Acórdão nº 10312/22.7T8LSB.L1-7 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2023-04-18

Data de Julgamento18 Abril 2023
Ano2023
Número Acordão10312/22.7T8LSB.L1-7
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Acordam os Juízes na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa:

I- RELATÓRIO
A intentou a presente ação de condenação, em processo declarativo comum, contra B , pedindo a condenação desta a pagar-lhe a quantia de €7.293,58.
Alega, para tanto, que celebraram três contratos de prestação de bens e serviços de telecomunicações, tendo a A., no âmbito de tais contratos, prestado à R. os serviços contratados, emitindo e remetendo as respetivas faturas, que esta não liquidou.
Mais alega que a R. se vinculou a manter os três contratos pelo período
de 24 meses, o que não cumpriu, pelo que está obrigada a indemnizar a A..
Por fim alega ter tido despesas com as tentativas de cobrança da divida.
A R., citada, não contestou, tendo sido julgados por confessados os factos alegados pela A., nos termos do Art. 567.º n.º 1 do C.P.C..
Cumprido o disposto no n.º 2 do citado preceito legal, foram apresentadas alegações pela A., que concluiu pela procedência da ação.
Na sequência foi proferida sentença que julgou a ação parcialmente procedente por provada, condenando a R., F… Lda., a pagar à A., N…, S.A., a quantia de €577,05, acrescida dos respetivos juros de mora vencidos desde a data de vencimento de cada uma das faturas até 22.04.2022, contabilizados à taxa comercial sucessivamente em vigor, e absolvendo a R. do demais peticionado.
É dessa sentença que a A. vem agora interpor recurso de apelação, apresentando no final das suas alegações as seguintes conclusões:
1. A decisão recorrida absolveu dos valores de indemnização por incumprimento contratual: “Deverá… a ré ser absolvida do pagamento à autora dos valores peticionados de €4.523,35, €734.79 e €739.80.”.
2. Salvo, porém, o devido respeito, tendo a sentença recorrida declarado que “… a validade da cláusula penal em apreço está dependente da mesma ter como contrapartida um benefício concedido ao consumidor, tal como expressamente previsto no artigo 48.º da Lei n.º 5/2004.”, resulta óbvio que, pelo facto da Ré não ser um consumidor, mas de pessoa coletiva, que celebrou os três contratos em causa nos autos no âmbito da sua atividade, tal pressuposto da sentença não se verifica.
3. Refira-se, ainda, que as partes podem, ao abrigo do princípio da liberdade contratual e nos termos do art.º 810º n.º 1 do CC, fixar, por acordo, o montante da indemnização exigível (cláusula penal), a qual não terá de corresponder, na íntegra, a vantagens efetivas, tendo em conta as funções ressarcidora e coercitiva que poderá assumir.
4. E é, precisamente, por não se tratarem de cláusulas desproporcionais ou nulas, que a Recorrida, citada na ação, não a contestou - o que não seria expectável, caso se tivesse vinculado pelos contratos a cláusulas penais a que não correspondessem vantagens efetivas.
5. Vantagens essas que, apesar de não ter sido contestadas, ficou demonstrado nos autos que existiam - pela junção dos contratos e faturas em dívida de onde, expressamente, consta a indicação de descontos nas mensalidades.
De tudo quanto ficou exposto, resulta que, a decisão recorrida violou a lei substantiva, nomeadamente, os art.ºs 405º e 810º, ambos do CC, e o art.º 48 da Lei 5/2004, de 10.02.
Pede assim que seja dado provimento ao recurso e que a sentença seja revogada e substituída por decisão que julgue procedente o pedido na parte relativa às cláusulas penais.
Não foram apresentadas contra-alegações pelo Recorrido.
*
II- QUESTÕES A DECIDIR
Nos termos dos Art.s 635º, n.º 4 e 639º, n.º 1 do C.P.C., as conclusões delimitam a esfera de atuação do tribunal ad quem, exercendo uma função semelhante à do pedido na petição inicial (vide: Abrantes Geraldes in “Recursos no Novo Código de Processo Civil”, Almedina, 2017, pág. 105 a 106).
Assim, em termos sucintos, a questão essencial a decidir é de saber se é devida a indemnização contratual penal, convencionada entre as partes, relativa ao período de fidelização dos contratos de prestação de serviços de telecomunicações a que os autos se reportam.
Corridos que se mostram os vistos, cumpre decidir.
*
III- FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO
A sentença sob recurso não discriminou a factualidade que julgou por provada, limitando-se a deixar consignado que julgou por provados os factos alegados na petição inicial, dando-os por reproduzidos por remissão para esse articulado.
Importa assim ter em consideração que a A. alegou na petição inicial o seguinte:
1. Entre A. e R. foram celebrados três contratos para prestação de bens e serviços de telecomunicações:
- contrato de 21.09.2021, a que foi atribuído o número de conta cliente/contrato 1.70442328;
- contrato de 11.10.2021, a que foi atribuído o número de conta cliente/contrato 961017049;
- contrato de 19.10.2021, a que foi atribuído o número de conta cliente/contrato 961116075 - (cfr. artigo 1.º da petição inicial).
A) Sobre o contrato 1.70442328
2. Entre A. e R. foi celebrado, no dia 21.09.2021, um contrato para prestação de bens e serviços de telecomunicações, a que foi atribuído o número de conta cliente /contrato 1.70442328- (cfr. artigo 2.º da petição inicial).
3. No âmbito do contrato, solicitou a R, à A. a prestação dos seguintes serviços:
1 Plano Mobilidade Sem Limites Max
3 Plano Mobilidade
1 Mens Internet P Mobilidade
2 Mens Web Segura Movel,
mediante pagamento de uma mensalidade de €97,50 acrescidos de IVA, nos demais termos constantes da proposta contratual, cuja cópia se junta e cujo teor se dá aqui por integralmente reproduzido para os devidos efeitos - cfr. doc. 1- (cfr. artigo 3.º da petição inicial).
4. Como contrapartida do fornecimento dos serviços e das demais ofertas contratuais, assumiu o R. a obrigação de proceder ao pagamento tempestivo das faturas e manter o contrato pelo período de 24 meses (vg. período de permanência) - (cfr. artigo 4.º da petição inicial).
5. Mais, convencionaram as partes que, em caso de incumprimento do período de permanência, seria devido pelo R. um valor indemnizatório, a título de cláusula penal, de igual valor ao das mensalidades em falta - cfr. doc. 1, cláusula 14 das condições gerais- (cfr. artigo 5.º da petição inicial).
6. Após a celebração do contrato a A. iniciou a prestação dos serviços, emitindo, mensalmente, as faturas correspondentes, todas enviadas à R. e sem que nenhuma tivesse sido devolvida ou a R. tenha apresentado qualquer reclamação- (cfr. artigo 6.º da petição inicial).
7. Pelo facto da R. não ter pago as faturas, apesar de interpelada para o efeito, a A. suspendeu os serviços em 10.01.2022; e em 05.02.2022, depois de ter interpelado a R. para o efeito (cfr. doc. 2), rescindiu o contrato por perda de interesse na sua manutenção e reclamou da R. o valor da cláusula penal contratual, determinada pelo valor das mensalidades até final do período de permanência- (cfr. artigo 7.º da petição inicial).
8. Das faturas emitidas e vencidas permanecem em dívida as seguintes, num total de €4.974,15:
- Fatura n.º FT 202112/446486, no valor de €145.89, emitida em 08.11.2021 e vencida em 28.11.2021, fatura relativa ao período de faturação de Outubro de 2021 - cfr. doc. 3;
- Fatura n.º FT 202112/489079, no valor de €94.77, emitida em 09.12.2021 e vencida em 29.12.2021, fatura relativa ao período de faturação de Novembro de 2021 - cfr. doc. 4;
- Fatura n.º FT 202212/38435, no valor de €164.2, emitida em 07.01.2022 e vencida em 27.01.2022, fatura relativa ao período de faturação de Dezembro de 2021 - cfr. doc. 5;
- Fatura n.º FT 202212/81713, no valor de €4566.29, emitida em 06.02.2022 e vencida em 26.02.2022, fatura relativa ao período de faturação de Janeiro de 2022 e que inclui o valor da cláusula penal contratual, de €4.523,35 (€3.677,52 + IVA) - cfr. doc. 6;
- Fatura n.º FT 202212/128945, no valor de €3, emitida em 07.03.2022 e vencida em 27.03.2022, fatura relativa a despesas de cobrança pelo atraso no pagamento - cfr. doc. 7- (cfr. artigo 8.º da petição inicial).
B) Sobre o contrato 961017049
9. Entre A. e R. foi celebrado um contrato para prestação de bens e serviços de telecomunicações, a que foi atribuído o número de conta cliente/ contrato 961017049- (cfr. artigo 9.º da petição inicial).
10. No âmbito do contrato, solicitou a R. à A. a prestação dos serviços de TV, telefone e internet fixa, mediante pagamento de uma mensalidade de €34,99 acrescidos de IVA, serviços que foram instalados no dia 11.10.2021 - cfr. doc. 8- (cfr. artigo 10.º da petição inicial).
11. Como contrapartida do fornecimento dos serviços e das demais ofertas contratuais, assumiu a R. a obrigação de proceder ao pagamento tempestivo das faturas e manter o contrato pelo período de 24 meses (vg. período de permanência) - (cfr. artigo 11.º da petição inicial).
12. Mais, convencionaram as partes que, em caso de incumprimento do período de permanência, seria devido pela R. um valor indemnizatório, a título de cláusula penal, de igual valor ao das mensalidades em falta - (cfr. artigo 12.º da petição inicial).
13. Após a celebração do contrato a A. iniciou a prestação dos serviços, emitindo, mensalmente, as faturas correspondentes, todas enviadas à R. e sem que nenhuma tivesse sido devolvida ou a R. tenha apresentado qualquer reclamação- (cfr. artigo 13.º da petição inicial).
14. Pelo facto da R. não ter pago as faturas, apesar de interpelada para o efeito, a A. suspendeu os serviços em 13.01.2022; e em 08.02.2022, rescindiu o contrato por perda de interesse na sua manutenção e reclamou da R. o valor da cláusula penal contratual, determinada pelo valor das mensalidades em falta (20 meses e 24 dias) até final do período de permanência- (cfr. artigo 14.º da petição inicial).
15. Das faturas emitidas e vencidas permanecem em dívida as seguintes, num total de €842,37:
- Fatura n.º FT 202131/37221, no valor de €31.6, emitida em 18.10.2021 e vencida em 04.11.2021, fatura relativa ao período de faturação de Outubro de 2021 - cfr. doc. 9;
- Fatura n.º FT 202191/2703911, no valor de €34.99,
...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT