Acórdão nº 1441/13.9BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 20-04-2023

Data de Julgamento20 Abril 2023
Ano2023
Número Acordão1441/13.9BELRS
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
I. RELATÓRIO

A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio recorrer da sentença proferida a 26.09.2020, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por S… P… 6 FI (doravante Recorrida ou Impugnante, entretanto incorporada por S…, FI), que teve por objeto o deferimento parcial da reclamação graciosa que, por seu turno, versou sobre a retenção na fonte de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC), do exercício de 2010.

Nas suas alegações, concluiu nos seguintes termos:

“a) A douta sentença a quo entendeu que tendo sido pagos à Impugnante, na altura do vencimento do cupão, os rendimentos devidos nessa altura, ou seja, os juros devidos por força de tal vencimento, em virtude de a Impugnante ser a beneficiária efetiva dos valores mobiliários em causa e por não resultar do regime previsto no Decreto-Lei nº 193/2005, de 7/11 qualquer limitação em termos de isenção, resulta que esta abrange todos os rendimentos devidos no momento do vencimento do cupão.

b) Com efeito, consistindo os rendimentos em causa em juros, entendeu a douta sentença a quo, que a distinção estabelecida pela AT entre os juros atinentes ao período de detenção dos títulos – relativamente aos quais o titular beneficiaria de isenção – e aqueles que correspondem a um período antecedente a essa titularidade, os quais já não beneficiariam daquela detenção, não encontra no regime jurídico em causa previsão legal.

c) Sustentou então a douta sentença a quo que no momento do vencimento do título (cupão), foram pagos à impugnante os juros que deveriam ser pagos naquele momento, independentemente da data de aquisição dos títulos.

d) Por conseguinte, entendeu a douta sentença a quo não decorrer do regime jurídico em causa que a isenção de tributação não abranja a totalidade dos juros vencidos, por ali não se prever uma isenção proporcional à titularidade efetiva do valor mobiliário.

e) Destarte, assentou a douta sentença a quo que na data do vencimento do cupão, era a Impugnante a titular efetiva dos rendimentos, pelo que tinha o direito à isenção da tributação incidente sobre a totalidade dos juros percebidos.

f) Dissente esta RFP da decisão e respetiva fundamentação em que se baseou a douta sentença a quo, porquanto, em face ao regime legal aplicável, verifica-se que, contrariamente ao ali decidido, ficam apenas abrangidos pela isenção de tributação os juros que o titular percebeu relativamente ao período em que deteve os títulos de dívida pública, in casu, o valor correspondente a € 58.574,47.

g) Com efeito, o que está em causa no Regime Especial de Tributação dos Rendimentos de Valores Mobiliários Representativos de Dívida, aprovado pelo Decreto-Lei nº 193/2005, de 7/11 não é uma isenção objetiva (do rendimento em si), mas sim uma isenção subjetiva (atendendo às características particulares dos beneficiários dos rendimentos), pelo que só o beneficiário efetivo do rendimento pode beneficiar da referida isenção.

h) Ora, o beneficiário efetivo será o que detém a titularidade dos valores mobiliários representativos da dívida, razão pela qual, os juros são contabilizados dia a dia e pagos no momento da transmissão dos títulos ao cedente, sendo ele o beneficiário efetivo dos rendimentos relativamente ao período em que foi o titular dos valores mobiliários.

i) Assim, no momento da maturação dos valores mobiliários ou do vencimento de juros, o titular que recebe os rendimentos só é o beneficiário efetivo dos rendimentos relativos ao período em que deteve os valores mobiliários, recebendo os restantes rendimentos por conta dos anteriores detentores dos valores mobiliários, uma vez que já pagou esses rendimentos aos mesmos, incluído no preço de aquisição dos valores mobiliários.

j) Nestes termos, a entidade requerente apenas é beneficiária efetiva dos rendimentos relativos ao período de tempo compreendido entre a data de aquisição dos títulos e o respetivo vencimento dos juros, e, como tal só deve ter direito ao reembolso do imposto relativo aos rendimentos correspondentes a esse lapso temporal.

k) Razão pela qual, e levando em linha de conta que, de acordo com o disposto no Regime Especial de Tributação dos Rendimentos de Valores Mobiliários Representativos de Dívida aprovado pelo Decreto-Lei nº 193/2005, de 7/11, a isenção de tributação de tais rendimentos apenas beneficia o juro corrido, ou seja, o requerente apenas pode beneficiar da isenção de tributação relativamente aos juros que recebeu correspondentes ao período de tempo em que deteve os títulos de dívida, o que, no caso em apreço corresponde ao reembolso no valor de € 58.574,47.

l) É certo que o imposto retido na fonte na data do pagamento dos juros no presente caso incidiu sobre a totalidade dos juros pagos à entidade requerente (ora impugnante), apesar da mesma ter sido detentora dos valores mobiliários entre 2010.07.06 e 2010.10.15, razão pela qual a mesma requereu a restituição da totalidade do imposto.

m) Acontece, porém que o regime criado pelo Decreto-Lei nº 193/2005, de 7/11, prevê que o reembolso ou a liquidação do imposto vá ocorrendo sempre que há uma transmissão dos títulos, levando-se em linha de conta o estatuto dos intervenientes da transação (artigo 11º), o qual é eficaz se os intervenientes tiverem estatuto diferente, mas se acontecer que os valores mobiliários sejam alienados por um beneficiário do regime de isenção a outro beneficiário do mesmo regime, não haverá nem retenção, nem reembolso.

n) O mesmo poderá ocorrer no caso de aplicação do disposto no artigo 17º daquele regime legal, uma vez que a Central de Liquidação Internacional se compromete a não efetuar serviços de registo a entidades não isentas.

o) Ora, numa situação destas, se não for efetuada a prova do estatuto de entidade isenta pelo titular dos valores mobiliários no momento do pagamento dos juros há lugar à retenção do imposto sobre a totalidade dos rendimentos, acabando por ser este último titular a suportar a totalidade do imposto apesar dos anteriores detentores dos valores também terem beneficiado do regime de isenção.

p) Nestes casos, até seria legítima a pretensão do titular dos valores mobiliários de que lhe seja restituída a totalidade do imposto retido na fonte, uma vez que não era só ele que beneficiava do estatuto de entidade isenta, mas também os anteriores detentores dos valores mobiliários.

q) Mas, para tanto, tornar-se-ia indispensável que fosse efetuada a prova de que durante todo o período que decorreu desde a emissão dos valores mobiliários ou desde o último vencimento de rendimentos e a data em que ocorre a retenção na fonte, os titulares dos valores mobiliários foram sempre sujeitos passivos beneficiários do regime de isenção.

r) Porém, não se afigurando ter sido efetuada esta prova nos autos, isto é, de que os anteriores detentores dos valores mobiliários geradores do rendimento também beneficiavam do regime de isenção, mostra-se legalmente correta a decisão da AT de autorizar apenas o reembolso do montante de € 58.574,47, correspondente ao período de detenção dos títulos por parte da ora Impugnante.

s) Pelo exposto, a douta sentença ao decidir que a Impugnante tem direito à isenção de tributação prevista no Regime Especial sobre a totalidade do valor dos juros recebidos em resultado da detenção da titularidade dos títulos representativos de dívida aqui em causa violou as normas previstas nos artigos 2.º, 4.º, 5.°e 11.º do Regime Especial de Tributação dos Rendimentos de Valores Mobiliários Representativos de Dívida.

t) Com efeito, é forçoso concluir, salvo melhor entendimento, que a sentença recorrida enferma de vício de violação de lei, devendo ser a mesma revogada e ser decidido pela legalidade da decisão de deferimento parcial da reclamação graciosa apresentada do ato de retenção na fonte de imposto sobre o rendimento das pessoas coletivas (IRC), do ano de 2010, que incidiu sobre juros auferidos em território português.

Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso, deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que declare a impugnação improcedente, quanto à matéria aqui discutida.

PORÉM V. EX.AS DECIDINDO FARÃO A COSTUMADA JUSTIÇA”.

A Recorrida apresentou contra-alegações, nas quais formulou as seguintes conclusões:

1.ª A douta sentença recorrida julgou procedente a impugnação judicial deduzida, considerando que, tendo sido pagos ao Recorrido, enquanto beneficiária efetiva dos valores mobiliários em causa, os juros devidos no momento do vencimento, e não resultando do regime legal aprovado pelo Decreto-Lei n.º 193/2005, de 7 de novembro, qualquer limitação respeitante ao período de tempo durante o qual o Recorrido foi titular dos aludidos valores mobiliários, este deverá ser reembolsado da totalidade do valor dos juros devidos e pagos no momento do vencimento;

2.ª Inconformada, a Fazenda Pública recorreu daquela sentença, alegando, em suma, que a sentença recorrida assenta a sua fundamentação numa errónea valoração da matéria de facto e incorre em vício de violação de lei, alegando que, contrariamente ao que resulta da sentença recorrida, só é beneficiário efetivo dos rendimentos nos termos do Decreto-Lei n.º 193/2005, de 7 de novembro, o titular que aufere os rendimentos respeitantes ao período em que deteve os valores mobiliários;

3.ª Não assiste, com o devido respeito, qualquer razão à Ilustre Representante da Fazenda Pública, devendo manter-se a sentença recorrida;

4.ª Em primeiro lugar, refira-se que a Ilustre Representante da Fazenda Pública, apesar de considerar que a sentença recorrida “(…) enferma de erro de julgamento resultante da incorreta valoração da factualidade assente (…)” (cf. artigo 1.º das alegações de recurso), em momento algum se insurge contra a decisão da matéria de facto;

5.ª Pelo que, tendo o presente recurso por fundamento exclusivo a matéria de direito, o Tribunal...

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