Acórdão nº 107/17.5BCLSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 2022-03-10

Ano2022
Número Acordão107/17.5BCLSB
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Sul
Acordam, em conferência, os Juízes que compõem a 1ª Subsecção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Sul

I – Relatório

R... SUCURSAL EM PORTUGAL, veio impugnar a decisão arbitral proferida no processo n.° 758/2016-T, que julgou procedente a excepção de incompetência absoluta do Tribunal Arbitral e absolveu a Entidade Demandada da instância, no que respeita ao pedido de declaração de ilegalidade do despacho proferido pelo Director de Finanças de Lisboa no segmento em que indeferiu, por extemporaneidade, a reclamação graciosa apresentada tendo por objecto a anulação das autoliquidações de Imposto Único de Circulação, identificadas nos autos (Doc n.° 7) e respectivos juros compensatórios, no montante total de € 3 305,05.

Foi admitida a impugnação, a subir em separado, e determinada a sua remessa a este TCAS.

A impugnante formulou as seguintes conclusões:

« 1. Esta Impugnação de decisão arbitral fundamenta-se, desde logo, na não especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão (artigo 28.º nº 1 a) do RJAT).

2. A fls. 8 da decisão arbitral refere-se que "50 - Tendo em conta a prova documental junta aos autos, e a informação inscrita no processo administrativo tributário, cumpre agora apresentar a matéria factual relevante para a compreensão da decisão, tal como se fixa nos termos abaixo mencionados.”.

3. Não obstante, não se vislumbra na decisão arbitral a fixação de qualquer matéria de facto provada/assente.

4. Ou seja, não foi feito qualquer julgamento da matéria de facto, provada ou não provada.

5. Por conseguinte, a decisão arbitral aqui impugnada é nula por omissão da respectiva fundamentação de facto, nos termos dos artigos 12 5º nº 1 do CPPT (ex vi do artigo 29º nº 1 a) do RJAT, 615º nº 1 b) e nº 4 do CPC (ex vi do artigo 29º nº 1 e) do RJAT).

6. Com a efeito, a decisão arbitral aqui impugnada, ao não discriminar minimamente a matéria de facto provada e/ou não provada relevante para a decisão, violou os artigos 123º nº 2 do CPPT, 94º nº 2, 3 e 4 do CPTA (ex vi do artigo 29º nº 1 c) do RJAT) e 607º nº 3, 4 e 5 do CPC.

Quanto à oposição dos fundamentos com a decisão

7. Esta Impugnação de decisão arbitral fundamenta-se também na oposição dos fundamentos com a decisão (artigo 28º nº 1 b) do RJAT).

8. Com efeito, a fls. 8 da decisão arbitral é afirmado inequivocamente que "47 — O Tribunal Arbitral encontra-se regularmente constituído e é competente para apreciar o caso, à luz do disposto na alínea a) do nº 1, do artigo 2º do Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro.".

9. Contudo, a mesma decisão arbitral concluiu a final que o Tribunal Arbitral era materialmente incompetente para julgar o pedido de pronúncia arbitral, precisamente à luz do disposto na mesma alínea a) do n.º 1 do artigo 2º do RJAT.

10. Ou seja, o Tribunal Arbitral concluiu em sentido diametralmente oposto àquele que pressupôs.

11. Por conseguinte, a decisão arbitral é nula por oposição dos fundamentos com a decisão, nos termos dos artigos 125º nº 1 do CPPT e 615º nº 1 c) e nº 4 do CPC.

Quanto à violação do princípio do contraditório

12. Finalmente, esta Impugnação de decisão arbitral fundamenta-se igualmente na violação do princípio do contraditório (artigo 28º nº 1 d) do RJAT).

13. Como se afirma na decisão arbitral em apreço, a excepção da incompetência em razão da matéria (incompetência absoluta) constitui uma excepção dilatória de conhecimento oficioso.

14. Sendo certo que a contraparte. a Requerida/AT, não arguiu essa excepção - a incompetência do tribunal arbitral em razão da matéria.

15. Com efeito, a Requerida/AT apenas excepcionou a intempestividade parcial do pedido de pronúncia arbitral, com base na extemporaneidade parcial da antecedente reclamação graciosa - "parcial", porque estavam em causa várias autoliquidações de IUC e a DF de Lisboa considerou a reclamação intempestiva apenas relativamente a algumas delas, conforme despacho de indeferimento parcial dessa mesma reclamação graciosa.

16. Tendo a Impugnante/Requerente exercido o seu direito de resposta contra essa concreta excepção suscitada pela Requerida/AT, conforme resulta também do processo arbitral.

17. Para além disso, conforme se afirma a fls. 2 da decisão arbitral, "5 - No dia 05 de Junho de 2017, o Tribunal Arbitral, ao abrigo do artº 16º, alínea c) do RJAT (Decreto-Lei nº 10/2011, de 20 de Janeiro), e tendo e conta o teor do despacho proferido em 21 de Maio de 2017, considerou dispensada a realização da reunião prevista no artigo 18º do referido diploma legal".

18. fixando, desde logo, a data de prolacão da decisão arbitral final, conforme resulta desse mesmo despacho.

19. Note-se que, tal como resulta do processo arbitral, à data da prolação daquele despacho arbitral de 21.05.2017, ninguém - nem a Requerida/AT, tão o pouco o tribunal arbitral - haviam sequer aflorado a eventual excepção dilatória da incompetência material do tribunal arbitral para conhecer do mérito do pedido de pronúncia arbitral.

20. Por isso, e uma vez que a Impugnante/Requerente já se havia pronunciado sobre a concreta excepção suscitada pela Requerida/AT - a extemporaneidade parcial do pedido de pronúncia arbitral, por intempestividade parcial da antecedente reclamação graciosa a Impugnante/Requerente não se opôs àquela dispensa da reunião prevista no artigo 18º do RJAT.

21. Contudo, a Impugnante/Requerente estava longe de pensar que estava igualmente em causa a excepção dilatória da incompetência do tribunal em razão da matéria - pela simples razão, como se disse, de que a mesma nunca havia sido suscitada, nem pela contraparte, nem oficiosamente pelo Tribunal Arbitral.

22. Com efeito, a Impugnante/Requerente apenas foi confrontada com essa excepção dilatória - incompetência do tribunal arbitral em razão da matéria - na própria decisão arbitral.

23. Tudo conforme resulta do processo arbitral.

24. Sendo certo que aquela excepção dilatória da incompetência absoluta do tribunal arbitral em razão da matéria foi suscitada oficiosamente pelo próprio tribunal arbitral, conforme se afirma na decisão arbitral em apreço.

25. E só foi suscitada (oficiosamente) na própria decisão arbitral, conforme resulta dos sinais dos autos arbitrals.

26. Por conseguinte, e porque ninguém (partes ou tribunal arbitral), à data, tinha suscitado a questão da excepção dilatória da incompetência material do Tribunal Arbitral, obviamente que a decisão arbitral aqui impugnada constituiu uma verdadeira decisão supresa.

27. Com efeito, tal como resulta do processo arbitral, nunca foi dada à Impugnante/Requerente a oportunidade desta se pronunciar previamente sobre essa concreta excepção dilatória - incompetência do tribunal arbitral em razão da matéria para se pronunciar sobre o pedido de pronúncia arbitral, com a consequente absolvição da Requerida/AT da instância.

28. Entre outras finalidades, a reunião prevista no artigo 18º do RJAT (Primeira reunião do tribunal arbitral), segundo o respectivo nº 1 b), tem por objectivo o seguinte: "1 — Apresentada a resposta, o tribunal arbitral promove uma primeira reunião com as partes para: (...) b) Ouvir as partes quanto a eventuais excepções que seja necessário apreciar e decidir antes de conhecer do pedido (...).

29. Ora, se o Tribuna! Arbitral cogitava suscitar e decidir, oficiosamente, que era incompetente em razão da matéria, impunha-se que ouvisse previamente a Impugnante/Requerente a esse propósito - antes da prolação da decisão arbitral final.

30. O que não sucedeu, conforme resulta do processo arbitral.

31. Com efeito, a isso obrigava o princípio do contraditório, consignado nos artigos 16º a) e 18º nº 1 b) do RJ AT, e 3º nº 3 do CPC.

32. De facto, tal como estipula este artigo 3º nº 3 do CPC, ex vi do artigo 29º nº 1 e) do RJAT, "O juiz deve observar e fazer cumprir, ao longo de todo o processo, o princípio do contraditório, não lhe sendo lícito, salvo caso de manifesta desnecessidade, decidir questões de direito ou de facto, mesmo que de conhecimento oficioso, sem que as partes tenham tido a possibilidade de sobre elas se pronunciarem.".

33. O que não sucedeu in casu, relativamente à excepção dilatória da incompetência absoluta do Tribunal Arbitral em razão da matéria.

34. Assim, a decisão arbitral em apreço violou o princípio do contraditório, nos termos em que este está consignado na alínea a) do artigo 16º do RJAT: "Constituem princípios do processo arbitral: a) O contraditório, assegurado, designadamente, através da faculdade conferida às partes de se pronunciarem sobre quaisquer questões de facto ou de direito suscitadas no processo;".

35. Por conseguinte, a decisão arbitral aqui impugnada é igualmente nula por violação do princípio do contraditório, conforme resulta do disposto nos artigos 16º a), 18º nº 1 b) e 28º nº 1 d) do RJAT, e 3º nº 3 do CPC. »

Termina, pedindo que se conceda provimento à impugnação declarando a nulidade da decisão arbitral.

Admitida a impugnação foi notificada a Autoridade Tributária e Aduaneira para responder, tendo apresentado o seu articulado de resposta, nos seguintes termos conclusivos:


«A

A impugnante não tem qualquer razão nos fundamentos que invoca, sendo claro que a decisão arbitral objecto de recurso não padece dos alegados vícios de não especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão, de oposição dos fundamentos com a decisão e violação do princípio do contraditório.

B

Aliás, o que a impugnante realmente impugna - não o podendo fazer é o sentido da decisão arbitral, procurando, de alguma maneira, para atingir este objectivo, identificar os vícios típicos que poderiam justificar, face à lei, a possibilidade de impugnação da decisão.

C

Não existe o vício de não especificação dos fundamentos de facto que justificam a decisão, porquanto o Tribunal na fundamentação da sua decisão, na qual o Tribunal Arbitral se declara incompetente em razão da matéria, consta de...

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