Acórdão nº 1264/21.1T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-05-25

Ano2023
Número Acordão1264/21.1T8TMR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]

I. Relatório
Na presente ação declarativa emergente de contrato individual de trabalho, sob a forma de processo comum, que AA intentou contra “Transportes BB, S.A.” e “CC, S.A.”, foi prolatada sentença com o seguinte dispositivo:
«4.1. Pelo exposto, decido julgar a presente ação parcialmente procedente e a reconvenção totalmente procedente, e, operando a compensação de créditos, condenar as rés Transportes BB, S.A., e CC, S.A., a pagarem ao autor AA a quantia total de € 1.673, acrescida de juros de mora à taxa legal desde a data do vencimento de cada prestação até integral pagamento.
4.2. Absolvo as rés do demais peticionado pelo autor.
4.3. Pese embora o desencontro das partes, não vislumbro nos autos indícios seguros da invocada má fé em qualquer das formas legalmente sancionadas, visto que as diferenças entre as várias versões também resultam em parte do próprio litígio entre ambas e do contexto em que foram apresentadas.
4.4. Condeno ainda o autor e as rés a pagarem as custas da ação, na proporção do respetivo decaimento. As custas da reconvenção são a suportar pelo autor.
4.5. Notifique.».

Não se conformando com o decidido, veio o Autor interpor recurso para esta Relação, extraindo das suas alegações, as seguintes conclusões:
«a. O presente recurso restringe-se à matéria de facto e de direito da douta sentença do Tribunal a Quo que: (1) não considerou justificado o despedimento do Autor como sendo um despedimento com justa causa imputável ao empregador; (2) Não considerou a obrigatoriedade do pagamento da indemnização prevista no Art.º 396.º do código do trabalho pela rescisão contratual com justa causa; (3) Não considerou os créditos laborais relativamente ao trabalho suplementar realizado em dias úteis pelo Autor. (4) Não considerou a integração nas férias e subsídio de férias da média recebida a título de ajudas de custo. (5) Não considerou o pagamento da totalidade da formação profissional reclamada pelo Autor; (6) Deu provimento ao valor pedido a título reconvencional da alegada falta de aviso prévio (em oposição à rescisão com justa causa imputada à Entidade Empregadora).
Sobre a rescisão contratual com justa causa
b. Não foi realizada prova suplementar em sede de audiência de julgamento relativamente a esta matéria, cingindo-se a mesma aos articulados e aos documentos.
c. O Tribunal a Quo decidiu não dar provimento ao pedido de condenação das Rés, por motivo divergente daquele que se encontrava alegado nem na petição inicial, nem na carta pelo Recorrente às Recorridas.
d. De acordo com a cópia da carta de rescisão contratual com justa causa, enviada pelo Autor à Ré, a rescisão prendeu-se pelo facto de – cito: “Esta decisão prende-se pelo facto de após a manifestação de desagrado (dele, e de alguns colegas) relativamente às condições laborais em geral, e aos créditos que este(s) têm a receber à muito da empresa, e, V.ª Exas. em forma de represálias terem alterado unilateralmente as funções que aquele vinha a desempenhar desde sempre na empresa (transporte internacional), e com esta alteração, o M/ Constituinte teve uma perca de rendimentos que se traduz em cerca de € 500,00 (quinhentos euros) mensais. Tudo como aliás se pode facilmente comprovar pelos recibos de vencimento que se poderão juntar em sede judicial, se para tanto se fizer necessário.
e. Não obstante tal alteração unilateral e ilícita, que acarreta sérios prejuízos patrimoniais para o meu constituinte, e não se contentando com tal, V.ª Exas. têm encetado um clima de afastamento, fazendo com que este se sinta humilhado, ou inferiorizado perante os demais colegas, o que se traduz num crime previsto como de assédio laboral.” Tudo conforme documento 7 junto com a Petição Inicial.
f. Ou seja, foram 3 os motivos que levaram o Autor à rescisão do contrato com justa causa, a saber (1) pelo facto de existirem créditos laborais que foram reclamados diversas vezes; (2) porque quando o Autor reclamou esses créditos, além de não ser atendido, foi vítima de represálias; (3) Porque essas represálias se traduziram na perca suplementar de € 500,00 mensais; tornando insustentável a manutenção da relação laboral.
g. O Tribunal a Quo fundamenta a decisão de não reconhecimento de justa causa, por factos totalmente divergentes dos que constam da carta a que ele mesmo faz referência, ou seja: cito “Ora, é precisamente na comunicação do trabalhador que se notam as dificuldades na apreciação da invocada justa causa, pois a redação é muitíssimo vaga e incerta. De exato apenas foi indicado um valor: € 53.849,78. O autor mostrou-se capaz de indicar um valor preciso, mas, estranhamente, já não a forma como foi calculado… Depois há a invocação vaga de diferenças retributivas em falta, incluindo as já notadas diuturnidades.
Realmente reconhece-se a existência dessas diferenças retributivas relativas ao cálculo das diuturnidades e da cláusula 61.ª, do atual C.C.T., mas considerando:
1) A sua natureza acessória em face da retribuição base; 2) O seu valor relativamente reduzido em face do total da massa salarial recebida pelo autor; 3) O facto de se reportarem a pagamentos dilatados no tempo; e de, 4) No momento, da rescisão a empregadora estar a proceder ao pagamento dessas rúbricas; Entende-se que tais diferenças de retribuição não comprometiam – como não comprometeram longamente – a manutenção do vínculo laboral, nem consubstanciaram uma lesão grave dos interesses do trabalhador, em termos de fundamentarem a rescisão do contrato e o pagamento da reclamada indemnização.” – Página 13 da sentença Recorrida, parágrafos 2, 3 e 4.
h. Os fundamentos para a rescisão contratual não foram os € 53.849,78 de créditos laborais, (pois estes traduziram-se nos créditos peticionados na ação), mas sim, (1) pelo facto de existirem créditos laborais que foram reclamados diversas vezes – a saber diuturnidades e cláusula 61.ª corretamente pagas; (2) porque quando o Autor reclamou esses créditos, além de não ser atendido, foi vítima de represálias; (3) Porque essas represálias se traduziram na perca suplementar de € 500,00 mensais; tornando insustentável a manutenção da relação laboral.
i. O Recorrente reclamou diversas o pagamento de diuturnidades, e as implicações que as mesmas tinham para a sua vida pessoal e financeira, e a Recorrida, não só não pagou as diuturnidades em falta, como não atualizou as mesmas, repercutindo-se estas na cláusula 61.ª que é calculada com base na percentagem de 48% sobre o salário base + diuturnidades + complemento salarial.
j. O Venerando Tribunal da Relação de Lisboa pronunciou-se relativamente à suficiência para a resolução do contrato com justa causa, o facto de durante muitos o Empregador recusar a pagar diuturnidades, dizendo que “Numa situação de não pagamento de diuturnidades, durante 12 anos consecutivos, presume-se a existência de justa causa e o trabalhador pode resolver o contrato, bastando prova do incumprimento continuado” Acórdão do TRL, datado de 23/04/2008.
k. O Tribunal à quo decidiu de forma contrária à Jurisprudência, quando diz “Entende-se que tais diferenças de retribuição não comprometiam – como não comprometeram longamente – a manutenção do vínculo laboral, nem consubstanciaram uma lesão grave dos interesses do trabalhador, em termos de fundamentarem a rescisão do contrato e o pagamento da reclamada indemnização”.
l. Acrescenta ainda o citado Acórdão do TRL “1. Tendo o trabalhador alegado e provado os factos constitutivos do direito às diuturnidades reclamadas, cabia ao empregador o ónus de provar o pagamento dessas prestações pecuniárias.(...) 6. Para que um trabalhador possa resolver o seu contrato de trabalho com justa causa e com direito a indemnização é necessário que a conduta da entidade empregadora configure um comportamento culposo que pela sua gravidade e consequências torne imediata e praticamente impossível a subsistência da relação de trabalho. (...) 11. Numa situação de não pagamento de diuturnidades, durante 12 anos consecutivos, presume-se a existência de justa causa e o trabalhador pode resolver contrato, bastando a prova do incumprimento continuado. 12. Nesta situação de carácter continuado e de efeitos duradouros, que se agrava com o decurso do tempo, o prazo caducidade não se inicia a partir da falta de pagamento de qualquer uma das referidas diuturnidades, mas sim a partir da data da cessação dessa situação de incumprimento continuado ou então a partir do momento em que os efeitos dessa falta, no contexto da relação laboral, assumem tal gravidade que a subsistência do contrato de trabalho se torna impossível, ou seja, se torna intolerável para o trabalhador, perante esses factos e as suas nefastas consequências, a manutenção da relação de trabalho.” - Tribunal da Relação de Lisboa, Acórdão de 23 de abril de 2008, processo 961/2008-4.
m. Além do Tribunal da Relação de Lisboa, também esse Venerando Tribunal da Relação de Évora se pronunciou recentemente sobre este assunto, dizendo que “III – Existe justa causa na resolução do contrato de trabalho pelo trabalhador quando esta se fundamenta no não pagamento mensal, durante os anos em que a relação laboral persistiu, na íntegra ou parcialmente, das diuturnidades e dos montantes previstos na cláusula 74.ª, n.º 7, do CCT aplicável. IV – A perpetuação no tempo de um comportamento culposo, de caráter continuado, por parte da entidade patronal, não diminui a sua culpa, antes sim, a agrava.” Tribunal da Relação de Évora, Acórdão de 12 de maio de 2022, processo 869/19.5T8TMR.
n. As diuturnidades não só fazem parte da sua retribuição, como são atualizadas a cada 3 anos de contrato, somando-se uma nova diuturnidade que é paga 14 meses por ano. Além de que in casu se repercutem nas restantes prestações de carácter pecuniário, influenciando por exemplo a cláusula 61.ª.
o. Foi dada razão ao
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