Acórdão nº 1433/21.4T8MAI.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 21-06-2022

Data de Julgamento21 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão1433/21.4T8MAI.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. nº 1433/21.4T8MAI.P1
Comarca do Porto – Juízo Local Cível da Maia – Juiz 4
Apelação
Recorrentes: AA e BB
Recorridos: “R..., Lda.” e “F..., S.A.”
Relator: Eduardo Rodrigues Pires
Adjuntos: Desembargadores João Ramos Lopes e Rui Moreira

Acordam na secção cível do Tribunal da Relação do Porto:

RELATÓRIO
Os autores AA e BB, casados, residentes na Rua ..., ... intentaram a presente ação declarativa comum contra os réus “F..., S.A.”, com sede na Rua ..., ..., Maia e “R..., Lda.”, com sede na Rua ..., ..., Maia pedindo que:
- seja reconhecida a resolução do contrato de empreitada celebrado entre os autores e a 1ª ré, por incumprimento contratual imputável às 1ª e 2ª rés;
- se condene, solidariamente, as 1ª e 2ª rés no pagamento da quantia de 16.300,00€ aos autores, a título de indemnização por mora, calculada nos termos do nº 5 da cláusula 6ª do contrato de empreitada celebrado entre os autores e a 1ª ré;
- se condene, solidariamente, as 1ª e 2ª rés no pagamento da quantia de 26.645,37€ aos autores, a título de indemnização/restituição pelas obras/trabalhos pagos pelos autores mas não realizados pelas 1ª e 2ª rés, bem como nos devidos juros moratórios até integral e efetivo pagamento.
A ré “F..., S.A.”, devidamente citada, veio apresentar contestação onde, para além do mais, suscitou a exceção dilatória de incompetência absoluta do tribunal, por entender existir violação de convenção de arbitragem, uma vez que a presente ação foi instaurada em tribunal estadual, devendo sê-lo no tribunal arbitral conforme convencionado entre as partes no art. 13.º do contrato celebrado e que é o objeto do litígio aqui em apreciação.
Pugna assim pela sua absolvição da instância.
Os autores, em articulado de resposta, pronunciaram-se sobre esta exceção, tendo arguido a nulidade da cláusula respetiva, visto que nunca foram esclarecidos quanto ao tribunal arbitral nem quanto à legislação vigente nesse âmbito.
Efetuou-se audiência prévia.
Seguidamente proferiu-se decisão que julgou procedente a invocada exceção dilatória de incompetência absoluta do tribunal e, em consequência, absolveu as rés da instância.
Os autores, inconformados com o decidido, interpuseram recurso tendo finalizado as suas alegações com as seguintes conclusões:
- Do Objeto e Propósito do Recurso:
I. Destina-se o presente recurso a impugnar a decisão proferida pelo Tribunal de Primeira Instância, in totum, que judiciou pela verificação de incompetência absoluta em virtude da preterição de tribunal arbitral e pela absolvição das Rés da instância, sendo que, mal andou a Mma. Juiz a quo na decisão proferida, mormente na subsunção jurídica dos factos resultantes dos autos, estando os Apelantes convictos de que Vossas Excelências, subsumindo a factualidade resultante dos autos, no mais alto e ponderado critério, não deixarão de revogar a decisão recorrida e de a substituir por uma que judicie pela competência do Tribunal a quo em virtude da inexistência de preterição de Tribunal Arbitral e consequente prossecução dos autos.
Contemplemos,
- Primórdios:
II. Na pretérita data de 05-04-2021, os aqui Autores/Apelantes propuseram acção declarativa de condenação contra as aqui Apeladas, alegando o incumprimento do contrato de empreitada celebrado e abandono de obra, peticionando, em suma, o reconhecimento da resolução do contrato de empreitada celebrado entre os Autores e a 1.ª Ré, a condenação solidária da 1.ª e 2.ª Rés no pagamento da quantia de €16.300,00 aos Autores, a título de indemnização pela mora; a condenação solidária da 1.ª e 2.ª Rés no pagamento da quantia de €26.645,37 aos Autores, a título de indemnização/restituição pelas obras/trabalhos pagos pelos Autores mas não realizados pelas 1ª e 2ª Rés, bem como nos devidos juros moratórios até integral e efetivo pagamento.
III. Após, deduziram as Rés, separadamente, contestação, tendo a 1.ª Ré excecionado a preterição de tribunal arbitral, em virtude da cláusula 13.ª do contrato de empreitada que estipulava que “I- As divergências sobre interpretação, validade e execução do contrato serão decididas por um Tribunal Arbitral, nos termos da legislação vigente.”.
IV. Nessa sequência, e não obstante a oposição fundamentada dos Autores, foi proferida a decisão a quo que determinou que “De todo o exposto resulta que o pretendido afastamento da convenção de arbitragem não é manifesto, implicando isso que seja o tribunal arbitral a pronunciar-se, primeiro, sobre a sua própria competência. * Questão que se impõe é a de saber se deveriam os autos prosseguir em relação à 2.ª Ré “R... Lda”, posto que a mesma não invocou a excepção em análise e não é subscritora do contrato. Entendemos que não. De facto, afigura-se-nos que a relação material controvertida entre as partes (AA e 1.ª Ré e 2.ª Ré), traduz uma relação triangular pelo que a apreciação do pedido formulado contra a 2.ª Ré – e nos moldes em que os autores o descrevem na petição inicial - se mostra afectada por se apresentar numa relação de prejudicialidade pela relação de insindicabilidade da ligação apontada entre a 1.ª Ré e 2.ª Ré, podendo suscitar-se a extensão da convenção de arbitragem à parte não signatária do contrato. Nessa conformidade e em face de todo o exposto, ao abrigo das disposições conjugadas dos artigos 96.º, b), 99.º, 278.º, n.º 1 al e) e 577, al. a) do Código de Processo Civil, e art. 5.º, n.º 1 e 18.º, n.º 1 da LAV julgo procedente a excepção dilatória de incompetência deste tribunal, absolvendo-se as Rés da respectiva instância.”, com a qual não concordamos, porquanto encerra em si mesma uma decisão processualmente injusta, não se afigurando consentânea com o enquadramento jurídico em vigor.
Vejamos,
- Das Normas Jurídicas violadas:
- Da errada interpretação e aplicação do disposto nos artigos 5.º n.º 1 e 18.º n.º 1 da Lei da Arbitragem Voluntária (doravante LAV), 96.º b), 99.º, 278.º, n.º 1 al e) e 577, al. a) do CPC e da violação do artigo 236.º n.º 1 do CC:
V. Na decisão a quo considerou o Tribunal verificar-se preterição de tribunal arbitral, porquanto havia sido estipulado entre as partes que as questões relacionadas com a interpretação, validade e execução do contrato seriam submetidas e dirimidas no Tribunal Arbitral, não lhe assistindo qualquer razão.
VI. Devidamente analisada a cláusula constante do artigo 13.º do contrato de empreitada, e atendendo ao critério de interpretação constante do artigo 236.º n.º 1 do CC, assalta à saciedade que a convocação do Tribunal Arbitral se daria em caso de divergências relativas à interpretação de tais cláusulas, à sua validade, e à execução dos termos do contrato, isto é, a concretização das suas cláusulas na vigência do mesmo.
VII. Devidamente compulsada a petição inicial, foi alegado pelos ali Autores que havia sido remetida comunicação de resolução do contrato, culminando a ação com pedido de reconhecimento de resolução do contrato por incumprimento das Apeladas, pelo que não estamos perante questões relacionadas com a execução do contrato, pois que o mesmo já não subsiste.
VIII. Dissecada a “causa petendi” e os pedidos formulados na petição inicial, resulta que a questão em litígio se prende com os efeitos da resolução do contrato, e não com questões relacionadas com a execução do mesmo, não se subsumindo tal factualidade à cláusula ínsita no artigo 13.º do contrato, mormente às “(…) divergências sobre interpretação, validade e execução do contrato (…)”. - Veja-se, sobre esta matéria, o entendimento verberado pelo Tribunal da Relação de Guimarães, no Acórdão de 09-07-2015, nos termos do qual “III. Para se determinar a natureza da questão em litígio “há que atender aos articulados, em particular à “causa petendi “e pedido formulados na petição inicial apresentada em juízo, pois é por aquela que se vai aferir a posição a tomar” (Ac. Supremo Tribunal de Justiça de 10/3/08, in www.dgsi.pt).”.
IX. Assim sendo, o objeto do litígio não se insere na relação especificada na cláusula compromissória, sendo a mesma manifestamente inaplicável no caso sub judice. – vide a sapiência propalada pelo Supremo Tribunal de Justiça no Acórdão de 12-11-2019, pelo relator Pedro de Lima Gonçalves, “(…) os tribunais judiciais só devem rejeitar a exceção dilatória de preterição de tribunal arbitral, deduzida por uma das partes, determinando o prosseguimento do processo perante a jurisdição estadual, quando seja manifesto e incontroverso que a convenção/cláusula compromissória invocada é inválida, ineficaz ou inexequível ou que o litígio, de forma ostensiva, se não situa no respetivo âmbito de aplicação.”.
X. Pelo que não se aplica, in casu, o disposto nas normas jurídicas ínsitas nos artigos 5.º n.º 1 e 18.º n.º 1 da LAV, tendo sido erradamente interpretadas e aplicadas, devendo ter sido interpretadas no sentido da inaplicabilidade, in casu, da cláusula compromissória, de modo manifesto, atendendo a que a questão decidenda não se enquadra na “execução” do contrato,
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