Acórdão nº 02539/21.5T8PRD-S1 de Tribunal dos Conflitos, 2022-09-21

Data de Julgamento21 Setembro 2022
Ano2022
Número Acordão02539/21.5T8PRD-S1
ÓrgãoTribunal dos Conflitos - (CONFLITOS)
Acordam, no Tribunal dos Conflitos:


1. Em 28 de Novembro de 2021, a Clínica Médico-Dentária R..., Lda., instaurou no Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este – Juízo Local Cível de Paredes uma ação declarativa contra o Município de Paredes, pedindo:
a) Seja o Réu condenado a reconhecer a natureza de caminho privado do arruamento particular que dá acesso ao logradouro dos imóveis que o ladeiam, com as demais consequências legais.
b) Seja o Réu condenado a repor a floreira que retirou e que dividia em duas vias aquele caminho particular, repondo a configuração do caminho, tal como ela era antes da ilícita intervenção do Réu”.
Alegou que o referido caminho sempre foi particular, tendo sido construído por particulares para servir de logradouro a dois prédios contíguos: “aquele arruamento sempre esteve ao serviço dos condóminos de ambos os prédios que o ladeiam, ou de quem, não sendo condómino utilizou o logradouro para se dirigir aos imóveis em apreço (nem o arruamento tem outra serventia), denunciando um uso circunscrito e subordinado a interesses de carácter meramente privatístico”.
O réu contestou. Por entre o mais, suscitou a incompetência material do Tribunal, por se tratar de litígio do âmbito da jurisdição administrativa, nos termos do disposto na alínea i) do n.º 1 do artigo 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais, uma vez que tem por objeto questões relativas à condenação à remoção de situações constituídas em via de facto, sem título que as legitime.
A autora replicou, sustentando a competência da jurisdição comum.
Recordou que, previamente à instauração da presente ação, demandou o réu no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel (processo n.º 725/19.7BEPNF), deduzindo, além do mais, pedido coincidente com o que acima foi transcrito como pedido b), assente na mesma relação material, para cuja apreciação o Tribunal Central Administrativo do Norte, em recurso, considerou competentes os tribunais comuns.
Por despacho de 3 de Abril de 2022, o Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este – Juízo Local Cível de Paredes – Juiz 1, julgando verificada a exceção dilatória de incompetência absoluta do tribunal, declarou-se incompetente em razão da matéria para apreciar o mérito da ação e absolveu o réu da instância. Entendeu o Tribunal que, pretendendo a autora o reconhecimento da natureza de caminho privado do arruamento em causa e a condenação do réu a repor tal parcela no estado em que se encontrava anteriormente à obra que levou a cabo – contra a sua vontade, sem o seu conhecimento ou autorização e sem que previamente a tenha adquirido pela via do direito privado ou da expropriação –, a acção enquadra-se na alínea i) do n.º 1 do art. 4.º do Estatuto dos Tribunais Administrativos e Fiscais - condenação à remoção de situação constituída em via de facto, sem título que a legitime.
Notificada, a autora requereu a resolução do conflito negativo de jurisdição pelo Tribunal dos Conflitos.
Por despacho de 20 de Maio de 2022, o Tribunal Judicial da Comarca do Porto Este – Juízo Local Cível de Paredes – Juiz 1 determinou a remessa dos autos ao Tribunal dos Conflitos.
Remetidos os autos ao Tribunal dos Conflitos, o Presidente do Supremo Tribunal de Justiça determinou que se procedesse à apreciação do presente conflito negativo de jurisdição, nos termos previstos pela Lei n.º 91/2019, de 4 de Setembro.
Notificadas para se pronunciarem, querendo, as partes nada disseram.
Nos termos do n.º 4 do artigo 11.º, n.º 4, da Lei n.º 91/2019, o Ministério Público emitiu parecer no sentido de a competência para conhecer da presente acção caber aos Tribunais Judiciais, concretamente ao Juízo Local Cível de Paredes, do Tribunal Judicial da Comarca de Porto Este, uma vez que se trata de uma acção real “em que a controvérsia se centra no reconhecimento do direito de propriedade sobre o imóvel reivindicado”.
Citou, em abono da interpretação de que “a nova alínea i), do n.º 1, do artigo 4.º do ETAF" não abrange estas acções, os acórdãos do Tribunal dos Conflitos com os n.ºs 048/18, 015/20 e 03802/20.8T8GMR-G1.S1.

2. Os factos relevantes para a decisão constam do relatório.
Está pois em causa, apenas, determinar quais são os tribunais competentes para apreciar o pedido da autora, se os tribunais judiciais – que, no conjunto do sistema judiciário, têm competência residual (n.º 1 do artigo 211º da Constituição, n.º 1 do artigo 40º da Lei de Organização do...

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