Acórdão nº 16180/22.1T8LSB.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-09-13

Ano2022
Número Acordão16180/22.1T8LSB.L1-7
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam as Juízas na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

I – RELATÓRIO
A [ …., S.A. ], pessoa colectiva n.º ..., com sede social sita na … Lisboa apresentou, em 29 de Junho de 2022, requerimento inicial de procedimento cautelar de entrega judicial, nos termos do artigo 21.º do Regime Jurídico do Contrato de Locação Financeira[1], aprovado pelo Decreto-Lei n.º 149/95, de 24 de Junho contra B [ ….– LOGÍSTICA, LDA ] ., pessoa colectiva n.º …, com sede no Largo … Guimarães, requerendo que, sem prévia audição da requerida, seja ordenada:
a) A entrega imediata dos veículos locados, cuja apreensão deve ser solicitada às autoridades policiais e, bem assim, de toda a respectiva documentação
b) A emissão de decisão que consubstancie resolução definitiva da causa, sem necessidade da propositura de acção principal conexa, nos termos e para os efeitos do n.º 7 do artigo 21.º do RJCLF.
Alegou para tanto, em síntese, o seguinte:
- A requerente é uma sucursal de uma instituição de crédito que tem por objecto social todas as operações bancárias, financeiras e de crédito, tendo, no exercício da sua actividade, celebrado com a requerida dois contratos de locação financeira mobiliária identificados pelos n.ºs 11600153 e 11700233, através dos quais deu em locação à requerida, no âmbito do primeiro, o veículo ligeiro de mercadorias, marca IVECO, modelo DAILY 35S15V 12M3, com a matrícula XX-XX-XX e, no âmbito do segundo, dois camiões, marca IVECO, modelo STRALIS AS440S46TP, com as matrículas YY-YY-YY e 00-00-00 ;
- A requerente pagou à empresa IVECO Portugal – Comércio de Veículos Industriais, S.A., fornecedora dos bens locados, o valor correspondente ao preço dos bens;
- O prazo de duração dos contratos foi fixado em 60 e 48 meses, respectivamente e foi celebrado um acordo de recompra, entre a requerente, a requerida e a Iveco Portugal, para a eventualidade de a segunda não optar pela aquisição dos bens locados findos os contratos;
- Os bens foram entregues à requerida;
- Após sucessivas moratórias decorrentes da aplicação do Decreto-Lei n.º 10-J/2020, de 26 de Março, e subsequentes alterações contratuais, a requerida não pagou à requerente, quanto ao contrato n.º 11600153, a 56ª renda, vencida em 22 de Novembro de 2021, no valor de € 818,71 (oitocentos e dezoito euros e setenta e um cêntimo) e quanto ao contrato n.º 11700233, a 43ª renda, vencida em 22 de Outubro de 2021, no valor de € 5.393,03 e a 44ª renda, vencida em 22 de Novembro de 2021, no valor de € 5.393,03, num total de € 10.786,06 (dez mil setecentos e oitenta e seis euros e seis cêntimos);
- A requerente efectuou diversas interpelações à requerida e ao seu avalista para pagamento das rendas em atraso, sem sucesso; em 10 de Dezembro de 2021, remeteu à requerida carta registada com aviso de recepção a informar sobre a respectiva resolução contratual, indicando que os bens locados teriam de ser entregues à empresa Iveco Portugal – Comércio de Veículos Industriais, S.A.;
- A requerida não procedeu à restituição dos bens locados, o que causa prejuízos patrimoniais sérios à requerente que, com o atraso verificado na entrega dos bens locados, vão sendo agravados;
- A requerente procedeu ao cancelamento dos registos dos bens objecto dos contratos junto da Conservatória do Registo Automóvel, estando reunidos os pressupostos para a sua apreensão e a entrega imediata, assim como estão reunidos todos os elementos necessários para que o Tribunal se possa pronunciar em termos definitivos sobre a causa principal.
Em 1 de Julho de 2022 foi proferida decisão que indeferiu a requerida dispensa de contraditório e ordenou a citação da requerida, nos termos do n.º 3 do art.º 21º do RJCLF (cf. Ref. Elect. 417192914).
Citada a requerida, esta não deduziu oposição (cf. Ref. Elect. 33088946).
Em 27 de Julho de 2022 foi proferida decisão final que julgou procedente o procedimento cautelar e decretou a apreensão e entrega imediata à requerente dos veículos automóveis supra identificados e respectivos documentos, tendo indeferido a dispensa do ónus da propositura da acção principal (cf. Ref. Elect. 417870644).
Em 8 de Agosto de 2022 a requerente dirigiu aos autos um requerimento para reforma da decisão, considerando ter ocorrido lapso manifesto quanto ao indeferimento da dispensa do ónus de propositura da acção principal, porquanto consta dos autos toda a prova documental necessária à análise definitiva do litígio devendo ter lugar a antecipação do juízo sobre a causa principal (cf. Ref. Elect. 33319855).
Tal requerimento foi indeferido, conforme despacho proferido em 11 de Agosto de 2022 (cf. Ref. Elect. 418081399).
Inconformada com a decisão proferida, dela vem a requerente interpor o presente recurso, cujas alegações concluiu do seguinte modo (cf. Ref. Elect. 33364430):
A. O presente recurso de apelação vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, em 28 de julho de 2022, que, em suma, declarou que os presentes autos não reúnem os elementos que permitam proferir decisão que antecipe o juízo acerca da causa principal.
B. Ora, a Recorrente não se pode conformar com tal entendimento, não tendo a decisão recorrida acolhido devidamente a especificidade da matéria em causa, a prova produzida e o âmbito jurídico do Regime Jurídico do Contrato de Locação Financeira (RJCLF).
C. Pois, os presentes autos de Providência Cautelar de Entrega Judicial de Bens Móveis (Veículos) foram intentados ao abrigo do vertido no artigo 21.º, nº 1, do Regime Jurídico do Contrato de Locação Financeira (RJCLF), aprovado pelo Decreto-Lei nº 149/95, de 24 de junho, com a redação que lhe foi dada pelo Decreto-Lei nº 265/97, de 2 de outubro e pelo Decreto-Lei nº 30/2022, de 25 de fevereiro.
D. Tendo a respetiva petição inicial sido apresentada em 29 de junho de 2022.
E. Em 28 de julho de 2022 é proferida sentença pela Mma. Juíza do Tribunal a quo considerando como provados, com relevância para a boa decisão da causa, os factos 8º a 11º, e 19º a 21º, melhor referidos no artigo 9.º do presente articulado, relativos à resolução dos contratos de locação financeira por incumprimento definitivo e à não restituição dos bens locados.
F. A sentença recorrida julgou procedente e provado o presente procedimento cautelar requerido contra a Requerida e, consequentemente, determinou o decretamento da providência requerida nos autos, sendo ordenada a entrega imediata a Recorrente do veículo ligeiro de mercadorias, marca IVECO, modelo DAILY 35S15V 12M3, com o número de série ..., com a matrícula XX-XX-XX, do camião, marca IVECO, modelo STRALIS AS440S46TP, com o número de série ... e matrícula YY-YY-YY e do camião, marca IVECO, modelo STRALIS AS440S46TP, com o número de série ..., com a matrícula 00-00-00
G. Mais, em decisão, in fine, foi proferido o seguinte: “Dispõe o nº 7 do artigo 21º do DL. 149/95 de 24 de junho que decretada a providência cautelar, o tribunal ouve as partes e antecipa o juízo sobre a causa principal, exceto quando não tenham sido trazidos ao procedimento, nos termos do n.º 2, os elementos necessários à resolução definitiva do caso. Ora assim sucede no caso em análise dado que os elementos de facto trazidos aos autos não revestem carácter que permita a resolução definitiva do litígio entre as partes, mas tão só a apreciação da tutela cautelar pretendida. Consequentemente, indefere-se a requerida dispensa do ónus da propositura da ação principal”.
H. São requisitos para que seja decretada a providência cautelar de entrega judicial prevista no artigo 21.º, nº 1, do Regime Jurídico do Contrato de Locação Financeira (RJCLF), a resolução do contrato por parte do locador, a não entrega pelo locatário aquele bem objeto da locação, bem como o cancelamento prévio do registo da locação financeira.
I. Requisitos que foram dados como provados, tanto assim é que o Tribunal a quo com base nos mesmos julgou procedente a providência cautelar e ordenou a entrega à Recorrente do veículo ligeiro de mercadorias, marca IVECO, modelo DAILY 35S15V 12M3, com o número de série ..., com a matrícula XX-XX-XX, do camião, marca IVECO, modelo STRALIS AS440S46TP, com o número de série ... e matrícula YY-YY-YY e do camião, marca IVECO, modelo STRALIS AS440S46TP, com o número de série ..., com a matrícula 00-00-00
J. Nos termos do disposto no nº 7 do artigo 21.º do diploma supra referido, decretada a providência cautelar o Tribunal, ouvidas as partes, antecipa o juízo sobre a causa principal.
K. Contudo, e apesar de a Requerida ter sido citada previamente, a Requerida não apresentou oposição ao presente procedimento cautelar.
L. Sendo que a ausência de oposição tem especial cominação e deve ser relevada, inclusivamente para dispensa do ónus da propositura da ação principal, sem necessidade de outro Tribunal analisar a mesma documentação e demais prova produzida.
M. Todas as oportunidades de defesa, bem como todo o contraditório, foram dados à Requerida ao longo de todo o processo.
N. Com efeito, no exercício da sua atividade, a Requerente celebrou com a Requerida 2 (dois) contratos de locação financeira mobiliária identificados pelos n.ºs 11600153 e 11700233, pelo qual deu em locação os bens melhor identificados no Anexo I aos contratos de Docs. 1 e 2.
O. Sucede que a Requerida, deixou de efetuar os pagamentos das rendas mensais a que encontrava obrigada nos termos contratos de locação financeira mobiliária identificados pelos n.ºs 11600153 e 11700233, designadamente, a renda nº 56, vencida em 22 de novembro de 2021 e as rendas nº 43, vencida em 22 de outubro de 2021, e 44, vencida em 22 de novembro de 2021, respetivamente.
P. Encontrando-se, pois, por demais provado, o incumprimento por parte da Requerida, aliás, tal facto nem sequer foi impugnado na decisão que decretou a presente providência.
Q. Nessa sequência, em 10 de dezembro de 2021, a Recorrente remeteu à Requerida cartas registadas com aviso de
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