Acórdão nº 137/22.5 BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 24-11-2022

Data de Julgamento24 Novembro 2022
Ano2022
Número Acordão137/22.5 BESNT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os juízes que constituem a 2.ª Subseção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul:


I - Relatório

A sociedade T…, Unipessoal, Lda., melhor identificada nos autos, não se conformando com a sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, que julgou totalmente improcedente reclamação deduzida contra o despacho do Diretor de Finanças Adjunto de Lisboa de 2021.10.06, que lhe indeferiu o pedido de dispensa de prestação de garantia, apresentado no âmbito do plano de pagamento em prestações nº 3654.2021.57225, associado ao processo de execução fiscal n.º 3654202001244388, dela veio recorrer para este Tribunal Central Administrativo Sul.

Nas alegações de recurso apresentadas, a Recorrente, formulou as seguintes conclusões:

1. O presente recurso vem interposto da Sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra, proferida no âmbito do Processo n.º 137/22.5BESNT, a qual julgou improcedente a Reclamação deduzida pela ora Recorrente, pedindo a anulação do despacho do Diretor de Finanças Adjunto de Lisboa, que indeferiu o seu pedido de dispensa de prestação de garantia, no âmbito do plano de pagamento em prestações melhor id. nos respetivos autos.

2. Afigura-se à Recorrente que a Sentença aqui recorrida, ao decidir pela improcedência da Reclamação apresentada, enfermará de error in iudicando na medida em que procedeu a uma errada aplicação do Direito, devendo, pois, o Tribunal Central Administrativo Sul intervir em sede de Apelação reapreciar e alterar o conteúdo da mesma em conformidade.

3. Como se sabe, a execução fiscal visa a cobrança coerciva das dívidas elencadas no art.º 148.º do CPPT. É, pois, um processo de natureza judicial, como decorre expressamente do n.º 1 do art.º 103.º da LGT, sem prejuízo de ser instaurada e se desenvolver perante órgãos da AT, que nela praticam os actos de natureza não jurisdicional que couberem, tudo nos termos dos artigos 10.º, n.º 1, alínea f), 149.º, 150.º e 151.º todos do CPPT.

4. Entre tais actos incluem-se os concernentes à prestação de garantia, quando a ela houver lugar, e às respetivas vicissitudes: apreciação da suficiência, dispensa, reforço, redução e levantamento.

5. É, pelo menos, o que se extrai das disposições dos artigos 169.º, 170.º, 183.º, 195.º, 199.º n.ºs 8, 9 e 10, todos do CPPT.

6. Em síntese, tudo quanto respeite à garantia prestada no âmbito da execução fiscal, quer tenha em vista a sua suspensão, quer o pagamento em prestações da dívida exequenda, é da competência do órgão da execução fiscal.

7. O pedido de dispensa de garantia deve, pois, ser apresentado ao órgão da execução fiscal, nos termos do n.º 1 do art.º 170.º do CPPT – que regulamenta o pedido de dispensa de prestação de garantia previsto no n.º 4 do art.º 52.º da LGT –, pois é a esse órgão que está legalmente atribuída a competência exclusiva para decidir sobre esse pedido.

8. Isto, sem prejuízo de o tribunal tributário competente poder ser chamado, mediante solicitação de qualquer interessado, a sindicar a legalidade da atuação da Administração no âmbito desse pedido (cf. artigos 151.º, n.º 1, e 286.º do CPPT).
9. Estamos, pois, perante um procedimento administrativo tributário enxertado no processo de execução fiscal, sendo a respetiva decisão um verdadeiro acto administrativo.

10. Esse procedimento da iniciativa do executado é um procedimento formal, que deve obedecer às regras legais; designadamente, deve seguir a forma escrita (cf. n.º 3 do art.º 54.º da LGT), deve indicar o órgão a que se dirige, identificar o requerente, com indicação do nome e domicílio [cf. art.º 102.º, n.º 1, alíneas a) e b), do Código do Procedimento Administrativo (CPA)], expor os fundamentos de facto e de direito em que se baseia o pedido e instruir o requerimento com a prova documental pertinente (cf. n.º 3 do art.º 170.º do CPPT).

11. Como expressamente referido em sede de Reclamação, não se pode deixar de sublinhar que o requerimento apresentado pela sociedade Executada, ora Recorrente não foi efetuado por um profissional do foro (vulgo mandatário judicial), antes tendo sido efetuado e assinado pelos respetivos gerentes da ora Recorrente.

12. Ora, em face dessa circunstância afigura-se que maxime o princípio da colaboração plasmado no art.º 59.º da LGT, impunha-se à AT, por efeito da densificação daquele princípio maxime ex vi art.º 7.º do CPC, enquanto órgão de execução fiscal, o dever de auxílio da parte na remoção de dificuldades ao exercício dos seus direitos ou faculdades ou ao cumprimento dos seus ónus ou deveres processuais.

13. E se o dever de colaboração deve ser cumprido quando a parte esteja representada por advogado, não pode deixar de se entender que, não estando a parte patrocinada por mandatário judicial, deve aumentar a diligência da AT, enquanto no cumprimento desse dever de assistência ao executado.

14. Por outro lado, a decisão de imediato indeferimento com base na falta de junção de prova, mas a qual havia sido efetuada noutros processos de execução fiscal anteriores e que, pois, era do perfeito conhecimento da AT, em especial tratando-se de factos negativos, sempre se revela, no caso, uma decisão absolutamente desproporcionada. Tanto mais que quanto às exigências do requerimento de dispensa de prestação de garantia, o artigo 170.º, n.º 3 do CPPT limita-se a referir de forma vaga que o pedido deve conter a “fundamentação de facto e de direito” e ser “instruído com a prova documental necessária.

15. Donde, não se vislumbra quais os interesses que possam justificar a inexistência sequer de um convite para a Executada, ora Recorrente, vir juntar meios de prova adicionais, em curto espaço de tempo, que permitissem aferir da bondade de quanto por si requerido.

16. Afigura-se, pois, à Recorrente que devendo sempre a justiça material prevalecer sobre a justiça formal, e sa-bendo desde logo que a executada não se encontrava patrocinada por mandatário judicial, caberia à AT convidar a Recorrente suprir a omissão da prova dos factos que alegou, e assim se obviaria a que uma omissão de natureza meramente procedimental conduzisse de imediato ao que veio a constituir uma denegação quase automática e cega do requerimento da ora Recorrente, quando por sinal a própria AT conhecia de uma vário conjunto de processos pelos quais a Recorrente havia já prestado várias garantias e ainda que a ora Recorrente estava e está a ser objeto de um outro conjunto variado de execuções fiscais.

17. O dever de colaboração - que deve mediar as relações entre os sujeitos do procedimento – não foi, pois, cumprido pela AT, sendo que a desproporção entre a irregularidade cometida pela ora Recorrente (não juntar os documentos obre os factos por si alegados) e a consequência que lhe é associada pela AT é manifesta, não se revelando adequada nem, pois, proporcional.

18. Atenta a redação do n.º 3 do artigo 170.º do CPPT, de onde não resulta expressamente quais as consequências do incumprimento ou cumprimento defeituoso do ónus de instrução do incidente de dispensa de garantia, tal resposta só poderá ser, pois, negativa; e para mais quando a executada não vem representada por mandatário judicial. Impondo-se ao órgão de execução, diligências no sentido do suprimento da irregularidade, ora “convidando” a executada requerente a instruir o pedido ou a vir esclarecer melhor as razões por que alegou a insuficiência económica ou a ausência de mais garantias que pudesse prestar.

19. A tal obriga a constatação de que, na compatibilidade entre o princípio da autorresponsabilidade das partes, concretizado no ónus de instrução do requerimento, com o princípio da colaboração, tem preponderância este último, dada a circunstância de a sociedade executada nem se encontrar sequer representada por advogado, poder apresentar prova de factos negativos de que lhe são exigidos, em tão curto espaço de tempo.

20. Donde, aplicando-se supletivamente as regras do processo civil, maxime o princípio da cooperação plasmado no art.º 7.º, n.º 4 do referido diploma, chega-se à conclusão que o órgão de execução fiscal não poderia ficar indiferente à ausência de patrocínio judicial da executada ora Recorrente e avançar desde logo para a aplicação das regras do ónus da prova, impondo-se, antes, uma atitude pro actione que, antes de mais, implicaria desde logo averiguar toda a prova documental que já estava em poder da AT e que imporia desde logo uma diferente decisão ou, no limite, o pedido de apresentação de prova adicional.

21. Acresce que sendo o despacho de indeferimento de pedido de isenção de prestação de garantia não precedido de audição prévia, afigura-se que o princípio do inquisitório e o já supracitado dever de colaboração...

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