Acórdão nº 1112/20.0T8LOU-A.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 15-06-2022

Data de Julgamento15 Junho 2022
Ano2022
Número Acordão1112/20.0T8LOU-A.P1
ÓrgãoTribunal da Relação do Porto
Recurso de Apelação
ECLI:PT:TRP:2022: 1112.20.0T8LOU.A.P1
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Sumário:
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Acordam os Juízes da 3.ª Secção do Tribunal da Relação do Porto:

I. Relatório:
Na execução para pagamento de quantia certa em que é exequente a Banco 1..., S.A., pessoa colectiva e contribuinte fiscal n.º ..., e são executados AA, contribuinte fiscal n.º ..., BB, contribuinte fiscal n.º ..., CC, contribuinte fiscal n.º ..., e DD, contribuinte fiscal n.º ..., todos residentes em ..., Amarante, procedeu-se à citação dos executados para deduzirem oposição e decorreu o prazo legal sem que o tenham feito.
Posteriormente, a executada AA apresentou nos autos um requerimento com o seguinte conteúdo:
«AA, executada nestes autos, vem deduzir excepção dilatória insuprível inominada por falta de condição objectiva de procedibilidade nos termos que se seguem:
1. A presente execução funda-se no vencimento da obrigação de restituição das quantias mutuadas pela exequente por força dos contratos de mútuo com hipoteca celebrados melhor identificados nos autos.
2. Sucede que em 01.01.2013 entrou em vigor o Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro, que estabelece princípios e regras a observar pelas instituições de crédito na prevenção e na regularização das situações de incumprimento de contratos de crédito pelos clientes bancários e cria a rede extrajudicial de apoio a esses clientes bancários no âmbito da regularização destas situações.
3. Como se retira do seu preâmbulo, o Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10 veio instituir o Plano de Acção para o Risco de Incumprimento (PARI) e regulamentar o Procedimento Extrajudicial de Regularização de Situações de Incumprimento (PERSI), face à crise económica e financeira sentida à época.
4. Nos termos do disposto na alínea b) do n.º 1 do art.º 2º, o referido diploma legal aplica-se aos contratos de crédito garantidos por hipoteca sobre bem imóvel, como indubitavelmente é o caso dos autos.
5. Dos art.º 12º a 21º do referido diploma legal resulta a obrigatoriedade da exequente, enquanto instituição de crédito, implementar o PARI e iniciar o PERSI quanto aos mutuários, nomeadamente quanto aos aqui executados.
6. Resulta concretamente do art.º 13º do referido diploma legal que a exequente tinha a obrigação de, no prazo máximo de 15 dias após o vencimento da obrigação de informar os executados e, posteriormente integrar os executados no PERSI e, no âmbito do referido procedimento, apresentar uma ou mais propostas de regularização da situação adequada à sua capacidade financeira para reembolsar o capital, designadamente através da renegociação das condições do contrato ou da sua consolidação com outros contratos de crédito – art.º 15º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25.10.
7. Como resulta das alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 18º do referido diploma legal, entre a data de integração da executada no PERSI e a extinção deste procedimento, a exequente estava impedido de resolver o contrato de crédito e de intentar acções judiciais tendo em vista a satisfação do seu crédito.
8. Ora, a exequente não integrou os executados no PERSI, que nem sequer implementou.
9. Aliás, a exequente nem sequer alega no seu requerimento executivo a integração dos executados no PERSI.
10. Ora, tendo incumprido com essa sua obrigação de integração dos executados no PERSI, era vedado à exequente intentar a acção executiva dos autos, e até mesmo resolver o contrato de crédito, nos termos do estatuído nas alíneas a) e b) do n.º 1 do art.º 18º do Decreto-Lei n.º 227/2012.
11. Como é bom de ver, dúvidas não se colocam que a exequente não podia ter intentado a execução dos autos, pelo que a mesma tramita e persiste ilegalmente, em clara violação dos art.º 12º e seguintes e art.º 18º do Decreto-Lei n.º 227/2012, de 25 de Outubro e do art.º 726º, n.º 2 alínea b) do Cód. de Proc. Civil.
12. Face à referida omissão na alegação por parte da exequente bem como a falta de prova do cumprimento do PERSI quanto aos executados, por não juntar ao requerimento executivo quaisquer documentos comprovativos, deveria ter sido indeferido liminarmente o requerimento executivo nos termos do comando legal contido na alínea b) do n.º 2 do art.º 726º do Cód. de Proc. Civil.
13. Com efeito, dispõe o referido normativo que: “2. O juiz indefere liminarmente o requerimento executivo quando: (…) b) Ocorram excepções dilatórias, não suprível, de conhecimento oficioso;”.
14. Pois que a falta de inclusão dos executados no PERSI por parte da exequente constitui uma excepção dilatória insuprível inominada por falta de condição objectiva de procedibilidade.
[…] 17. Também a jurisprudência do STJ tem vindo a sedimentar o entendimento que a comunicação de integração no PERSI, bem como a extinção do mesmo, constituem condição de admissibilidade da acção (declarativa ou executiva), consubstanciando a sua falta uma excepção dilatória insuprível, de conhecimento oficioso, que determina a extinção da instância – ver, entre outros, Ac STJ de 13 de Abril de 2021 (Processo 1311/19.7T8ENT-B.E1.S1), Ac STJ de 19 de Maio de 2020 (Processo 6023/15.8T8OER-A.L1.S1) e Ac STJ de 19 de Maio de 2020 (Processo 4701/16.3T8MAI-A.P1.S2), todos disponíveis in www.dgsi.pt.
18. Compulsado o enquadramento jurídico e a fundamentação dos referidos arestos, cumpre concluir que a falta de integração dos executados constitui uma excepção dilatória inominada impeditiva ab initio a instauração da acção executiva, por se tratar de uma falta de condição objectiva de procedibilidade insanável.
19. E, tratando-se de uma excepção dilatória, determina o art.º 578º do Cód. de Proc. Civil que deve ser conhecida oficiosamente pelo Tribunal,
20. pois constituindo uma excepção de conhecimento oficioso, que não carece de ser invocada para ser apreciada, deverá, com o devido respeito, este Tribunal dela tomar conhecimento.
Termos em que se requer a V.Ex.ª: a) seja conhecida e decidida a excepção dilatória de conhecimento oficioso ora deduzida, b) seja declarada procedente, por provada, a invocada excepção dilatória de falta de condição objectiva de procedibilidade; c) seja os executados absolvidos da instância, declarando-se a extinção da instância.»
A exequente respondeu a este requerimento invocando, a título de questão prévia, a extemporaneidade do requerimento, defendendo que a eventual falta de integração da mutuária no PERSI não constitui uma nulidade e que a executada teria de ter invocado a falta de integração no PERSI no prazo de oposição à execução, o qual se encontrava há muito ultrapassado, constituindo a tentativa de suscitar agora esse suposto vício um ostensivo abuso de direito, por exceder manifestamente os limites impostos pela boa fé e pelo fim económico do direito invocado. De qualquer modo, ao contrário do que ela refere, integrou a mutuária no PERSI o qual foi encerrado por falta de resposta dos mutuários.
A seguir foi proferida a seguinte decisão judicial:
«A executada AA veio, depois de esgotado o prazo para deduzir embargos de executado, requerer o conhecimento oficioso de excepção dilatória inominada, traduzida em alegada falta de condição objectiva de procedibilidade, por não implementação do PERSI quanto aos executados mutuários.
A exequente respondeu, seja para invocar a extemporaneidade do suscitado, seja para contraditar a alegação de fundo da executada, sustentando que o regime PERSI foi observado e cumprido em momento prévio à interposição da execução.
Decidindo:
As excepções dilatórias são fundamento de embargos de executado, nos termos dos arts. 729.º e 731.º do NCPC, de tal forma que será essa a sede própria principal para o executado suscitar o conhecimento por parte do tribunal.
De qualquer modo, como resulta dos arts. 726.º, n.º 2, al. b), e 734.º, n.º 1, do NCPC, mesmo não sendo deduzidos embargos de executado, o juiz pode, até à transmissão de bens, conhecer oficiosamente do que poderia ter determinado o indeferimento liminar do requerimento executivo, ou seja, entre o mais, pode conhecer de excepções dilatórias insupríveis que sejam de conhecimento oficioso.
No entanto, como decorre dos aludidos preceitos legais, a possibilidade de, ultrapassada a fase da apreciação liminar do requerimento executivo e dos embargos de executado, serem conhecidas excepções dilatórias (ou outras questões) apenas se verifica quando o juiz, efectuando uma reapreciação do requerimento/título executivo (ou apreciação, no caso de execução sumária em que não tenha havido despacho liminar), verifique alguma excepção que devesse ter implicado o indeferimento liminar do requerimento executivo, sem que caiba, numa fase posterior/avançada da execução, inserir um incidente declarativo, incluindo com produção de prova, para que as partes suscitem a verificação de excepções dilatórias, sob pena de tal corresponder a um prolongamento potencial desproporcionado da fase de oposição à execução. De facto, se o juiz, fora do incidente de embargos e após a fase liminar da execução, (só) pode conhecer de questões que poderiam ter determinado, se apreciadas nos termos do art. 726.º do NCPC, o indeferimento liminar do requerimento executivo, como decorre do disposto no art. 734.º do NCPC, tal implica que a apreciação do juiz se tenha de limitar ao que poderia ter conhecido na fase liminar da execução (no despacho liminar efectivamente proferido, no caso de execuções na forma ordinária, ou no despacho que, a existir, seria proferido, no caso de execuções na forma sumária), onde não há lugar a defesa/oposição prévia por parte do executado.
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