Acórdão nº 1665/14.1T8BRG-I.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11-05-2022

Data de Julgamento11 Maio 2022
Ano2022
Número Acordão1665/14.1T8BRG-I.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I
Na presente ação de prestação de contas, que corre termos no Juízo de Família e Menores de Braga, em que é autor L. F. e ré M. C., a 18-1-2022 foi proferida sentença em que se decidiu:
"Por tudo o exposto, julgo a ação totalmente improcedente e, consequentemente, absolvo a R. M. C. do pedido.
Custas pelo Autor.
Notifique expressamente o A para, no prazo de dez dias, se pronunciar sobre a sua eventual condenação como litigante de má fé."
Na sequência desta notificação, o autor pronunciou-se no sentido de que não litiga de má-fé.

Por despacho de 18-2-2022 a Meritíssima Juiz decidiu:
"Pelo exposto e verificando-se uma das situações previstas no art.º. 542.º/2 do CPCivil, existe fundamento para a condenação do A como litigante de má-fé, considerando-se adequada, face ao grau de culpa, à natureza do facto omitido e aos interesses subjacentes aos presentes autos, a condenação deste na multa de 20 (vinte) UC."

Inconformado com a sentença, o autor dela interpôs recurso, findando a respetiva motivação com as seguintes conclusões:

1. Não pretende o apelante, nas conclusões que se seguem, reduzir o objeto do presente recurso.
2. Vem o presente recurso interposto da sentença do Tribunal a quo que julgou a ação improcedente e considerou que as obras realizadas não têm qualquer valor económico.
3. Ora, o A. discorda veementemente dessa posição, pelo que se propõe provar que se tivesse sido corretamente valorada a prova, teria sido a decisão distinta.
4. A Recorrente considera que a matéria de facto dada como provada constante da sentença sob 10 e a não provada constante da sentença sob ponto 1 e se encontra incorretamente julgada, impondo-se assim, a sua modificação, nos termos do artigo 662.º n.º 1 do Código de Processo Civil.
5. Ora, com tal conclusão jamais se poderá concordar que as obras realizadas não têm qualquer valor económico
6. O seu valor económico afere-se pela utilidade que tem demonstrado ao longo dos últimos anos para o fim de oficina, como a R. bem sabe e conhece.
7. Tendo-se dado como provado no n.º 8 dos factos provados que de facto foram executados os trabalhos que o A. peticiona no valor de 40.441,58 € (quarenta mil quatrocentos e quarenta e um euros e cinquenta e oito cêntimos), andou mal o tribunal a quo ao não considerar esse valor.
8. Ainda assim, mesmo que se considerasse que parte das benfeitorias realizadas no imóvel que foi "legalizado" não teriam qualquer valor económico - o que nem por mero exercício académico se admite -, ignorou o tribunal a quo, como resultou provado, que o A. efetuou obras de reparação que resultaram em benfeitorias nos escritórios, na adaptação da cozinha e exposição, em edifícios "legais" à luz das regras gerais de urbanização e edificação.
9. O tribunal a quo desvalorizou completamente toda e qualquer intervenção que o cabeça-de-casal fez, ainda que, resultassem na conservação necessária do imóvel.
10. Chega mesma o tribunal a quo a dizer na sua motivação que: "1. O facto provado 10.º e o facto não provado decorrem de ter ficado demonstrado que as obras realizadas se referem à adaptação de uma parte do imóvel edificada para habitação (cozinha), escritórios, exposição e à construção de um edifício novo para oficina, executadas num terreno cuja classificação do solo não permite a edificação, sobre a qual as entidades administrativas emitiram ordem de demolição, do que se conclui que não têm qualquer valor económico."
11. Ora, como se sabe terreno rústico e reserva ecológica nacional são coisas diferentes. Pelo que, em terreno rústico poderá existir procedimento administrativo de "legalizar" o edificado existente que não estaria. E foi isso que foi produzido, que existe a legítima expectativa de que não se proceda à demolição, pois corre procedimento para esse fim.
12. Foi a própria Câmara Municipal onde se encontre o imóvel que permite a "legalização", que só não ocorreu por falta de uma simples assinatura que a R. se recusa a apor em documento para esse fim.
13. Mas, ainda deveria ter considerado o tribunal os trabalhos executados naquela parte do imóvel que é "legal", mas não fez. Ignorou por completo a despesa que o cabeça-de-casal suportou.
14. Deste modo, de acordo com o que ficou demonstrado não deveria ter sido dado como provado que as obras realizadas não têm qualquer valor económico e o que conta no n.º 10 dos factos provados deveria passar a constar dos factos não provados.
15. Da prova pericial junta aos presentes autos a fls. 76 a 74, resultou provado a execução dos trabalhos no referido imóvel, resultou um valor concretamente apurado: o valor peticionado pelo A. Isto é, as obras de reparação foram concretamente executadas, tendo existido uma despesa.
16. Nunca poderia o tribunal dizer que as obras não têm qualquer valor económico, quando a própria sentença resulta que o edificado existe desde 1994 e, pelo menos desde 2011, que as obras foram realizadas, adicionam utilidade ao imóvel.
17. Também sabe, o tribunal a quo que as obras poderão ser suscetíveis de serem legalizáveis ao abrigo do DL n.º 177/2001, de 4 de junho e do Código Regulamentar do Município de Braga, tanto é que, caso assim não fosse, não teria decorrido este hiato temporal se quase 30 anos sem que as mesmas tivessem sido demolidas.
18. Ainda assim, o tribunal desconsidera que existe parte edificada em terreno passível de edificação, pelo que, o raciocínio lógico do julgador deveria ter sido de considerar e quantificar qual é esse montante e condenar, pelo menos, pelas obras realizadas na parte que estava legalizadas - o que o tribunal a quo desconsiderou.
19. Portanto, não poderia ter sido outra a conclusão do tribunal, senão considerar que as obras têm valor económico.
20. Como resultou provado nos presentes autos, as obras realizadas de adaptação de parte do imóvel deveram-se à necessidade de conservação do mesmo. Ora, a não realização daquelas obras colocariam em causa a sustentabilidade e utilização do mesmo para os fins a que se destina.
21. Foi por isso que, de boa fé e com o zelo de quem administra a coisa que lhe foi confiada, o A., após vários anos, empregou esforços para garantir a não deterioração do imóvel objeto nos autos.
22. Tal é legítima, que a parte do edifício que se encontra em terreno rústico pode-lhe ser conferida a viabilidade que o A. alega - o que resultou da produção de prova e dos documentos trazidos aos autos pelas partes.
23. É, portanto, neste exercício, que cabe os poderes de administração do cabeça-de-casal, ao garantir que o edificado existente não perderá valor - o que teria acontecido se o A. não tivesse agido naquele momento.
24. Ademais, a R. bem conhece o prédio, o qual visita/visitava regulamente, bem conhece todas as obras que lá foram realizadas, pelo que só de má fé pode ignorar e desconhecer o fim das mesmas. A R. conhecia todas as obras que lá foram efetuadas para conservação do imóvel, bem como a obra nova, pelo menos desde 2011.
25. Ora, o tribunal a quo deu como provado que o A. efetuou tais despesas, pelo que deveria ter considerado o pagamento de metade dessas despesas pela R. - o que não fez.
26. Deste modo, de acordo com o que resultou da produção de prova pericial junta aos autos, o A. procedeu efetivamente ao pagamento de despesas com a execução de obras de conservação do imóvel, como tal deveria ter sido dado como provado que a R. deveria pagar ao A. metade do montante que este despendeu, passando este facto a constar dos factos provados. Deveria, ainda, constar dos factos provados o que consta no n.º 1 dos factos não provados.
27. De facto, o relatório pericial apenas considera que não podem ser consideradas obras de conservação no edificado em solo com classificação que não permite a edificação. Ora, não se refere às obras edificadas no imóvel que está localizado em solo que permitiu a sua edificação e que está legal.
28. Foi o próprio A. que disse conhecer as decisões administrativas que pendiam sobre o imóvel e que demonstrou ter a legítima expectativa de que as mesmas fossem "legalizadas".
29. Como tal, se tivesse valorado corretamente a prova, teria o tribunal a quo decidido em sentido diverso, tendo condenado a R. no pagamento dos valores peticionados pelo A..
30. Conforme resulta do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa 16126/17.9T8SNT.L1-7: "5. O fim da ação de prestação de contas é o de estabelecer o montante das receitas cobradas e das despesas efetuadas, de modo a obter-se a definição de um saldo e a determinar a situação de crédito ou de débito."
31. O A. despendeu o valor peticionado de 40.441,58€, o que fez com que existisse um aumento do valor económico do imóvel.
32. A obra não foi demolida, tendo viabilidade à luz dos ditames jurídicos para ser licenciada, pelo que nunca poderá proceder a incorreta interpretação e formulação de juízo de valor que o tribunal a quo levou a cabo, porque apenas por falta de zelo tal poderia ser possível.
33. Tendo o A. despendido tal valor, a R. ex-cônjuge (e comproprietária do imóvel) teria que ressarcir pelo menos em metade o A. pelas melhorias que este efetuou enquanto cabeça de casal, isto é, de ressarcir o A. do valor de € 20.220,79.
34. Leia-se o Acórdão do Tribunal...

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