Acórdão nº 100/22.6T8MDR-B.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 19-10-2023

Data de Julgamento19 Outubro 2023
Ano2023
Número Acordão100/22.6T8MDR-B.G1
ÓrgãoTribunal da Relação de Guimarães

Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães

I. Relatório

AA intentou, em .../.../2022, ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, contra BB, pedindo que se decrete o divórcio entre ambos, com fundamento no disposto no disposto nos artigos 1773.º n.º 3, 1781.º als. a) e d) e 1785.º, n.º 1 todos do Código Civil (CC), porquanto, além da separação de facto entre ambos há dezasseis meses, o réu saiu definitivamente o lar conjugal e passou a considerar a rutura do casamento com a ré, como definitiva, não mantendo intenção de manter o vínculo matrimonial ou de restabelecer a vida em comum.
Foi realizada a tentativa de conciliação, sem sucesso.
A ré foi citada para contestar, o que veio a fazer, impugnando o valor da causa e excecionando a nulidade do processo, por ineptidão da petição inicial. Impugnou a matéria alegada, pedindo, em reconvenção, a dissolução do casamento entre ambos, com fundamento nos factos alegados na contestação; a condenação do autor a pagar à ré uma indemnização pelos danos morais infligidos, em consequência da dissolução do casamento, de montante nunca inferior a 50.000,00 €, acrescida de juros desde a data em que resultar demonstrada a separação de facto.
O autor replicou, alegando, entre o mais, não ter qualquer interesse o vertido nos artigos do petitório reconvencional, face ao que institui o artigo 1792.º do CC e o n.º 1 do artigo 93.º do Código de Processo Civil (CPC).
O Tribunal a quo proferiu despacho, de 27-02-2023, no qual, além do mais, decidiu não admitir o pedido reconvencional apresentado pela ré, por inadmissibilidade legal.
Inconformada com esta decisão dela recorre a ré, pugnando no sentido da revogação da sentença.

Termina as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem):

«1. A Contestação da Ré termina com os pedidos seguintes: A) Julgar-se a acção improcedente, por não provada. B) Julgar-se a reconvenção procedente, dissolvendo-se o casamento entre ambos, com fundamento nos factos alegados nesta peça; C) O Autor condenado a pagar à Ré, uma indemnização pelos danos morais infligidos ao Autor, em consequência da dissolução do casamento (art 1792 C.Civ) de montante nunca inferior a €50 000,00, acrescida de juros desde a data em que resultar demonstrada a separação de facto.
2. É na própria acção, pela via reconvencional, que a R deve peticionar, quer a dissolução do casamento pelos factos por ela alegados, quer indemnização correspondente.
3. Ao indeferir os pedidos reconvencionais formulado pela R, o Tribunal recorrido violou os artigos 1975 do Código Civil e arts 2, 3, 3-A, 4, 266, 272, 501, 584 e 932, todos do CPC, o P. da descoberta da verdade material, o P. da adequação formal, princípios e normas que foram interpretados em violação dos artigos 1º, 13º e 20º da Constituição, sendo certo que o Tribunal recorrido deveria ter sido interpretado tais normas e princípios, admitindo a reconvenção do R.

Pedido:
Termos em que, fazendo-se a correcta aplicação das normas e princípios legais invocados e a melhor interpretação dos elementos dos autos, deve ordenar-se a revogação do Despacho recorrido e a sua substituição por outro que determine a admissibilidade das reconvenções, com as legais consequências».
Não consta que tenham sido apresentadas contra-alegações.
O recurso foi admitido pelo Tribunal a quo para subir de imediato, em separado e com efeito devolutivo.
Os autos foram remetidos a este Tribunal da Relação, confirmando-se a admissão do recurso nos mesmos termos.

II. Delimitação do objeto do recurso

Em face das conclusões das alegações do recurso, as quais delimitam o seu âmbito, e sem prejuízo do que seja de conhecimento oficioso - artigos 608.º, n.º 2, 635.º, n.º 4 e 639.º, n.º 1 do Código de Processo Civil (CPC) -, o objeto do presente recurso circunscreve-se a saber se a reconvenção deduzida pela apelante em processo de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, pretendendo que seja decretado o divórcio e a condenação do autor/reconvindo a pagar-lhe uma indemnização pelos danos morais infligidos, em consequência da dissolução do casamento, é ou não admissível.
Corridos os vistos, cumpre decidir.

III. Fundamentação

1. Os factos
1.1. Os factos, as ocorrências e elementos processuais a considerar na decisão deste recurso são os que já constam do relatório enunciado em I. supra.

2. Apreciação sobre o objeto do recurso

Na presente apelação vem impugnada a decisão de não admissão da reconvenção apresentada pela ré, por inadmissibilidade legal.
Para a apreciação do objeto da presente apelação, importa considerar que a reconvenção em referência foi deduzida pela apelante em processo de divórcio sem consentimento do outro cônjuge, pretendendo a reconvinte que seja decretado o divórcio com fundamento nos factos alegados na contestação, bem como a condenação do autor/reconvindo a pagar-lhe uma indemnização pelos danos morais infligidos, em consequência da dissolução do casamento, de montante nunca inferior a 50.000,00 €, acrescida de juros desde a data em que resultar demonstrada a separação de facto.
Analisando o que vem alegado como fundamento do pedido da ré/reconvinte, verifica-se que o pedido de indemnização formulado contra o autor/reconvindo se baseia em alegados danos não patrimoniais derivados da dissolução do casamento.
Por outro lado, embora na parte final da contestação-reconvenção, a ora apelante aluda à pretensão de dissolução do casamento entre ambos, com fundamento nos factos alegados na mesma peça, não especifica de forma expressa qual a causa objetiva de divórcio em que fundamenta tal pedido, dentro das atualmente previstas no artigo 1781.º do CC.

Nos termos do artigo 1781.º do CC são fundamento de divórcio sem consentimento de um dos cônjuges:
a) A separação de facto por um ano consecutivo;
b) A alteração das faculdades mentais do outro cônjuge, quando dure há mais de um ano e, pela sua gravidade, comprometa a possibilidade de vida em comum;
c) A ausência, sem que do ausente haja notícias, por tempo não inferior a um ano;
d)...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT