Acórdão nº 11379/21.0T8PRT.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 2022-07-13

Ano2022
Número Acordão11379/21.0T8PRT.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Processo nº 11379/21.0T8PRT.P1
Origem: Tribunal Judicial da Comarca do Porto - Juízo do Trabalho do Porto - Juiz 1
Recorrente: ... - Sindicato ...
Recorrida: ...- Associação ...
Relatora: Teresa Sá Lopes
1º Adjunto: Desembargador António Luís Carvalhão
2ª Adjunto: Desembargadora Rita Romeira

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação do Porto

I – RELATÓRIO: (Consigna-se que se irá utilizar/transcrever o texto da primeira Relatora, na parte em que foi obtido consenso)
“A requerente, F..., Lda. pessoa coletiva n.º ..., com sede na ... Maia, ao abrigo do disposto no art. 183º e ss. do Código de Processo do Trabalho, veio intentar acção de interpretação de Convenção Colectiva de Trabalho, - em concreto, a Cláusula 82º, da CCT celebrada entre a Associação ... e o Sindicato ..., publicado no Boletim do Trabalho e do Emprego nº 10, de 15 de Março de 2010 que, após ser diversas vezes alterada, a sua actual versão consta do Boletim do Trabalho e do Emprego nº 20, de 29 de Maio de 2019 - contra os Outorgantes:
- ...- Associação ..., pessoa colectiva n.º ..., com sede na ... Porto; e
- ... - Sindicato ..., pessoa coletiva n.º ..., com sede na Rua ..., ... Lisboa, concluindo com o pedido de que seja, “proferida decisão de interpretação da Cláusula 82.ª do CCT em causa, no sentido de que a menção a “dias consecutivos” não pode ser interpretada como referindo-se apenas a “dias úteis” ou “dias de trabalho”.”.
Para o efeito, alega que face à redacção daquela Cláusula, se impõe a sua interpretação no que respeita ao sentido do termo “consecutivo” e invoca o sentido que entende a mesma deverá ser levada em consideração.
E, alega que ao longo dos anos, esta cláusula sempre foi interpretada e aplicada no sentido de os dias em causa serem dias “consecutivos” ou “seguidos” e não no sentido de serem “dias úteis” ou “dias de trabalho”, sem qualquer controvérsia até à emissão da nota técnica n.º 7 da ACT, porque era consensualmente aceite que “dias consecutivos” tinha o significado de dias seguidos ou ininterruptos (ou seja, para o que aqui interessa, incluindo dias de descanso, feriados e dias em que o trabalhador não tem obrigação de trabalhar).
Mais, alega que, após aquela nota técnica da ACT, datada de Agosto de 2018, começou a surgir a confusão e a discussão quanto ao facto de se saber se a menção a “dias consecutivos” teria o significado restritivo de “dias úteis” ou “dias de trabalho”, sendo que é esta a tese que vêm defendendo os representantes sindicais do Sindicato ... junto da aqui Autora, ou seja, de que aqueles “dias consecutivos” devem ser interpretados como referindo-se apenas a “dias úteis” ou “dias de trabalho”.
Por fim, defende que a Cláusula do CCT em questão não pode ter outro significado senão o de “dias seguidos” e não “dias úteis” ou “dias de trabalho” e invoca, para sustentar o seu entendimento, cláusulas da CCT em questão, onde, diz, se constata que são utilizadas, para diferentes situações, as expressões “dias úteis” (vg. Cláusula 38.ª, n.º 3), “dias seguidos” [vg. Cláusula 81.ª, n.º 2, alínea a)], “dias consecutivos” (Cláusula 82.ª) e “dias úteis consecutivos” (vg. Cláusulas 72.ª, alínea d) e 73.ª, n.º 6) e, ainda, que na Cláusula 68.ª do CCT, se esclarece o que são considerados dias úteis para efeitos de férias, alegando que, caso se pretendesse que os dias concedidos ao trabalhador por falecimento de um familiar se considerassem os “(…) dias úteis da semana, com exceção dos feriados e dos dias de descanso semanal (…)”, então bastaria uma simples remissão para a referida disposição.
*
Após, serem regularmente citados, nos termos do art. 184º do CPT, os outorgantes/requeridos vieram apresentar as suas alegações, respectivamente:
-A ...- Associação ..., nos termos do requerimento junto, em 18.11.2021, invoca que “a referida cláusula não é a transcrição literal do atual art.º 251º do Código do trabalho, nem as partes outorgantes do CCT pretenderam que assim fosse,” e alega que “a redação acordada entre a Associação ... e o Sindicato ..., foi a que mais se adequava a uma compreensão fácil e rápida dos leitores do CCT para conhecerem os seus direitos por morte de familiar, sem que para tal tivessem de recorrer a um profissional da área de direito”.
Mais, alega que “a expressão "dias consecutivos" quer referir-se a dias de calendário e não a dias úteis, tanto mais que quando as partes outorgantes do CCT quiseram referir-se a dias úteis assim o fizeram, como por exemplo na cl.ª 67ª e 68º do CCT com os dias de férias úteis e a majoração de férias úteis ou na cl.ª 73ª n.º 6 relativa ao gozo obrigatório de 10 dias úteis consecutivos de férias quando haja lugar a férias interpoladas ou na cl.ª 84ª n.º 5 no que diz respeito ao prazo de apresentação da justificação de falta.”.
Conclui, assim, que “a presente ação deve proceder por provada, sendo que a cláusula 82ª do CCT celebrado entre as aqui demandadas e acima identificado deverá ser interpretada como sendo dias seguidos (independentemente de serem dias úteis ou dias de trabalho ou dias de descanso).”.
*
- O ... - Sindicato ..., nos termos que constam do requerimento junto, em 23.11.2021, começa por impugnar o valor que foi atribuído à acção e, por excepção, invoca que há erro na forma de processo e, por impugnação, diz que a cláusula, em causa, estabelece o mesmíssimo regime previsto no artigo 251º do Código e alega que, não podendo a cláusula, em causa, violar normas imperativas previstas no Cód. do Trabalho, têm de se reconduzir ao ali estatuído.
Mais, alega que, quer a norma geral quer a convenção coletiva consideram que as ausências ao trabalho por motivo de falecimento de familiar são faltas.
E termina com as seguintes “CONCLUSÕES:
a) A Autora atribuiu à ação o valor de 500,00€. Ora, atento os interesses em causa na acção, o disposto no n.º 2 do Art.º 185º do C.P.T. que consagra a hipótese de recurso até ao Supremo Tribunal de Justiça, e o disposto no n.º1, do Art. 303º, do C.P.C., à ação deve ser atribuído o valor de 30.000,01€ por ser o valor correspondente à alçada da Relação e mais €0,01.
b) A norma da convenção coletiva cuja interpretação a Autora veio ao tribunal pedir através da ação especial de anulação e interpretação de cláusulas de convenções coletivas de trabalho, é uma repetição da norma legal do artigo 251º do Código do Trabalho à qual foi apenas acrescentada o teor entre parêntesis e a cuja interpretação a Autora nada requereu.
c) Razão pela qual há erro na forma de processo a que a Autora recorreu e cuja consequência é a absolvição dos réus da instância, nos termos do disposto nos arts. 278º, n.º 1 al e), 577º e 578º, todos do C.P.C.
d) O sentido de interpretação da cláusula 82ª do CCT peticionado, não só configura uma errada interpretação da norma, que versa sobre faltas, como viola várias normas legais que por se tratar de normas do Código do Trabalho imperativas se lhe sobrepõem.
e) A redação da clausula 82ª é de conteúdo material igual ao artigo 251º do CT. A clausula 82ª do CTT - Associação ... limita-se a reproduzir o artigo 251º do CT, acrescentando somente quais são parentes ou afim no 1.º grau na linha reta e os parentes ou afim na linha reta ou no 2.º grau da linha colateral, por forma a facilitar a compreensão por parte dos destinatários.
f) Sendo o regime do artigo 250º do Código do Trabalho imperativo é irrelevante a interpretação da clausula 82ª do CCT – ANIMME, já que a Autora estará sempre obrigada a aplicar aquela norma legal.
g) O que está em causa é a falta e só pode haver falta quando existe obrigação de trabalhar, não se pode conceber faltas em dias de descanso.
h) Assim, improcede a interpretação peticionada para a cláusula 82ª do CCT –Associação ... e artºs. 248º, n.º 1, 250º e 251º do Código do Trabalho.
Nestes termos e nos mais de direito que doutamente forem supridos, deverá a presente ação ser julgada improcedente por não provada, improcedendo a interpretação peticionada para a clausula 82ª do CCT – Associação ...”.
*
Oportunamente, não tendo sido requerida a produção de qualquer meio de prova, foi proferida sentença que, fixou o valor de € 30.000,01 à acção, concluiu pela improcedência da excepção de erro na forma do processo, invocada pelo Sindicato ... e, após, pronunciar-se quanto ao mérito, terminou com a seguinte: “DECISÃO:
Tudo visto e nos termos expostos julga-se a acção procedente por provada e em consequência declara-se que a cláusula 82ª do CCT celebrado entre os aqui demandados e acima identificada deverá ser interpretada como sendo dias seguidos (independentemente de serem dias úteis ou dias de trabalho ou dias de descanso).
Custas pelos demandados em igual proporção sem prejuízo da isenção de que beneficiam – cfr. art. 4º nº 1 al. f) do RCP.
Registe e notifique.”.
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Inconformado o Réu, ... - Sindicato ..., veio interpor recurso, cujas alegações terminou com as seguintes “CONCLUSÕES:
1. O sentido de interpretação da cláusula 82ª do CCT peticionado e que a sentença concede, não só configura uma errada interpretação da norma, que versa sobre faltas, como viola várias normas legais que por se tratar de normas do Código do Trabalho se lhe sobrepõem.
2. A redação da clausula 82ª é de conteúdo material igual ao artigo 251º do CT. A clausula 82ª do CTT - Associação ... limita-se a reproduzir o artigo 251º do CT, acrescentando somente quais são parentes ou afim no 1.º grau na linha reta e os parentes ou afim na linha reta ou no 2.º grau da linha colateral, por forma a facilitar a compreensão por parte dos destinatários.
3. Sendo o regime do artigo 250º do Código do Trabalho imperativo é irrelevante a interpretação da clausula 82ª do CCT – ANIMME, já que a Autora estará sempre obrigada a aplicar aquela norma legal.
4. A interpretação da clausula em apreço deveria em primeiro lugar ter sido feita no âmbito e em concordância com o conceito de “falta” e não por referência ou comparação
...

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