Acórdão nº 1287/20.8T8VFR-D.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-06-27

Ano2023
Número Acordão1287/20.8T8VFR-D.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Apelação
Processo n.º 1287/20.8T8VFR-D.P1
Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo de Família e Menores de Santa Maria da Feira - Juiz 1
Recorrente – AA
Recorrido – BB
Relatora – Anabela Dias da Silva
Adjuntos – Desemb. Ana Lucinda Cabral
Desemb. Rodrigues Pires

Acordam no Tribunal da Relação do Porto (1.ªsecção cível)

I – Nos autos de inventário para separação de meações em consequência de divórcio que AA intentou no Tribunal Judicial da Comarca de Aveiro – Juízo de Família e Menores de Santa Maria da Feira contra BB e onde este desempenha as funções de cabeça de casal.
O cabeça de casal apresentou nos autos a relação de bens e dela reclamou a requerente, alegando em síntese, que:
- O valor atribuído ao veículo de marca Mercedes relacionado na verba n.º 1 é baixo, que se cifrará em €18.000,00.
- existe omissão de relação de bens móveis que eram parte integrante do recheio da casa de morada de família descritos no ponto II-5 do articulado de reclamação que aqui se dá por integralmente reproduzido, com o valor global de €7.000,00;
- existe omissão de relação de crédito da requerente sobre o cabeça de casal no montante de €18.500,00 resultante da liquidação pelo património comum da quantia de €37.500,00 de tornas, com vista a aquisição por parte do cabeça de casal, na pendência do casamento, de um imóvel antes pertença da herança da qual o cabeça-de-casal era herdeiro, valor que foi aceite para ser relacionado como património comum em sede de tentativa de conciliação;
- existe omissão de relação do PPR património comum do casal no montante de €33.702,93 e de €11.000,00.
- e ainda existe omissão de relação do saldo das contas bancárias que eram património comum do casal, as quais chegaram a perfazer mais de €150.000,00;
- por fim, invocou sonegação de bens por parte do cabeça-de-casal e que o cabeça-de-casal auferia duas pensões no montante global de €2.495,00 que deviam também ser relacionadas a data do divórcio.
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O cabeça-de-casal exerceu o contraditório, impugnando o alegado pela requerente e mais defendeu que esta, nos últimos seis meses do ano de , apoderou-se do montante de €13.000,00 e no dia 6.02.2020 procedeu à transferência do montante de €20.000,00 de uma conta bancária do cabeça-de-casal para uma conta bancária sua e ainda que, após a propositura da ação de divórcio, emprestou à requerente a quantia de €1.500,00.
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A reclamante veio ainda dizer, em síntese, que no início de 2020 deu entrada em juízo de ação de divórcio, da qual veio a desistir, sendo que entre o início do ano de 2020 e a entrada em juízo da ação de divórcio a qual os presentes autos estão apensos o requerido dissipou o saldo das contas bancárias do casal e, reconheceu que o requerido lhe emprestou o montante de €1.500,00, para devolver no acerto da partilha por divórcio.
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Foi realizada audiência prévia.
Foram pedidas as informações bancárias requeridas pela reclamante.
Foi produzida a prova indicada pelas partes.

Por fim, foi proferida decisão de onde consta: “Em face do exposto, decide-se;
- O veículo automóvel descrito na verba n.º 1 deve ser relacionado pelo valor de €18.000,00;
- Deve passar a constar da relação de bens, no ativo: - uma mobília de quarto (composta por cómoda, cama, mesinha de cabeceira e espelho), dois espelhos de quarto de banho, um móvel de hall de entrada; dois candeeiros; uma televisão, um móvel de televisão, um conjunto de dois sofás, um fogão, um frigorífico, uma máquina de lavar louça, uma máquina de lavar roupa, uma cristaleira e um aparador.
- Deve passar a constar da relação de bens, no ativo, em verbas distintas, os seguintes montantes:
- €1.379,35 na posse do cabeça-de-casal, referente ao saldo de conta bancária da titularidade do cabeça-de-casal;
- €463,00 na posse da reclamante referente ao saldo da conta bancária da titularidade da reclamante;
- €112,00 na posse da reclamante referente ao saldo da conta bancária da titularidade da reclamante;
- €18.500,00 referente aos saldos das contas bancárias da titularidade da reclamante.
- Reconhece-se como dívida de compensação entre ex-cônjuges o montante de €15.450,00 (a favor da reclamante) e o montante de €1.500,00 (a favor da cabeça-de-casal).
- Não se declara a sonegação de bens (…)”

Inconformada com tal decisão, dela veio a requerente ecorrer de apelação pedindo a sua revogação com as legais consequências.
A apelante juntou aos autos as suas alegações onde formulam as seguintes conclusões:
A. Decidiu o Tribunal a quo que a requerente era titular e proprietária do montante de €18.500,00 (dezoito mil e quinhentos euros) que se encontravam depositados na conta bancária n.º ..., domiciliada junto do Banco 1....
B. Entendendo que, por tal motivo, deve esse valor ser relacionado como bem comum do casal à data de 19.05.2020.
C. Porém, da prova carreada para os autos, não foi possível aferir que a recorrente era a titular exclusiva da conta bancária, nem tão pouco o modo de movimentação da mesma.
D. Tendo em audiência realizada em 04.10.2022 sido referido pela recorrente e pela sua filha CC que o dinheiro existente nessa conta bancária era da propriedade desta última.
E. Mas, face à junção da cópia dos 2 (dois) cheques, nos montantes de €3.000,00 (três mil euros) e €6.000,00 (seis mil) euros por parte do cabeça-de-casal, onde consta o número da conta bancária ..., dúvidas não restam que tal valor era da filha da recorrente, de seu nome CC.
F. Tendo ainda sido demonstrado em audiência de julgamento que a conta bancária onde se encontrava depositado esse dinheiro, da propriedade da filha da recorrente, de seu nome CC, também tinha como titular a outra filha da recorrente, de nome DD.
G. Contudo, não foi aferida se a conta bancária n.º ..., domiciliada junto do Banco 1..., era conjunta ou solidária, nem tão pouco a sua forma de movimentação.
H. Assim sendo, considera-se que foi incorretamente julgado e dado como provado o ponto 14) da sentença recorrida, uma vez que o Tribunal a quo não podia presumir que a titularidade e o valor existente nessa conta bancária eram exclusivos da recorrente.
I. O que redunda na violação do disposto no art.º 1082.º do Código de Processo Civil, uma vez que o inventário tem como função a partilha dos bens comuns do casal.
J. Caso assim não se entenda, e face à prova produzida, então sempre seria de presumir que apenas uma parte do dinheiro existente na conta bancária era da recorrente, face à a presunção do art.º 516.º do Código Civil.
K. Isto porque, da prova existente nos autos e realizada em audiência no passado dia 04.10.2022, ficou demonstrado que existia mais do que um titular na conta bancária n.º ..., domiciliada junto do Banco 1....
L. O que resultaria que apenas €9.250,00 (nove mil, duzentos e cinquenta euros) poderiam ser relacionados como bem comum do casal, que corresponde à metade da recorrente, obtida por aplicação do art.º 516.º do Código Civil ao montante de €18.500,00 (dezoito mil e quinhentos euros), existente na conta bancária à data de 19.05.2020.
M. Resultado a que se chegaria também se aplicadas as regras relativas à compropriedade, previstas no art.º 1403.º do Código Civil.
N- Devendo, assim, ser alterado o ponto 14) da sentença recorrida, o qual deverá ser dado como não provado, em particular no que se refere à conta bancária n.º ..., nomeadamente sendo retirada a referência a essa conta bancária, bem como o segmento “e a terceira com saldo a 19 de maio de 2020 de €18.500,00 e a 10 de maio de 2020 de 439,61, 352,46 e €18.500,00.”.
O- Devendo ser proferida decisão diversa daquela que foi proferida pelo Tribunal a quo, retirando-se da relação de bens comuns do casal, à data da entrada em juízo da ação de divórcio, o valor de €18.500,00 (dezoito mil e quinhentos euros), existentes na conta bancária n.º ..., domiciliada junto do Banco 1..., uma vez que se trata de um bem que é da propriedade da filha da recorrente, de seu nome CC, não devendo o mesmo ser relacionado na relação de bens a partilhar entre o casal.
P. Caso assim não se entenda, então sempre deverá ser deduzido pelo menos o valor de €9.250,00 (nove mil, duzentos e cinquenta euros), por aplicação do disposto no art.º 516.º do Código Civil, uma vez que a conta bancária n.º ..., domiciliada junto do Banco 1..., possui, pelo menos, dois titulares.

Não há contra-alegações.

II – Da 1.ª instância chegam-nos assentes os seguintes factos:
1- AA e BB contraíram casamento civil, sem convenção antenupcial, no dia 23 de novembro de 1999.
2- O casamento foi dissolvido por divórcio decretado em 7 de julho de 2021.
3- A ação de divórcio deu entrada em juízo no dia 19 de maio de 2020.
4- Na diligência de tentativa de conciliação realizada em 19 de junho de 2020 na ação de divórcio ficou a constar na ata o seguinte: «As partes estão, ainda, de acordo em relacionar como património comum, sujeito a futura partilha, os seguintes bens: -Veículo marca Mercedes, atualmente na posse do cônjuge-marido; -Veículo marca Volkswagen, modelo ..., atualmente na posse da cônjuge-mulher; - De entre o recheio da casa de
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