Acórdão nº 100/19.3PJAMD-B.L1-9 de Tribunal da Relação de Lisboa, 2022-12-15

Ano2022
Número Acordão100/19.3PJAMD-B.L1-9
ÓrgãoTribunal da Relação de Lisboa
Decisão proferida na 9ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa

AA e BB, arguidos nos autos, vieram recorrer da decisão da JIC que rejeitou o seu requerimento de abertura de instrução, com fundamento na sua inexistência por falta de assinatura da peça processual, apresentando para o efeito as seguintes conclusões:
I. O presente recurso tem por objeto o Despacho com a referência citius n.° 138104981, proferido nos presentes autos no dia 13.06.2022, que incide sobre a matéria de direito, no qual a Mm.a Juíza, decidiu no sentido de " ...é de considerar inexistente o requerimento de abertura de instrução apresentado pelos AA e BB., razão pela qual vão os mesmos rejeitados - art° 287°, n°3 do C.P.P.."
II. Na sequência da Acusação Pública subscrita pelo Ministério Público, datada de dia 17.03.2022, os Recorrentes apresentaram no dia 09.05.2022, os respetivos Requerimentos de Abertura de Instrução.
III. Como tal, os Requerimentos de Abertura de Instrução foram apresentados (i) em tempo, (ii) por quem tinha legitimidade - os Arguidos -, (iii) no tribunal competente - Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa Oeste, Juízo de Instrução Criminal da Amadora - e (iv) por um meio legalmente admissível, nos termos da Portaria n.° 642/2004 de 16/06, designadamente, por correio eletrónico.
IV. Não obstante, no dia 13.06.2022, o Douto Tribunal a quo, proferiu o despacho recorrido, no qual considerou "inexistente o requerimento de abertura de instrução apresentado pelos arguidos AA e BB, razão pela qual vão os mesmos rejeitados – artº 287º, n°3 do C.P.P..".
V. Para o efeito considerou o Douto Tribunal a quo, que "Vieram estes arguidos apresentar o seu requerimento de abertura de instrução através do Distinto Advogado que remeteu o aludido RAI por correio electrónico profissional, ou seja, da Ordem dos Advogados, porém, sem aposição de assinatura física ou electrónica, mormente certificada pela respectiva Ordem dos Advogados, logo sem observância das disposições da Portaria n.° 642/2004 de 16/4 e mesmo sem a validação por entidade certificadora nos termos do D.L.n° 290-D/99 de 2/8, na redacção do D.L.n° 62/2003 de 3/Abr, inexistindo certificação de qualquer assinatura digital, como inexiste a validação cronológica desse acto."
VI. Ambos os Requerimentos de Abertura de Instrução, foram, regularmente enviados, para o Ministério Público, pelo Mandatário Judicial dos Recorrentes, no dia 09.05.2022, através de correio eletrónico certificado, tendo o Requerimento de Abertura de Instrução do Recorrente ………………………., sido enviado às 23h:48m e o do Recorrente …………………… às 23h:51m.
VII. Ora, não obstante os Requerimentos de Abertura de Instrução não estarem assinados - assinatura autógrafa -, pelo Mandatário Judicial, os mesmos foram enviados através do e-mail profissional do Advogado, que é um e-mail seguro, certificado pela Ordem dos Advogados e que se encontra associado a um certificado digital qualificado - onde consta o nome e a cédula profissional do Advogado.
VIII. Pelo que a autenticidade e credibilidade do emissor do e-mail, neste caso do Mandatário Judicial, bem como dos documentos estavam devidamente assegurados.
IX. Para além do exposto, o Douto Tribunal a quo não tinha fundamento legal para rejeitar os Requerimentos de Abertura de Instrução com este fundamento, visto que a decisão de rejeição apenas pode ocorrer nos casos taxativamente previstos na lei, designadamente quando o requerimento de abertura de instrução for (i) extemporâneo, (ii) houver incompetência do juiz ou for (iii) inadmissível legalmente a instrução.
X. Sendo que nesta última hipótese de "inadmissibilidade legal da instrução", apenas se incluem as deficiências do conteúdo e não as deficiências formais dos Requerimentos de Abertura de Instrução.
XI. No caso sub judice não se verifica nenhuma das hipóteses enumeradas na disposição legal, dado que os Requerimentos de Abertura de Instrução, foram (i) entregues em prazo (dia 09.05.2022), (ii) no tribunal competente, sendo admissível a instrução, (iii) pelos Arguidos, relativamente a factos pelos quais o Ministério Público deduziu acusação, nos termos do artigo 287.° n.° 1, alínea a), do Código do Processo Penal.
XII. Para além desta situação, não existe, na lei, cominação para as situações de vícios de forma nos Requerimentos de Abertura de Instrução, até porque, em bom rigor, não estão sujeitos a formalidades especiais (artigo 287.° n.° 2 do Código Processo Penal).
XIII. Para além do exposto, diga-se também que não poderia o Douto Tribunal a quo rejeitar os Requerimentos de Abertura de Instrução com fundamento na "inadmissibilidade da instrução", por ausência de assinatura, dado que esta é uma questão de forma e não de conteúdo.
XIV. Aliás, a ausência de assinatura configura uma irregularidade que, nos termos dos artigos 118.°, n.° 2, e 123.°, ambos do Código do Processo Penal, é suscetível de sanação.
XV. Não obstante, e ainda que se considere que estamos perante uma nulidade - o que não se concede mas se alvitra por mero dever de patrocínio -, sempre se diga que a mesma é, igualmente, sanável.
XVI. Aliás, não faz sentido o legislador ter previsto que (i) a falta de assinatura da Acusação pelo Ministério Público (artigo 283.°, n.° 3, do Código de Processo Penal), ou do Assistente (artigo 284.°, n.° 2, do Código de Processo Penal) ou ainda (ii) a falta de assinatura do juiz na Sentença (artigo 615.°, n.° 1, alínea a), e n.° 2 do Código do Processo Civil aplicadas por remissão do artigo 4.° do Código do Processo Penal) sejam nulidades suscetíveis de sanação (a este respeito veja-se o Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, proferido no dia 26.06.2021, no âmbito do processo n.° 5028/18.1T9LSB.E1, em que foi Relator o Juiz Desembargador Berguete Coelho) e a falta de assinatura no Requerimento de Abertura de instrução - que não está sujeito a formalidades especiais -, seja cominada com a inexistência jurídica.
XVII. Desta forma, o Douto Tribunal a quo deveria, primeiramente, ter permitido que os Arguidos sanassem o vício, constituindo-se esta situação, aliás, num dever do juiz, de providenciar - de forma oficiosa -, pelo suprimento de falta de pressupostos ou vícios suscetíveis de sanação, conforme o disposto no artigo 6.°, n.° 2, do Código do Processo Civil, por remissão do artigo 4.° do Código do Processo
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