Acórdão nº 1212/21.9T8OAZ.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 08-06-2022

Data de Julgamento08 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão1212/21.9T8OAZ.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Procº nº 1212/21.9T8OAZ.P1
Relator: Paula Leal de Carvalho (Reg. nº 1272)


Acordam, em conferência, na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto:



I. Relatório

A Autoridade para as Condições do Trabalho proferiu decisão administrativa de condenação da arguida B..., Lda, actualmente designada B 1... Unipessoal, Lda, pela prática de uma contra-ordenação muito grave, prevista no artigo 15.º, n.º 2, alíneas c) e l) e n.º 14, da Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, na coima de 90 unidades de conta e de uma contraordenação muito grave, prevista no artigo 15.º, n.º 4 e n.º 14, da Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, conjugado com o artigo 19.º, n.º 2, do mesmo diploma, na coima de 90 unidades de conta e, em cúmulo jurídico, na coima única de 86 unidades de conta [€ 8.772].

Recebida a impugnação judicial e realizada a audiência de discussão e julgamento, a 1ª instância proferiu sentença, que julgou a impugnação judicial nos seguintes termos:
Pelo exposto, julgo parcialmente procedente a impugnação e, em consequência, absolvo a recorrente da prática de uma contraordenação muito grave, prevista no artigo 15.º, n.º 2, alíneas c) e l) e n.º 14, da Lei n.º 102/2009, de 10 de setembro, mantendo a decisão administrativa na parte restante, com ajustamento da coima parcelar aplicada para 86 unidades de conta [€8.772].
Mais condeno a recorrente nas custas, fixando a taxa de justiça em duas unidades de conta.”

Inconformada, a arguida recorreu, tendo formulado as seguintes conclusões:
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Nestes termos e nos demais de direito, sempre com o mui douto suprimento de V. Exas., deve o presente recurso ser julgado procedente, e, em consequência, deve revogar-se a douta sentença recorrida substituindo-a por outra que julgue absolvida a recorrente da primeira infracção, subsistindo a condenação pela segunda infracção e a condenação na aplicação de uma coima de 42 unidades de conta, condenando e absolvendo a Ré nos devidos termos.”

O Ministério Público contra-alegou, tendo formulado as seguintes conclusões:
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9ª – O presente recurso não merece provimento, pelo que deve, como tal, ser confirmada a douta decisão recorrida.

O recurso foi admitido pela 1ª instância com efeito suspensivo, mantido pela ora relatora, nos termos do art. 35º, nºs 2 e 3 do da Lei 107/2009.

O Exmº Sr. Procurador Geral Adjunto nesta Relação emitiu douto parecer no sentido do não provimento do recurso, ao qual respondeu a Recorrente dele discordando, reiterando as alegações de recurso e pugnando pela sua procedência.

Colheram-se os vistos legais.
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II. Objecto do recurso

1. São as seguintes as questões suscitadas pela Recorrente:
- Da nulidade da sentença por insuficiência da motivação da decisão da matéria de facto;
- Se o Tribunal a quo não analisou a prova produzida quanto ao cumprimento do disposto no n.º 4 do art. 15.º da Lei 102/2009, de 10 de Setembro, pois que, tendo ficado cabalmente provado que o trabalhador tinha mais de 30 anos de experiência nas mesmas funções, deve ser tomada em consideração pela entidade patronal as aptidões e experiência do trabalhador, sempre que lhe é confiada uma tarefa e, com base nessas características, ser prestada as informações e formação necessária, aludindo, no corpo da motivação a erro notório na apreciação da prova nos termos do art. 410º, nº 2, al. c), do CPP.
- Do montante da coima.

2. Como decorre da sentença, a arguida, ora Recorrente, foi absolvida da contraordenação muito grave prevista no art. 15º, n.ºs 2, als. c) e l) e 14, da Lei n.º 102/2009, de 10.09, não tendo a sentença, nesta parte, sido objecto de impugnação, pelo que transitou em julgado.
Subsiste, assim e apenas a contraordenação muito grave prevista art. 15.º, n.ºs 4 e 14 da citada Lei 102/2009, conjugado com o artigo 19.º, n.º 2, da mesma, a esta se reportando as questões elencadas no antecedente ponto 1.
***

III. Decisão da matéria de facto proferida pela 1ª instância:

A. É a seguinte a decisão da matéria de facto proferida em 1ª instância:
“1. Factos provados:
1. É arguida B 1... UNIPESSOAL, LDA, anteriormente designada como B..., Lda, com o NIPC ..., com sede na Praça ... Lisboa e estabelecimento (local do acidente) num estaleiro de construção civil sito na Rua ..., ..., com atividade de Transporte Rodoviário de Mercadorias (CAE ...), na qualidade de entidade empregadora.
2. Representa a arguida, AA, com o NIF ..., com domicílio na rua ... Lisboa.
3. No dia 13 de novembro de 2018, pelas 16:30 horas, quando o trabalhador BB procedia à lavagem / limpeza da tubagem e tremonha da autobomba, sofreu um acidente de trabalho do qual resultou amputação traumática do D2 (dedo indicador) e D3 (dedo médio) pela F1 (falange) e fratura de F2 (falange) do D4 (dedo anelar) da mão direita.
4. À data do acidente, o trabalhador sinistrado, com a categoria profissional de Motorista e Operador de Autobomba, procedia à lavagem / limpeza da tubagem e tremonha de uma Autobomba num estaleiro de construção civil sito na Rua ..., ....
5. Tal trabalhador foi admitido com Contrato de Trabalho a Termo Incerto, estando o mesmo colocado na unidade de Santa Maria da Feira da U..., S.A., no âmbito da celebração de um contrato de prestação de serviços de bombagem de betão entre a sua entidade empregadora e a U..., S.A..
6. O trabalhador sinistrado tem como funções a condução de viaturas pesadas para as obras de construção civil e consequente bombagem de betão pronto.
7. O mesmo foi admitido em 08 de outubro de 2018.
8. O trabalhador sinistrado procedia à lavagem / limpeza da tubagem e tremonha da Autobomba.
9. Segundo o Manual da Autobomba trata-se de uma limpeza por aspiração que, consiste nas seguintes etapas:
· Esvaziar a tremonha do agitador até o betão ficar ao nível da borda superior dos tubos do cilindro de bombagem;
· Desligar então a bomba;
· Introduzir uma esponja de limpeza embebida em água na saída da mangueira de descarga;
· Colocar a lança de distribuição numa posição uniformemente inclinada;
· Regular a bomba para a bombagem em retorno no comando remoto;
· Durante a limpeza, bater com um pedaço de madeira dura próximo da abertura de limpeza da linha de betão;
· Desligar a bomba, assim que a esponja de limpeza tiver passado no local onde bateu;
· Abrir a abertura de limpeza no tubo de transferência, virando a tampa da abertura de limpeza ao contrário e voltando a fechá-la com a espiga para dentro;
· Ligar a bomba para bombagem de retorno (a esponja de limpeza fica presa na espiga da tampa da abertura de limpeza;
· Em seguida desligar a bomba;
· Abrir a tampa da abertura de limpeza e retirar a esponja de limpeza.
10. Segundo o “Relatório” de Acidente de Trabalho realizado pela S..., e não pela arguida, exibido no seguimento de Notificação para Entrega de Documentos à mesma:
· Após conclusão da betonagem, o operador da autobomba realizou a tarefa habitual, de lavagem / limpeza da tubagem e tremonha da autobomba, fazendo passar da bola de limpeza, desde a lança até à tremonha;
· No momento em que o trabalhador (a utilizar o comando remoto da autobomba) colocou a mão para retirar a bola do interior da tubagem, a autobomba realizou um movimento de expulsão da bola de limpeza, provocando o esmagamento dos dedos da mão direita do trabalhador contra a estrutura (Vide Fotografia n.º 10) devido à passagem brusca da bola e de betão.
11. O trabalhador sinistrado, BB, no seu depoimento escrito declara que, no dia 13-11-2018, ao fazer o trabalho numa obra de ... – Oliveira de Azeméis, ao fazer uma betonagem com a autobomba na qual era condutor e manobrador, depois de terminar o trabalho fiz a limpeza da autobomba como era habitual. Coloquei a bola no interior dos tubos e ao fazer a recuperação da bola, como é hábito nesse tipo de autobomba que tem que se colocar a mão no interior da tremonha para recuperar a bola. Ao colocar a mão, a tremonha teve um movimento e levou a mão e cortou-me os dedos.”
12. Concretiza, ainda, o “Relatório” de Acidente de Trabalho supra referido como Causas Potenciais, “Deficiência ou ausência de organização e/ou planeamento do trabalho. Avaria de equipamento de trabalho.”
13. O mesmo refere como Recomendações Gerais:
· “Pressionar sempre o botão de paragem de emergência para garantir que o equipamento se encontra parado, antes de se retirar a bola de limpeza;
· Nas operações de manutenção / limpeza não introduzir as mãos dentro da tremonha ou de outros componentes móveis da autobomba sem garantir que o equipamento se encontra parado;
· Recomenda-se o estudo e aplicação da tampa na tubagem perno móvel que permita um melhor posicionamento da bola de limpeza, eliminando a possibilidade dos trabalhadores colocarem as mãos no interior da tubagem para acesso à respetiva bola de limpeza;
· Recomenda-se a análise dos riscos da tarefa de limpeza da tubagem em todas as autobombas (diferente entre marcas)”.
14. Solicitada à arguida a Instrução de Trabalho e/ou Instrução de Segurança inerente à tarefa relacionada com o acidente de trabalho, exibiu a Instrução 01 IT P 12 02 – Bombagem de Betão e a Instrução 01 IT S 12 02 – Autobomba, elaboradas pela U... / S....
15. A Instrução 01 IT S 12 02 – Autobomba refere que:
· A Autobomba é um equipamento móvel para proceder à elevação e colocação de betão em Obras de Construção Civil, sendo constituído essencialmente por um veículo matriculado que suporta uma bomba hidráulica de transporte e levação de betão e uma lança de distribuição e colocação de betão de acionamento hidráulico e desdobrável;
· A receção do betão no equipamento é assegurada através de uma tremonha onde as autobetoneiras descarregam o betão;
· O comando do equipamento é assegurado através de controlo remoto (telecomando).
16. Mais refere que, no fim do trabalho, deve esvaziar as tubagens mediante
...

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