomínio. [facto provado em 31.]
10) Ainda nessa mesma reunião, a Ré entregou toda a documentação que tinha na sua posse, nomeadamente, as Facturas da EDP e da Indaqua referentes ao ano de 2016, o Contrato de Empreitada da Obra realizada no interior do Edifício, os recibos de pagamento ao empreiteiro, os documentos do seguro do Edifício, alguns documentos de despesas extra. [facto provado em 32.]
Desta audiência de julgamento:
11) As receitas do Condomínio Autor entre 01.01.2016 e 17.10.2016 foram:
Proveniência
Transferência de conta poupança do condomínio ...
Data 29.01.2016
Valor €.1753,99
Proveniência
Transferência de conta poupança do condomínio ...
Data 29.01.2016
Valor
€.2500,00
Proveniência
Depósito de juros
Data 29.01.2016
Valor €.2,35
Proveniência
Depósito de juros
Data 30.01.2016
Valor €.0,77
Proveniência
Transferência de DD
Data 10.02.2016
Valor €.360,00
Proveniência
Transferência de conta negócios condomínio ...
Data 26.02.2016
Valor €.1000,00
Proveniência
Transferência de conta negócios condomínio ...
Data 29.02.2016
Valor €.1000,00
Proveniência
Transferência de EE
Data 01.03.2016
Valor €.360,00
Proveniência
Transferência de FF
Data 07.03.2016
Valor €.360,00
Proveniência
...

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