Acórdão nº 118395/21.4YIPRT.L1-2 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-11-10

Ano2022
Número Acordão118395/21.4YIPRT.L1-2
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam na 2.ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

1. Relatório:
1. IBERINFORM – INTERNACIONAL, S.A., identificada nos autos, requereu injunção contra JTINN, LDA., também identificada nos autos, requerendo fosse aposta fórmula executória para pagamento da quantia total de € 7.760,30 (correspondendo: € 7.373,85 a capital; € 284,45 a juros de mora; e € 102,00 de taxa de justiça paga), com referência a “Contrato de: Compra e venda”, datado de 31-05-2021, respeitando a obrigação a transação comercial, invocando o seguinte:
“ENTRE REQUERENTE E REQUERIDA FOI CELEBRADO UM CONTRATO DE FORNECIMENTO DE BASE DE DADOS DE EMPRESAS, TENDO A REQUERIDA ACEITE A PROPOSTA APRESENTADA PELA REQUERENTE EM 21.05.2021, PELO PREÇO DE € 5.995, ACRESCE IVA Á TAXA LEGAL DE 23%, NO VALOR DE 1.378,85€. FOI EMITIDA A FATURA EM 31.05.2021, COM VENCIMENTO A TRINTA DIAS. PORÉM, NA DATA DO VENCIMENTO, A FATURA NÃO FOI PAGA, NEM POSTERIORMENTE, APESAR DAS DIVERSAS INTERPELAÇÕES FEITAS PELA REQUERENTE NESSE SENTIDO. PELO QUE, NESTA DATA, A REQUERIDA É DEVEDORA DA REQUERENTE NO VALOR DE € 7.373,85, A QUE ACRESCEM JUROS À TAXA LEGAL E QUE NESTA DATA PERFAZEM A QUANTIA DE €281,22”.
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2. A requerida deduziu oposição invocando, em suma, não ter solicitado à requerente qualquer proposta de fornecimento, nada tendo a requerente fornecido à requerida, nem remeteu qualquer fatura ou a interpelou para pagamento, muito embora tenha tomado conhecimento da existência da fatura reclamada, por consulta, efetuada em 10-01-2022, pelos seus serviços de contabilidade na plataforma da Autoridade Tributária e Aduaneira. Nesse dia, posteriormente, foi contactada por funcionária da requerente que lhe informou que o fornecimento tinha sido adjudicado por MG, da empresa F5C (empresa da qual também é gerente o gerente da requerida), mas que nunca representou a requerida.
Concluiu pela improcedência da ação, com a sua absolvição do pedido.
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3. Por despacho de 16-02-2022 foi a autora notificada para se pronunciar sobre a matéria da exceção invocada na oposição, pronúncia que a autora efetuou – por requerimento de 25-02-2022 – concluindo que pela improcedência das exceções invocadas e juntando documentos.
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4. Na sequência, a ré – por requerimento de 11-03-2022 – veio pronunciar-se sobre os documentos juntos pela autora, nos termos e para os efeitos do disposto no artigo 444.º do CPC e concluiu que a autora deverá ser condenada como litigante de má fé, em multa e indemnização.
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5. A autora, por requerimento de 22-03-2022, ainda veio arguir: a inadmissibilidade processual do requerimento de 11-03-2022, quanto à impugnação dos documentos; a improcedência desta impugnação; e a condenação da ré como litigante de má fé, em multa e indemnização.
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6. Em 02-06-2022 foi proferido despacho do seguinte teor:
“A Autora instaurou o presente procedimento de injunção pedindo a condenação da Ré no pagamento da quantia de €7.760,30, acrescido de juros, alegando como causa do seu pedido a celebração de um contrato.
(…)
O Tribunal é competente em razão da nacionalidade, da matéria e da hierarquia.
(…)
Questão prévia:
Da ineptidão do requerimento de injunção:
Dispõe o n.º 1 do artigo 3.º, ex vi o n.º 1, do artigo 17.º, ambos do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01.09, que se a acção tiver de prosseguir, pode o juiz julgar logo procedente alguma excepção dilatória ou nulidade que lhe cumpra conhecer.
Por outro lado, nos termos do artigo 186.º, n.ºs 1 e 2 do Código de Processo Civil, é nulo todo o processo quando for inepta a petição inicial, o que sucede quando falte ou seja ininteligível a indicação do pedido ou da causa de pedir, quando o pedido esteja em contradição com a causa de pedir ou quando se cumulem causas de pedir ou pedidos substancialmente incompatíveis. A nulidade do processo decorrente da ineptidão da petição inicial constitui uma excepção dilatória, determinante da absolvição do réu da instância (artigos 278.º, n.º 1, alínea b), 576.º, n.º s 1 e 2 e 577.º, alínea b) do Código de Processo Civil).
Efectivamente, a toda a acção corresponde um pedido e uma causa de pedir, sendo o pedido o efeito jurídico pretendido pelo autor e a causa de pedir os factos concretos que geram o efeito jurídico pretendido.
Deve, por isso, o autor, na petição inicial, formular o pedido, isto é, solicitar ao Tribunal a providência processual que julgue adequada para a tutela de uma situação jurídica ou de um interesse que afirma materialmente protegido, e indicar a causa de pedir respectiva, ou seja, alegar o facto constitutivo da situação jurídica material que pretende fazer valer em juízo, deste modo delimitando o objecto do processo (Lebre de Freitas, Código de Processo Civil Anotado, vol. 1.º, Coimbra, 1999, págs. 321 a 322).
Trata-se de um corolário do princípio do dispositivo, consagrado no artigo 264.º, do Código de Processo Civil, segundo o qual são as partes que dispõem da relação material controvertida objecto da acção, cabendo-lhes, em exclusivo, a faculdade de provocar a actuação do Tribunal, através da formulação do pedido, e de delimitar os contornos do litígio, com as alegações dos factos, deste modo proporcionando a base factual da sentença, que, nos termos do artigo 607.º, do Código de Processo Civil, só pode ter em consideração os factos alegados pelas partes.
Ora, nos termos do artigo 7.º, do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01.09, considera-se injunção a providência que tem por fim conferir força executiva a requerimento destinado a exigir o cumprimento de obrigações emergentes de contratos de valor não superior à alçada do tribunal de 1ª instância, ou das obrigações emergentes de transacções comerciais abrangidas pelo DecretoLei n.º 32/2003, de 17.02.
Como resulta depois do disposto no artigo 10.º, n.º 2, alínea d), do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01.09, no requerimento da providência de injunção deve o requerente expor sucintamente os factos que fundamentam a sua pretensão.
E de acordo com o n.º 1, do mesmo artigo 10.º, do Decreto-Lei n.º 269/98, de 01.09, salvo manifesta inadequação ao caso concreto, o requerimento de injunção deve constar de impresso de modelo aprovado por portaria do Ministério da Justiça.
Contudo, a utilização do impresso não legitima os requerentes a não efectuarem uma exposição, ainda que sucinta, da sua pretensão e dos seus fundamentos, ou seja, aqueles não ficam libertos do ónus de alegação dos factos que constituam a sua causa de pedir e fundamentam o seu pedido (neste sentido, entre outros, Acórdão do Tribunal da Relação de Guimarães, Proc. n.º 30491/18.7YIPRT.G1, de 27-06-2019, e Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa, Proc. n.º 89078/18.6YIPRT-A.L1-6, de 16-05-2019, ambos disponíveis em www.dgsi.pt..
Aliás, o próprio modelo aprovado de impresso contém um campo específico para tal, intitulado Exposição dos factos que fundamentam a pretensão, onde o requerente deve efectuar tal descrição (Salvador da Costa, A Injunção e as Conexas Acção e Execução, 1.ª ed., págs. 145 e segs.).
No caso em apreço a Autora limita-se a invocar o direito ao pagamento da quantia acima referida não se conseguindo compreender da alegação efectuada qual o contrato a que se refere, com quem foi celebrado, a data em que o mesmo foi celebrado, qual o conteúdo do mesmo e as obrigações que foram assumidas pelas partes e quais os montantes em dívida e em que data se
verificou o incumprimento. Sendo que mesmo após contraditório não se descortina qual a relação jurídica entre as partes. Em face da ausência total de alegação e em face da ininteligilidade da causa de pedir, não estamos perante uma situação de convite ao aperfeiçoamento, por se considerar que não são sanáveis as deficiências do requerimento de injunção.
De facto, foi a Autora notificada nos termos do artigo 3.º, n.º 3 do Código de Processo Civil, no sentido de se pronunciarem quanto à oposição apresentada pela Ré, tendo a Autora aproveitado para alegar os factos que não constam do requerimento de injunção. Ora, salvo o devido respeito por tese contrária, não pode um despacho em que se refere expressamente que se destina ao exercício do contraditório, ser considerado como convite ao aperfeiçoamento, nos termos e para os efeitos do artigo 590.º, nº 2 alínea b) e nº 4 do Código de Processo Civil.
Assim, não olvidando o Tribunal o disposto no artigo 186.º, n.º 3 do Código de Processo Civil face ao teor da oposição deduzida, verifica-se que o mesmo não tem aplicação no caso dos autos, já que nada se pode retirar quanto à causa de pedir alegada pela Autora, o que face à relação complexa entre as partes em causa exigiria uma alegação bastante por parte da Ré.
A Autora não alegou, assim, factos essenciais à procedência da acção, podendo fazê-lo, através da utilização, nomeadamente, do campo específico para tal e já mencionado ou, caso a situação não se revelasse adequada ao uso do impresso, utilizando um simples requerimento.
Conclui-se, deste modo, que falta a causa de pedir, na medida em que não foram alegados os factos concretos constitutivos da situação jurídica que a Autora pretende fazer valer em juízo e que determinariam a eventual procedência da acção, pelo que cumpre absolver os Réus da instância, por nulidade do processo, decorrente de ineptidão do requerimento de injunção.
Em face de todo o exposto, julgo procedente a excepção de ineptidão da petição inicial e, em consequência, declara este Tribunal nulo todo o processado absolvendo da instância os Réus, nos termos dos artigos 278.º, n.º 1, alínea b), 186.º, n.º 1 e 2 alínea a), 576.º, n.º s 1 e 2 e 577.º, alínea b) do Código de Processo Civil.
Custas pela Autora (artigo 527.º, n.º 1 e 2 do Código de Processo Civil).
Notifique e registe.(…)”.
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7. Não se conformando com o referido despacho, dele apela a autora – cfr. requerimento de recurso apresentado em 27-06-2022 - pugnando pela sua revogação e prosseguimento dos autos, tendo formulado as seguintes
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