Acórdão nº 1579/20.6T8PVZ.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-06-08

Data de Julgamento08 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão1579/20.6T8PVZ.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo n.º 1579/20.6T8PVZ.P1
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Sumário
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Acordam no Tribunal da Relação do Porto:

I- Relatório
1- AA, de nacionalidade ..., residente na Rua ..., ... ..., Povoa do Varzim, instaurou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra, E... Inc., com sede em ..., ..., ..., ..., EUA, pedindo a condenação desta sociedade a pagar-lhe:
a) A título de indemnização por danos patrimoniais de personalidade, pela utilização indevida da sua imagem e do seu nome, a quantia de 180.000,00€, de capital, acrescida dos juros vencidos, no montante de 49.580,06€, tudo no total de 229.580,06€ e dos juros que se vencerem até integral pagamento, à taxa legal, tudo com o mais da lei;
b) E um montante nunca inferior a 5.000,00€, a título de danos não patrimoniais, acrescido, também, dos juros vencidos, no montante de 2.167,12€, tudo no total de 7 167,12€ e dos juros que se vencerem até integral pagamento, à taxa legal, tudo com o mais da lei.
Baseia este pedido, em resumo, na circunstância de ser um jogador de futebol profissional brasileiro, atualmente a jogar em Portugal, mas, devido à sua já longa carreira, tornou-se conhecido no meio do futebol.
Acontece que a Ré, que é uma empresa líder global em entretenimento digital interativo, aproveitando-se desse facto, passou a utilizar, sem a sua autorização, a sua imagem, o seu nome e as suas características pessoais e profissionais nos jogos de que é proprietária, denominados FIFA (também com as designações FIFA ...l ou FIFA ...), pelo menos nas edições 2011, 2012, 2013, 2014, 2018 e 2020; FIFA ..., pelo menos nas edições de 2010, 2011, 2012, 2013 e 2014; FIFA .... - ..., pelo menos nas edições de 2014, 2018 e 2020, e FIFA ... nas edições de 2018 e 2020.
E faz a distribuição desses jogos através de várias subsidiárias entre as quais se destaca, na Europa, a E..., sedeada em Genebra, Suiça, que é uma empresa que opera como subsidiária (subdivisão) daquela, e que assume a responsabilidade pela venda dos produtos perante todos os consumidores não residentes nos Estados Unidos da América, Canadá e Japão.
Assim, porque a sua imagem está, pelo menos desde setembro de 2009, a ser indevidamente usada em milhões de jogos difundidos em Portugal e por todo o mundo, sofreu com isso os referidos danos, que especifica e pelos quais quer ser ressarcido.
2- Contestou a Ré, refutando os aludidos pedidos, seja porque o direito invocado pelo A. está prescrito; tem licenciamento dos direitos de imagem a seu favor; o A. age em abuso de direito; e, em qualquer caso, são infundados os pedidos pelo mesmo formulados, uma vez que, em síntese, para o desenvolvimento dos seus jogos FIFA, a mesma não carecia, nem carece, da autorização do A.
3- Subsequentemente, no dia 31/03/2021, a Ré veio suscitar a incompetência absoluta dos tribunais portugueses para o conhecimento do presente litígio, uma vez que não existem fatores de conexão juridicamente relevantes com a ordem jurídica portuguesa.
Por isso mesmo, termina pedindo a sua absolvição da instância.
4- O A. respondeu pugnando pela solução contrária, dado que não reconhece fundamento legal para a procedência da referida exceção.
5- Posteriormente, depois do A. se ter pronunciado sobre as exceções deduzidas pela Ré na contestação, foi ainda admitida a entretanto requerida intervenção da sociedade, F ..., como assistente da Ré.
6- No âmbito da audiência prévia foi, então, conhecida a arguida exceção de incompetência internacional, a qual foi julgada procedente e a Ré absolvida da presente instância.
7- Inconformado com esta decisão, dela recorre o A., terminando a sua motivação de recurso com as seguintes conclusões:
“a) A decisão recorrida é, salvo o devido respeito, que aliás é muito, injusta e precipitada, tendo partido de pressupostos errados.
b) Entende o Recorrente que as suas legítimas pretensões saem manifestamente prejudicadas pela manutenção da decisão recorrida.
c) O ora Recorrente não se conforma com a sentença proferida pelo Tribunal a quo, entendendo que a mesma padece de vícios, no que à decisão proferida sobre a sua incompetência internacional, já que não restam dúvidas da competência internacional do Tribunal a quo para o julgamento do presente litígio.
d) A ré produziu e comercializou, fisicamente e online, milhões de jogos de video contendo a imagem, nome e demais características pessoais do Autor, sem o seu consentimento ou autorização e sem lhe pagar qualquer contrapartida económica.
e) Tal conduta constituiu uma apropriação da imagem do Autor, que tem um valor patrimonial, emergente do valor comercial que aquela imagem, tem no mercado.
f) O Autor – ao contrário do que a decisão recorrida refere - substanciou em factos a ocorrência de um dano, e os danos causados ao Autor (patrimoniais e não patrimoniais), por acção da ré, apenas a esta podem ser imputáveis, por ela a única autora do facto danoso (cfr. artigos 562.º, 563.º, 564, n.º 1, 565.º, 566.º n.ºs 1, 2 e 3, todos do Código Civil e ainda artigo 609.º n.º 2 do Código de Processo Civil).
g) Ao contrário do que a decisão recorrida refere, esses danos verificam-se no nosso país, porquanto os jogos são comercializados, distribuídos, jogados e a imagem, nome e demais caraterísticas do Autor são utilizadas, mundialmente, pelo que, logicamente, também em Portugal.
h) Isso mostra-se devidamente alegado nos artigos 14.º, 17.º, 101.º e 192.º, da petição inicial.
i) É, pois, absolutamente evidente que são praticados em território português os factos que integram a causa de pedir na presente acção.
j) A obrigação de reparação, no caso concreto do Autor, resulta de um uso indevido de um direito pessoalíssimo, não sendo de exigir - ao menos na componente de dano não patrimonial - a prova da alegação da existência de prejuízo ou dano, porquanto o dano é a própria utilização não autorizada e indevida da imagem. (negrito e sublinhado nossos).
k) A obrigação de reparação, in casu, decorre de um uso indevido de um direito pessoalíssimo, não sendo de exigir - ao menos na componente de dano não patrimonial – a prova da alegação da existência de prejuízo ou dano, porquanto o dano é a própria utilização não autorizada e indevida da imagem. Tal como a decisão recorrida, salvo o devido respeito, ignora ostensivamente!
l) Não podia, pois, o Tribunal a quo deixar de concluir, in casu, pela verificação do factor de conexão previsto na alínea b) do artigo do artigo 62.º do Código de Processo Civil: ter sido praticado em território português o facto que serve de causa de pedir na ação ou algum dos factos que a integram (à causa de pedir).
m) Neste sentido, e no que respeita a situações análogas já analisadas pelo TJUE quanto a esta matéria salientam-se os acórdãos Shevill e eDate Advertising GmbH, cujos textos, para efeitos de exposição, aqui se dão por reproduzidos e ainda a doutrina já fixada no douto acórdão do STJ de
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