Acórdão nº 12590/19.0T8LSB.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-12-19

Ano2023
Número Acordão12590/19.0T8LSB.L1-7
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 7.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

A. Relatório
A.A. Identificação das partes e indicação do objeto do litígio
FGDP instaurou a presente ação declarativa, com processo comum, contra Companhia de Seguros, S.A., pedindo a condenação da ré no pagamento das quantias:
“a. €1.856,06 (…), a título de danos patrimoniais sofridos pelo autor em consequência do acidente a que reportam os presentes autos;
b. €2.819,04 (…), a título de perdas salariais referentes ao período de ITA sofrido pelo autor entre 18/12/2017 e 12/02/2018;
c. €334.348,56 (…), a título de perda de chance, por referência aos prejuízos salariais que o autor sofrerá em consequência da impossibilidade de exercer a sua profissão de cozinheiro de primeira;
d. €62.104,93 (…), a título de indemnização pela IPP – incapacidade permanente parcial de que o autor ficou a padecer;
e. €50.000,00 (…) a título de danos não patrimoniais sofridos em consequência do acidente ocorrido a 9 de julho de 2015”.
Para tanto, alegou que foi vítima de um acidente de viação causado por pelo condutor de uma viatura segurada pela ré.
Citada a ré, ofereceu esta a sua contestação, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Por sentença final de mérito, o tribunal a quo julgou a ação parcialmente procedente, decidindo:
A) (…) condenar a ré a pagar ao autor a quantia de 99.424,54 Euros (120.000,00€ - 20.575,46€), a título de danos não patrimoniais pelo mesmo sofridos em consequência do acidente dos autos e correspondente às dores pelo mesmo sofridas nessa sequência e dano biológico.
B) (…) condenar a ré a pagar ao autor a quantia de 150,00 Euros, a título de danos patrimoniais pelo mesmo sofridos.
C) Condenar a ré a pagar ao autor juros à taxa legal sucessivamente vigente para os créditos dos não comerciantes sobre a quantia referida em A), a contar do trânsito em julgado da decisão nestes autos proferida e, sobre a quantia aludida em B), a contar da citação e até integral pagamento, à mesma taxa legal.
D) No mais, julgar improcedente, por não provada, a ação e absolver a ré do demais contra a mesma peticionado.
Inconformado, o autor apelou desta decisão, concluindo, no essencial:
PRIMEIRO. Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida pelo Juiz 10 do Juízo Central Cível de Lisboa do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa, dividindo-se nos seguintes temas: a. da subtração, à indemnização fixada a título de dano biológico e danos não patrimoniais, das quantias pagas pela ré ora recorrida ao autor ora recorrente a título de adiantamento por conta da indemnização final; b. da improcedência do pedido de condenação da ré no pagamento do montante de €2.819,04 (…) a título de perdas salariais sofridas entre 18.12.2017 e 12.02.2018; c. da improcedência do pedido de condenação da ré no pagamento, ao autor, da quantia de €334.348,56 (…) a título de perda de chance face ao prejuízo salarial que sofrerá por força de não poder continuar a sua atividade profissional de cozinheiro. (…)
TERCEIRO. Entendeu o Tribunal a quo (…) condenar a ré ora recorrida a pagar ao autor a quantia de €60.000,00 (…) a título de danos não patrimoniais, acrescida de indemnização a título de dano biológico e/ou IPP fixada no valor de €60.000,00 (…).
QUARTO. Contudo, errou o Tribunal a quo ao subtrair a tal montante, o valor de €20.575,46 (…), uma vez que esta quantia havia sido paga pela ré ora recorrida ao autor ora recorrente, a título de indemnização pelas despesas suportadas pelo autor na sequência do acidente – despesas médicas, medicamentosas e de transporte – bem como pelos prejuízos decorrentes da incapacidade temporária para o trabalho sofrida pelo autor, única e exclusivamente resultante das lesões a que reportam o acidente dos presentes autos. (…)
NONO. Muito mal andou igualmente o Tribunal a quo ao julgar improcedente o pedido de condenação da ré, a pagar ao autor, a quantia de €2.819,04 (dois mil oitocentos e dezanove euros e quatro cêntimos) a título de perdas salariais sofridas entre 18.12.2017 e 12.02.2018, uma vez que, com o devido respeito – que muito é – extravasa em absoluto a matéria de discussão nos presentes autos, como é absolutamente contraditória com o elenco dos factos provados. (…)
DÉCIMO QUINTO. O Tribunal a quo, entre o demais, julgou como factos não provados, que: 2. Que as sequelas de que o Autor ficou a padecer em consequência do acidente em causa nos autos impossibilitem o Autor de continuar a exercer a atividade de cozinheiro; 3. Que o Autor sempre tenha sonhado ser cozinheiro; e, 4. Que as sequelas de que o Autor ficou a padecer em consequência do acidente o impeçam de concretizar o sonho referido em 3.
DÉCIMO SEXTO. (…) [O] Tribunal a quo incorreu em grosseiro e manifesto erro de julgamento, ao entender não estar provado que as sequelas de que o autor ficou a padecer o impossibilitem de continuar a exercer a atividade de cozinheiro, assentando a sua decisão nos seguintes argumentos: a. que tal conclusão não decorre das perícias médicas; b. que das conclusões das perícias médicas juntas aos autos, resulta que as sequelas de que o autor ficou a padecer implicam para o mesmo, “apenas” esforços acrescidos significativos no exercício da atividade profissional de cozinheiro, mas não impedindo o exercício da mesma; c. que o autor ora recorrente sempre poderá ser cozinheiro em restaurantes com tipologias e horários diferentes daquele em que o autor trabalhava aquando do acidente.
DÉCIMO SÉTIMO. A discordância do autor ora recorrente com o julgamento dos factos 2., 3. e 4. como factos não provados, assenta nos seguintes pontos: a. da conjugação da matéria de facto provada, por si só, resulta a impossibilidade permanente de o autor ora recorrente voltar a exercer a atividade profissional de cozinheiro; b. das regras da lógica e da experiência comum, resulta igualmente inequívoco que o autor ora recorrente se encontra permanentemente impossibilitado de exercer a atividade profissional de cozinheiro; c. as perícias médicas realizadas na pessoa do autor ora recorrente, não têm valor absoluto, devendo ser a prova que delas resulta conjugada com a demais factualidade do caso concreto; d. mesmo que assim não se entendesse, do resultado das perícias medicas, é possível extrair conclusão contrária àquela que foi a alcançada pelo Tribunal a quo, nomeadamente: que o autor ora recorrente se encontra permanentemente impossibilitado de exercer a atividade profissional de cozinheiro; e. que, também se assim não se entendesse, as perícias médicas não correspondem à verdade do caso concreto, tal conclusão se alcançando do depoimento dos senhores peritos médicos que as elaboraram; f. que do depoimento de parte do autor ora recorrente e da prova testemunhal resulta inequívoco que o autor ora recorrente se encontra permanentemente impossibilitado de exercer a atividade profissional de cozinheiro. (…)
QUADRAGÉSIMO QUARTO. Em face do exposto, é manifesto que o Tribunal a quo incorreu em erro de julgamento quanto à matéria de facto, uma vez que mal andou na apreciação das provas produzidas, termos em que, face a todo o exposto, se impõem que, nos termos do disposto no artigo 662.º do Código de Processo Civil, se modifique o elenco dos factos provados, fazendo constar do mesmo os factos que, pelo Tribunal a quo, foram considerados não provados, nomeadamente, os factos não provados 2., 3. e 4., passando assim a constar do elenco de FACTOS PROVADOS: Facto provado 85.: Que as sequelas de que o Autor ficou a padecer em consequência do acidente em causa nos autos impossibilitem o Autor de continuar a exercer a atividade de cozinheiro; Facto provado 86.: Que o Autor sempre tenha sonhado ser cozinheiro; Facto provado 87.: Que as sequelas de que o Autor ficou a padecer em consequência do acidente o impeçam de concretizar o sonho referido em 3-.
QUADRAGÉSIMO QUINTO. Alcançada a conclusão inevitável, nomeadamente, que o autor ora recorrente se encontra permanentemente impossibilitado de exercer a atividade profissional de cozinheiro, importará, naturalmente, alterar a decisão ora objeto de recurso e, assim, julgar procedente o pedido de condenação da ré no pagamento, ao autor, da quantia de €334.348,56 (…) a título de perda de chance face ao prejuízo salarial que sofrerá por força de não poder continuar a sua atividade profissional de cozinheiro (…).
Termos em que, nos termos expostos e pugnados, e nos demais de direito que v/ exas. doutamente suprirão,
Deverá o presente recurso ser julgado procedente e em consequência ser alterada a decisão da matéria de facto e ser revogada e substituída a douta sentença recorrida, com as legais de demais consequências, pois só assim decidindo, será cumprido o direito e será feita justiça.
A apelada contra-alegou, pugnando pela manutenção de decisão do tribunal a quo recorrida e interpondo recurso subordinado, concluindo este nos seguintes termos:
1 – O valor de €150,00 arbitrado a título de compensação por danos patrimoniais referente ao montante pago pelo autor por parecer de avaliação de dano corporal emitido por médico particular, com vista a instrução da presente ação judicial, é indevido. Não existe nexo de causalidade entre o valor despendido pelo autor com a obtenção de tal parecer técnico, e o facto gerador da responsabilidade da ré, isto é o acidente dos autos
2 – A decisão tomada a este respeito deverá ser revogada, devendo, em consequência a ora alegante ser absolvida do pedido contra si, a tal título, deduzido.
3 – A sentença recorrida viola o disposto no artigo 496.º do Código Civil, ao não aplicar devidamente os critérios para valoração dos danos de natureza não patrimonial aí definidos.
4 – Os factos dados por provados que podem consubstanciar danos não patrimoniais sofridos pelo autor merecem a tutela do direito. Contudo para compensação de tais danos deveria o julgador, fazendo uso de um prudente e criterioso uso
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