Acórdão nº 1003/20.4T8LLE-B.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 23-11-2023

Data de Julgamento23 Novembro 2023
Ano2023
Número Acordão1003/20.4T8LLE-B.E1
ÓrgãoTribunal da Relação de Évora
Processo n.º 1003/20.4T8LLE-B.E1
Tribunal Judicial da Comarca de Faro – Juízo de Execução de Loulé – J1
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Acordam na secção cível do Tribunal da Relação de Évora:
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I – Relatório:
Na presente acção executiva proposta por “(…), Unipessoal, Lda.” contra (…), este veio interpor recurso de despacho de indeferimento liminar proferido no incidente de oposição ao arresto.
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Em 10/07/2020 foi elaborado o auto de penhora junto aos autos de execução onde consta a penhora de diversos bens móveis (17 verbas), constado a menção que tais bens são pertença do executado (…), auto em cuja última página consta a menção de que foi constituído fiel depositário dos bens, (…) e que o mesmo aceitou o cargo.
Consta na mesma folha, logo de seguida, em dizeres manuscritos, o seguinte: «Os bens não foram removidos, contrariamente ao referido quanto ao depositário, passa a ser o Sr. (…), que assumirá solidariamente com o executado o pagamento da divida que ascende actualmente ao montante previsível de 25.000 euros, em pagamentos mensais e sucessivos de 3.000 euros a serem realizados até ao dia 10 de cada mês com início em 10/7/2020 para o IBAN (…)”;
Em seguida aos dizeres acima referidos constam diversas assinaturas, entre elas, a de (…).
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Por requerimento apresentado em 03/03/2021 e reiterado em 18/11/2021, (…) veio arguir a nulidade da sua constituição como fiel depositário, declarando que reiterava o alegado no requerimento de 02/03/2021, alegando, para tanto, que não tinha na sua posse os bens penhorados.
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Ouvidos o agente de execução e a exequente, foi proferido o despacho de 21/07/2022, que julgou improcedente a arguida nulidade de constituição de fiel depositário.
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Nesse mesmo despacho foi fixado o prazo de 5 dias para o fiel depositário, (…), apresentar ao agente de execução os bens penhorados de que havia sido constituído fiel depositário em 10/07/2020, sob pena de ser ordenado arresto em bens do depositário suficientes para garantir o valor do depósito e das custas e despesas acrescidas, sendo executado no próprio processo para o pagamento do valor do depósito e das custas e despesas acrescidas, tudo sem prejuízo de procedimento criminal, como previsto no artigo 771.º do Código de Processo Civil.
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O fiel depositário foi notificado e nada requereu no prazo que lhe foi fixado nem entregou os bens em causa.
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Por requerimento apresentado em 20/9/2022 o agente de execução comunicou que os bens não tinham sido entregues e requereu o arresto de bens do fiel depositário.
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Não resultando dos autos que os bens tivessem sido apresentados, por despacho datado de 23/11/2022, foi ordenado o arresto de bens do depositário de valor suficiente para garantir o valor do depósito, custas e despesas inerentes, prosseguindo a execução contra o depositário para pagamento do valor do depósito, custas e despesas inerentes. *
Foi igualmente ordenado que fosse extraída certidão de diversas peças processuais e a respectiva remessa ao Ministério Público para efeitos de instauração de procedimento criminal.
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Relativamente ao requerimento do fiel depositário em 13/10/2022, foi fixado o prazo de 10 dias para o exequente e o agente de execução se pronunciarem.
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Seguidamente, foi ordenado o arresto de bens do liquidatário.
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Na parte com relevo para a justa composição do incidente, o despacho recorrido tem a seguinte redacção:
«O Opoente, enquanto fiel depositário de bens penhorado e em face do arresto dos seus bens pela falta de apresentação dos bens penhorados, conforme determinado no despacho proferido em 23/11/2022 nos autos de execução, veio instaurar incidente de oposição à penhora nos termos previstos no art.º 784º do Código de Processo Civil.
No requerimento inicial discute o mérito da decisão que determinou o arresto dos seus bens, sustentando a inadmissibilidade desse arresto e bem assim da exigência de apresentação dos bens penhorados e que esteve na base do referido arresto.
Sucede que ao caso não tem cabimento o incidente de oposição à penhora, pois o acto praticado não foi a penhora de bens à ordem da execução, mas sim de arresto de bens do fiel depositário e determinado por despacho judicial (aliás, após audição desse fiel depositário).
Não é admissível igualmente a dedução de oposição ao abrigo do disposto no artigo 372º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil pois não estamos no âmbito do procedimento cautelar de arresto.
Em conclusão, perante o despacho proferido nos termos do artigo 771.º, n.º 2, do Código de Processo Civil, não se conformando, dispõe o fiel depositário da faculdade de interpor recurso nos termos legais (o qual, aliás, já foi interposto pelo Requerente), estando vedada a dedução e oposição, seja ao abrigo do disposto no artigo 784.º ou do artigo 372.º, n.º 1, alínea b), do Código de Processo Civil.
Neste sentido, veja-se o acórdão do Tribunal da Relação de Coimbra de 12/1/2010, proc.º n.º 820/04.7TBCBR-C.C1., in www.dgsi.pt.
Por conseguinte, porque manifestamente improcedente, deverá ser liminarmente indeferido o requerimento inicial».
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O recorrente não se conformou com a referida decisão e as alegações de recurso continham as seguintes conclusões:
«A. A douta decisão de que se recorre é o despacho de 05/04/2023 (ref. Citius 127735133), que indefere por “manifestamente improcedente” o requerimento de oposição ao arresto – embora notificado para tal.
B. Nos autos está em causa a defesa, por parte do ora Recorrente de um arresto aos seus bens que considera manifestamente injusta e infundada.
C. A reclamação que o ora Recorrente fez sobre o ato do Agente de Execução não pode ser considerada – como o faz o Tribunal a quo – como uma defesa cabal e o pleno exercício ao contraditório.
D. O auto de penhora não faz qualquer prova da posse por parte do ora Recorrente de quaisquer bens penhorados à ordem do processo.
E. Está-se a tratar de uma execução onde o verdadeiro executado não tem oportunidade de se opor, (onde a maior prova é a falta de acesso aos autos).
F. O despacho liminar fundamenta a decisão de “manifestamente improcedente” com a oportunidade de recurso ao despacho de 13/11/2022.
G. Não foi dada oportunidade ao Recorrente para discutir o acerto da ordem de arresto, nem o mais elementar direito ao contraditório, onde nem sequer lhe é dado a conhecer todos os elementos processuais para uma defesa das mais elementares.
H. Tal decisão viola os mais elementares princípios do direito entre ele o acesso ao direito à tutela jurisdicional efetiva consagrada constitucionalmente nos artigos 2.º e 20.º n.º 4 da Constituição da República Portuguesa.
Termos em que, nos melhores de direito e com o sempre mui douto suprimento de Vossas Excelências, deve o presente recurso ser considerado procedente, e a douta decisão recorrida ser revogada nos termos expostos, com as consequências legais, com o que se fará a esperada Justiça!».
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Foi ordenada a notificação da exequente/oposta para os termos do incidente de oposição (cfr. n.º 2 do art.º 293º do Código de Processo Civil) e, bem assim, para os termos do recurso, tudo como previsto no nº7 do artigo 641º do Código de Processo Civil.
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Não houve lugar a resposta.
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Admitido o recurso, foram observados os vistos legais.
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II – Objecto do recurso:
É entendimento uniforme que é pelas conclusões das alegações de recurso que se define o seu objecto e se delimita o âmbito de intervenção do Tribunal ad quem (artigos 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1, do Código de Processo Civil), sem prejuízo das questões cujo conhecimento oficioso se imponha (artigo 608.º, n.º 2, ex vi do artigo 663.º, n.º 2, do referido diploma).
Analisadas as alegações de recurso, o thema decidendum está circunscrito à apreciação da possibilidade de apresentação deste tipo de defesa por parte do depositário e, em caso afirmativo, se a mesma deve ser julgada procedente.
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III – Dos factos apurados
Os factos com interesse para a justa resolução da causa são os que constam do relatório inicial.
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IV – Fundamentação:
No que respeita aos deveres do depositário de bens penhorados, além das obrigações gerais previstas no artigo 1187.º[1] do Código Civil
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