Acórdão nº 121/21.6T8EVR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 09-02-2023

Data de Julgamento09 Fevereiro 2023
Ano2023
Número Acordão121/21.6T8EVR.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora

Acordam na 1ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Évora

I - RELATÓRIO
Planície Parda - Construção Civil, Lda. instaurou a presente ação declarativa de condenação, sob a forma de processo comum, contra AA e BB, pedindo que os réus sejam condenados a pagar-lhe a quantia de € 58.432,66, correspondente ao capital em dívida no montante de € 57.663,81 e aos juros vencidos desde 08.09.2020, no montante de € 768,85, acrescida de juros vincendos até integral pagamento.
Alegou em síntese que:
- A autora exerce a atividade de construção civil e, no exercício dessa atividade, elaborou um orçamento, que os réus aceitaram, ficando a autora obrigada a construir-lhes uma moradia unifamiliar, após aprovação e licenciamento camarários que ocorreram em 04.07.2019;
- O prazo previsível para a edificação da moradia era de 12 meses, a contar da adjudicação e o preço global da obra era de € 177.754,30, acrescido de IVA à taxa legal em vigor, quantia a ser paga em tranches, nos termos acordados pelas partes;
- Os réus nunca cumpriram o plano de pagamentos acordado, tendo os mesmos efetuado pagamentos vários, no valor total de € 93.500,00;
- No dia 01.07.2020 a moradia encontrava-se em fase de acabamentos finais, tendo a autora solicitado aos réus a prestação de uma garantia bancária no valor de € 125.137,79, correspondente ao valor total dos trabalhos cujo pagamento ainda estava em falta e dos que ainda estavam por executar;
- Em resposta, os réus solicitaram à autora a prestação de uma garantia bancária, alegando que os prazos de construção estavam ultrapassados, e exigiram uma compensação por erros e incorreções da obra, que haviam sido resolvidos no decurso da mesma, logo que detetados, em abril de 2020;
- Após troca de correspondência entre as partes, os réus comunicaram à Autora, em 17.07.2020, o fim da relação comercial e contratual;
- Em 27.07.2020 a autora desmontou o estaleiro e retirou os equipamentos da obra, data em que realizou uma reunião na obra com os réus para medição dos trabalhos realizados;
- Os trabalhos realizados na obra pela autora e não pagos correspondem a € 57.663,81, como descrito na fatura remetida aos réus, que estes devolveram por não reconhecerem essa dívida, entendendo que lhes é devida uma indemnização pelas incorreções e erros da obra, sendo que tais erros foram já corrigidos pela autora que suportou os respetivos custos.
Os réus contestaram, impugnando em geral os factos articulados na petição inicial e invocaram a exceção de não cumprimento.
Alegaram, em resumo, que a autora, na execução da obra, cometeu diversos erros de construção, tendo os réus, que não dispunham de conhecimento técnicos de construção, sido ludibriados durante algum tempo pelo representante da autora que apenas sugeria emendas, sem nunca ter reposto a obra de acordo com o projeto e, apesar de instada por diversas vezes a fazê-lo, a autora nunca corrigiu nenhum dos erros, o que levou os réus a contratarem um outro empreiteiro para finalizar a obra.
Mais alegaram que para correção dos referidos erros, os réus teriam de pagar mais € 63.048,09, acrescido de IVA, mas como não dispunham de meios financeiros para suportar essa despesa, decidiram finalizar a obra e requerer o licenciamento em alterações em obra de construção, despesa que suportaram, sendo que devido a atraso na finalização da obra, os réus tiveram ainda de suportar o custo com a renda da casa onde habitavam por período superior ao previsto, o que implicou um gasto de € 3.850,00.
Alegaram, por último, que os prejuízos dos réus, resultantes da má execução dos trabalhos por parte da autora é muito superior ao peticionado pela autora, pelo que lhes deve ser reconhecido o direito de opor à autora a exceção de não cumprimento e recusa de pagamento das faturas em questão, devendo ser reconhecida a extinção da dívida por compensação.
Houve resposta, concluindo a autora pela improcedência da exceção de não cumprimento invocada pelos réus.
Dispensada a realização da audiência prévia, foi proferido despacho saneador tabelar, com subsequente identificação do objeto do litígio e enunciação dos temas da prova, sem reclamação.
Realizada a audiência final, foi proferida sentença com o seguinte dispositivo:
«Nestes termos, tudo visto e ponderado, decido:
a) Julgar improcedente, por infundada, a exceção perentória suscitada pelos Réus;
b) Julgar parcialmente procedente, por provada, a presente ação e, consequentemente, condenar solidariamente os Réus AA e BB a pagar à Autora Planície Parda - Construção Civil, Lda. a quantia total de €39.144,38 (a que acresce o IVA à taxa legal), bem como os juros de mora, à taxa civil, vencidos sobre tal quantia, desde 08/09/2020 e vincendos, até integral pagamento, absolvendo-se os Réus do demais peticionado.
*
Custas da ação a cargo da Autora e dos Réus na proporção do respetivo decaimento (artigo 527.º, n.º 1, do Código de Processo Civil).»
Inconformados, os réus interpuseram o presente recurso de apelação, tendo finalizado a respetiva alegação com prolixas conclusões[1], que por isso não serão aqui transcritas, das quais se respiga que os recorrentes pretendem colocar em causa a sentença por alegado erro de julgamento de direito e de facto, designadamente por não ter considerado verificada a exceção de não cumprimento do contrato e, a não se entender assim, por não ter condenado os réus “em pedido genérico para subsequente incidente de Liquidação de Sentença”, por o ponto 12 dos factos provados não refletir uma correta análise da prova produzida[2].

Não foram apresentadas contra-alegações.

Corridos os vistos, cumpre apreciar e decidir.

II – ÂMBITO DO RECURSO
Sendo o objeto do recurso delimitado pelas conclusões das alegações, sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso (arts. 608º, nº 2, 635º, nº 4 e 639º, nº 1, do CPC), as questões a decidir, atenta a sua precedência lógica, consubstanciam-se em saber:
- se os réus podem opor à autora a exceção de não cumprimento do contrato;
- a não se entender assim, se os réus devem ser condenados em quantia a apurar em incidente de liquidação, sendo que a resposta a esta questão pressupõe saber se está corretamente julgado o ponto 12 dos factos provados.


III – FUNDAMENTAÇÃO FÁCTICO-JURÍDICA
Na 1ª instância foram dados como provados os seguintes factos:
1. A Autora é uma sociedade comercial que tem por objeto o exercício da atividade de construção civil, compra e venda de terrenos e outros bens imóveis e arrendamento de bens imobiliários.
2. A administração e representação da sociedade é exercida pelo gerente CC, casado, residente em Santana ..., Arraiolos, no Largo ..., ....
3. No final do mês de maio de 2019, por acordo verbal entre A. e RR., a primeira obrigou-se a construir uma moradia unifamiliar, na Travessa ..., em Arraiolos, em prazo não concretamente apurado, mas não superior a 12 meses, ficando os réus obrigados ao pagamento faseado do preço global de 177.754,30€ (cento e setenta e sete mil, setecentos e cinquenta e quatro euros e trinta cêntimos), acrescido de IVA à taxa legal em vigor.
4. No dia 24 de maio de 2019, a Autora enviou aos Réus, já depois de negociação entre ambos, o “Orçamento para Obras de Moradia Unifamiliar”, junto a fls. 16 a 18 e que aqui se dá por inteiramente reproduzido.
5. Os Réus aceitaram o referido orçamento, ficando a Autora obrigada a construir-lhes a moradia unifamiliar, após a aprovação e o licenciamento camarários, que ocorreram em 4/7/2019.
6. A obra teve o seu início em finais de julho de 2019.
7. O plano de obra foi enviado aos Réus, por e-mail, em 3 de setembro de 2019.
8. No dia 6 de agosto de 2019, a obra já se encontrava em fase de abertura e enchimento as sapatas de pilar e os Réus ainda não haviam pago à Autora a 1.ª tranche.
9. No dia 16 de setembro de 2019 os Réus efetuaram o 1.º pagamento, no valor de 40.000,00€, com IVA incluído no montante de 7.479,67€.
10. O 2.º pagamento por parte dos Réus ocorreu em 4 de dezembro de 2019, no valor de 27.000,00€, com IVA incluído, no montante de 5.048,78€.
11. Os Réus efetuaram ainda à Autora os seguintes pagamentos:
a) Em 18 de março de 2020, o valor de 4.000,00€, que inclui o montante de 747,97€, relativo ao IVA, à taxa de 23%;
b) Em 1 de abril de 2020, o valor de 7.500,00€, que inclui o montante de 1.402,44€, relativo ao IVA, à taxa de 23%;
c) Em 28 de maio de 2020, o valor de 7.500,00€, em dinheiro, que inclui o montante de 1.402,44€, relativo ao IVA, à taxa de 23%;
d) Em 8 de julho de 2020, o valor de 7.500,00€, em dinheiro, que inclui o montante de 1.402,44€, relativo ao IVA, à taxa de 23%;
o que perfaz um total de 93.500,00€, com o IVA já incluído.
12. No dia 1 de julho de 2020, a moradia encontrava-se em fase de acabamentos, sendo que os trabalhos discriminados no orçamento supra referido em 4) e 5) encontravam-se já executados nas seguintes proporções:
verba n.º 1, no valor de €560,00: 100% executado
verba n.º 2, no valor de 1.123,00: 75% executado
verba n.º 3, no valor de €51.134,00: 100% executado
verba n.º 4, no valor de €9.885,00: 95% executado
verba n.º 5, no valor de €18.178,20: 75% executado
verba n.º 6, no valor de €10.200,00: 80% executado
verba n.º 7, no valor de €4.200,00: 95% executado
verba n.º 8, no valor de €4.160,50: 85% executado
verba n.º 9, no valor de €420,00: 100% executado
verba n.º 10, no valor de €2.560,00: 100% executado
verba n.º 11, no valor de €2.870,40: 0% executado
verba n.º 12, no valor de €1.435,20: 30% executado
verba n.º 13, no valor de €1.800,00: 30% executado
verba n.º 14, no valor de €3.175,00: 0% executado
verba n.º 15, no valor de €6.723,00: 100% executado
verba n.º 16, no valor de €10.160,00: 0% executado
verba n.º 17, no valor de €2.560,00: 0% executado
verba n.º 18, no valor de €5.600,00: 0% executado
verba n.º 19, no valor de €5.800,00: 0% executado
verba n.º 20, no valor de €900,00: 0% executado
verba n.º 21, no valor de €1.210,00:
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