Acórdão nº 16166/21.3YIPRT.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-03-30

Ano2023
Número Acordão16166/21.3YIPRT.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA:

I – RELATÓRIO
O autor, Novo Banco SA, intentou procedimento de injunção contra o réu, AA, pretendendo fazer valer em juízo créditos seus sobre o réu, seu cliente bancário.
Alegou o autor, em resumo, que sucedeu ao Banco Espírito Santo, SA, por força de deliberação do Conselho de Administração do Banco de Portugal de 3 de Agosto de 2014, e que nessa qualidade é titular de um saldo devedor em capital, relativo à conta à ordem n.º ...04, sobre o réu AA, que a 10/12/2012 apresentava o valor de €280,94, acrescidos de juros à taxa de 27,000%, acrescida da sobretaxa de mora de 2,000% e, ainda é titular de um saldo credor em capital sobre o mesmo no valor de €1.586,89, decorrente da utilização do cartão de crédito, por este solicitado aos 10/05/2005, referente à conta crédito n.º ...75, acrescido dos juros contratualmente estipulados à taxa de 24,500 %, acrescida da sobretaxa de mora de 4%, sobre os montantes a cada momento devidos, entre 10/10/2011 e 06/02/2021, que contabilizados nessa data perfazem o montante de €4.055,99.
Por não ter sido apurado o paradeiro do réu, foi este citado por éditos, após o que, não tendo o réu constituído mandatário nem contestado a acção, interveio o Ministério Público, que contestou em sua representação.
Na contestação, e além do mais, foi invocada a falta de uma condição objectiva de procedibilidade, por não inclusão dos créditos em causa no PERSI.
Discordou o autor, em resposta, defendendo que no caso presente não havia lugar à aplicação do PERSI, uma vez que o DL 227/2012 de 25 de outubro que instituiu o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) entrou em vigor a 01.01.2013, data posterior aos incumprimentos contratuais verificados.
Realizada audiência de discussão e julgamento, com vista a indagar da factualidade controvertida, veio a ser proferida sentença, na qual se concluiu pela verificação da excepção dilatória insuprível de falta de condição objectiva de procedibilidade, prevista no artigo 18.° n.° 1, al. b) do DL n.° 227/2012, de 25 de Outubro, pelo que foi o réu absolvido da instância.
*
II – O RECURSO
Em face do decidido, o autor não se conformou e reagiu através do presente recurso de apelação, cujos fundamentos sintetizou nas seguintes conclusões:
“I- Vem o presente recurso interposto da douta sentença de fls. (…) que, absolveu “o Réu da instância” ao considerar que, “o Autor não fez prova de ter integrado o Réu no referido PERSI, tal configura uma condição objectiva de procedibilidade da presente acção, como defende o Ministério Público, impondo-se o julgamento da verificação da excepção dilatória insuprível de falta de condição objectiva de procedibilidade, prevista no artigo 18.° n.° 1, al. b) do DL n.° 227/2012, de 25 de Outubro, pelo que absolvo o Réu da presente instância declarativa, nos termos do disposto nos artigos 278.° n.° 1 al. e), 279.° e 577.º (proémio), todos do Código de Processo Civil.”
II- O Autor, ora Recorrente, não se conforma com a decisão a quo, por entender que, a prova documental produzida nos autos, impunha distinta decisão de facto e, consequentemente, distinta decisão de direito.
III- Na perspectiva do Autor, ora Recorrente, a reapreciação/reponderação da matéria de facto conduzirá a diferente conclusão quanto à procedência da presente acção.
IV- Assim, desde logo, para efeitos do disposto no artigo 640º do CPC, o Autor, ora Recorrente, não se conforma que, não tenha sido dado como provado o seguinte facto, o qual deve ser aditado aos factos provados:
Facto 16
- O saldo descoberto na conta D/O ...04 verifica-se desde 20/09/2012.
V- Porquanto, da leitura do extracto integrado n.º 11/2012, alusivo à conta de depósitos à ordem n.º ...04, junto sob o doc. 1 ao requerimento do Autor de 06/09/2022, extrai-se que aos 20/09/2012 a respectiva conta ficou a descoberto, pelo montante de €41,60, em virtude do lançamento, a débito, dos seguintes movimentos:
(iv) €11,39: Tpa – Pagamento Comissão Gestão Mensal;
(v) €40,00: Gest Conta BES Neg Tes. Comercio – 21/08/2012 a 20/09/2012;
VI- €1,60: Imposto Selo S/ Gestão de Conta
VII- E da leitura dos demais extractos ali juntos sob os docs. 2, 3 e 4 afere-se que a respectiva conta permaneceu sempre negativa e aos 20/12/2012 a gestão do saldo devedor passou, então, para a Direcção de Recuperação de Crédito; cfr. extracto ali junto como doc. 4, “passagem A Gestão Drc”, crédito €280,94.
VIII- Por seu lado, o tribunal a quo não declarou a falsidade dos expostos documentos.
IX- Ademais, o facto 11 dos factos provados deverá ter a seguinte completa redacção:
- Como contrapartida, foi acordado que o Réu pagaria ao Autor o saldo indicado no extracto de “Conta-cartão” n.º ...75, acrescidos de juros convencionados à taxa anual de 24,500%, e juros de mora à taxa de 4%, que incidiam sobre o montante remanescente em dívida, no caso de não pagamento do saldo indicado.
84- Atenta a Cláusula 7.ª sob a epígrafe “taxas de juro”, do título “Condições específicas de utilização dos cartões de crédito BES VISA para Clientes Particulares” do contrato junto ao requerimento do Autor de 04/04/2022 sob o doc. 1, pág. 8ª e as disposições conjugadas do art.º 7.º, n.ºs 1 e 2 do DL nº 344/78, de 17 de Novembro (na redacção introduzida pelo decreto-lei nº 83/86, de 06 de Maio), do aviso nº 5/88, de 15 de Setembro de 1988, publicado no Diário da República, Iª série, nº 214, de 15 de Setembro de 1988, do aviso de 17 de Março de 1989, publicado no Diário da República, Iª série, nº 65, de 18 de Março de 1989 e do art.º 1º, nº1, do DL nº 32/89.
X- Por seu lado, o Autor, ora Recorrente, não se conforma com o entendimento do tribunal a quo no sentido em que apesar da situação de incumprimento, não se provou que o banco Autor houvesse promovido a extinção da relação jurídico-contratual, nomeadamente, por via da resolução. Antes pelo contrário, já que continua a reclamar do Réu os juros vincendos contratualmente estipulados. Significa isto que, no seu entender, este é um dos casos sujeitos a PERSI, pois não houve resolução contratual ou qualquer outra forma de extinção do vínculo obrigacional.
XI- No que concerne ao saldo devedor da conta à ordem n.º ...04, a exigibilidade de juros consta de cláusula contratual, concretamente das Cláusulas 4.ª intitulada “Descoberto Autorizado“, 6.ª, intitulada “provisão insuficiente”, e 14.ª intitulada “comissões, encargos e despesas” das condições gerais de abertura de conta aplicáveis no caso.
XII- Logo, o saldo negativo gera a obrigatoriedade de pagamento de juros remuneratórios, acrescidos de juros moratórios, se o referido saldo não for regularizado no prazo que o banco credor fixar.
XIII- Ou seja, a exigibilidade dos juros, seja a título remuneratório, seja a título moratório, depende apenas da interpelação do devedor, com fixação do prazo para pagamento.
XIV- A qual ocorreu no caso em apreço; cfr. o facto 8 dos factos provados.
XV- Donde, em função da interpelação, a data relevante para efeitos de aferição da
necessidade de integração do Réu no PERSI é a data do saldo do descoberto em conta, e por via disso do incumprimento do contrato, que se verifica desde 20/09/2012; cfr. o extracto junto aos autos através do requerimento do Autor de 06/09/2022 sob o n.º 1 e o facto 16 supra a aditar aos factos provados.
XVI- Logo, portanto, há muito que a obrigação decorrente do saldo devedor se venceu.
XVII- Não havia assim lugar à integração do Réu no PERSI, na medida em que a mora resultante do incumprimento se iniciara há mais de um ano e na medida em que tal incumprimento já havia determinado que o contrato já não estava em vigor.
XVIII- Ora, o DL 227/2012 de 25 de outubro que instituiu o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), que entrou em vigor aos 01.01.2013 é posterior ao incumprimento.
XIX- O período de 30 dias, desde a data do incumprimento, há muito se havia verificado.
XX- Por isso, o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI) é inaplicável aos presentes autos.
XXI- Já a intento do saldo credor da conta crédito n.º ...75, à semelhança da situação antecedente, também no contrato de utilização do cartão de crédito se previu a exigibilidade de juros, concretamente na Cláusula 7.ª sob a epígrafe “taxas de juro”, do título “Condições específicas de utilização dos cartões de crédito BES VISA para Clientes Particulares”; cfr. doc. 1 junto ao requerimento do Autor de 04/04/2022, pág. 8a.
XXII- Sendo que, a intento da liquidação do extracto de conta-crédito, estipulou a Cláusula 6.ª sob tal epígrafe que:
“6.1 A data de vencimento dos montantes em dívida constará o extracto da conta-crédito, enviado mensalmente para a morada do Titular, no caso dos Extractos em Papel, ou
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