Acórdão nº 104/19.6GAMSF-A.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10-07-2023

Data de Julgamento10 Julho 2023
Ano2023
Número Acordão104/19.6GAMSF-A.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam, em conferência, os Juízes na Secção Penal do Tribunal da Relação de Guimarães.

I. Relatório

1.

A Ex.ma Senhora Juiz de Direito AA, a exercer funções no Juízo Local Criminal ..., veio requerer ao abrigo do disposto no art.43º, nº1,2 e 4, do CPP, que lhe seja concedida escusa de intervenção no processo comum com intervenção de tribunal singular, com o nº 104/19.6GAMSF, no qual preside à realização da audiência de julgamento.

Alegou, para o efeito (transcrição):
“1. Presido à audiência de julgamento no âmbito do processo comum singular n.° 104/19.6GAMSF.
2. O crime em causa é um crime público: crime de homicídio por negligência, p. e p. pelos artigos 15.°, 137.°, nº1 e 69.°, n.°1, alínea a) do Código Penal.
3. A primeira sessão da audiência de julgamento teve lugar no dia 23 de Maio de 2023, com duração de todo o dia.
4. A segunda sessão teve lugar no dia 16 de Junho de 2023, com duração de todo o dia.
5. Ainda não terminou a produção de prova.
6. Foi ouvida a arguida.
7. Das dezassete testemunhas arroladas, foram ouvidas quatro.
8. Ao longo das duas sessões da audiência de julgamento, o Il. Mandatário dos Assistentes coloca questões à arguida e testemunhas que, na parte criminal, tendo por base o objecto do processo e a razão de ciência da testemunha, são objectivamente repetidas (uma vez que já foram colocadas por mim — no caso da arguida — ou pelo Ministério Público), impertinentes e dilatórias.
9. Quando tal acontece, ao abrigo do poder de direcção da audiência de julgamento, o mesmo é advertido que tal questão — por ser repetida ou não ter interesse para o objecto do processo — não é permitida.
10. Desde a primeira sessão da audiência de julgamento, quando tal acontece, o II. Mandatário dos Assistentes lavra “protesto” — apesar de não ser este o âmbito do direito ao protesto previsto no art.° 80.° do Estatuto da Ordem dos Advogados, uma vez que o mesmo não foi impedido de fazer qualquer requerimento —, não lhe sendo feita qualquer objecção.
11. Tais “protestos” não foram, até agora, transcritos para a acta, uma vez que ia usar da faculdade permitida pelo art.º 362.°. n.° 2 do CPP.
12. Ao todo foram feitos quatro “protestos”.
13. Os três primeiros “protestos”, apesar de qualificarem a minha forma de dirigir a audiência de julgamento “inadmissível numa democracia e num estado de direito democrático”, permitiram, a meu ver, continuar a audiência de julgamento, sem que a presidência da mesma fosse posta em causa.
14. No entanto, no quarto e último “protesto” o Il. Mandatário dos Assistentes subiu o “tom”.
15. Aí refere que tento impedir o “ testemunho das pessoas que têm conhecimento directo e pessoal (...) que não é admissível no estado de direito democrático”, que o que faço são “medidas coercivas e persecutórias no sentido de ocultar as respostas das testemunhas que têm conhecimento sobre os factos”, que estou a “tentar ocultar prova” e “deixar a mentira prevalecer”.
16. Refere que, desde o início da audiência, tento “calar o mandatário dos assistentes e determinados factos que são fundamentais para o apuramento das circunstâncias que envolvem o acidente”.
17. Devo esclarecer que as minhas advertências são apenas feitas relativamente às questões colocadas na matéria criminal. Nenhuma advertência foi feita no que diz respeito à matéria do pedido de indemnização civil.
18. Pois bem.
19. Em face do acima exposto, sou de opinião que não tenho condições para continuar a presidir a audiência de julgamento.
20. Caso absolva a arguida, a decisão que profira nos presentes autos será vista com desconfiança quanto à sua imparcialidade.
21. Designadamente, entender-se-á como severidade, ou antipatia pessoal face ao II. Mandatário dos Assistentes, e que estarei a fazer uma perseguição a esta pessoa, independentemente de eventual recurso.
22. Caso a condene, tal decisão será vista como proferida por medo que o Il. Mandatário dos Assistentes faça queixa da minha pessoa e que cedi a determinada coacção.
23. Em conclusão, entendo que, face ao desenrolar dos acontecimentos, existe grave inconveniente que os autos continuem a ser por mim julgados.
Termos em que requeiro a V.ª Ex.ª que defira o meu pedido de escusa de tramitação e decisão dos presentes autos”.

2.
O pedido de escusa foi instruído com cópia e certidão das peças processuais atinentes ao incidente suscitado, não se tornando...

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