Acórdão nº 1074/19.6T8FLG.P1 de Tribunal da Relação do Porto, 24-11-2022
Data de Julgamento | 24 Novembro 2022 |
Ano | 2022 |
Número Acordão | 1074/19.6T8FLG.P1 |
Órgão | Tribunal da Relação do Porto |
Proc. n.º 1074/19.6T8FLG.P1
Sumário.
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1). Relatório.
AA, residente na Rua ..., ..., ..., ...,
BB, residente na Rua ..., ..., ...,
Propuseram contra
Índice G..., S. A., com sede no Lugar ..., Monção
Ação especial de divisão de coisa comum pedindo que se declare a indivisibilidade do imóvel identificado no artigo 1.º da petição inicial e se proceda à adjudicação do bem a um dos proprietários, mediante pagamento de tornas aos restantes, ou à venda do imóvel, com repartição do valor pelos mesmos.
Alegaram em síntese, que são comproprietários do prédio urbano, correspondente a terreno para construção sito no Lugar ..., ..., ..., inscrito na respetiva matriz predial urbana daquela freguesia sob o artigo ..., descrito na C. R. P. ... sob o n.º ..., ..., na proporção de 1/3 a favor de cada um dos Autores e Réu.
Tal prédio não é passível de divisão por constar de um único artigo.
O perito nomeado concluiu pela divisibilidade em substância do prédio em causa nos autos através de uma operação de loteamento e subsequente constituição de três lotes.
Inconformado, recorre a Ré, formulando as seguintes conclusões:
«1) A douta sentença em sindicância deve ser revogada, porque entendeu quanto à divisibilidade em substância ou indivisibilidade do prédio que “…, a divisão em substância impossibilitaria uma repartição “igualitária” na medida das respetivas proporções entre os proprietários atenta a configuração e demais características de cada um dos lotes a constituir, e de se formarem quinhões na proporção da quota de cada proprietário, havendo necessidade de haver lugar a tornas.”;
2) Previamente, deve ser alterada A MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA no facto 13 da sentença, com a redação: “Inexiste, à presente data, qualquer operação de licenciamento de loteamento referente ao prédio referido em 1) aprovado”, dando-se como não provado;
3) Efetivamente, do cotejo da redação dado aos factos 5), 8) e 13) dados como assentes, quanto à fundamentação destes factos, o tribunal socorre-se de uma operação de loteamento, mas quanto ao facto 13 dá como assente que não existe nenhum projeto de licenciamento aprovado.
4) Ora, a operação de loteamento que permite a divisão do prédio em abstrato em 3 parcelas não pode servir para, ao mesmo tempo, considerar a divisão do prédio impossível, em concreto ou substância, por não permitir quinhões igualitários, para os seus três proprietários.
5) Se o tribunal de primeira instância entendia que faltava saber se a operação de loteamento, se mantinha válida ou as partes, estavam interessadas na sua concretização, sempre deveria ter notificado para aperfeiçoamento dos articulados, e, sendo a exceção suprível, devia ter feito atuar os mecanismos do art.º 6.º, n.º 2 e 590.º, n.º 2, alínea a, b) e c), ex vi art.º 549.º, n.º 1 todos do CPC.
6) É caso para se dizer que, como se refere na nota 5.º de O Código de Processo Civil Anotado, Volume II, Processo de Execução, Processos especiais e Processo de Inventário Judicial, de António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, – art.ºs 703.º a 1139.º, Edição Almedina, página 368.º. “O “prudente arbítrio” do julgador referido no n.º 3 tem de ser entendido como pressuposto do uma apreciação jurisdicional não arbitrária, embora submetida a critérios de conveniência e de oportunidade que estão na sua base, sempre em função da realização dos fins do processo (a justa composição do litígio com respeito pelos direitos e garantias processuais das partes).”.
7) Ademais, em reforço desta incongruência, importa salientar que o tribunal dá como provado o facto 8), qual seja: “Os lotes a constituir nos termos referidos em 5) apresentam áreas idênticas e a mesma capacidade construtiva”, com fundamento na mesma operação de loteamento resultante do juízo pericial.
8) Pelo exposto, o Tribunal a quo, ao entrar em contradição na fundamentação destes factos e na aplicação do direito respetivo cometeu uma ambiguidade ou obscuridade que torna a decisão ininteligível atento plasmado nos art.ºs 615.º, n.º 1, c) do CPC tornam a sentença nula, o que se requer.
9) Sem prescindir, quanto ao direito, resulta que o tribunal decidiu o pleito de acordo com o critério de que a (in) divisibilidade de uma coisa comum tem ainda de ser aferida em função da quota-parte de cada um dos proprietários.
10) Nas palavras de Luís Filipe Pires de Sousa, Processos Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas, Editora Almedina, Ano 2107, páginas 32, 33 e 34, “…, se os comproprietários, não puderem ser todos eles contemplados com frações ou quinhões do imóvel constitutivos de novos prédios, o imóvel terá de ser considerado indivisível.”.
11) No entanto, no caso concreto não podemos concordar com este critério, tal como preconizado nas objeções aduzidas pelo autor sobredito à orientação jurisprudencial supra.
12) Efetivamente, transcrevendo-se o que alude o citado Autor a propósito, “... Salvo o devido respeito, não temos este critério como irrepreensível. Há que não confundir divisão com o conceito de divisibilidade. Divisão significa o cessar da compropriedade pela concentração do direito de cada consorte num objeto determinado e privativo (parte da coisa ou do seu valor). Divisibilidade consiste na possibilidade de fracionamento da coisa sem que as partes daí provenientes percam a essência da coisa dividida, diminuam o seu valor ou vejam alterada a sua função económico-social. O preenchimento de cada quinhão coloca uma questão de divisão e não de divisibilidade. A questão da (in)divisibilidade afere-se em função dos critérios veiculados pelo artigo 209º do Código Civil e outras normas imperativas (como veremos), nela não interferindo a possibilidade de todos os interessados verem a sua quota satisfeita e integrada por uma fração do primitivo prédio. Não devemos esquecer o carácter instrumental do direito processual que não define direitos ou interesses dos particulares mas apenas fornece os instrumentos jurisdicionais para a sua proteção. Não cabe ao processo civil a função de atribuir e, muito menos, de retirar direitos. Estamos em sede de direitos disponíveis, podendo o comproprietário renunciar válida e eficazmente ao seu direito, não dependendo a renúncia do consentimento dos outros comproprietários. A renúncia abdicativa tem como efeito a...
Sumário.
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1). Relatório.
AA, residente na Rua ..., ..., ..., ...,
BB, residente na Rua ..., ..., ...,
Propuseram contra
Índice G..., S. A., com sede no Lugar ..., Monção
Ação especial de divisão de coisa comum pedindo que se declare a indivisibilidade do imóvel identificado no artigo 1.º da petição inicial e se proceda à adjudicação do bem a um dos proprietários, mediante pagamento de tornas aos restantes, ou à venda do imóvel, com repartição do valor pelos mesmos.
Alegaram em síntese, que são comproprietários do prédio urbano, correspondente a terreno para construção sito no Lugar ..., ..., ..., inscrito na respetiva matriz predial urbana daquela freguesia sob o artigo ..., descrito na C. R. P. ... sob o n.º ..., ..., na proporção de 1/3 a favor de cada um dos Autores e Réu.
Tal prédio não é passível de divisão por constar de um único artigo.
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A Ré contestou, alegando que o prédio em causa é divisível através da realização de operação de loteamento, concluindo pela sua divisão em conformidade e adjudicação do respetivo quinhão a cada um dos comproprietários.*
Entendeu-se que o litígio assenta somente na questão da divisibilidade ou indivisibilidade, tendo sido ordenada a realização de perícia.O perito nomeado concluiu pela divisibilidade em substância do prédio em causa nos autos através de uma operação de loteamento e subsequente constituição de três lotes.
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Foi proferida decisão que fixou as quotas para os comproprietários em 1/3 para cada e declarou o prédio indivisível, determinando o prosseguimento dos autos nos termos previstos no artigo 929.º, n.º 2, do C. P. C..Inconformado, recorre a Ré, formulando as seguintes conclusões:
«1) A douta sentença em sindicância deve ser revogada, porque entendeu quanto à divisibilidade em substância ou indivisibilidade do prédio que “…, a divisão em substância impossibilitaria uma repartição “igualitária” na medida das respetivas proporções entre os proprietários atenta a configuração e demais características de cada um dos lotes a constituir, e de se formarem quinhões na proporção da quota de cada proprietário, havendo necessidade de haver lugar a tornas.”;
2) Previamente, deve ser alterada A MATÉRIA DE FACTO DADA COMO PROVADA no facto 13 da sentença, com a redação: “Inexiste, à presente data, qualquer operação de licenciamento de loteamento referente ao prédio referido em 1) aprovado”, dando-se como não provado;
3) Efetivamente, do cotejo da redação dado aos factos 5), 8) e 13) dados como assentes, quanto à fundamentação destes factos, o tribunal socorre-se de uma operação de loteamento, mas quanto ao facto 13 dá como assente que não existe nenhum projeto de licenciamento aprovado.
4) Ora, a operação de loteamento que permite a divisão do prédio em abstrato em 3 parcelas não pode servir para, ao mesmo tempo, considerar a divisão do prédio impossível, em concreto ou substância, por não permitir quinhões igualitários, para os seus três proprietários.
5) Se o tribunal de primeira instância entendia que faltava saber se a operação de loteamento, se mantinha válida ou as partes, estavam interessadas na sua concretização, sempre deveria ter notificado para aperfeiçoamento dos articulados, e, sendo a exceção suprível, devia ter feito atuar os mecanismos do art.º 6.º, n.º 2 e 590.º, n.º 2, alínea a, b) e c), ex vi art.º 549.º, n.º 1 todos do CPC.
6) É caso para se dizer que, como se refere na nota 5.º de O Código de Processo Civil Anotado, Volume II, Processo de Execução, Processos especiais e Processo de Inventário Judicial, de António Santos Abrantes Geraldes, Paulo Pimenta e Luís Filipe Pires de Sousa, – art.ºs 703.º a 1139.º, Edição Almedina, página 368.º. “O “prudente arbítrio” do julgador referido no n.º 3 tem de ser entendido como pressuposto do uma apreciação jurisdicional não arbitrária, embora submetida a critérios de conveniência e de oportunidade que estão na sua base, sempre em função da realização dos fins do processo (a justa composição do litígio com respeito pelos direitos e garantias processuais das partes).”.
7) Ademais, em reforço desta incongruência, importa salientar que o tribunal dá como provado o facto 8), qual seja: “Os lotes a constituir nos termos referidos em 5) apresentam áreas idênticas e a mesma capacidade construtiva”, com fundamento na mesma operação de loteamento resultante do juízo pericial.
8) Pelo exposto, o Tribunal a quo, ao entrar em contradição na fundamentação destes factos e na aplicação do direito respetivo cometeu uma ambiguidade ou obscuridade que torna a decisão ininteligível atento plasmado nos art.ºs 615.º, n.º 1, c) do CPC tornam a sentença nula, o que se requer.
9) Sem prescindir, quanto ao direito, resulta que o tribunal decidiu o pleito de acordo com o critério de que a (in) divisibilidade de uma coisa comum tem ainda de ser aferida em função da quota-parte de cada um dos proprietários.
10) Nas palavras de Luís Filipe Pires de Sousa, Processos Especiais de Divisão de Coisa Comum e de Prestação de Contas, Editora Almedina, Ano 2107, páginas 32, 33 e 34, “…, se os comproprietários, não puderem ser todos eles contemplados com frações ou quinhões do imóvel constitutivos de novos prédios, o imóvel terá de ser considerado indivisível.”.
11) No entanto, no caso concreto não podemos concordar com este critério, tal como preconizado nas objeções aduzidas pelo autor sobredito à orientação jurisprudencial supra.
12) Efetivamente, transcrevendo-se o que alude o citado Autor a propósito, “... Salvo o devido respeito, não temos este critério como irrepreensível. Há que não confundir divisão com o conceito de divisibilidade. Divisão significa o cessar da compropriedade pela concentração do direito de cada consorte num objeto determinado e privativo (parte da coisa ou do seu valor). Divisibilidade consiste na possibilidade de fracionamento da coisa sem que as partes daí provenientes percam a essência da coisa dividida, diminuam o seu valor ou vejam alterada a sua função económico-social. O preenchimento de cada quinhão coloca uma questão de divisão e não de divisibilidade. A questão da (in)divisibilidade afere-se em função dos critérios veiculados pelo artigo 209º do Código Civil e outras normas imperativas (como veremos), nela não interferindo a possibilidade de todos os interessados verem a sua quota satisfeita e integrada por uma fração do primitivo prédio. Não devemos esquecer o carácter instrumental do direito processual que não define direitos ou interesses dos particulares mas apenas fornece os instrumentos jurisdicionais para a sua proteção. Não cabe ao processo civil a função de atribuir e, muito menos, de retirar direitos. Estamos em sede de direitos disponíveis, podendo o comproprietário renunciar válida e eficazmente ao seu direito, não dependendo a renúncia do consentimento dos outros comproprietários. A renúncia abdicativa tem como efeito a...
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