Acórdão nº 12866/19.6T8PRT-C.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2023-02-09

Ano2023
Número Acordão12866/19.6T8PRT-C.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Proc. n.º 12866/19.6T8PRT-C.P1 – 3ª Secção (Apelação) - 1475

Execução Sumária – Tribunal Judicial da Comarca do Porto – Juízo de Execução do Porto – Juiz 7



I.
AA instaurou execução sumária, para pagamento de quantia certa, contra BB e CC.
Foi concedido aos executados o benefício do apoio judiciário na modalidade de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
A Agente de Execução (AE) juntou aos autos nota discriminativa de honorários e despesas, na qual indicou:
- A quantia de €3.578,48, devida ao exequente;
- A quantia de €1.248,09, de honorários e despesas da AE;
- A quantia de €4.825,09, depositada nos autos, proveniente de penhoras de salários e da venda de direitos;
- A quantia de €1,47, devida ainda pelos executados.
Os executados reclamaram da referida nota, alegando, em síntese, que, por beneficiarem de apoio judiciário na modalidade de dispensa do pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo, não lhes podem ser cobradas quantias a título de taxa de justiça, honorários e despesas com a AE, que terão de ser suportadas pelo exequente, a quem serão reembolsadas pelo IGFEJ.
O Ministério Público promoveu o deferimento parcial da reclamação.
De seguida, foi proferido despacho em que se decidiu:
- Deferir parcialmente a reclamação da nota discriminativa de despesas e honorários da AE na qual deverão ser eliminadas a rúbrica das custas de parte e quantias a suportar pelos executados;
- Determinar que a AE notifique o exequente para este proceder ao pagamento dessa nota de despesas e honorários, dado que os executados não são responsáveis pelo pagamento dos honorários e despesas da AE por beneficiarem de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo;
- Devolver o remanescente do montante penhorado aos executados, face à cobrança coerciva da quantia exequenda e juros respectivos em causa na execução.

O exequente recorreu daquele despacho formulando, em síntese, as seguintes

CONCLUSÕES
1ª – O regime regra constante do artigo 541.º do CPC não comporta a excepção à previsão factual aí contida no caso de o executado beneficiar de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos legais.
2ª – Também no artigo 45.º, n.º 2, da Portaria 282/13, de 29.08 não se excepciona o caso do executado beneficiar de apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos legais.
3ª – Do ponto de vista da ponderação da justiça material e dos princípios fundamentais do processo civil, a realização da Justiça implica que, numa execução em que é realizado o crédito exequendo pelo produto da venda dos bens penhorados aos executados, as custas, os honorários e as despesas suportadas pelo agente de execução saiam precípuas do produto da venda, ainda que os executados beneficiem de apoio judiciário na modalidade de dispensa total do pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo.
4ª – A consideração da prevalência da regra da precipuidade prevista no artigo 541.º do CPC, quando ocorre a venda de bens penhorados e o seu produto é suficiente para o pagamento do crédito exequendo e das custas da execução, incluindo honorários e despesas do agente de execução, em nada contende com o acesso ao direito e aos tribunais e com as regras do apoio judiciário, uma vez que, quando um processo executivo atinge a fase da venda dos bens penhorados, já o executado teve todas as oportunidades de se defender anteriormente, através de oposição à execução e/ou à penhora, de pronúncia sobre a modalidade da venda e do valor dos bens a vender, pelo que o acesso ao direito e aos tribunais já foi previamente cumprido através do recurso ao benefício do apoio judiciário, muitas vezes com nomeação de patrono.
5ª – A regra da precipuidade do artigo 541.º do CPC, em caso de existência de produto da venda, dá efectivo cumprimento à regra e princípio essencial das obrigações, do artigo 601.º do CC, que dispõe que pelo cumprimento das obrigações respondem todos os bens do devedor que sejam susceptíveis de penhora, assim se cumprindo a efectiva justiça material. O contrário, ou seja, desonerar o devedor dos custos a que deu causa, quando existe produto da venda, acaba por se traduz na atribuição de um prémio injustificado ao inadimplente.
6ª – No caso destes autos, os executados, através do regime do apoio judiciário, tiveram oportunidade de exercer todos os direitos que a lei confere a qualquer executado, deduzindo embargos e sujeitando os seus fundamentos a uma decisão de mérito, como efectivamente se verificou, sem qualquer restrição de acesso à justiça, pelo que não é materialmente justo que os mesmos sejam ainda beneficiados, no final do processo, com a sua não sujeição à regra do artigo 541.º do CPC, o que, no limite, consubstanciaria a imputação de um encargo injustificado ao exequente.
7ª – Existindo, como existe, produto da venda dos bens penhorados, isentar os executados dessa regra da precipuidade – que é aplicável a qualquer executado que litigue sem o benefício do apoio judiciário mas desde que exista produto da venda dos bens penhorados – constituiria uma verdadeira discriminação positiva que aquela norma não prevê nem ressalva.
8ª – Quer o diploma que regula as custas processuais quer o diploma relativo ao acesso ao direito e aos tribunais estavam já em vigor quando foi aprovado o actual CPC, não tendo o legislador dado uma redacção tal à norma do artigo 541.º desse Diploma, que permita dela extrair-se que da sua previsão ficam excluídos os executados que sejam beneficiários do apoio judiciário na modalidade de dispensa de pagamento de taxa de justiça e demais encargos com o processo. Se o legislador assim o quisesse fazer teria seguramente, no texto da norma, feito a menção expressa dessa excepção, tal como
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