Acórdão nº 132/23.7 BELLE de Tribunal Central Administrativo Sul, 07-06-2023

Data de Julgamento07 Junho 2023
Ano2023
Número Acordão132/23.7 BELLE
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Sul:

A…, devidamente identificada como requerente nos autos de outros processos cautelares, que instaurou contra o Município de Olhão inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal de Loulé em 5.3.2023 que rejeitou liminarmente o requerimento inicial por manifesta falta de fundamento da pretensão formulada e dos pressupostos da acção principal.

Nas respectivas alegações a Recorrentes formulou as conclusões que seguidamente se reproduzem:
«1 - Considera o tribunal a quo que a Requerente nada alegou a propósito do periculum in mora.
2 - Sucede que, se não for tomada uma medida antecipatória de suspensão de eficácia de acto administrativo – que se requer na presente providência cautelar –, a tomada de posse com vista à demolição do alpendre será levada a cabo pela Câmara Municipal, e quando for decidida a impugnação da respectiva decisão administrativa o alpendre não existirá.
3 - Pelo que, desde logo, a própria demolição coerciva representa, por si só, um perigo decorrente da mora na obtenção de uma decisão definitiva.
4 - Além disso, na sua petição inicial a Recorrente alega ainda que:
a) “necessita de tal edificação por não possuir mais nenhuma que possa cumprir as suas funções”;
b) “a tomada de posse com vista à demolição, no cumprimento do decidido no acto que se pretende sindicar, irá causar um dano irreparável.”
c) “tais edificações são utilizadas, como apoio à actividade agrícola e pecuária que a Autora exerce
d) tal alpendre sempre serviu de apoio aos animais que as pessoas levavam consigo e que ali deixavam à sombra quando iam cuidar as terras.”
5 - Em face do exposto, encontram-se alegados factos suficientes para justificar o fundado receio da constituição de uma situação de facto, encontrando-se, assim, preenchidos os fundamentos legais para a pretensão formulada.
Sem prescindir, e caso assim não se entenda,
6 - Nos termos do[sic] alínea g), do n.º 3, e do n.º 4[sic] do artigo 114.º do CPTA, na falta da indicação dos fundamentos do pedido da providência cautelar, o tribunal deve notificar o interessado para suprir a falta no prazo de cinco dias.
7 - Assim, ao invés de rejeitar liminarmente o requerimento inicial, o tribunal a quo devia ter convidado a Requerente para, no prazo de 5 dias, suprir os fundamentos em falta, nomeadamente concretizando os fundamentos para a existência de periculum in mora.
8 - Uma vez que a omissão do tribunal influi directamente na decisão causa, o referido despacho padece de nulidade, nos termos do n.º 1 do artigo 195.º do Código de Processo Civil, aplicável por força do artigo 1.º do CPTA – nulidade essa que se requer seja declarada.
Sempre sem prescindir,
9 - Se o tribunal a quo entende que a Requerente não deu cumprimento à obrigação prevista na alínea e) do n.º 2[sic] do artigo 114.º do CPTA, mais uma vez devia o tribunal a quo ter convidado a Requerente a suprir essa deficiência, ao abrigo do n.º 4[sic] do mesmo artigo, notificando-a para indicar a acção de que o processo depende ou irá depender.
10 - Uma vez que a omissão do tribunal influi directamente na decisão causa, pelo mesmo motivo padece de nulidade o referido despacho.
Ainda sem prescindir, e caso assim não seja entendido,
11 - O tribunal a quo discorda da qualificação jurídica dada pela Requerente aos vícios alegados, considerando que tratar-se-ão de meras anulabilidades, e não de nulidades, e concluindo, por isso, que a acção a intentar para impugnação de acto anulável seria intempestiva.
12 - Ora, salvo o devido respeito, no âmbito de procedimento cautelar, a manifesta falta de fundamento da acção deve ser analisada à luz da configuração jurídica apresentada pela Requerente.
13 - Se a Requerente invoca a nulidade do acto administrativo impugnável, a impugnação do mesmo não está sujeita a qualquer prazo, nos termos do n.º 1 do artigo 58.º do CPTA, pelo que a acção principal ainda será tempestiva.
14 - Acresce que a Requerente alega diversos fundamentos para a nulidade do acto (crime de dano, de abuso de poder e de prevaricação, e usurpação de poderes) cuja verificação e prova apenas poderão ser realizados numa acção com um formalismo mais rigoroso como o da acção principal.
15 - Ainda que assim não se entenda, deveria o tribunal a quo pelo menos ter dado oportunidade à Requerente para comprovar, em sede de produção de prova, os fundamentos de nulidade que invoca.
16 - Não tendo sido dada oportunidade à Requerente de provar os fundamentos de nulidade do acto que invocou no seu requerimento inicial, não podia o tribunal a quo ter proferido despacho de inferimento liminar.
17 - Ao decidir como decidiu, o tribunal a quo violou o artigo 114.º e o artigo 117.º do CPTA.»
Requerendo,
«Termos em que,
a) Deve o presente recurso ser julgado procedente revogando-se a douta decisão recorrida e substituindo-a por outra que aceite o requerimento inicial apresentado pela Requerente, ordenando o prosseguimento dos autos, nomeadamente com a citação da Requerida;
Sem prescindir, e caso assim não seja entendido,
b) Deve o presente recurso ser julgado procedente, considerando nula a decisão recorrida, por violação do n.º 4[sic] do artigo 114.º do CPTA, e substituindo-a por outra que convide a Requerente a suprir as deficiências do requerimento inicial, no prazo de 5 dias, indicando a acção de que o processo depende ou irá depender, e especificando os fundamentos do pedido, nomeadamente no que diz respeito ao periculum in mora.».

Por despacho o juiz a quo admitiu o recurso e determinou a sua subida.

O Ministério Público, junto deste Tribunal, notificado nos termos e para efeitos do disposto nos artigos 146º e 147°, do CPTA, emitiu parecer no sentido da procedência parcial do recurso, referindo, designadamente, que não foi ordenada a citação do requerido para os termos do recurso e da causa.

Citado para a causa e notificado para o efeito, o Recorrido apresentou contra-alegações, com as seguintes conclusões:
«1. A Recorrida intentou providência cautelar de suspensão de eficácia de ato administrativo sem indicar de forma clara e inequívoca do ato cuja suspensão pretende;
2. De acordo com a intenção da recorrente o ato cuja suspensão se pretende será o despacho proferido pelo Sr. Presidente de Câmara que ordenou a demolição proferido em 20/06/2022 no qual e conforme notificado à ora Recorrida o mesmo deu Ordem de demolição de construção ilegal ao abrigo do nº 1 do artigo 106º do Decreto-Lei nº 555/99, de 16 de dezembro, na redação atual [de ora em diante RJUE]
3. A suprarreferida notificação foi recebida pela Recorrente em 07.07.2022.
4. A referida notificação veio no seguimento da notificação para audiência prévia datada de 31.11.2020, no qual a Recorrente fora notificada da intenção da Autarquia em ordenar a demolição dos elementos construídos e/ou implantados, e reposição do prédio na situação em que se encontrava antes da execução das obras tendo sido atribuído prazo para a Recorrente se pronunciar sobre tal intenção;
5. Ultrapassado o prazo para apresentação de Audiência Prévia em 17.12.2020 a ora Recorrente apenas referiu que “1. O prédio em causa já se encontra na família da Expoente desde, pelo menos há 20 anos. 2. Desde, pelo menos, há 20 anos que o alpendre em causa existe ali. 3. Sempre com a mesma área e configuração. 4. Tais edificações são utilizadas, como apoio à atividade agrícola e pecuniária que a Expoente exerce. 5. Tal alpendre sempre serviço de apoio aos animais que as pessoas levavam consigo e que ali deixavam à sombra quando iam cuidar as terras. 6. A arguida vai iniciar a legalização de todas as construções em causa 7. O qua não aconteceu antes por desconhecer a ilegalidade.” [negrito e sublinhado nosso]
6. Em 12.08.2019 a Recorrente foi notificada para apresentar projeto referente à edificação do prédio rústico 105 BT a fim de averiguar a possibilidade da sua legalização – o que nunca fez.
7. Em 02.03.2023, inconformada com a decisão, a Recorrente intententou[sic] Procedimento Cautelar de Suspensão do Acto Administrativo, ou seja, a suspensão da Ordem de demolição proferida e notificada em 30.06.2022 e recebida pela Recorrente em 09.07.2022 (Registo CTT RH956843687PT).
8. O procedimento intentado pela Recorrentenão[sic] identifica o acto que pretende ver suspenso nem tão pouco demonstra os Requisitos necessários para que a referida ação proceda;
9. O Procedimento Cautelar apresentado pela Recorrente limita-se a tecer conclusões e relatar os diversos inputs administrativos da Recorrida sem nunca demonstrar (porque também não o fez) a possibilidade de legalizar as operações urbanísticas existentes no seu prédio ou que exista perigo que não possa ser suprido na eventualidade da Recorrida substituir a Recorrente na reposição da legalidade;
10. O articulado da Providência Cautelar apresentado pela Requerente é composto apenas por meras conclusões, conceitos jurídicos ou por não ter conhecimento dos mesmos, com a exceção dos artigos 1º a 12º.
11. A Recorrida acompanha a Rejeição Liminar proferida porquanto a Providencia Cautelar padece de inúmeras deficiências por aplicação alínea d) e f) do nº 2 do artigo 116.° do CPTA.
12. A Recorrente não demonstra o fundado receio de uma situação de facto consumado ou da produção de prejuízos de difícil reparação, ou seja, nada é referido quanto ao periculum in mora, pressuposto cumulativo para a adoptação de providências cautelares (n° 1 do artigo 120. ° do CPTA).
13. A Recorrente não acatou pela demonstração do periculum in mora.
14. A Recorrente não demonstrou que se dedicasse a qualquer atividade agrícola que iria ficar irreversivelmente prejudicada com a reposição da legalidade que se impõe.
15. A Recorrente, ao abrigo do art.º 106 do RJUE foi...

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