Acórdão nº 1237/23.0T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 19-03-2024

Data de Julgamento19 Março 2024
Número Acordão1237/23.0T8TMR.E1
Ano2024
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Proc. n.º 1237/23.0T8TMR.E1

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1]:

I. Relatório
AA intentou em 01-08-2023, no Juízo do Trabalho de Tomar – Juiz ..., do Tribunal Judicial da Comarca de Santarém, e mediante formulário a que aludem os artigos 98.º-C e 98.º-D, do Código de Processo do Trabalho, a presente ação especial de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento contra JD Portalegre, Unipessoal, Lda., requerendo que seja declarada a ilicitude ou irregularidade do seu despedimento, com as legais consequências.
A acompanhar o requerimento juntou a decisão de despedimento que recebeu da Ré.

Designada e realizada a audiência de partes, na mesma não se logrou obter o acordo destas.
Após, veio a empregadora, nos termos previstos no artigo 98.º-J do CPT, apresentar articulado a motivar o despedimento.
Para o efeito alegou, em síntese e no que ora releva, que é uma sociedade comercial por quotas, que tem como atividade comercial a indústria e comércio de leite e produtos lácteos, que no âmbito do processo de insolvência da sociedade Queijo Saloio – Indústria de Lacticínios, S.A., adquiriu por contrato de transmissão de estabelecimento comercial a unidade económica do estabelecimento industrial de produção de queijo, sito no ..., ...., ..., ..., ..., e que o Autor era trabalhador da referida sociedade Queijo Saloio – Indústria de Lacticínios, Lda., pelo que se transmitiu para si, Ré, a posição de entidade empregadora no contrato de trabalho do Autor, o que ocorreu em 01-10-2022.
Mais alegou que o Autor foi previamente informado de tal situação, não só no âmbito do processo de insolvência (no qual se encontra representado), como pela própria Ré, nomeadamente através de cartas datadas de 16 de Setembro de 2022 e de 30 de Setembro de 2022, e que comunicou ainda ao Autor que a alteração do seu local de trabalho – para as instalações da Ré sitas na Zona Industrial ... – ocorreria a partir de 03-10-2022, data a partir da qual estaria assegurada a sua deslocação.
Todavia, em 21-09-2022 o Autor enviou uma comunicação escrita à Ré, na qual a informou que no âmbito do processo de insolvência supra referido requerera a declaração de encerramento do estabelecimento industrial e que, caso assim não se entendesse, fosse declarado que a sua deslocação para as instalações de ... lhe causava prejuízo sério.
A Ré respondeu a tal comunicação, esclarecendo, em suma, que a transmissão do estabelecimento industrial de produção de queijo da insolvente se operara no âmbito do processo de insolvência, com cumprimento de todas as exigências processuais e legais, assegurando a Ré aos trabalhadores do estabelecimento transmitido (entre os quais o Autor) a manutenção dos seus contratos de trabalho com todos os direitos adquiridos, nomeadamente retribuição, antiguidade, categoria profissional, conteúdo funcional e benefícios sociais, acrescentando que a assunção dos trabalhadores produziria efeitos a 01-10-2022 e que a Ré asseguraria as despesas decorrentes da deslocação ... – ....
Posteriormente (a Ré) informou ainda o Autor que a sua (dele, Autor) comunicação de 03-10-2022 e respetivos fundamentos não mereciam qualquer acolhimento, mantendo-se em vigor a relação laboral entre as partes, instando-o a justificar as suas faltas, o que o Autor nunca fez, designadamente desde o dia 03-10-2022 até à data da instauração do procedimento disciplinar, em 06-02-2023.
Concluiu que o Autor violou os deveres laborais, maxime o previsto na alínea b) do n.º 1 do artigo 128.º do Código do Trabalho (comparecer ao serviço com assiduidade e pontualidade), e, em conformidade, que deve ser declarada a licitude do despedimento.

O trabalhador/Autor contestou o articulado da empregadora/Ré, afirmando, em síntese, que era trabalhador de Queijo Saloio, S.A., que exercia a atividade em ..., ..., que por sentença proferida no dia 18-05-2022, no processo .../22...., do Juízo do Comércio de Vila Franca de Xira – Juiz ...., foi decretada a insolvência da referida sociedade comercial, tendo aí reclamado os seus créditos laborais, incluindo pela cessação do contrato de trabalho, no âmbito desse processo.
Porém, nesse processo de insolvência foi proposta a transmissão dos estabelecimentos e dos trabalhadores para outras empresas do grupo sociedade comercial Queijo Saloio, S.A., ao que o Autor e outros trabalhadores se opuseram, alegando não ter sido cumprido o disposto no artigo 286.º, n.º 1, do Código do Trabalho, e através de carta datada de 3 de Outubro de 2022, rececionada no dia seguinte, resolveu, tal como outros colegas de trabalho, o contrato de trabalho com a Ré com efeitos imediatos; e no processo de insolvência pediram a inviabilidade do plano, a entrega dos bens e a liquidação do património, o que foi indeferido por decisão proferida em 1 de maio de 2023, tendo entretanto, o Autor e os colegas, interposto recurso dessa decisão.
A final do articulado pediu que seja declarado que resolveu o contrato de trabalho com justa causa, porque a transferência para ... para trabalhar para a Ré lhe causava um prejuízo sério, ou, caso assim se não entenda, que seja declarada a nulidade do despedimento e, em consequência, condenada a Ré a pagar-lhe a quantia global de € 26.473,00, ou ainda condenar-se a Ré no “pagamento da indemnização por despedimento ilícito, com a antiguidade e remuneração devidas à data da decisão definitiva, acrescida das remunerações vencidas desde a decisão do despedimento até à decisão final, tudo acrescido de juros à taxa anual de 4% calculados desde a citação até integral pagamento”.

Respondeu a Ré, a reafirmar o constante do articulado de motivação de despedimento, designadamente que em 01-10-20202 se transmitiu para si a qualidade de empregadora no contrato de trabalho do Autor, e que a partir de 03-10-2022 verificou-se a alteração do local de trabalho para as instalações da Ré sitas na Zona Industrial ... (tal como foi previamente informado ao Autor), não existindo fundamento legal para a resolução do contrato de trabalho, existindo sim, ao invés, fundamento para o despedimento com justa causa.

No prosseguimento dos autos, foi em 04-12-2023 proferida decisão que considerou verificar-se erro na forma de processo e absolveu a Ré da instância.
Consta da fundamentação, além do mais, o seguinte:
«No presente caso, como se aludiu, existem duas questões prévias a decidir, a saber:
se, na sequência da declaração de insolvência, o estabelecimento da insolvente, onde o Autor desempenhava funções deveria ter sido encerrado definitivamente (com consequente pagamento da compensação aos trabalhadores, no âmbito da insolvência), ao invés de ter sido transmitido para a Ré;
se o contrato de trabalho foi prévia e efetivamente resolvido pelo trabalhador, com fundamento em justa causa, nos termos do art. 394.º n.º 3 al. d) do Código do Trabalho, não produzindo já efeitos quando foi instaurado o procedimento disciplinar, devendo a Autora
...

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