Acórdão nº 1245/21.5T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 2023-05-11

Ano2023
Número Acordão1245/21.5T8TMR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 1245/21.5T8TMR.E1
Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora:
I – Relatório
AA (Autor) intentou a presente ação declarativa, sob a forma de processo comum, emergente de contrato individual de trabalho, contra “Associação Humanitária de Bombeiros Voluntários de ...” (Ré), solicitando que a ação seja julgada procedente por provada, devendo:
1- Reconhecer-se que o Autor tem direito a auferir mensalmente o subsídio de chefia, por fazer parte da sua retribuição;
2- Ser a Ré condenada a pagar ao Autor a quantia de €11.500,00 referente às retribuições do subsídio de chefia de janeiro de 2020 a junho de 2021;
3- Ser a Ré condenada a pagar ao Autor as quantias suprarreferidas, acrescidas dos juros à taxa legal, desde os respetivos vencimentos e até integral pagamento;
4- Ser revogada a sanção disciplinar aplicada ao Autor de perda de 5 dias de férias, condenando-se a Ré a reconhecer ao Autor o gozo dos 5 dias durante o ano de 2021, acrescido do pagamento de €30,00 do subsídio de alimentação referente aos 5 dias e €250,00 a titulo de indemnização, tudo acrescido dos juros à taxa legal, desde o vencimento e até integral pagamento;
5- Condenar-se a Ré a pagar a retribuição do subsídio de chefia nos meses subsequentes a junho de 2021 e nas férias e subsídios de férias vencidos posteriormente a 01-01-2021, acrescidas dos juros à taxa legal, desde os vencimentos e até integral pagamento;
6- Condenar-se a Ré a pagar ao Autor a quantia de €50,00 que pagou a todos os trabalhadores no natal de 2020, acrescida dos juros à taxa legal, desde o vencimento e até integral pagamento;
7- Condenar-se a Ré a pagar ao Autor, a título de danos não patrimoniais, a quantia total de €6.000,00, acrescida de juros à taxa legal, desde a citação e até integral pagamento;
8- Tudo com as legais consequências.
Para o efeito, alegou, em síntese, que, em 01-10-2014, efetuou contrato de trabalho com a Ré, na qualidade de bombeiro, tendo exercido o cargo de Comandante em Substituição ou Segundo Comandante entre 01-11-2016 e 25-01-2019, recebendo, nesse cargo, o prémio de €150,00 mensais.
Mais alegou que a partir de dezembro de 2018 passou a exercer as funções de Comandante da Ré, funções que exercia até à interposição da presente ação, recebendo, a esse título, a partir de janeiro de 2019, o prémio de chefia, no montante mensal de €500,00, conforme acordo formalizado por escrito, entre as partes, em 29-01-2019.
Alegou igualmente que a sua remuneração é, assim, de €900,00 mensal, acrescida de €500,00 a título de prémio de chefia, porém, a Ré, após a tomada de posse da nova Direção, em 05-01-2020, cortou tal prémio ao Autor, desde janeiro de 2020, inclusive, tendo enviado ao Autor um documento intitulado “carta de resolução do acordo laboral celebrado a 29 de Janeiro de 2019”, no qual alegou a nulidade desse acordo, por apenas ter sido subscrito por um membro da Direção e por as funções de Comando desempenhadas na Ré terem cariz voluntário, não se tratando, por isso, de cargo remunerado.
Invocou, de igual modo, que, tratando-se de uma retribuição habitual e normal na Ré, para a concessão de tal prémio pago ao Comandante não é obrigatória a sua redução a forma escrita, reclamado o Autor, por isso, tal pagamento à Ré.
Alegou também que os demais funcionários continuam a receber prémios e subsídios pelas funções que exercem, tendo visto os seus salários serem aumentados, sendo o Autor o único trabalhador da Ré que viu o seu salário diminuir, uma vez que a presente Direção vem fazendo uma perseguição cerrada ao Autor, desde que tomou posse, instaurando-lhe processos disciplinares infundados e ameaçando-o com processos disciplinares, pretendendo violar os seus direitos enquanto trabalhador-estudante.
Invocou ainda que no natal de 2020 todos os trabalhadores da Ré, e mesmos os que não são pagos pela Ré, receberam um presente de natal no valor de €50,00, sendo o Autor o único a não receber tal presente, sentindo-se, por isso, discriminado e humilhado em relação aos outros trabalhadores, devendo a Ré ser condenada a pagar-lhe essa quantia.
Invocou também que no processo disciplinar, que culminou com a sanção disciplinar de perda de 5 dias de férias, é nulo porque na decisão final, proferida em 17-02-2021, ficaram a constar factos que não constavam da nota de culpa, a que acresce a circunstância de tais factos não corresponderem à verdade e de a Ré não ter efetuado qualquer das diligências requeridas pelo Autor na sua resposta à nota de culpa, nem ter justificado por escrito porque assim atuou.
Mais alegou que sempre realizou o seu trabalho com pontualidade e assiduidade, nunca tendo faltado ao serviço, nem tendo praticado qualquer infração disciplinar, pelo que a sanção disciplinar de perda de 5 dias de férias deve ser revogada, condenando-se a Ré a conferir-lhe o gozo desses dias.
Invocou também que a sanção disciplinar aplicada é claramente abusiva, por ser desproporcional, visto que aquilo que lhe é imputado é a falta de 3 horas numa tarde e um dia completo, e não a falta de 5 dias, sendo que o facto de o Autor ser trabalhador-estudante e, enquanto Comandante da Ré, ter sido convidado a participar num ato público, são aspetos que deveriam orgulhar a Ré e não levar a aplicar ao Autor uma sanção disciplinar, pelo que deve ser indemnizado nos termos do art. 331.º, n.º 3, do Código do Trabalho, em montante não inferior a €250,00.
Por fim, alegou que por ter sido vítima de discriminação e assédio por parte da Direção da Ré, o que o levou a sentir-se humilhado e vexado, em relação aos outros colaboradores, trabalhadores e perante a sociedade civil de ..., e a sentir-se deprimido, sendo afetado na sua honra, imagem, nome e dignidade, deverá a Ré ser condenada a pagar ao Autor a quantia de €3.000,00 a título de danos morais por assédio, e a quantia de €3.000,00 a título de danos não patrimoniais, pela prática de ato discriminatório contra o Autor.
Realizada a audiência de partes, não foi possível resolver por acordo o litígio.
A Ré apresentou contestação, por exceção e por impugnação, solicitando, a final, que:
a) a exceção deduzida seja julgada procedente, por provada, sendo a Ré absolvida da instância relativamente aos pedidos feitos na petição inicial quanto aos pontos 1, 2, 3 e 5;
b) seja declarada a nulidade do “acordo laboral”; e
c) seja a ação julgada improcedente, por não provada, sendo a Ré absolvida do pedido.
Em síntese, alegou que o Autor foi admitido, em 01-10-2014, ao serviço da Ré, para sob as suas ordens e direção, exercer as funções de bombeiro, inexistindo, na estrutura do quadro de pessoal da Ré o quadro de Comando remunerado, visto que as funções de Comando foram sempre desempenhadas na Ré como cargo não remunerado, que não corresponde a uma categoria profissional, tem carácter temporário e não está sujeito a qualquer horário, não tendo a Ré sequer poder disciplinar sobre o Comandante, pois no exercício do seu cargo não está sob as ordens e direção da Ré.
Mais alegou que, em face do carácter de voluntariado e temporário das funções de Comandante, é ilegal o acordo celebrado entre o Autor e a anterior Direção da Ré, facto que ambos bem sabiam, razão pela qual o “acordo laboral” celebrado não corresponde a um real contrato de trabalho ou sua adenda, porque falta o requisito da subordinação, tratando-se as funções de Comandante uma atividade exercida pelo Autor de forma paralela ao cumprimento do seu contrato, não reunindo, por isso, os requisitos do art. 11.º do Código do Trabalho, nem sendo de presumir a sua existência nos termos do art. 12.º do mesmo Diploma Legal.
Invocou ainda a incompetência do tribunal de trabalho de Tomar, considerando competente o tribunal comum, devendo, em conformidade, ser a Ré absolvida da instância.
Alegou igualmente que o referido acordo é nulo à luz dos Estatutos da Ré, mais concretamente, em face do disposto no art. 31.º, n.º 1, o qual prevê que a Ré se obriga com a assinatura de dois membros efetivos da Direção, encontrando-se o acordo apenas assinado pelo Presidente da Direção, sendo tais Estatutos do conhecimento do Autor, pelo que a revogação desse acordo é legítima.
Impugnou, por fim, qualquer ato de discriminação ou de assédio para com o Autor, bem como a ilegalidade do processo disciplinar, afirmando que este respeitou o princípio do contraditório e a sanção aplicada mostra-se adequada ao comportamento que se provou o trabalhador ter tido, não havendo, por isso, lugar a qualquer tipo de indemnização.
Proferido despacho saneador, foi dispensada a realização da audiência preliminar, foi fixado o valor da ação em €17.830,00, foi julgada improcedente a exceção de incompetência material invocada pela Ré, foi identificado o objeto do litígio, foram dados como assentes os factos provados por confissão e enunciados os temas da prova.
Realizada a audiência de julgamento de acordo com as formalidades legais, foi proferida a respetiva sentença, em 10-05-2022, com a seguinte decisão:
4.1. Pelo exposto, julgo a acção parcialmente procedente e decido:
a) Reconhecer que o A. tinha o direito a auferir mensalmente o subsídio de chefia, por fazer parte da sua retribuição, enquanto exerceu as funções de comandante;
b) Condenar a R. a pagar ao A. a quantia de € 12.916,67, correspondente ao período de Janeiro de 2020 a 12/11/2021 em que exerceu as sobreditas funções de comandante, acrescida dos juros à taxa legal, desde o vencimento e até integral pagamento;
c) Revogar a sanção disciplinar aplicada ao A. de perda de 5 dias de férias, condenando a R. a reconhecer ao A. o gozo desses dias; e,
d) Absolver a ré de tudo o mais que foi peticionado pelo autor.
4.2. Condeno o A. e a R. a pagarem as custas da acção na proporção de metade.
4.3. Notifique.
Não se conformando com a sentença, veio a Ré “Associação Humanitária de Bombeiros
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT