Acórdão nº 1315/21.0T8VCT-H.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 2023-02-02

Ano2023
Número Acordão1315/21.0T8VCT-H.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE GUIMARÃES,
* * *
1. RELATÓRIO

1.1. Da Decisão Impugnada

Por apenso ao processo de insolvência, no âmbito do qual AA e mulher, BB foram declarados insolventes por sentença proferida em 24/05/2021, CC instaurou contra os Insolventes e contra a Massa Insolvente, acção de despejo, pedindo que: «a) Ser decretada a resolução do contrato de arrendamento urbano celebrado entre as partes, ao abrigo do disposto no artigo 1083º, nº 2, al. d) e nº 3 do Código Civil; b) Serem os Réus condenados a proceder à desocupação do imóvel locado, devendo o mesmo ser entregue ao Autor, livre de pessoas e bens; c) Serem os Réus condenados a pagar ao Autor as rendas já vencidas e não pagas, no montante de €725,25; d) Serem os Réus condenados no pagamento das rendas vincendas na pendência da ação até efetiva entrega do locado, ao abrigo do disposto no artigo 557º, nº 2 do Código de Processo Civil, acrescidas de juros de mora, à taxa legal em vigor, desde a data inicial do incumprimento até ao integral e efetivo cumprimento; e) Serem os Réus condenados no pagamento ao Autor, a título de indemnização, do valor de 20% do montante em dívida, conforme disposto no artigo 1041º, nº 1 ex vi 1048º, nº 1, ambos do Código Civil, que atualmente se fixa em €145,05».

Fundamentou a sua pretensão essencialmente no seguinte: «no ano de 1971, o Autor celebrou um contrato de arrendamento comercial com DD, tendo por objeto a fração correspondente ao ... do prédio urbano sito na Rua ..., concelho ...; a 31/01/1991, o estabelecimento comercial afeto à atividade de restauração e bebida, um café, foi trespassado aos Réus; os Réus não têm utilizado o locado por uma temporada que dura há mais de 1 ano e 6 meses; desde março de 2020 que os Réus não efetuam o pagamento referente à contrapartida pelo arrendamento do imóvel; quando a quantia em dívida já ascendia a € 3.142,75, o Réu realizou a 25/03/2021 uma transferência bancária para a conta do Autor, no montante de € 2.357,16; os Réus deixaram de proceder ao pagamento da renda desde o mês de abril do corrente ano; assiste-lhe o direito à resolução».

A Ré Massa Insolvente contestou, pugnando que «I. Seja declarada a exceção dilatória invocada, designadamente a exceção da ilegitimidade ativa do Autor, e em consequência, ser a Ré,
Massa Insolvente absolvida da instância; II. Seja declarada a exceção dilatória invocada, designadamente a exceção de inutilidade superveniente da lide, e em consequência, ser a ser a Ré, Massa Insolvente absolvida da instância; III. Seja declarada a exceção dilatória inominada, e em consequência seja a Ré, Massa Insolvente de absolvida da instância; Em caso de improcedência dos pedidos formulados em I. a III., IV. Deve a presente ação ser julgada improcedente, por não provada, e em consequência ser a Ré, Massa Insolvente absolvida da instância absolvidos de todos os pedidos».
Os Réus Insolventes contestaram, pugnando que «1. a exceção dilatória da ilegitimidade do Autor seja julgada procedente, por provada, e, em consequência serem os Réus absolvidos da instância, ou 2. Caso se entenda que, o Autor é parte legitima no presente pleito, seja a presente acção julgada improcedente, por não provada e, em consequência serem os Réus absolvidos dos
pedidos formulados pelo Autor, ou 3. Caso se entenda que se verificam in casu algum dos fundamentos para a resolução do contrato celebrado entre a herança indivisa e os Réus, seja o pedido reconvencional deduzido pelos Réus julgado procedente, por provado, e em consequência: A) ser a herança aberta por óbito da malograda EE condenada a pagar aos Réus/Reconvintes a quantia de € 84 738,80 valor esse correspondente ao valor actualizado das obras de conservação e beneficiação realizadas por estes últimos na fracção que os mesmos ocupam e que integra o acervo patrimonial da referida herança, valor esse acrescido de juros de mora desde a notificação da presente contestação até efectivo e integral pagamento; B) Ser reconhecido aos ora reconvintes o direito de retenção sobre a fracção identificada em 1 da petição inicial até ao pagamento do montante referido na alínea anterior».
Fundamentaram o pedido reconvencional essencialmente no seguinte: «assiste-lhes o direito a serem indemnizados das quantias despendidas nas obras que executaram no locado por forma a que o mesmo pudesse funcionar como estabelecimento comercial destinado à restauração; os Réus solicitaram autorização para realizar obras de conservação do imóvel por forma a que o mesmo pudesse continuar a funcionar como estabelecimento comercial destinado à restauração e bebidas, tendo obtido do Autor e da sua falecida mulher o consentimento para a sua realização; a realização destas obra importou a quantia de € 58.493,53; as obras não podem ser levantadas do locado sem prejuízo de deterioração do mesmo e devem ser qualificadas como necessárias; o valor deve ser atualizado de acordo com o índice de preços do consumidor, e actualmente cifra-se em € 84.738,80; deve ser reconhecido aos Réus o direito de retenção sobre o locado, até efectivo e integral pagamento da indemnização».
Na data de 31/01/2022, o Tribunal a quo proferiu despacho saneador, no qual, para além do mais, se julgou improcedente a excepção dilatória inominada inidoneidade e/ou impropriedade do meio processual, se julgou improcedente a invocada nulidade por ineptidão da petição inicial e/ou inutilidade superveniente da lide, se julgou improcedente a arguida excepção de ilegitimidade activa, por preterição do litisconsórcio necessário, e se admitiu a reconvenção deduzida pelos Réus Insolventes.

Na data de 01/03/2022, o Tribunal a quo proferiu o seguinte despacho (na parte que aqui releva):
“Admite-se a realização de uma perícia singular, mais concretamente com vista a apurar a existência e extensão de obras ou trabalhos levados a cabo no locado – cfr. arts. 467.º, 478.º e 482.º do Cód. Proc. Civil.
Objecto da perícia: saber se e quais as obras ou trabalhos que foram levadas a cabo no locado, designadamente:
- Foram realizados os trabalhos e aplicados os materiais descritos no art.º 57.º do articulado de contestação apresentado pelos RR. AA e BB?
- Qual o valor dos materiais aplicados a preços praticados no ano de 1999?
- Qual o valor do imóvel antes das obras ali realizadas?
- Qual o valor actual do imóvel?
(…)”

Na data de 19/04/2022, o Perito nomeado juntou aos autos relatório pericial, com o seguinte teor (na parte que aqui releva):
RESPOSTAS: (…)
a) Isolar a placa com tela.
Resposta: (…)
De qualquer modo, de acordo com o visível nas fotografias nº2 e nº3, a ter sido aplicada a tela, em qualquer momento, ela não estará já a ter qualquer eficiência, pois as infiltrações de água são abundantes e distribuídas por todo o teto abrangido pela placa.
Por tal, independentemente do seu custo à data de execução, o valor atual será nulo.
b) Colocar pavimento em granito em toda a extensão do ... piso
Resposta: (…)
Trata-se efetivamente de um granito em peças quadradas, de nível de qualidade médio, aplicado numa área de cerca de 90 m2, no 1º caso, e de um mosaico cerâmico, de qualidade económica, na área de cerca de 11 m2.
O seu fornecimento e aplicação, em 1999, terá sido da ordem dos 15 €1m2 para o granito, e de cerca de 10 €1m2 para o mosaico cerâmico.
O que, para as áreas indicadas, resulta num valor de:
90 m2 x € 15 + 11 m2 x € 10 = € 1 460
Valor que, atendendo ao desgaste sofrido, terá, à data atual, um valor inferior em cerca de 30%, pelo que o seu valor será de:
€ 1 460 x 0,70 = € 1 022
c) Aplicar tijoleira na cozinha.
Resposta:
A resposta foi considerada no âmbito do conjunto da alínea anterior.
d) Remodelar o wc existente, com aplicação de novos cerâmicos e loiças sanitárias.
Resposta: (…)
Sendo que tal conjunto engloba uma área de intervenção de cerca de 18 m2, o que implicou construção de paredes divisórias, revestimento de paredes, de pavimentos e de tetas, para além das peças sanitárias, distribuição de água, drenagem de águas residuais e iluminação.
E para determinação dos seus custos, uma vez tratar-se de um trabalho abrangente, parece mais sensato aplicar um valor unitário global, considerando a manutenção das paredes exteriores, pavimento e estrutura do teto, e executando de novo as tarefas conforme descrição inicial.
Sendo que os valores de mercado para tal, reportados a 1999, seriam da ordem dos 300 €/m2.
O que, para os 18 m2 considerados, resulta num global de:
18 m2 x € 300 = € 5 400
Ora, estando a maior parte das áreas já não regulamentares, designadamente no que toca a instalações para pessoas com mobilidade condicionada, e sendo o desgaste deste tipo de equipamentos superior à média da construção em geral, entende-se dever aplicar uma desvalorização da ordem dos 40%, o que resulta num valor atual de:
€ 5 400 x 0,60 = € 3 240
e) Colocar rodapé em granito.
Resposta:
O referido rodapé consiste num "friso" de remate do revestimento de pavimento com as paredes perimetrais. Que, de acordo com o projeto licenciado, corresponde a uma extensão de cerca de 55 metros.
E que, ao preço unitário de 4 €Iml, corresponde a:
55 m x € 4 = € 220,
Cujo valor atual sofrerá uma desvalorização idêntica à do revestimento, portanto de 30%.
A que corresponderá o valor de:
€ 220 x 0,70 = € 154
f) Picar e regularizar o pavimento dos 2 pisos que compunham o estabelecimento comercial
Resposta: (…)
No entanto, sempre será de admitir que tal tenha tido um custo da ordem dos 51m2.
O que, para a área total do estabelecimento, de cerca de 200 m2 (100 m2 por piso) corresponderá a:
200 m2 x € 5 = € 1 000
g) Picar e rebocar paredes de armazém, corredor de acesso ao armazém e wc
Resposta:
Conforme se pode ver pelas fotografias nº7 e nº8, tais trabalhos estão completamente degradados, pelo que, independentemente dos custos que tenham tido,...

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