Acórdão nº 02817/13.7BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 2023-11-09

Ano2023
Número Acordão02817/13.7BEPRT
ÓrgãoTribunal Central Administrativo Norte - (TAF do Porto)
Acordam em conferência, os juízes que constituem a Subsecção Comum da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte:

1. RELATÓRIO
1.1. A Recorrente (Autoridade Tributária), notificada da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, datada de 06 de maio de 2016, que julgou procedente a acção administrativa especial proposta pela Recorrida ([SCom01...], Lda.), visando a anulação do despacho do Chefe do Serviço de Finanças ... 2 que determinou a cessação de benefícios fiscais por existência de dívidas a 31 de Dezembro de 2012 e, em consequência, o condenou na respectiva reposição relativamente ao exercício de 2012, inconformada vem apresentar o presente recurso.
Alegou, formulando as seguintes conclusões:
« (...)
A - Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto de 06.05.2016 que julgou procedente a ação administrativa especial interposta pelo ora Recorrido, anulou o acto impugnado e condenou o ora Recorrente a repor o benefício fiscal relativamente ao ano de 2012.
B - Em causa nos presentes autos está a legalidade da decisão do Recorrente de cessação de benefícios fiscais por existência de dívidas fiscais a 31.12 nos termos das disposições conjugadas da a) do nº 5 com o que dispõe o nº 7 do artigo 14.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais.
C - Considerou a douta sentença recorrida visto que os serviços não estavam abertos ao público (devido à tolerância de ponto) de 31 .12, de acordo o disposto no art.º 72.º, nº 1 alínea c) do CPA, o termo do prazo transferiu-se para o primeiro dia útil seguinte.
D - Salvo melhor entendimento, considera o Recorrente que a douta decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto incorre em erro de julgamento por errónea interpretação a) do nº 5 em conjugação com o nº 7. do artigo 14.º do EBF e do artigo 72.º do CPA.
E - Com efeito, a cessação do benefício fiscal não resulta do incumprimento do prazo mas da aferição de uma situação contributiva debitória reportada a um determinado momento do ano.
F - A cessação de benefícios fiscais por motivos de existência de dívidas fiscais não resulta de um processo de contagem de um prazo.
G - Conforme resulta da lei, a data de 31.12 não é o termo de um prazo, mas a ocorrência de um evento temporalmente determinado que determina a aferição de um determinado requisito.
H - E porque assim não tem aplicação, ao caso em apreço o disposto no artigo 72.º do CPA, nem quaisquer outras normas relativas à suspensão, interrupção ou transposição de prazos.
I - Assim sendo, como na realidade o é verificam-se os pressupostos legais de que depende a cessação dos benefícios fiscais em face da constatação da situação debitória da Recorrida.
J - Aliás, a Recorrida tinha ao seu dispor vários meios de pagamento e um período alargado de tempo para efectuar o referido pagamento das dívidas fiscais
K - Pelo que a concessão da tolerância de ponto não constitui causa direta nem indirecta do incumprimento das suas obrigações fiscais.
L - Donde, sendo a falta de pagamento atempado apenas é imputável à Recorrida, a aplicação do artigo 72.º do CPA ao caso em apreço poderia com facilidade constituir uma situação de abuso de direito.
M - Tendo em conta os factos dados como assentes considera-se estarem verificados todos os pressupostos legais para fazer perecer o direito aos benefícios fiscais em causa, nos termos do disposto no n.º 6 do art. 14º do EBF, relativamente ao ano ou período de tributação em que ocorrem os pressupostos, 2012.
N - Resulta assim evidente que a decisão impugnada foi praticada de acordo com os preceitos legais aplicáveis, assim como foi efectuada uma correcta interpretação dos pressupostos de facto.
O - Por tudo quanto vem exposto é de concluir que a douta sentença recorrida padece de erro de julgamento quanto à da matéria de direito pelo que não poderá manter-se.
Termos em que deverá ser concedido provimento ao presente recurso jurisdicional ora interposto e em consequência, ser revogada a sentença recorrida.»
1.2. A Recorrida, notificada da apresentação do presente recurso, não apresentou contra-alegações.
1.3. Foi notificado o Ministério Público junto deste Tribunal.
1.4. Com dispensa dos vistos legais dos Exmos. Desembargadores Adjuntos (cf. artigo 657º, n.º 4 do Código de Processo Civil (CPC), submete-se desde já à conferência o julgamento do presente recurso.
Questões a decidir:
As questões sob recurso e que importa decidir, suscitada e delimitada pelas alegações de recurso e respectivas conclusões, consiste em saber se a sentença recorrida enferma de erro de julgamento de direito por errónea interpretação a) do nº 5 em conjugação com o nº 7. do artigo 14.º do EBF e do artigo 72.º do CPA.

2. FUNDAMENTAÇÃO
2.1. De facto
2.1.1. Matéria de facto dada como provada na 1ª instância e respectiva fundamentação:
« Com interesse para a decisão da causa resulta apurada a seguinte factualidade:
a) Em 13/08/2012 foi emitida em nome da A. a liquidação de IRC nº ...82, relativa ao exercício de 2011, no montante de €35.953,39, com data limite de pagamento de 26/09/2012 (cf. fls. 5 do processo administrativo apenso aos autos, doravante, apenas, PA). ---
b) A A. não procedeu ao pagamento do imposto dentro do prazo limite para o pagamento voluntário referido em a), o que levou a que fosse instaurado em 06/11/2012, o processo de execução fiscal nº ...70 para pagamento da quantia de €36.253,46, sendo emitida em 15/11/2012 a competente citação dirigida à impugnante (cf. fls. 6 e 9 do PA). ---
c) A A. procedeu ao pagamento do montante de €37.067,09, que estava a ser exigido no processo de execução referido em b), através do Documento Único de Cobrança em 02/01/2013, tendo-se extinguido o processo executivo (cf. fls. 7 do PA). ---
d) No dia 31/12/2012 foi concedida tolerância de ponto e os Serviços de Finanças estiveram encerrados ao público.---
e) Pelo ofício nº ...29, datado de 14/08/2013, a A. foi notificada da “Não produção de efeitos de benefícios fiscais – Notificação para audição”, ali se adiantando que “por análise sistemática dos dados existentes nos sistemas da AT, constatou-se a existência da(s) seguinte(s) dívidas à data de 2012-12-31” (cf. fls. 9 dos autos). ---
f) Em resposta ao ofício referido em e), a A. apresentou em 23/08/2013, onde além d o mais refere que “Face ao exposto e porque apenas não liquidamos o IRC no ano civil de 2012 pelo facto do serviço de finanças estra encerrado, motivo pelo qual o sujeito passivo é completamente alheio, solicitamos a V. Exa. que considere o pagamento efectuado e que nos seja resposto o benefício fiscal na declaração periódica (Mod. 22) relativa ao período de 2012” (cf. fls. 22 dos autos). ---
g) Sobre o pedido referido em f) recaiu a informação de 26/08/2013, onde se concluiu que:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
h) Sobre esta informação recaiu o despacho do Chefe do Serviço de Finanças ..., de 27/08/2013, com o seguinte teor:
[Imagem que aqui se dá por reproduzida]
i) A presente acção foi intentada em 27/11/2013 (cf. fls. 2 dos autos). ---
Factos não provados
Dos autos não resultam provados outros factos com interesse para a decisão da causa. ---
*** ***
O Tribunal firmou a sua convicção na consideração dos documentos juntos aos autos que não foram alvo de contestação. ---
Em relação à factualidade apurada na alínea d) o tribunal firmou a sua convicção na posição da R. vertida nas suas alegações e nas notícias publicadas nos jornais que ali são indicados, bem como no conhecimento pessoal que teve de tal facto, uma vez que a tolerância de ponto foi extensiva aos tribunais.»

2.2. De direito
Importa apreciar se a decisão recorrida que julgou procedente a acção administrativa especial proposta por [SCom01...], Lda., visando a anulação do despacho do Chefe do Serviço de Finanças ... 2 que determinou a cessação de benefícios fiscais por existência de dívidas a 31 de dezembro de 2012 e, em consequência, o condenou na respectiva reposição relativamente ao exercício de 2012, padece do erro de julgamento de direito que lhe é imputada pela Recorrente.
A sentença julgou procedente a acção. Para tanto, estruturou, em síntese, a argumentação seguinte:
«Está em causa apurar se o despacho de cessação dos benefícios fiscais é lícito e qual o reflexo que tem o facto de no dia 31/12/2012, último dia em que podia ser pago o imposto ter havido tolerância de ponto para os funcionários públicos e o Serviço de Finanças ter encerrado. ---
Vejamos. ---
O art. 14º do Estatuto dos Benefícios Fiscais dispõe da seguinte forma:
“Artigo 14.º
Extinção dos benefícios fiscais
1 - A extinção dos benefícios fiscais tem por consequência a reposição automática da tributação-regra.
2 - Os benefícios fiscais, quando temporários, caducam pelo decurso do prazo por que foram concedidos e, quando condicionados, pela verificação dos pressupostos da respectiva condição resolutiva ou pela inobservância das obrigações impostas, imputável ao beneficiário.
3 - Quando o benefício fiscal respeite a aquisição de bens destinados à directa realização dos fins dos adquirentes, fica sem efeito se aqueles forem alienados ou lhes for dado outro destino sem autorização do Ministro das Finanças, sem prejuízo das restantes sanções ou de regimes diferentes estabelecidos por lei.
4 - O acto administrativo que conceda um benefício fiscal não é revogável, nem pode rescindir-se o...

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